INTRODUÇÃO
O Estado Federal foi uma importante forma de Estado estruturada no decorrer da história. De acordo com Baracho (1982) já na antiguidade havia estruturas que possuíam semelhanças com o federalismo, como nas Confederações Gregas que por meio de pactos objetivavam relações mais estreitas com fins religiosos, políticos e algumas vezes militares como na liga lacedemônica, assim como na Confederação etrusca, na Itália Antiga. Dallari (2003, p.255) não considera que essas semelhanças sejam tão válidas, reconhece a existência de alianças entre Estados na Antiguidade e na Idade Média, mas acredita que elas não tenham passado de associações “temporárias e limitadas a determinados objetivos, não implicando a totalidade dos interesses de todos os integrantes”, por isso não se configurando como estado federal
Um maior número de historiadores consente que a experiência da Confederação Suíça, de 1291, tenha de fato sido uma união completa e indissolúvel. Nela três cantões se uniram com o intento de sustentar sua independência e liberdade, quando o príncipe Alberto, arquiduque da Áustria, pretendeu que os cantões reconhecessem sua soberania, sob a forma de principado. Essa associação que no início buscava o fim da luta e a defesa comum, concluiu, após a batalha de Morgarten, em 1315, com a união permanente, segundo Cavalcanti (1983, p. 29) conhecida como origem básica do sistema federativo no país. Até o ano de 1848 houve várias dissensões, lutas e adesões de outros cantões, mas que “cedendo à aspiração popular, resolveu transformar a Confederação existente em uma União, verdadeiramente nacional” (CAVALCANTI, 1983, p. 30).
Os Estados Unidos da América são considerados os precursores do Estado Federal como conhecemos hoje. Com a Constituição dos Estados Unidos de 1787 dá-se início a um novo tipo de Estado, que unifica as treze colônias inglesas, anteriormente configuradas em uma Confederação, e assim se fortalecem os laços da União.
Conhecidos aspectos importantes da história do federalismo, podemos ter uma visão ampla dos acontecimentos que determinaram o surgimento de muitos Estados com essa configuração, inclusive o brasileiro. O presente artigo seguirá buscando desvelar por meio de incursões que possam fornecer dados para determinar aspectos relevantes acerca do Estado Federal, para que depois de compreendido seu conceito, sua origem moderna, seguindo a análise da experiência Americana, suas características, especificidades e crítica, possa se estudar o Estado brasileiro.
Na análise do Estado Federal do Brasil se buscará conhecer sua história e evolução ao longo das suas sete Constituições, suas disfunções e inadequações, focando finalmente nos desafios atuais do federalismo brasileiro, que será a concretização da pesquisa.
1. ESTADO FEDERAL
O estudo da teoria do Estado nos permite desprender que o Estado Moderno, mesmo com a diversidade de opiniões, é formado essencialmente por três elementos, nas palavras de Gruppi (apud GORCZEVSKI; LEAL; BOTELHO, 2007, p. 69) “o povo como dimensão humana, o território como dimensão geográfica e o governo como dimensão política”. O governo que pode ser entendido como soberania é justamente a melhor maneira de se classificar as formas de Estado, tradicionalmente. São considerados unitários aqueles Estados onde apenas uma autoridade exerce a soberania, sob um único governo, por isso total centralização do poder. Já o Estado composto é aquele com descentralização de poder, existe a possibilidade de que haja mais de uma soberania ou mais de um governo exercendo autoridade nas unidades autônomas, mas permanece com um poder central. A união é indivisível e deve respeitar um ordenamento superior.
A principal forma de Estado composto é o Estado Federal. Derivado da palavra latina “foedus” seu significado etimológico é aliança, pacto, união. E é justamente chamada de União a nova formação de uma instituição associativa de Estados de caráter permanente e indissolúvel, que transfere, por meio de uma Constituição única que reúne as normas válidas para o seu território, competências a suas entidades autônomas que se comprometem a obedecerem a uma soberania central. Kelsen (1998, p. 451) considera que “apenas o grau de descentralização diferencia um Estado unitário dividido em províncias autônomas de um Estado federal.”
Devido a essa estruturação que respeita características específicas de determinadas regiões e, ao mesmo tempo, possibilita que os Estados-membros unidos possam buscar objetivos comuns, o Estado Federal tem sido considerado uma das formas mais convenientes de organização política e hoje compreende grande parte das Repúblicas mundiais.
