Resumo: O presente artigo acadêmico faz uma abordagem acerca dos defeitos do negócio jurídico consolidando o método de pesquisa em levantamentos de diversos autores da doutrina do Direito Civil.
INTRODUÇÃO
Ao tratar os vícios do negócio jurídico, recai uma importantíssima abordagem para os conceitos dos vícios da vontade; logo, bastante pertinente sobretudo para a seara contratual. Pois os vícios que maculam o negócio jurídico celebrado, atingem tanto a vontade das partes, como também pode haver uma repercussão social.
Frisa-se na diferenciação entre vícios de vontade, com vícios redibitórios ou ocultos. Pois, estes nestes não há deformidade de vontade, e sim o próprio objeto de contrato não estando satisfatório para uma das partes, patrimonialmente.
ERRO
O erro é considerado uma falsa percepção da realidade, tanto para uma pessoa, pelo objeto ou a um direito que compromete de preencher a vontade de uma das partes.
Para ser considerado erro, um vício de vontade que compromete a validade do negócio jurídico. O erro deve ser substancial, o que significa que qualquer pessoa, através de uma simples diligência, possa notá-lo.
O exemplo clássico do erro. Quando um pedestre ao notar que há uma enorme outdoor inseridas nele, num terreno baldio, as palavras: VENDE-SE. Após o contato com o vendedor, e finalmente a venda do negócio jurídico, no momento da tradição, o pseudo-comprador, descobre que na verdade a placa se referia ao “ponto comercial” do outdoor, e não ao terreno vazio.
Típico caso de erro, tendo o negócio jurídico, especificamente passível de ação anulatória, ou declaratória de nulidade. Lembrando que no caso apontado é caso para nulidade relativa.
Quando se trata de erro de cálculo, basta uma simples correção para ratificar, não comprometendo totalmente o negócio jurídico em questão.
DOLO
O dolo é a arma dos estelionatários, como dizia a antiga doutrina civilista. Dolo é o artifício ardiloso para enganar alguém, viciando assim a vontade da outra parte no negócio jurídico.
Não pode ser confundido o dolo essencial com o dolo da responsabilidade civil, pois este não está relacionado ao negócio jurídico, não comprometendo sua anulabilidade, ademais, se afetar o negócio jurídico; gera somente o dever em indenizar em perdas e danos. Enquanto que naquele, está relacionada ao negócio jurídico, especificamente a sua causa de celebração, e é passível de anulação.
Tartuce divide o dolo em:
Dolus Bônus: Quando inicialmente é o dolo tolerável, a medida que se passa a pessoa enganadora exagera nos seus efeitos; típico caso de um vendedor ao se empolgar com a propaganda, acaba prometendo mais atributos do que os que existem de fato.
Dolus malus: Ação maliciosa, visando o prejuízo de outrem no negócio jurídico. O clássico exemplo do vendedor que não repassa a mercadoria prometida.
COAÇÃO
A coação segundo Tartuce é uma pressão moral ou física exercida pelo negociante, visando obrigar a assumir uma obrigação que não lhe interessa.
Através da ameaça, a coação, pode ser relevante em fundado temor de dano iminente, tanto na pessoa envolvida, quanto na família ou nos bens.
Para VENOSA(2010. p, 418). É necessário elencar os requisitos da coação:
1. essencialidade da coação
2. intenção de coagir
3. gravidade do mal cominado
4. injustiça ou ilicitude da cominação
5. dano atual
6. justo receio de prejuízo igual, pelo menos ao decorrente do dano extorquido
7. tal prejuízo deve recair sobre pessoa ou bens do paciente, ou pessoas ou sua família.
Deve existir um critério acerca da aferição, ou avaliação da gravidade da ameaça. Pois se leva em consideração a idade, condição, saúde, temperamento do paciente e as demais circunstâncias que possam influenciar no caso específico.
A coação exercida por terceiro também gera a anulabilidade do negócio, se o negociante beneficiado dela tiver ou devesse ter conhecimento, ambos respondendo solidariamente face ao prejudicada pela perdas e danos.
Por outro lado, segundo o art. 154 do Código Civil pátrio vigente; não constituem coação quando: A ameaça relacionada com o exercício regular de um direito reconhecido, como no caso de ameaça de protesto de um título em cartório, sendo existente e devido a dívida. Ou o mero temor reverencial ou o receio de desgostar de pessoa querida ou a quem se deve obediência. Exemplo: casar com outrem para agradar ou por receio da reação dos familiares.
