O presente trabalho tem por objeto destacar as principais características do jus variandi do empregador, tendo por base sua definição e aspectos gerais, demonstrando suas diferenciações com o chamado jus resistentiae, e suas divisões existentes, tendo como pilar as respeitadas doutrinas trabalhistas.
Nesse sentido, o presente trabalho trás uma forma resumida ao traçar um panorama do instituto jurídico chamado jus variandi, expondo os diversos entendimentos a respeito desse instituto que é muito utilizado no gerenciamento das atividades empresariais, e que gera discussões pela sua forma incorreta de ser aplicada pelos empregadores, caracterizando sua ilicitude e abuso.
Na relação de emprego o empregador possui o poder de mando, comando, de gestão e de direção das atividades empresariais. Deste modo, o empregador assume exclusivamente os riscos da atividade econômica, sendo tal entendimento considerado pelo ordenamento jurídico como princípio da alteridade.
Diante disso, o empregado se sujeita à subordinação jurídica ao seu empregador, o que caracteriza a relação de emprego, podendo este alterar unilateralmente o contrato de trabalho do empregado, desde que não haja prejuízo ao subordinado.
Nesse sentido, tem-se a figura do jus variandi definido pela doutrina como poder de direção do empregador, pelo qual este pode alterar unilateralmente, dentro dos limites da lei, as condições de trabalho de seus empregados.
De outra sorte, segundo ensinamentos de Eduardo Gabriel Saad, o jus variandi é o direito que possui o empregador de alterar unilateralmente, somente em casos excepcionais, as condições de trabalho de seus empregados. Tal variação decorre do poder de direção do empregador.
Tal definição difere de outro principio chamado de jus resistentiae, que trata do direto do empregado de resistir às alterações impostas pelo empregador para que não viole as cláusulas pactuadas.
O que para Sérgio Pinto Martins o entendimento se dá da seguinte forma:
O empregado poderá também opor-se a certas modificações que lhe causem prejuízos, ou seja, ilegais, que é o que se chama de jus resistentiae, inclusive pleiteando a rescisão indireta do contrato de trabalho.
Ao se comparar os referidos institutos, temos que: o jus variandi é atributo jurídico do empregador, ao passo que o jus resistentiae é necessidade do empregado. Desta forma, os dois institutos se opõem e se completam quando da alterabilidade do contrato individual de emprego.
Assim, o jus variandi é a faculdade que tem o empregador de proceder unilateralmente, a mudanças não essenciais da relação de trabalho, a fim de atender exigências do desenvolvimento da empresa, possuindo previsão legal no art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho-CLT.
Em análise anterior, define-se o jus variandi como sendo o poder diretivo do empregador na relação de emprego.
É importante salientar que este não é um poder absoluto, tampouco se trata de uma subordinação econômica ou técnica, mas tão somente de uma subordinação jurídica que advém de uma relação jurídica do contrato de trabalho.
Os limites do jus variandi estão nas cláusulas essenciais do contrato de trabalho e em necessidades reais da empresa, coibindo o uso abusivo desse poder, conforme conceitua Márcio Túlio Viana:
O campo do jus variandi é o espaço em branco entre as cláusulas, onde nada se previu especificamente. Ali o empregador se movimenta, preenchendo os vazios de acordo com a sua própria vontade. E por ser assim, talvez possa se dizer – por mais paradoxal que pareça – que a originalidade do contrato de trabalho está um pouco ‘fora’ dele, no poder de se exigir o que não se ajustou. Entenda-se: como ocorre com o poder diretivo geral, o jus variandi tem fonte no contrato: é contratado. Mas se realiza através da vontade de um só, exatamente por se situar num campo em que a outra vontade não se expressou de antemão (Viana, 1996, p. 256).
Com efeito, o jus variandi não constitui uma exceção ao princípio da força obrigatória dos contratos, mas apenas uma adaptação necessária tendo em vista as necessidades decorrentes de novas realidades econômicas e, ainda, a função social que o próprio contrato possui. Portanto, a regra da imutabilidade do pactuado torna-se mais flexível com a utilização do direito de variar, sem que com isso afaste a ideia de proteção do empregado.