1.1. ORIGEM MODERNA
Aos Estados Unidos da América, como expresso anteriormente, é reconhecido o título de precursor do Estado Federal por terem instituído os princípios do federalismo com a promulgação da Constituição em 1787.
O processo de estruturação do Estado Federal norte-americano iniciou no final do século XVIII quando os habitantes das colônias inglesas da América reivindicavam maior representatividade no parlamento da metrópole, assim como as garantias constitucionais e os direitos da Common Law que possuíam os cidadãos ingleses em geral. O primeiro passo tomado pelas colônias foi a realização de um Congresso no ano de 1774 na Filadélfia com o intuito de uma efetiva união entre as colônias, ainda que sem a intenção de separação com a Inglaterra.
Mesmo sem obtenção de êxito no primeiro encontro, os congressos entre as colônias continuaram ocorrendo e finalmente no ano de 1776 foi publicada a “Declaração de Independência” assinada pelas treze colônias. Segundo Cavalcanti (1983, p. 31), em vista da guerra de independência (1775-1783), decorrente da declaração que rompia com a colônia Britânica, “resolveu-se estabelecer, desde logo, uma verdadeira confederação, que correspondesse às suas aspirações e necessidades” suprindo com a insuficiência da organização existente. A Confederação foi efetivada, depois de prolongadas discussões, no dia 1° de Março de 1781, com a assinatura dos Artigos da Constituição que elevaram as colônias à condição de Estados.
Dallari (2003, p.256) observa que, em pouco tempo, “os laços estabelecidos pela confederação eram demasiado frágeis e que a união dela resultante era pouco eficaz” justamente por ser um tratado o instrumento usado para efetivar a aliança que poderia ser rompida por qualquer um dos membros. Dessa forma, propôs-se na Convenção da Filadélfia, ocorrida em 1787, que inicialmente pretendia apenas a revisão dos artigos da Confederação, pelos federalistas James Madison e Alexander Hamilton a criação de uma nova forma de governo, onde todos os Estados manteriam determinada autonomia, mas se submeteriam a uma Constituição única. Com a efetivação da proposta substituiu-se a Confederação pelo Estado Federal. A diferença entre essas formas de governo serão trabalhadas mais a frente.
1.2. CARACTERÍSTICAS
Em busca de uma caracterização comum para o federalismo se observa a inexistência de um modelo único que possa ser seguido como parâmetro. Isso acontece devido à estruturação dos Estados Federais que podem se diferenciar devido aos processos de formação específicos, assim como pelos distintos graus de descentralização existentes nos diferentes países. Mello (1982, p.29) então sugere que a busca pela caracterização não se fundamente nem nos mecanismos institucionais tampouco numa possível história comum, “mas em princípios que lhe são imanentes”. Seguindo seus apontamentos dois princípios são essenciais à natureza das federações, “os quais se podem enunciar como a lei da autonomia e a lei da participação, pois que, embora varie o seu grau nos diferentes Estados Federais, em todos eles estarão presentes” (MELLO, 1982, p.29).
Dallari (2003, p.257) procura caracterizar o federalismo observando que os constituintes norte-americanos haviam sido fortemente influenciados por Montesquieu ao organizarem seu governo baseando-se no princípio da separação dos poderes. Dessa forma criou-se um sistema chamado de freios e contrapesos que regulamentaria os três poderes, Legislativo, Executivo e Judiciário, mantendo-os independentes e harmônicos entre si, sem que houvesse a prevalência de um sobre os demais. Gorczevski (2007) corrobora afirmando que essa organização se dá nos âmbitos federal e estadual. Desse modo, além do poder da União, os Estados-membros também seriam detentores dos três poderes.
Relaciona-se a divisão dos poderes com os princípios de autonomia e participação do federalismo. Conforme Mello (1982, p.29) a autonomia política é entendida como “a capacidade de auto-gestão e auto-organização, o poder do Estado de reger-se por leis próprias”. Baracho (1982, p.50) corrobora explicando que essa “autonomia constitui a pluralidade de ordenamentos, revestindo de organização própria os centros territoriais de atividade jurídica, política e social. Autonomia é, no caso, expressão do poder estatal”, que lhes permite conservem relativa independência para efetuar a gestão de seus negócios. Dessa forma, o Legislativo se apresenta no âmbito federal, criando normas para toda União, e no âmbito estadual criando normas para o respectivo Estado-membro. Isso se repete com os demais poderes, havendo tribunais, ou poder judiciário, e governos, ou poder executivo, no domínio estadual e federal. Gorczevski (2007) complementa apontando a eletividade de seus governantes como sendo mais um exemplo da autonomia assumida pelos Estados-membros.