Entre a coação e o dolo, existe perfeito paralelismo: ambos tendem a diminuir ou subtrair a liberdade de resolução que os homens de boa fé devem assegurar-se nas suas relações: a coação turba diretamente a liberdade de querer, o dolo falseia o intelecto que deve ser guia de vontade.
LESÃO
Ocorre lesão, segundo os termos do art. 157 da atual codificação: “quando uma pessoa, sob premente necessidade ou por inexperiência, se obriga a prestação manifestamente desproporcional ao valor da prestação oposta”.
Para Maria Helena Diniz: “o instituto da lesão visa proteger o contratante que se encontra em posição de inferioridade, ante o prejuízo por ele sofrido na conclusão de contrato devido à desproporção existente entre as prestações das duas partes” (2010. p, 399)
Para a caracterização da lesão é necessária a presença de um elemento objetivo (TARTUCE, 2006. p, 388), formado pela desproporção das prestações a gerar uma onerosidade excessiva, um prejuízo a uma das partes: bem como um elemento subjetivo: a premente necessidade ou inexperiência,
Há até jurisprudência no sentido de vulnerabilidade contratual, em que o aderente não possui outra escolha senão aderir forçadamente o conteúdo do negócio não acordado, mas imposto. Nesse caso, pode-se entender que a premente necessidade é presumida (n.290 do CJF/STJ), da IV Jornada de Direito Civil.
Ao fazer uma análise histórica; no Direito Romano, ocorria um vício quando já havia desproporção entre as prestações recíprocas, uma das partes recebia menos da metade do valor que se comprometia em entregar. Denota-se então uma grande objetividade por parte dos romanos ao encontro do conceito de lesão.
O conceito da inexperiência, já foi caso de uma grande polêmica doutrinária e jurisprudencial (TARTUCE, 2006. p, 389). Devido ao conceito amplo de hipossuficiência, pois no Direito do consumidor pode ser econômica, financeira, política, social ou técnica e que se favorece pela inversão do ônus da prova. Assim, o mesmo conceito de hipossuficiência pode ser utilizada tanto no campo da lei consumerista, como na lei civil, no tocante a lesão; afinal, utiliza-se por analogia.
Quando o agente perde a noção do justo e do real, a sua vontade é conduzida a praticar atos que constituem verdadeiros disparates, desequilibrando uma relação jurídica, ao afetar a vontade de uma das partes. No final, uma vez a parte lesada, gerará uma vantagem manifestamente desproporcional ao proveito resultante da prestação, ou exageradamente exorbitante dentro da sua normalidade.
Nos contratos aleatórios, (VENOSA, 2010. p, 435) – apenas excepcionalmente pode ser tipificada a lesão quando a vantagem obtida é frontalmente superior à Alea do contrato. A lesão tem seu campo de atuação de fato, como modalidade de aplicação de decantada boa-fé objetiva nos contratos sinalagmáticos ou comutativos.
Ao diferir do dolo, basta o agente demonstrar não vontade de prejudicar, mas apenas de se aproveitar da inferioridade da situação em que é colocada a vítima; lucrando desproporcionalmente; desequilibrando uma relação justa.
Ainda que não estudado o estado de perigo; próximo tópico do presente estudo, já vale diferenciá-los, devido ao objeto do dano. No estado de perigo, o dano diz respeito a alguém de sua família, ou a própria pessoa correr perigo de vida. Já o dano na lesão é meramente patrimonial.
ESTADO DE PERIGO
Para Venosa, é possível utilizar os requisitos supramencionados da coação, para caracterizar o estado de perigo. É importante para o julgador ter como critérios a boa-fé objetiva, equidade, lealdade contratual além da função social do contrato para apontar o acontecimento do Estado de Perigo.
Há o clássico exemplo do plano médico; de quando um sujeito de direito se vê na necessidade em internar algum dos seus familiares, entretanto, não está em dia com suas obrigações pecuniárias perante o plano de saúde. No iminente momento, o que o hospital oferecer de prestação manifestamente desproporcional, para que o sujeito necessitado se comprometa, ele o fará. Pois, diante de um grave, iminente dano, há o perigo da morte do familiar, face a coisificação do ser humano. No estado de perigo, o negociante temeroso de grave dano ou prejuízo acaba celebrando o negócio, mediante uma prestação exorbitante, presente onerosidade excessiva (elemento objetivo). Para tal vício esteja presente, é necessário que a outra parte tenha conhecimento da situação de risco que atinge o primeiro elemento subjetivo que diferencia o estado de perigo da coação propriamente dita e da lesão.