Assim, o princípio do jus variandi sofre presunção absoluta de nulidade quando o empregado sofrer algum prejuízo seja direta ou indiretamente, típica aplicação do Princípio da Não Alteração Contratual Lesiva do artigo 468 da CLT, que quando confrontado em face do jus variandi ordinário tem aplicabilidade absoluta. Pois a alteração não poderá ser lesiva ao obreiro seja ela feita por ato unilateral ou bilateral, pois conforme já explicitado anteriormente, somente por acordo ou convenção coletiva se admite alterações contratuais lesivas ao trabalhador e mesmo assim por prazo pré-determinado no próprio ajuste coletivo.
Merece destacar que, o principio em comento não atinge conteúdo básico do contrato de trabalho, mas tão somente, aos aspectos circunstanciais de que trata o contrato de trabalho. Ao passo que, se as modificações importam uma alteração substancial do contrato, já se saiu do âmbito do jus variandi, uma vez que este é exercido sem atingir os vínculos contratuais, que muitas vezes deixa uma margem indefinida.
O jus variandi empresarial trás um conjunto de prerrogativas que se ajusta as circunstâncias e critérios da prestação laborativa pelo obreiro, desde que não altere a forma normativa e contratual, assim como de forma extraordinária, em face de permissão normativa, cabendo alterar clausulas do próprio contrato.
Tal instituto encontra amparo legal no artigo 2° da CLT, o qual o empregador dirige a prestação de serviço.
Desta feita, cabe uma divisão tida como jus variandi ordinário que se configura pela prerrogativa conferida ao empregador de conduzir a prestação laboral de seus empregados, ajustando as circunstâncias e critérios de acordo com o seu interesse. Tais modificações se referem a aspectos não essenciais do contrato, fora do campo das cláusulas contratuais e normas jurídicas. Assim, por este tipo de jus variandi qualquer modificação não atinge as cláusulas do contrato, poderá ele ser exercido a qualquer momento, sem necessidade de uma situação especial.
Sendo que, com relação ao segundo tipo de jus variandi, por assim dizer, o jus variandi extraordinário corresponde à possibilidade de o empregador modificar condições de trabalho no âmbito das cláusulas contratuais e da lei. Neste caso, só é permitida a alteração se houver autorização direta ou indireta da norma. Assim, empregado não deve se recusar a obedecer às determinações do empregador, uma vez que este só se utiliza daquele direito quando da necessidade de alterações excepcionais, e a recusa do empregado pressupõe o cometimento de falta grave, já que o obreiro deve estar em colaboração com o empregador.
Conforme entendimento de Simone C. Gonçalves, o jus variandi extraordinário se caracteriza quando:
Utilizado somente em caso de emergência e em caráter transitório, consiste na possibilidade de o empregador modificar as condições de trabalho do empregado, em face de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, devidamente comprovados. Por tal motivo, as modificações introduzidas pelo jus variandi excepcional são mais amplas, podendo atingir cláusulas do contrato de trabalho e, até mesmo, causar prejuízo ao empregado (GONÇALVES, Op. cit., p.98).
Assim, no jus variandi extraordinário o empregado não deve se recusar a obedecer às determinações do empregador, uma vez que este só se utiliza daquele direito quando da necessidade de alterações excepcionais, e a recusa do empregado pressupõe o cometimento de falta grave, já que o obreiro deve estar em colaboração com o empregador.
Contudo, o jus variandi encontra limites ao seu exercício, quais sejam, nos princípios da boa fé, dignidade da pessoa humana, da não discriminação e no jus resistentiae, inclusive em se tratando do extraordinário, que admite uma maior flexibilização.
Através do jus variandi o empregador possui o poder de fiscalizar seu subordinado, visando uma prevenção no local de trabalho. Sob esta égide, até que ponto chegaria este poder fiscalizatório? Tal questionamento tem sido muito discutido ao se tratar, por exemplo, da chamada revista pessoal.
A revista pessoal caracteriza-se por uma das hipóteses poder de fiscalização do empregador, visando ao resguardo de sua propriedade, sendo, uma medida de natureza preventiva que, indiretamente, também acaba por identificar funcionários desonestos, praticantes de atos de improbidade dos quais resultam na resolução do contrato de trabalho, conforme autoriza o art. 482, a, CLT.
