Resumo: O presente estudo acadêmico faz uma análise hermenêutica via pesquisa doutrinária acerca da função social do contrato e seus critérios de interpretação.
Abstract: This academic study is a hermeneutic analysis via doctrinal research on the social function of the contract and its interpretation parameter.
Introdução:
A importância da interpretação contratual se dá no alcance da revelação da vontade comum. A exteriorização expressa da vontade não consiste somente em revelar o sentido das respectivas partes, mas naquilo que a vontade representa considerando suas limitações e consequências.
Após um estudo sobre a interpretação da função social do contrato, induz finalmente a conclusão do presente estudo, considerando todos os conhecimentos inseridos no trabalho acadêmico aliada a uma pesquisa jusfilosófica.
A importância do contrato como instrumento político, econômico e social justificado pela intervenção do Estado, passa pelo preenchimento intimamente ligado aos valores morais, sociais, culturais e ideológicos de cada momento histórico da sociedade.
Paulo Lobo (2011, p. 175) desfragmenta a distinção da aplicação da lei com a intenção de quem redige o contrato:
A interpretação dos contratos apresenta peculiaridades distintas das interpretações da lei. A lei é predisposta pela autoridade legislativa; o contrato é fruto de acordo das partes. A lei é abstrata e geral; o contrato é concreto e relativo às partes. A lei não depende do consentimento ou aprovação dos destinatários para valer e ser eficaz; o contrato vale e é eficaz a partir do consentimento de suas partes. A finalidade da lei é de regular interesses particulares e determinados. A aplicação da lei não leva em conta a intenção de quem a edita; a do contrato busca exatamente essa intenção comum exteriorizada. A lei é uma regulamentação heterônima: o contrato é uma regulamentação autônoma.
Como consta nos critérios de interpretações do Código Civil de 2002, nos arts: 110 a 114 da parte geral:
1. A intenção comum deve ser levado em consideração, afinal o contrato é lei entre as partes.
2. Quando houver conflito de significados, a intenção comum sempre prevalecerá.
3. Se uma das partes fizer reserva mental de não se obrigar ao que foi exteriorizado na declaração formal, esta deve prevalecer sobre a reserva mental. Recordando que o ônus da prova é de quem se utilizar da reserva mental.
4. Ao contrário do costume do senso comum: Silêncio não significa consentimento. Exceto se: o uso e circunstância que envolvam determinado contrato e em determinada comunidade o admitam – deve ser considerado. Ou quando não for exigível na declaração de vontade expressa.
5. A boa-fé objetiva deve ser prioridade da interpretação, assumindo entre as partes a presunção de lealdade íntegra.
6. Os contratos benéficos, como a doação e a fiança devem ser interpretados em sentido estrito, não agravando a situação da parte que beneficia a outra.
Esses são os direcionamentos que norteiam a interpretação contratual, entretanto, tratando-se de um contrato cuja intervenção é da função social, então questiona-se pragmaticamente qual a interpretação possível para aferir a alcançar ao princípio da sociabilidade.
Para Paulo Roberto Toniazzo, (2008, p. 77), os critérios estabelecidos que favoreçam o desenvolvimento a repartição mais equilibrada das riquezas, bem como que coíbam qualquer desigualdade dentro da relação contratual, desde o momento de sua formação até sua complexa execução, a partir de certas vedações para que o seu uso não se converta em abuso, mas, também, de certas imposições, para que sua utilização possa se converter na satisfação de interesses coletivos. Ou seja, a intervenção efetivamente benéfica não alcançará somente uma das partes, mas todas as partes e todos os terceiros interessados; ou seja, a sociedade.
Marighetto, afirma que (2012, p. 66), a interpretação sistemática é a ideal para a intervenção do Estado, pois além de respeitar os limites da autonomia privada, é necessário considerar os conceitos de microrrelacionamento e do macrorrelacionamento econômico, pois tanto a livre concorrência como a liberdades e garantias individuais e sociais estão em jogo.
A função social como princípio não deixa de ser uma cláusula aberta, inclusive considerada cláusula geral pela ausência de critérios legais da intervenção contratual.
JHERING (1943, p. 16), recorda que: “o direito não é uma teoria, mas uma força viva. Por isso a justiça sustenta numa das mãos a balança em que pesa o direito, e na outra, a espada de que se serve para defender. A espada sem a balança é a força brutal; a balança sem a espada é a impotência do direito. ”
Uma norma, ou princípio com força normativa, carregando sentido normativo vago, o direito perde sua força. Por isso, seguindo o princípio da concretitude de Reale, (1983, p. 13), o legislador não deve legislar em abstrato. A cláusula geral possui dois significados: no sentido de designar a técnica legislativa de criação de normas, como próprias normas resultantes de produção legislativa.
