A célebre obra, Teoria Pura do Direito, escrita pelo filósofo e jurista austríaco Hans Kelsen em 1934, amplamente respeitada e ensinada até hoje globalmente, elabora um axioma notório, a Grundnorm, traduzida para o direito inglês como Basic Norm. Grund, a qual em alemão pode significar motivo, razão, causa, como também, base, fundamento, observando-se um dos sinônimos na língua alemã é a palavra: boden, ou seja, solo, chão, piso. Logo, a tradução deste conceito, estudada e difundida em todo Brasil, bem como internacionalmente é norma fundamental, Basic Norm (Norma Básica).
A nobre motivação de se ensinar conceitos por símbolos semióticos, geométricos, ou meramente gráficos é tanto construtiva quanto imprescindível. No entanto, ao inaugurar uma teoria, o que se pretende é audacioso, pois no mínimo, introduz profundas mudanças de entendimento e esclarecimento do mundo. Portanto se utilizar algum símbolo, ele tem que ser correto, seria um absurdo admitir uma contradição. Trata-se de um significado e não mero significante!
Assim, o rigor cientifico de uma Teoria Pura do Direito, mais do que qualquer outra reflexão, deve estar livre de incoerências. A representação gráfica em quase todos os livros de direito no mundo, é por meio de uma pirâmide, cujo ápice hospeda o conceito em exame. Logo, se algo fundamental é aquilo que se tem mais importância, ou seja, imprescindível para a existência de uma pirâmide é sua base, seu fundamento. Salta aos olhos o erro semiótico de se empregar a norma fundamental no topo, pois o sistema conseguiria existir, mesmo sem ela.
Por estar no topo, historicamente as pessoas atribuíram importância preestabelecida de exclusividade, notoriedade, como por exemplo, a imagem do olho que tudo vê estampada na cédula do dólar, parecendo monitorar a estrutura. Além do mais, em muitas civilizações existem tantas pirâmides sem ápice, quanto àquelas que possuem. Indubitavelmente, confirmado pelo postulado da Física, a lei da gravidade determina a importância da base em detrimento ao topo da pirâmide. Certamente, existe pirâmide sem ápice, mas não existe pirâmide sem fundamento ou base. Portanto, erro não justificável é acreditar que, se a grundnorm estivesse representada na base, não lhe seria conferida importância devida.
Kelsen, ao afirmar que “o fundamento último de validade de qualquer ordem jurídica é uma norma hipotética fundamental, como o pressuposto lógico de validade do sistema”, esta não pode ser última, mas sim a primeira. Em que pese o autor argumentar que o fundamento da validade de uma norma jurídica só ocorra numa outra norma superior, o que se impõe através do signo estaria abaixo, porquanto dar-lhe suporte é ainda mais essencial.
Considerando que o positivismo pretendia uma assertiva asséptica e epistemológica, com o afã de tratar as ciências humanas como se exatas fossem, não admitindo interferências sociológicas e ideológicas nos conceitos jurídicos, esta reflexão propõe repensar e discordar de tamanha insensatez, que proclama e estabelece um equívoco como o mais importante modo de se entender a Ordem Jurídica Constitucional.
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