Embora seja a revista um direito subjetivo do empregador, decorrente do direito fundamental de propriedade inserto no art. 5º, XXII da Constituição da República de 1988, ocorre que o mesmo encontra limites no próprio texto constitucional, quando este, declara serem invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurada, em caso de violação deste princípio, a faculdade de o violado requerer indenização conforme consta no art. 5º, X, CF/88.
Desta forma, a revista pessoal é prática tolerável desde que preservada a dignidade do trabalhador, sendo, pois, admitida excepcionalmente, observadas, entretanto, a intimidade e a privacidade do empregado. Frise-se, ainda, que a revista pessoal, para ser admitida como meio legal de proteger o patrimônio do empregador, como preservação do próprio objeto da atividade econômica ou para a segurança interna da empresa, deve levar em conta o princípio da razoabilidade e seus decorrentes.
Assim, afirmar que a revista pessoal deve ser norteada pela proporcionalidade, implica concluir que a mesma deve ser realizada em caráter geral e impessoal, não levando em consideração critérios como sexo, etnia, raça, dentre outros aspectos considerados discriminatórios, ou que constranja o empregado. E com a redação dada ao art. 373-A da CLT, restringiu-se a forma de realização da revista pessoal, cabendo realização da revista de outras formas que não ofendam a dignidade da pessoa humana, bem como sua intimidade e honra.
O presente artigo teve por base exposição das principais características, requisitos, e impacto que o jus variandi tem na relação de trabalho atualmente, assim como suas limitações e diferenciações existentes.
Conforme exposição feita acima, o jus variandi presente em nosso ordenamento jurídico, tem que ser aplicado cuidadosamente pelo empregador para realizar modificações no contrato de trabalho (poder diretivo, organizacional) de forma justa e lícita, perante a resistência do obreiro quando incorre no pólo patronal em flagrantes arbitrariedades ao praticar alterações que causem lesão à esfera jurídica do lado hipossuficiente da relação de trabalho. Afinal, espera-se que seja o empregado tratado com respeito, dignidade.
Há vários casos em que o empregador decide despedir o empregado sem ao menos lhe dar qualquer satisfação, e o empregado por ter sido uma pessoa boa, necessária, durante anos se pergunta como aquilo está acontecendo, o que ele fez para merecer tal conduta do empregador.
Contudo, jus variandi se utilizado corretamente é uma excelente ferramenta a ser utilizada pelo empregador a fim de garantir o sucesso de seu empreendimento, mas se usado arbitrariamente deve ser coibido a fim de resguardar a parte hipossuficiente da relação trabalhista, ou seja, o trabalhador, pois o empregador deve se utilizar de critérios objetivos, com a necessidade de motivação para despedir o empregado, de forma que não acarrete um grande número de desemprego ou informalidade.
O jus variandi, portanto, deve ser experimentado nos limites estudados, e entre outros, no da razoabilidade, reconhecendo-se alguns direitos sobre o empregado sem a intenção de prejudicar, causar prejuízos ou ainda cometer abusos de direito ao obreiro.
BRASIL. Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em:http://www.trt02.gov.br/geral/tribunal2/legis/CLT/INDICE.htm. Acesso em 24 de maio de 2015.
GONÇALVES, Simone Cruxên. Limites do jus variandi do empregador. São Paulo: LTr, 2001.
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 28 edição. Editora Atlas. São Paulo. 2012.
SAAD, Eduardo Gabriel; SAAD, José Eduardo Duarte; BRANCO, Ana Maria Saad C. CLT Comentada. 42. ed. São Paulo: Editora LTr, 2009.
VIANA, Marcio Túlio. Direito de resistência: possibilidades de autodefesa do empregado em face do empregador. São Paulo: LTr, 1996.
Bacharel em Direito pela Universidade de Taubaté.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRAGA, Tamires Martins. "Jus variandi" Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 jun 2015, 03:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44653/quot-jus-variandi-quot. Acesso em: 22 nov 2024.
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