Referente a interpretação do contrato no tocante a função social; Reale defende a que a interpretação seja interpretada de acordo com o espírito da lei, bem como seu travamento lógico e técnico, acompanhado por uma base de fundamentação ética. (1986, p. 3)
A consequência para o excesso de abrangência e generalidades é que o tratamento jurídico se rende ao domínio de casos, o que se configurará um realismo jurídico baseado em precedentes, enfraquecendo o princípio da legalidade.
A função social do contrato é, antes de tudo, um princípio jurídico de conteúdo indeterminado, que se compreende na medida em que lhe reconhecemos o precípuo efeito de impor limites à liberdade de contratar, em prol do bem comum. (GAGLIANO, 2012, p. 63)
Paulo Nader é favorável na flexibilização do sentido normativo, pois tal flexibilidade acompanha a modernidade, (2003, p. 47):
(…) A necessidade de flexibilização do ordenamento pátrio, ao afirmar que o animus desse novo Código reside justamente no combate a essa instabilidade. Não que se esteja a defender a chamada ‘escola de direito livre’, encabeçada por Kantorowicz, nem mesmo o movimento muito em moda na atualidade do chamado ‘direito alternativo’. Mas a flexibilidade na interpretação das normas permitirá que o direito se modernize, sem que haja necessidade de estar, a cada instante, alterando os textos legais.
Arruda Alvim, (2003), considera as cláusulas gerais como conceitos abertos, que não contém elementos definitórios mais exaurientes e demandam o preenchimento de espaços por obras da atividade jurisdicional à luz da conjuntura e das circunstâncias presentes no momento da aplicação da lei, tendo como eixo de gravidade o caso concreto.
“Conceitos legais e indeterminados são palavras ou expressões indicadas na lei de conteúdo e extensão altamente vagos, imprecisos e genéricos”, para Nery Júnior. (2003, p. 144). Considera, assim as “normas abertas”. O resultado de uma norma aberta, no caso da cláusula aberta para Nery Júnior, é a impossibilidade de um trabalho integrativo, mas simplesmente interpretativo. Por outro lado, Nery Júnior (2003, p. 143), enxergar um lado positivo em relação às cláusulas gerais, pois elas podem prolongar a aplicabilidade dos institutos jurídicos. Amoldando às necessidades da vida social, evitando o engessamento da lei: “A técnica legislativa moderna se faz por meio de conceitos legais indeterminados e cláusulas gerais, que dão mobilidade ao sistema, flexibilizando a rigidez dos institutos jurídicos e dos regramentos do direito positivo.” (2003, p. 402).
Humberto Theodoro Júnior (2008, p.144), faz uma análise da evolução normativa, aliás, interpretativa acerca das codificações e linguagens; fazendo um paralelismo entre sistemas antigos com o atual, e como afeta o ordenamento jurídico:
Do rigor positivista dos conceitos rígidos e das formas acabadas, passou-se a um diploma normativo dinâmico, cuja virtude maior é a aptidão para adquirir, progressivamente a dimensão que os códigos do passado pretendiam encerrar; de ponto, em enunciados universais e frios. Reconhece-se de antemão, que não se tem o propósito de obra perfeita e absoluta. Torna-se como ponto de partida a idéia de que o direito privado deve ser visto como um “sistema em construção”, onde as cláusulas gerais constituem disposição que utilizam, intencionalmente, uma linguagem de tessitura “aberta”, “fluida”, ou “vaga”, com propósito de conferir ao juiz um mandato para que, à vista dos cacos concretos, possa criar, complementar, ou desenvolver normais jurídicas, mediante reenvio para elementos cuja concretização pode estar fora do sistema. É um estímulo constante à conveniência com os princípios e regras constitucionais, que durante a maior parte do século XX permaneceram à margem das indagações dos civilistas e operadores do direito civil. (2008, p. 144)
Robert Alexy (2009, p. 39) lidera o pensamento de transformar a ordem constitucional em um sistema predominantemente denominado por valores auto-aplicáveis. Já JURGEN HABERNAS (1997, p .321-322), critica essa inconveniente sistema dessa possível ordem jurídica, sustentando que criar uma ordem concreta e permanente de valores ameaça causar ausência de preceitos jurídicos. O que classifica de: “sistema normativo tendencialmente exaustivo”.