O princípio da participação garante as unidades que compõem a federação colaborarem com as decisões que dizem respeito à União. Burdeau (apud BARACHO, 1982, p.50) afirma que a participação é necessária para que de fato haja uma colaboração e não uma subordinação entre os Estados. Isso é possível através de instâncias que representam as entidades participantes no órgão próprio do legislativo. Essa representação se dá de duas maneiras, uma onde os Estados são representados de forma igual e outra conforme a sua população. Assim, o Legislativo Federal, representado no Brasil pelo Congresso Nacional, é bicameral, sendo composto por duas casas: o Senado Federal e a Câmara dos Deputados. Destarte, o Senado Federal representa os Estados-membros, que elege três senadores pelo sistema majoritário. E a Câmara dos Deputados que representa o povo é composta por 513 membros eleitos pelo sistema proporcional.
1.3. PROCESSOS DE FORMAÇÃO
Como visto as características dos Estados Federais diferem devido a seus processos de formação específicos. Os principais processos são: agregação (ou associação) e desagregação (ou dissociação). A agregação ocorre quando Estados autônomos se unem transferindo sua soberania original a União. Exemplos desse processo de formação foram registrados nos Estados Unidos, assim como na Rússia, na Suíça e na Alemanha, nesses países houve primeiramente uma associação confederativa e posteriormente, com a promulgação de uma Constituição única, a solidificação de uma nova e forte aliança. No processo de desagregação um Estado unitário cria unidades administrativas com relativa autonomia política, que passam a ser chamadas de Estados-membros de uma União Federal. Essa experiência é apontada no México, na Argentina e no Brasil.
O que se observa nos países com experiências de dissociação é que processo não resultou numa distribuição de poder igualitária e o poder central ainda permaneceu muito concentrado, pois absorve muitas vezes as competências estaduais. Em contrapartida nos processos de associação os Estados-membros são resistentes a transferência de poder para a União, permanecendo com poderes equiparados entre a União e seus Estados-membros.
1.4. CONFEDERAÇÃO DE ESTADOS
Para que se compreendesse o Estado Federal, no decorrer deste trabalho, inúmeras vezes se fez referencia a Confederação de Estados. Sabe-se, no entanto, que, embora a Confederação se relacione, assim como a federação, com uma associação de Estados, possuem correspondência de significado diverso.
“A principal distinção entre uma Confederação e uma Federação é que, naquela, os estados constituintes não abandonam a sua soberania, enquanto que, nesta, a soberania é transferida para a união federal.” (MORAIS, 2008, p.4)
Outrossim, Gorczevzki (2007), antes de buscar uma definição para a Confederação, nos lembra que parte da doutrina a considera como sendo um Estado composto, porém, retomando os elementos essenciais do Estado, observa que ela própria não possui a soberania, por conseqüência não se pode considerá-la como Estado. Dessa forma, Cavalcanti (1983, p. 49) traz a explanação de que essa associação não constitui uma nova entidade, superior aos seus membros e, então, define-a como sendo “uma associação de Estados soberanos, na qual existe um poder central, dotado de personalidade jurídica, e servindo por órgãos permanentes”.
A Confederação é uma associação resultante de um tratado de cooperação entre Estados independentes e soberanos que se unem devido a interesses comuns. Cavalcanti (1983) nota que na formulação do contrato as partes podem estipular livremente as condições mútuas, fixar a duração do pacto, além de precisar e definir bem os limites e as regras das obrigações, a que se submetem. Dessa forma, Dallari (2003, p. 256) aponta que “sendo um tratado o instrumento jurídico da aliança, e preservando cada signatário sua soberania, liberdade e independência, qualquer um dos signatários que o desejasse poderia desligar-se da confederação, mediante simples denúncia do tratado”.
Pode se também instituir uma constituição, que Kelsen (1998, p. 455) define como “uma ordem jurídica válida para o território de todos os Estados dessa comunidade internacional. Ela tem o caráter de uma ordem central.”
