RESUMO: O art. 5º da Constituição Federal assegura proteção aos estrangeiros que se encontrem no país. A regulamentação da autorização para o estrangeiro laborar no território nacional está contida na lei n. 6.815/1980, que dispõe sobre a situação jurídica do estrangeiro no Brasil. A legislação trabalhista pátria é plenamente aplicável a estes trabalhadores, também merecendo proteção os obreiros que se encontram em situação migratória irregular.
PALAVRAS CHAVE: TRABALHADOR ESTRANGEIRO. VISTO PARA TRABALHO. DIREITOS TRABALHISTAS.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos o Brasil tem recebido um número cada vez maior de trabalhadores estrangeiros. Dentre os profissionais estrangeiros procurados para trabalhar no país destacam-se os que são das áreas de tecnologia da informação e das engenharias.
O objeto desse trabalho consiste em compreender o que ocorre quando o estrangeiro vem trabalhar no Brasil, desde a autorização para o trabalho emitida pelos órgãos competentes até o tipo de proteção legal que recebe.
A história do Brasil é marcada pela presença de imigrantes. Desde a colonização, a partir de 1530, o país começou a receber estrangeiros, principalmente de origem portuguesa e africana e, posteriormente, europeus. O Brasil, nos últimos anos, passou a ser um destino procurado por muitos estrangeiros.
O Ministério do Trabalho e Emprego disponibiliza, em meio eletrônico, relatórios sobre as autorizações concedidas a estrangeiros para trabalhar no Brasil. Segundo a base estatística da Coordenação-Geral de Imigração (CGIg) foram concedidas no ano de 2012 um total de 73.022 autorizações de trabalho a estrangeiros. Destes, 8.340 receberam autorização permanente e os 64.682 restantes receberam a provisória.
Os próximos tópicos serão dedicados ao estudo do tratamento legal dado ao trabalhador estrangeiro, incluindo a entrada no país e a fiscalização feita pelos órgãos competentes.
Os estrangeiros que pretendem trabalhar no Brasil somente podem fazê-lo mediante a concessão do visto para trabalho. É imprescindível que o Ministério do Trabalho e Emprego, por meio da Coordenação-Geral de Imigração, autorize o trabalho aos estrangeiros. Em determinadas situações a autorização é emitida pelo Conselho Nacional de Imigração (CNIg).
Para que um estrangeiro possa trabalhar no território nacional é necessário que uma pessoa jurídica estabelecida no Brasil requeira, previamente, uma autorização de trabalho junto à Coordenação-Geral de Imigração do Ministério do Trabalho e Emprego. O pedido deve ser instruído com os documentos exigidos e obedecerá às disposições legais.
Além dessa regra geral, vislumbra-se que os estrangeiros casados com brasileiros ou que tenham filho brasileiro sob sua guarda ou assistência podem residir no Brasil, com direito a trabalhar. Insta salientar que o Brasil também participa de alguns Acordos Internacionais que preveem a hipótese de residência com direito a trabalho, como os Acordos de Regularização Migratória e o Acordo de Residência para Nacionais dos Estados Partes do MERCOSUL, Bolívia e Chile.
Para os estrangeiros que entraram irregularmente no país ainda existe a possibilidade de edição de uma lei que corrija estas situações mediante a concessão de anistia. Um fato dessa natureza ocorreu com a Lei n. 11.961/2009, que concedeu anistia aos estrangeiros indocumentados que entraram no território brasileiro até 01.02.2009 e ainda estavam em situação migratória irregular.
Compete ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil conceder no exterior os vistos para trabalho. Ressalte-se a necessidade de prévia autorização do Ministério do Trabalho e Emprego para a emissão deste tipo de visto.
O art. 1º da lei 6.815 dispõe que aos estrangeiros que pretendam vir ao Brasil pode ser concedido visto de trânsito, de turista, temporário, permanente, de cortesia, oficial e diplomático.
Os denominados vistos de trabalho pertencem à categoria dos temporários, especificamente àqueles indicados nos incisos III e V do art. 13 da lei n. 6.815: estrangeiro que pretenda vir ao Brasil na condição de artista ou desportista ou na condição de cientista, professor, técnico ou profissional de outra categoria, sob regime de contrato ou a serviço do Governo brasileiro.
