1. INTRODUÇÃO
O presente estudo tem por objetivo estudar o imóvel e seu registro no âmbito do ordenamento jurídico, abordando aspectos relativos à propriedade e aos seus gravames reais. Cabe ao serviço de registro de imóveis, com exclusividade, assegurar a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos e negócios jurídicos imobiliários, sendo que a titularidade desse serviço é exercida pelo registrador, agente em regime de colaboração com o Estado, profissional do direito, ou seja, com conhecimento jurídico, dotado de fé-pública, que se traduz na presunção legal de legalidade e de veracidade daquilo que se atesta.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1. Da Publicidade registrária
Diógenes Gasparini (2003) conceitua a publicidade como elemento qualitativo daquilo que é dado ao conhecimento de todos, de maneira geral, ou ainda a determinado grupo de pessoas ou a pessoa determinada, que possa a vir a ter algum interesse.
Assim, coexistem no ordenamento jurídico pátrio tanto a chamada publicidade ativa, na qual o conhecimento é dado a todos, ou à generalidade de determinado grupo de pessoas, tendo como exemplos a publicação inerente à instituição de bens de família e aos editais de loteamento. Quanto à disponibilização passiva, ou seja, a publicidade passiva ela se mostra tipicamente registral, muito própria dos acervos documentais, sendo que o conhecimento será propiciado àqueles que demonstrem interesse específico, expressado na iniciativa de busca, exame, ou mesmo o pedido de certidão do registro ou assento.
A publicidade passiva se encontra umbilicalmente ligada à atividade registral dos imóveis. O princípio da publicidade não se desenvolve como um fim em si mesmo, mas como instrumento de garantia de eficácia às quais atos registrários estão jungidos, na qualidade de verdadeiros atos administrativos. A garantia de publicidade se encontra vinculada ao caráter público dos atos registrais, praticados por delegação estatal, e diz respeito à proteção de interesses individuais, traduzindo-se em oponibilidade a terceiro ou mesmo à coletividade. Assim, a publicidade passiva no registro de imóveis se manifesta pela exibição de livros de registro ou mediante a expedição de certidão do assento buscado, nos termos do artigo 16 da Lei de Registros Públicos, Lei n.º 6.015/73, in verbis:
“Art. 16. Os oficiais e os encarregados das repartições em que se façam os registros são obrigados:
1º a lavrar certidão do que lhes for requerido;
2º a fornecer às partes as informações solicitadas.”
As certidões podem ser lavradas em inteiro teor, em resumo, ou em relatório por quadros, de acordo com os quesitos apresentados pelo interessado.
2.2. Do Imóvel
O imóvel se apresenta como o suporte material sobre o qual recaem os direitos reais. Os artigos 79 a 81 do Código Civil delimitam os contornos jurídicos do imóvel. Vejamos:
“Art. 79. São bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente.
Art. 80. Consideram-se imóveis para os efeitos legais:
I - os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram;
II - o direito à sucessão aberta.
Art. 81. Não perdem o caráter de imóveis:
I - as edificações que, separadas do solo, mas conservando a sua unidade, forem removidas para outro local;
II - os materiais provisoriamente separados de um prédio, para nele se reempregarem.”
Assim, a lei civil tratou de enumerar não somente os imóveis materiais mas também realiza ficções jurídicas para equiparar a imóveis elementos diversos, como é o caso do direito à sucessão aberta. Todos os imóveis particulares devem ser inscritos no registro de imóveis, com matricula própria, sendo que não há necessidade de ingresso dos prédios públicos, pois eles prescindem da proteção do serviço registrário. A justificativa para essa desnecessidade ocorre no fato de que os imóveis públicos não são objeto de negócios jurídicos entre particulares, tais como os rios federais, as ilhas fluviais, oceânicas e costeiras, dentre outros. Todavia, aqueles prédios transmitidos aos particulares ou deles oriundos, são inscritos no serviço de registro de imóveis, como é o caso de imóveis desapropriados ou mesmo a criação de espaços públicos, no contexto de loteamento urbano, por exemplo.
Em princípio, pois, a base física do registro é o imóvel material, porção delimitada da superfície terrestre, demarcada por uma poligonal fechada. Há casos em que o imóvel, do ponto de vista registral, se encontra baseado sobre imóvel material diverso, sendo o caso do condomínio edilício. Nesses casos, a unidade autônoma, de uso exclusivo, recai sobre a base do condomínio, sendo que após a instituição do condomínio, haverá uma matrícula para cada unidade de uso exclusivo, com a respectiva fração ideal do terreno. Assim, os direitos reais não recairão sobre o imóvel físico (a poligonal fechada sobre a superfície), e sim, sobre a unidade autônoma baseada em uma matrícula exclusiva.
Com efeito, cada imóvel deverá ser inscrito em uma matrícula, na qual serão feitos todos os assentos relativos aos direitos reais sobre ele incidentes, sendo que tais negócios jurídicos, por se tratar de direitos reais, oponíveis erga omnes, têm seu rol exaustivamente prescrito em lei, no caso nos artigos 168 da Lei de Registros Públicos, e em algumas leis ordinária federais esparsas.