1.5. CRÍTICA DO ESTADO FEDERAL
Antes de iniciar o aprofundamento do Estado Federal brasileiro, faz-se pertinente a análise realizada por teóricos acerca dos pontos favoráveis e contrários a implantação dessa forma de governo. Cavalcanti (1983, p.107) explica que o federalismo possui vantagens importantes, mas que nenhum sistema de governo é por si só, o regime perfeito e adequado sempre e em todos os lugares. Devem-se levar em conta na adoção de determinado modelo as tradições históricas, os elementos etnológicos e o meio material, pois tais fatores influem de maneira decisiva no sucesso do sistema político.
Dallari (2003, p. 260) promove uma síntese dos argumentos favoráveis ao federalismo, ressaltando os aspectos que corroboram com a defesa da liberdade e da democracia, no sentido de aproximar o povo dos seus governantes, uma vez que o poder local influi sobre o poder da União. Outro argumento apresentado se refere aos mecanismos que o Estado Federal possui para evitar a concentração de poder. Acrescenta-se a isso a promoção da integração entre os Estados, que mesmo mantendo seus caracteres regionais, há o favorecimento da solidariedade.
Além destes, Cavalcanti (1983, p.108) acredita que o federalismo pode ser considerado como sistema válido empregado para desenvolver um grande país. Isso ocorre essencialmente devido à possibilidade dos Estados-membros se auto-gerirem e escolherem a melhor maneira de investirem seus tributos, com observância nos aspectos culturais.
Os aspectos defeituosos do sistema se relacionam a fraqueza do poder federal que muitas vezes não consegue se impor de maneira eficaz. Dallari (2003, p. 260) observa que essas críticas ao sistema se relacionam a planificação global das atividades, que num contexto que se deveria buscar o máximo aproveitamento dos recursos sociais, econômicos e financeiros, o poder central do Estado Federal é impedido de obrigar um determinado Estado-membro a seguir os planos da União. Dessa forma, existe a possibilidade de que haja a dispersão de recursos, que se agravam ainda mais pela necessidade de manutenção dos vários aparelhos burocráticos existentes.
2. FEDERALISMO NO BRASIL
A forma federativa de governo, sob regime representativo, foi adotada no Brasil com a Proclamação da República de 1889. Ainda que, muitos historiadores acreditem que a descentralização política fosse um fenômeno já presente nas províncias imperiais, assim como na primeira Assembléia Constituinte do Brasil, em 1822, que debelava ideais federativos, efetivando, a partir da primeira Constituição de 1824, a delegação de poderes administrativos as províncias. Apenas com a Constituição brasileira de 1891 oficializou-se o sistema federativo brasileiro, garantindo uma união permanente e indissolúvel das suas antigas províncias, sob o nome de “Estados Unidos do Brasil”.
Seus elementos estruturais foram fortemente influenciados pela Constituição dos Estados Unidos da América, mas assumiram características muito distintas. Essa distinção ocorreu principalmente devido aos processos de formação. Enquanto no Brasil se objetivava maior autonomia dos Estados frente ao governo central, no Estado americano seus membros, que eram independentes, transferiram parte de sua autonomia à União. Outrossim, o federalismo brasileiro se desenvolveu com suas particularidades ao longo da elaboração das suas constituições.
2.1. HISTÓRIA DO FEDERALISMO NO BRASIL
Os princípios de autonomia e participação não estiveram presentes durante boa parte do período republicano brasileiro, mas indubitavelmente a Proclamação da República foi o momento decisivo para o federalismo no Brasil.
O golpe de estado de 15 de novembro de 1889 foi realizado por um grupo de militares que objetivavam a superação da monarquia que, após relativa estabilidade política, passou a presenciar, como conseqüência da Guerra da Tríplice Aliança, um período de constantes crises. Atingido o objetivo do golpe dá-se início a um período denominado de República Velha que vai até a Revolução de 1930, marcado por uma distribuição desigual de poderes. Primeiramente instaura se no país o Governo provisório que passa a ser liderado pelo militar Deodoro da Fonseca que ainda mantém total centralidade nos poderes. Com a promulgação da primeira constituição da República brasileira em 24 de fevereiro de 1891, Deodoro é eleito pelo congresso ao cargo de presidente constitucional e se mantém até 1894 na administração do país. Esse período é chamado de República da Espada havendo grande presença militar, pois havia grande receio de que a monarquia fosse restaurada.
O período seguinte, que compreende os anos de 1895 até 1930, é chamado de República Oligárquica. Ele é marcado pela política dos governadores, onde os Estados de São Paulo e Minas Gerais, mais ricos da época, se alternavam no governo federal mantendo grande concentração de poder, que foi sentida ainda mais devido ao repasse desigual dos tributos arrecadados, que se observou no rápido crescimento econômico e populacional dos Estados no poder em detrimento do empobrecimento dos demais.