Quanto ao assunto observem-se as lições esclarecedoras do juiz do trabalho e doutrinador Marcelo Moura:
Portanto, o estrangeiro que quiser trabalhar no Brasil, além do referido contrato de trabalho com visto do Ministério do Trabalho, ou órgão ao qual for delegada esta atribuição, deverá ter visto permanente, concedido no exterior pelas Missões Diplomáticas e Repartições Consulares (art. 2º do decreto).
O visto temporário só autoriza o trabalho dos profissionais especificados no art. 22 do regulamento, quais sejam: cientista, professor, técnico ou profissional de outra categoria, sob regime de contrato ou a serviço do governo brasileiro (art. 22, V), correspondente de jornal, revista, rádio, televisão ou agência de notícias estrangeiras. (MOURA, 2012, p.375)
O estrangeiro artista ou desportista pode permanecer no país por um período de até 90 dias, ao passo que os demais mencionados podem ficar enquanto durar o contrato, ou a prestação de serviços, comprovada perante a autoridade consular, observado o disposto na legislação trabalhista.
De acordo com o art. 15 da lei n. 6.815, os estrangeiros que pretendem obter o visto para trabalho devem satisfazer as exigências especiais estabelecidas pelo Conselho Nacional de Imigração e ser parte em contrato de trabalho, visado pelo Ministério do Trabalho, salvo no caso de comprovada prestação de serviço ao Governo brasileiro.
O Conselho Nacional de Imigração editou várias resoluções normativas dispondo acerca da autorização aos estrangeiros para trabalhar no Brasil, de forma que a finalidade da vinda do estrangeiro determinará a documentação exigida e o tempo de permanência no país.
Os vistos que necessitam de autorizações prévias tramitadas junto à Coordenação-Geral de Imigração do Ministério do Trabalho e Emprego podem ser subdivididos em duas categorias: temporário e permanente.
Na categoria do visto temporário incluem-se os que precisam ser concedidos para artistas e desportistas; professores e pesquisadores estrangeiros; estrangeiro a serviço do governo brasileiro; para a prestação de serviço que envolva assistência técnica ou transferência de tecnologia; estrangeiro empregado a bordo de embarcação de turismo estrangeira ou a bordo de embarcação ou plataforma estrangeira, atleta profissional estrangeiro; estrangeiro que pretende vir para capacitação e assimilação da cultura empresarial e assimilação da metodologia de gestão; estrangeiro que venha com contrato de trabalho no Brasil; estrangeiro a bordo de embarcação de pesca estrangeira; estrangeiro vinculado à empresa estrangeira para treinamento profissional junto à filial, subsidiária ou matriz brasileira de mesmo grupo econômico; e estrangeiro, estudante ou recém formado, que venha ao Brasil no âmbito do programa de intercâmbio profissional.
Dentre os que solicitam visto permanente incluem-se os que pretendem vir na condição de administrador, gerente, diretor ou executivo com poderes de gestão de Sociedade Civil ou Comercial ou Grupo Econômico, na condição de representante no Brasil de instituição financeira ou assemelhada sediada no exterior e ao investidor estrangeiro como pessoa física.
Em determinadas situações a autorização prévia para trabalho no Brasil deve ser emitida pelo Conselho Nacional de Imigração, dentre as quais se incluem o visto temporário, visto permanente ou permanência para casos omissos e situações especiais envolvendo estrangeiros; o visto permanente para estrangeiro designado para o cargo de administrador, gerente ou administrador de pessoa jurídica de direito privado sem fins lucrativos; visto temporário, visto permanente ou permanência ao estrangeiro companheiro, em união estável, sem distinção de sexo, com brasileiro ou estrangeiro já residente no Brasil; visto permanente para investidor estrangeiro como pessoa física, com investimento inferior a R$150.000,00; visto permanente ou permanência a estrangeiro vítima do tráfico de pessoas.
Concedido o visto, o estrangeiro pode trabalhar normalmente no país e, em regra, será submetido à legislação trabalhista brasileira.