Para VENOSA, Silvio. É possível utilizar os requisitos supramencionados da coação, para caracterizar o estado de perigo. É importante para o julgador ter como critérios a boa-fé objetiva, equidade, lealdade contratual além da função social do contrato para apontar o acontecimento do Estado de Perigo.
Então, pode-se concluir numa análise fática: o individuo está tão refém das circunstâncias, que não possui outra saída ou alternativa viável. Enquanto que na coação o elemento subjetivo é essencial. No estado de perigo, o que importa é o elemento objetivo, isto é, as condições por demais onerosas,
Portanto, desfragmentando o art. 156: “Configura-se o estado de perigo quando alguém, premido de necessidade de salvar-se, ou a pessoa de sua família, de grave dano conhecido pela outra, assume obrigação excessivamente onerosa.”, assim encontra-se a seguinte fórmula: situação de necessidade, iminência de dano atual e grave, nexo de causalidade entre manifestação e o perigo do dano, ameaça de dano à pessoa do próprio declarante ou de sua família, conhecimento de perigo pela outra parte e assunção de obrigação excessivamente onerosa. (VENOSA, 2010. p,429)
FRAUDE CONTRA CREDORES
Não só uma questão privada, mas uma garantia de ordem pública, de segurança jurídica, a certeza de que o credor receberá sua devida e justa prestação do devedor. Trata-se especificamente da garantia patrimonial do credor.
Segundo (VENOSA, 2010. p, 443), houve uma evolução lenta de acordo com a teoria dos atos e negócio jurídico acerca do que se trata dos atos ilícitos. A preocupação em proibir, coibir, desestimular o abuso, considerando a fraude um grande abuso de ordem social; tanto a jurisprudência, como a própria doutrina a fraude é a mais grave ato ilícito, destruidor das relações sociais responsável por danos de vulto e de difícil reparação.
Houve um tempo em que o devedor pagava seu débito com o próprio corpo, de acordo com a evolução histórica da sociedade ocidental; deixou-se de punir o devedor, mas o seu patrimônio.
Na fraude, há o intuito de prejudicar terceiros ou burlar a lei. Sendo assim, encontra-se a má-fé guarida na fraude..Uma vez que, ao menos, inicialmente, a fraude decorre da prática de atos legais, entretanto, tem por finalidade prejudicar terceiros.
Há um notável instrumento processual, chamado de ação pauliana, tendo a natureza declaratória de ineficácia do negócio jurídico face dos credores, e não necessariamente desconstitutiva. Caso o devedor, depois de proferida a sentença, conseguir levantar numerário suficiente e pagar todos eles, o ato de alienação subsistirá, visto não existirem mais credores.
Das soluções da ação pauliana são:
Ou restituição do objeto invalidando o negócio jurídico, comprometendo o patrimônio do devedor aproveitando indistintamente a invalidação de todos os atos. Ou restituição do objeto do ato invalidado ao patrimônio do devedor, aproveitando somente aos credores do ato. Ou aproveitar a invalidação aos que apenas provocaram.
Apesar do instrumento da ação pauliana. Não se ignora a ação anulatória, com a finalidade em anular o ato jurídico, nas hipóteses do art. 158 do CC; remissão ou perdão de dívida, caso caracterizado o ato fraudulento toda vez que o devedor estiver insolvente ou beirando a insolvência.
Portanto, qualquer ato praticado pelo devedor, já insolvente ou por esse ato levado à insolvência com prejuízo de seus credores.
Tendo a fraude contra credores três requisitos: tipificação da fraude como anterioridade do crédito, o consilium fraudilis e o eventus dammi.(VENOSA. 2010. p, 450)
Na fraude contra credores (TARTUCE. 2006. p, 392) em regra, o elemento objetivo é formado pela atuação prejudicial do devedor e de terceiro, bem como no elemento subjetivo, volitivo, a intenção de prejudicar os credores do primeiro.
É interessante a seguinte advertência: é necessária o julgador ter um sensível critério ao julgar se deparar com determinado caso, pois o caso concreto e suas circunstâncias vão determinar a conclusão da fraude. Sempre visando a notoriedade da insolvência do devedor.
Não é possível confundir a fraude contra credores com a fraude na execução; enquanto que na fraude contra credores é genuinamente um instituto do Direito Civil, ademais, o devedor possui várias obrigações com seus credores, assim como há os requisitos da vontade de fraudar e o prejuízo ao credor, nessa fase, há necessidade da ação pauliana, ou revocatória, tendo a sentença da fraude contra credores natureza de constitutiva negativa.