Getúlio Vargas, desde a Revolução de 1930, passa a assumir o governo federal que se modifica profundamente, se ajustando às novas necessidades econômicas e sociais do país. Em 1934 o país ganha uma Constituição. O regime adotado pelo novo presidente é fortemente centralizador, considerado até totalitário, mas se procurou de certa forma aliar os interesses do poder central e os objetivos dos demais estados.
De 37 a 1945 instaura-se o Estado Novo e promulga-se a Constituição de 1937. O então presidente, Getúlio Vargas, promove um processo de modernização administrativa intergovernamental garantindo maior controle do poder central sobre os Estados, através do fortalecimento do poder Executivo. Pode se disser que somente existia um federalismo de fachada.
A República Nova inicia com a renúncia de Vargas e vai até 1964. O federalismo nessa época se torna mais equilibrado, com a nova Constituição de 1946, há a restauração do regime constitucional muito mais democrático que o anterior. Os Estados recuperam sua autonomia e seus poderes passam a ser equiparados com a União. Os municípios também aumentam consideravelmente seu poder político e financeiro, por meio de uma autonomia político-administrativa.
Com a ditadura militar de 1964 instaura-se no país a ditadura militar, efetivada, após vários atos Institucionais, em 1967 com a promulgação da nova Constituição Federal, a União volta a centralizar o poder, e os Estados e municípios perdem a autonomia política conquistada. Segundo Dallari (2005, p.15):
“Setores importantes foram entregues a administradores improvisados, pelo critério único da absoluta subserviência ao comando militar superior, os instrumentos jurídicos de expressão da vontade popular foram eliminados e o exagero de sigilo nas decisões políticas e administrativas, agravado pela censura à imprensa, favoreceu a corrupção. Por tudo isso, ainda agravado pelo uso arbitrário dos instrumentos tradicionais de poder e de controle social, o novo regime praticamente anulou o federalismo, que só ressurgiu com o fim do período militar e se redefiniu com a aprovação da Constituição de 1988 por uma Assembléia Constituinte.”
A passagem do regime ditatorial para a democracia em 1985 marca o início da nova República, que consagra, com a Constituição de 1988, o sistema federativo democrático. O Estado Federal do Brasil efetiva-se como uma União indissolúvel que reconhece a autonomia e distribui competências que garantem poder aos Estados-membros, aos Municípios e ao Distrito Federal e ainda concede formas de cooperação entre os membros da federação, porém restando alguns resíduos centralizadores.
A Constituição reafirma os poderes do presidente, garantindo poderes na área legislativa muito mais importantes e decisivos no que no período democrático de 45 a 64. O Poder Legislativo passa a ser composto pelo Senado, pela Câmara e pelo Presidente da República. Estes dispõem de poder para de criarem medidas provisórias, que são os decretos com força de lei logo que publicados.
Além disso, ela reduz expressivamente os casos em que o governo federal pode intervir nos Estados e os Estados nos Municípios, embora o que se observa hodiernamente é que o instituto da intervenção ainda é muito presente, apesar de ser sujeito à aprovação legislativa.
2.2. DESAFIOS ATUAIS DO FEDERALISMO NO BRASIL
Por meio do sucinto histórico do período Republicano, observou-se que o ideal federativo esteve presente em todas as suas Constituições. O federalismo brasileiro atual apresenta inúmeras dificuldades. Embora muitos considerem que o sistema esteja passando por uma crise, é notável que ele tenha se aperfeiçoado e contribuído para o desenvolvimento do país, tendo em vista que o Brasil hoje se encontra entre as maiores economias mundiais.
Entre os principais problemas se pode apontar a pouca responsabilidade que os Estados possuem sobre as suas economias regionais. A autonomia buscada pelos Estados para se desenvolver seguindo suas particularidades, seria conquistada com um ordenamento próprio que realmente seja a expressão do Estado e não uma mera repetição da Constituição Federal. A criação de regras específicas é submetida à legislação federal, normalmente esses projetos são declarados inconstitucionais pelo STF, devido a Constituição de 88 ser extremamente detalhada e impedir alterações estaduais que se diferenciem da interpretação do STF.