A sistemática do fólio real, ou matrícula, foi introduzida em nosso ordenamento jurídico pela referida Lei n.º 6.015/73, onde o conjunto de registros e averbações ocorrerão de maneira continuada no seio da matrícula de cada imóvel, no caso, no Livro 2 (registro geral). Assim, toda e qualquer mutação jurídica previamente arrolada em lei será registrada ou averbada na matrícula correspondente, de modo que se tenha fácil acesso de toda a vida jurídica do prédio. Tal sistemática contribuiu sobremaneira para o aperfeiçoamento da segurança nas transações imobiliárias, ficando plenamente possível conhecer eventuais gravames que venham a recair sobre qualquer imóvel.
Para que seja dada efetividade à mencionada segurança jurídica, vige em nosso ordenamento o princípio da unitariedade da matrícula, sendo que, em existindo dois fólios, um deles necessariamente será nulo. Liminarmente é lícito o bloqueio de matrícula até o fim da ação de declaração de nulidade de matrícula imobiliária. Nessa esteira, trazemos à colação aresto do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que ficou assim ementado:
“Processo: Agravo de Instrumento-Cv
1.0407.12.003763-2/001 1221812-46.2012.8.13.0000 (1)
Relator(a): Des.(a) Hilda Teixeira da Costa
Data de Julgamento: 21/05/2013
Data da publicação da súmula: 03/06/2013
Ementa: Ação cautelar preparatória. Liminar. Bloqueio de matrícula no registro de imóveis. Letigimidade ad causam. Espólio daquele em cujo nome consta o domínio. Presença. Duplicidade de matrículas. Ofensa ao princípio da unitariedade. Imóvel rural desmembrado. Indícios veementes de nulidade de pleno direito. Medida acautelatória. Possibilidade. Natureza jurídica da medida prevista no art. 214 da lei dos registros públicos. Profilaxia do registro público. Medida preventiva que visa impedir o alastramento da ilegalidade. §4º do art. 214 da LRP. Inteligência. Imóvel objeto de praça em execução trabalhista. Ausência de prejuízo. Recurso a que se dá provimento. (Des. Marcelo Rodrigues)
v.v.
EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO - BLOQUEIO DE MATRÍCULA IMOBILIÁRIA - INDEVIDO - DECISÃO MANTIDA
- O registro público, perante a legislação brasileira, tem como fundamento a segurança dos negócios jurídicos em nome do estado. Essa é a atribuição maior do registrador mobiliário, conforme está na Lei 8.935/94, que regulamenta o artigo 236 da Constituição da República.
- Enquanto a própria matrícula não for cancelada nos termos do artigo 233 da Lei de Registros Públicos, a matrícula é o repositório legal acerca das alterações/modificações havidas no imóvel. (Des. Afrânio Vilela)” (grifos da autora).
Calha registrar ainda que o imóvel constitui-se em uma unidade física, não se admitindo que um imóvel descontínuo tenha uma só matrícula, ainda que as partem venham a formar um todo para a exploração agropecuária, por exemplo.
2.3. Possíveis modificações na matrícula imobiliária
Existem algumas modificações que somente ocorrem na base registral do imóvel, a matrícula, são elas: a fusão, agregação, segregação e a divisão.
A fusão de matriculas ocorre somente entre imóveis limítrofes, pertencentes a um mesmo proprietário, ou condomínio, sendo que, aberta nova matrícula para o imóvel fundido, cancelam-se as matrículas antigas, forte no já mencionado princípio da unitariedade do fólio real.
A agregação se assemelha à fusão, reclamando coincidência de proprietário e continuidade física, ocorre que nesse caso o um imóvel sofrerá redução, sem deixa de existir, enquanto o outro terá sua área acrescida, sem haver abertura de nova matrícula e cancelamento das existentes.
A segregação se dá quando há um desdobramento de um prédio, formando-se um novo imóvel, nesse caso haverá a abertura de uma nova matrícula para o novo imóvel, não havendo cancelamento do prédio que sofreu o desdobro. A divisão se assemelha à segregação, onde também há delimitação a partir de um imóvel, ocorre que nesse caso, além da abertura de nova matricula para o novo imóvel há também cancelamento da matrícula antiga, com abertura de nova matricula para o prédio que sofreu a divisão.
3. CONCLUSÃO
Diante do que restou exposto, verificamos a importância do princípio do fólio real nas transações imobiliárias, em especial no princípio da unitariedade da matrícula, que ficará exclusivamente a cargo do registrador de imóveis, a quem cabe zelar pela segurança jurídica e legalidade nos negócios jurídicos envolvendo imóveis.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.
BRANDELLI, Leonardo. Teoria geral do direito notarial. São Paulo: RT, 1998.
CENEVIVA, Walter. Lei dos Registros Públicos Comentada. 13ª ed. São Paulo: Saraiva, 1999.
CHAVES, Carlos Fernando Brasil e REZENDE, Afonso Celso F. Tabelionato de Notas e o Notário Perfeito. 7ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
FILHO, Nicolau Balbino. Registro de Imóveis. Doutrina. Prática e Jurisprudência. 16ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012
KONNO, Alyne Yumi. Registro de Imóveis: Teoria e Prática. Editora Memória Jurídica, 2010.
LOPES, Seabra. J. Direito dos Registos e Notariado - 2ª ed. Coimbra: Livraria Almedina, 2002.
Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Graduada em Direito pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Procuradora Federal.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOLLERO, Barbara Tuyama. Do imóvel e seu registro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42179/do-imovel-e-seu-registro. Acesso em: 22 nov 2024.
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