O art. 21 da lei n. 6.815 dispõe acerca do trabalhador fronteiriço, ao qual é permitida a execução de atividade remunerada no país sem a necessidade de emissão de visto.
A norma legal permite que o estrangeiro natural de país limítrofe, domiciliado em cidade contígua ao território nacional, entre nos municípios fronteiriços a seu respectivo país, desde que apresente prova de identidade. Ressalte-se que os interesses da segurança nacional serão sempre respeitados.
Para que o fronteiriço possa trabalhar é imprescindível que possua documento especial que o identifique e caracterize a sua condição, e, ainda, Carteira de Trabalho e Previdência Social, quando for o caso.
O texto do § 2º do art. 21 é enfático ao dispor que tais documentos não conferem ao estrangeiro o direito de residência no Brasil, nem autorizam o afastamento dos limites territoriais daqueles municípios.
Feita essa explanação sucinta, importante é examinar a questão da aplicabilidade da CLT aos estrangeiros.
Os trabalhadores estrangeiros, assim como qualquer brasileiro, também são objeto de proteção legal. O art. 5º da Constituição Federal é a norma base de atribuição de direitos aos estrangeiros.
Os trabalhadores estrangeiros que laboram no Brasil são protegidos pelas leis trabalhistas brasileiras, fazendo jus aos direitos previstos na Consolidação das Leis do Trabalho.
Além dos direitos à jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, a horas extraordinárias, ao salário mínimo, ao intervalo intrajornada e interjornada, à anotação na carteira de Trabalho, a férias, ao décimo terceiro salário e ao repouso semanal remunerado, aos trabalhadores estrangeiros também são aplicadas as normas relativas à saúde e segurança no trabalho.
O TST já decidiu, em várias oportunidades, que o trabalhador estrangeiro que se enquadra numa relação de emprego tem o direito a receber todas as verbas daí decorrentes.
No que concerne aos contratos em que se ajustou o pagamento do salário em moeda estrangeira, ressalta-se a necessidade de conversão para o real, haja vista que a CLT dispõe, em seu art. 463, que a quitação dessa verba será feita em moeda corrente do país. Na conversão deve-se respeitar o câmbio da data em que devida a parcela.
As demandas oriundas do trabalho de estrangeiros no país são de competência da Justiça do Trabalho. Segundo o art. 651 da CLT, a competência das varas do trabalho é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.
O C. TST apreciou a questão em vários julgados e decidiu que o empregado que trabalha no Brasil pode ajuizar sua reclamação trabalhista no foro do local onde laborou. Situação interessante diz respeito a estrangeiros que trabalharam um período no Brasil e depois foram transferidos para outros países. Nessa hipótese, entende o TST que o trabalhador pode reclamar no Brasil somente as verbas trabalhistas decorrentes do período em prestou serviços no território nacional. Observe-se:
JURISDIÇÃO. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 651,CAPUT E § 3º, DA CLT. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS EM DIFERENTES PAÍSES. OPÇÃO DO EMPREGADO. 1. Determina o exercício da jurisdição trabalhista a lei do local da execução do serviço (-lex loci executionis-), o que é consentâneo com o escopo protetivo das normas trabalhistas. 2. Ao empregado estrangeiro cujo contrato foi celebrado e rescindido no exterior, bem assim que, por conta de transferências, ora trabalhou no Brasil, ora na Argentina, ora na República Dominicana, é lícito demandar perante o Estado brasileiro para solver o litígio concernente ao período em que prestou serviços no Brasil. 3. Embargos parcialmente conhecidos e providos para limitar o exercício da jurisdição trabalhista ao período em que o contrato de trabalho foi executado no Brasil. (Tribunal Superior do Trabalho. Subseção I Especializada em Dissídios Individuais. Embargos em Recurso de Revista. Processo n. 478490-12.1998.5.01.5555, Relator: Ministro João Oreste Dalazen. 03 fev. 2006.)
Compreendido o alcance da legislação trabalhista quanto aos estrangeiros, cumpre, ainda, tratar da situação dos trabalhadores que estão em situação migratória irregular.