Outrossim, a dificuldade no desenvolvimento dos Estados e Municípios pode ser justificada pela inaptidão de alguns administradores públicos de gerirem seus recursos. Muitos governadores ao longo do tempo aplicaram as verbas dos bancos estaduais em obras que não resultaram em melhorias as populações locais. E ainda tantos outros governantes estiveram envolvidos em desvios para o financiamento de campanhas políticas. Esses fatos resultaram numa visível distinção econômica entre as regiões.
Assim, se observa a necessidade de um árduo trabalho que efetive a autonomia e a participação dos Estados e Municípios. Tais conquistas podem ser atingidas por meio da adequação do ordenamento jurídico, que mesmo mantendo a consonância com a Constituição federal, garanta as especificidades regionais de caráter social com respaldo na população, nas economias locais, no meio ambiente e na cultura.
E ainda que a eqüidade e a competência nas ações dos administradores possam ser efetivadas com o estabelecimento de normas que tracem rigorosos parâmetros para a gestão dos orçamentos dos Estados e Municípios, mantendo ativos continua e expressivamente órgãos que garantam a fiscalização.
Tudo isso somado a ações dos cidadãos que podem, a partir de seus Municípios, começaram a participar de militâncias que efetivem sua participação, exigindo o cumprimento das metas traçadas em campanha, a fiscalização das aplicações das verbas e ainda sugerindo melhorias.
CONCLUSÃO
Conclui-se, a partir da análise do Estado Federal, que este sistema de governo é notoriamente útil para o desenvolvimento de um país com grandes dimensões, como o Brasil. Compreendido que desde sua origem na Constituição dos Estados Unidos da América em 1787 seus princípios essenciais de autonomia e participação devem ser respeitados para o sucesso deste sistema político.
Adotada no Brasil desde a Proclamação da República de 1889, com o objetivo de um melhor gerenciamento e desenvolvimento do território nacional, a forma federativa de governo passou por inúmeras transformações. No decorrer da história e da promulgação de suas Constituições, vivenciaram-se períodos de extrema centralização, mas em equivalência se vivenciaram épocas com uma estruturação política descentralizada e democrática.
São incontestáveis as mazelas que o Estado Federal brasileiro apresenta em suas estruturas e organização, mas é evidente que com esforços do Legislativo e principalmente do cidadão os desafios atuais podem ser superados. Dessa forma, o federalismo poderá ser legitimado como sistema de governo válido para o desenvolvimento do país.
REFERÊNCIAS
BARACHO, José Alfredo de Oliveira. Teoria geral do federalismo. Belo Horizonte: FUMARC/UCMG, 1982.
CAVALCANTI, Amaro. Regime federativo e a república brasileira. v. 48. Brasília: Ed. Universidade de Brasília, 1983.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado. 24 ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Parecer de 14 de janeiro de 2005. Subchefia de Assuntos Federativos da Casa Civil. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/CCIVIL_03/revista/Rev_72/Pareceres/consorcio_DalmoAbreuDallari.pdf> Acesso em: 23 jun. 2010.
GORCZEVSKI, Clovis; BOTELHO, Edilson; LEAL, Mônia Clarissa Hennig. Introdução ao estudo da ciência Política, teoria do estado e da Constituição. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2007.
KELSEN, Hans. Teoria Geral do Direito e do Estado. Trad. Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
MELLO, Osvaldo Ferreira de. Tendências do Federalismo no Brasil. Florianópolis: Ed. Lunardelli, 1982.
MORAIS, Job Duarte; BORGES, Eliete Nascimento; BORGES, João Nascimento. “O Federalista”: gênese de uma nova forma de governo. Disponível em: <www.eap.ap.gov.br/revista/upload/artigo12.pdf>. Acesso em: 23 jun. 2010.
Bacharelando do Curso de Direito da Universidade Federal do Rio Grande - FURG É Vice-Presidente do Conselho da Comunidade da Vara de Execuções Criminais da Comarca do Rio Grande/RS. Realizou intercâmbio na Faculdade de Direito, da Universidade de Coimbra (UC), em Portugal. Experiência em projetos de extensão e pesquisa com ênfase no Cooperativismo, Economia Popular Solidária, Execução Penal, Direitos Humanos, Gênero, Questões Decoloniais e Sistema Penitenciário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: HATJE, Luis Felipe. Considerações para a análise dos desafios atuais do Estado Federal do Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 set 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45098/consideracoes-para-a-analise-dos-desafios-atuais-do-estado-federal-do-brasil. Acesso em: 22 nov 2024.
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