Já na fraude na execução é instituída pelo código de processo civil originalmente, sendo assim, o executado já foi devidamente citado, já situado no processo e nas circunstâncias da execução. Atualmente, o reconhecimento da fraude à execução depende do registro do nome da penhora ao bem alienado. Não há, de antemão, necessidade da ação pauliana, o reconhecimento da fraude perante o judiciário pode se dar tão somente com um simples requerimento, e finalmente a sentença tem natureza declaratória, diferente da fraude contra credores.
SIMULAÇÃO
É interessante a seguinte advertência: é necessária o julgador ter um sensível critério ao julgar se deparar com determinado caso, pois o caso concreto e suas circunstâncias vão determinar a conclusão da fraude. Sempre visando a notoriedade da insolvência do devedor.
É vital que na simulação há uma discrepância entre a vontade declarada ou manifestada da vontade interna. Pois na simulação as duas partes estão combinadas e objetivam iludir terceiros. Sem duvida, há um vício de repercussão social, não tanto equiparável à fraude contra credores, mas gera uma nulidade absoluta. Isso significa que o juiz deve reconhecer de ofício, e tal ato jurídico já nasceu invalido.
Tarturce classifica duas espécies de simulação: absoluta – na aparência é apenas um negócio, mas na essência a parte não deseja negócio algum. E relativa – quando há uma celebração de um negócio por aparência, almejando outro a finalidade benéfica de outro negócio jurídico.
Enquanto que VENOSA, (2010. p, 524) classifica a simulação como maliciosa ou inocente. Naquela, existe intenção de prejudicar por meio de processo simulatório. Nesta, é uma simulação que pode ser tolerada por não trazer prejuízos a priori.
É importante considerar a reserva mental, pois não se confunde declaração de vontade, com a vontade propriamente dita; assim, a reserva mental é a vontade propriamente dita, operando da seguinte forma; se a outra parte dela não tem conhecimento, o negócio é válido. Se a outra parte conhece a reserva mental, o negócio é nulo, pois o instituto é similar da simulação (VENOSA, 2006. p, 405):
Diz que há uma simulação, quando o ato existe apenas aparentemente sob a forma em que o agente faz entrar nas relações da vida. É um ato fictício, que encobre e disfarça uma declaração real da vontade, ou que simula a existência de uma declaração que se não fez. É uma declaração enganosa de vontade, visando a produzir efeito diverso do ostensivamente indicado.
Os requisitos para a simulação podem ser encontrados entre a declaração de vontade e a intenção da vontade. Ou seja, é através desse limiar que é possível encontrar o vício social da simulação.
José Calor Moreira Alves (2003, p. 118) ao comentar a guinada de posição e analisando o código civil anterior ao atual:
Ao disciplinar a simulação, apartou-se o projeto inteiramente do sistema observado pelo Código Vigente. A simulação, seja relativa, seja absoluta, acarreta a nulidade do negócio simulado. Se relativa, subsistirá o negócio dissimulado, se válido for na sua substância e na forma. Não mais se distingue a simulação inocente da fraudulenta; ambas conduzem ao mesmo resultado: nulidade do negócio simulado, e subsistência do dissimulado se for o caso. Essa, aliás a consequência – segundo a melhor doutrina – que resulta do art. 103 do Código em vigor (Código de 1916), que não se considera defeito a simulação inocente.”
Uma importante ressalva: a prova da simulação são limitados a todos os meios legais são hábeis para provar a verdade dos fatos que se funda a ação ou a defesa. Então, há uma ampla possibilidade de o juiz valer-se dos indícios para pesquisar a simulação. A presunção também outro meio de prova útil no caso, presunção no sentido de ilação que o julgador absolve de um fato conhecido para chegar a um desconhecido (VENOSA. 2010, p. 535)
Ademais; o julgador não pode se valer dos autos, mas considerar a relação que os possíveis simuladores possuem com o meio social: os antecedentes, a personalidade, os atos praticados pela falta de possibilidade financeira do adquirente; preço vil na transferência, entre outras coisas.
Referências:
ALVES, José Carlos Moreira. A parte geral do projeto de Código Civil brasileiro (subsídios históricos para o novo Código Civil brasileiro). São Paulo: Saraiva, 2003.
TARTUCE, Flávio. Direito Civil. São Paulo: Método, 2006.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2010.
Advogado. Especialista em direito civil e empresarial pela UFPE e especialista em Filosofia e teoria do direito pela PUC-MINAS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VASCONCELLOS, Steel Rodrigues. Os defeitos do negócio jurídico Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 out 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45272/os-defeitos-do-negocio-juridico. Acesso em: 27 dez 2024.
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