Inúmeros estrangeiros entram ilegalmente no Brasil por diferentes motivações, como a procura por condições dignas de sobrevivência, a esperança em conseguir um trabalho que pague melhor ou até mesmo na condição de refugiado.
É fato notório no país que as fronteiras não são controladas devidamente por conta da grande extensão territorial e do déficit de profissionais aptos a fiscalizarem a zona de fronteira. Essa deficiência culmina em possibilitar nas zonas de fronteira o contrabando, o exercício de atividades ilícitas e o ingresso ilegal de estrangeiros no país.
Apesar da situação migratória irregular, muitos estrangeiros conseguem trabalhar no país. Por se encontrarem nesta condição normalmente se submetem a trabalhos em condições análogas ao de escravo.
O setor de confecções é um dos que mais absorve esse tipo de mão-de-obra. Tal fato se deve à necessidade em reduzir os custos da produção e, simultaneamente, funciona como uma tentativa em se furtar do alcance da jurisdição trabalhista, haja vista que dificilmente esses trabalhadores levarão suas contendas ao Poder Judiciário.
Segundo o art. 125, VII, da lei n.6.815 constitui infração, punível com multa, empregar ou manter a seu serviço estrangeiro em situação irregular ou impedido de exercer atividade remunerada. O art. 359 da CLT veda à empresa admitir a seu serviço empregado estrangeiro sem que este exiba a carteira de identidade de estrangeiro devidamente anotada.
Apesar dessas normas, o TST reconhece que o estrangeiro em situação migratória irregular deve ter os direitos decorrentes da relação de emprego resguardados, conforme demonstra o aresto transcrito:
RECURSO DE REVISTA - CARÊNCIA DE AÇÃO - VÍNCULO EMPREGATÍCIO - ESTRANGEIRO EM SITUAÇÃO IRREGULAR. A Constituição Federal adota como fundamentos da República o valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana (art. 1º, III e IV), os quais demandam, para a sua concretização, a observância do direito fundamental à igualdade (art. 5º, caput). Tal direito, por sua vez, deve ser estendido a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no País, sem distinção de qualquer natureza, salvo as limitações expressas na própria Carta Magna. A garantia de inviolabilidade do referido direito independe, portanto, da situação migratória do estrangeiro. Dessarte, à luz dos princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, e em respeito ao valor social do trabalho, a autora faz jus aos direitos sociais previstos no art. 7º da Constituição da República, que encontram no direito ao trabalho sua fonte de existência, e, por consequência, ao reconhecimento do vínculo de emprego. Recurso de revista conhecido e desprovido. (Tribunal Superior do Trabalho. 1ª Turma. Recurso de Revista. Processo n. 49800-44.2003.5.04.0005, Relator: Ministro Luiz Philippe Vieira de Mello Filho. 12 nov. 2010).
O Ministério Público do Trabalho e o Ministério do Trabalho e Emprego têm se empenhado na fiscalização de empresas com o objetivo de combater a submissão de trabalhadores à condições desumanas de trabalho, bem como o trabalho irregular de estrangeiros.
A imigração de estrangeiros para o Brasil cresceu nos últimos anos. Para que o estrangeiro exerça atividade remunerada é necessário que a Coordenação-Geral de Imigração ou o Conselho Nacional de Imigração (CNI) emita uma autorização, que seguirá os trâmites estabelecidos na lei e nas resoluções do CNI. O estrangeiro que ingressa legalmente no país para trabalhar contribui para o desenvolvimento econômico e tem seus direitos trabalhistas resguardados.
Um problema a ser enfrentado pelo Governo brasileiro com ações mais eficazes é a imigração ilegal. Percebe-se que o Brasil está avançando no que se refere à proteção dos estrangeiros, tendo o Judiciário desempenhado um papel crucial para o cumprimento dos direitos desses trabalhadores.
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MOURA, Marcelo. Consolidação das Leis do Trabalho para Concursos. 2. ed. Salvador: Juspodium, 2012.
Advogada formada pela Universidade Federal da Bahia.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: REIS, Taíse Macêdo. Trabalhador Estrangeiro no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 abr 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44081/trabalhador-estrangeiro-no-brasil. Acesso em: 22 nov 2024.
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