Canotilho (1987, p. 257) defende a clareza de normas argumentando no sentido de segurança jurídica, pois a norma necessita ser precisa e determinante para um mínimo de concretitude. Assim, o autor desfragmenta a seguinte classificação: 1 – Alicerçar posições juridicamente protegidas por cidadãos. 2 – constituir uma norma de actuação para a administração. 3 – possibilitar, como norma de controle, a fiscalização da legalidade e defesa dos direitos e interesses dos cidadãos.
Para Maria Helena Diniz (2010, p.365), a interpretação da aplicação do princípio da função social se dá de acordo com os direitos da personalidade, colocando como em evidência a dignidade da pessoa humana:
O art. 421 é um princípio geral de direito, ou seja, uma norma que contém uma cláusula geral. A ‘função social do contrato’ prevista no art. 421 do novo Código Civil constitui clausula geral, que impõe a revisão do princípio da relatividade dos efeitos do contrato em relação a terceiros, implicando a tutela externa do crédito; reforça o princípio de conservação do contrato, assegurando trocas úteis e justas e não elimina o princípio da autonomia contratual, mas atenua ou reduz o alcance desse princípio, quando presente interesses metaindividuais ou interesse individual relativo à dignidade da pessoa humana.
Marcelo Neves (2013, p. 14) assim como os autores supramencionados, também adverte sobre o princípio normativo do princípio. Assim o autor distingue imprecisão semântica da discricionariedade.
A imprecisão semântica se dá mediante as formas de ambiguidade (conotativo), e vagueza (denotativo). Assim, a imprecisão se torna um refém de uma referência e circunstância do texto normativo. Já a discricionariedade não deve ser confundida com a imprecisão semântica, pois, um sentido estreito acerca do exercício do ato, ficando a cargo de condições políticas (oportunidade e conveniência), ou seja, discricionariedade através da competência em que a própria lei lhe atribui.
Ademais, Neves (2013, p.15) ainda se refere às características hermenêuticas do princípio como “teses de demarcação frágil”, quando se atribui a generalidade ou especificação da norma. Assim a fonte da problemática é determinar o grau de abstração da norma. Pois segue a proporção de: maior a generalidade normativa, maior estímulo ao método de interpretação indutivo. Os princípios encontrados por generalizações ou abstrações no sistema normativo não devem ser confundidos com os princípios sectoriais, como os de direito administrativo e direito tributário. Sectoriais por ter como característica menor generalidade, e menor abstração, porque segue um apontamento direcionando princípio e regra na mesma equivalência material.
Ao tratar do princípio da função social do contrato, identifica-se uma identidade não ao direcionamento, mas ao próprio conteúdo da norma, eis que é encontrado nesse presente princípio uma abrangência generalizante. Quando o princípio possui alto teor de generalidade, afasta-se assim o mundo fático da dimensão normativa.
DWORKIN, (1977, p. 23), como positivista, remete o seguinte ensino: é lícito e moralmente aceitável ao juiz utilizar os princípios quando o juiz suas vias legais estiverem esgotadas. Eis então outro sentido de discricionariedade no sentido autoritário, porque não será possível se fundamentar da legislação e sim a aplicação de uma interpretação de um princípio. Afinal, como próprio Dworkin aborda: “o juiz seleciona de acordo com suas próprias luzes no exercício do seu poder.”.
O autor entende por princípio: “Um padrão que deve ser observado, não porque vá promover ou assegurar uma situação econômica, política, ou social considerada desejável, mas porque é uma exigência de justiça ou equidade ou alguma dimensão de moralidade.”.
Sobre a moralidade apontada por Dworkin; João Maurício Adeodato (2009, p.96) adverte sobre o decisionismo, tema em que o juiz decide o que a lei significa através dos princípios. Desa forma o juiz mediante interpretação moral, estimula ampliar ainda mais a vagueza e a ambiguidade, assim é iminente a possibilidade dos juízes se transformarem em porta-vozes da moral da sociedade.
Decisões sobre direitos pressupõem a identificação de direitos definitivos. O caminho que vai do princípio, isto é, do direito prima face, até o direito definitivo passa pela definição de uma relação de preferência. Mas a definição de uma relação de preferência é, segundo a lei de colisão, a definição de uma regra. Nesse sentido é possível afirmar que sempre que um princípio for, em última análise, uma razão decisiva para um juízo concreto de dever-ser, esse princípio é fundamento de uma regra que representa uma razão definitiva para esse juízo concreto. Em si mesmos, princípios nunca são razão definitivas.
Na citação acima ALEXY (2009, p. 92), preocupar-se com a construção dos direitos definitivos, para tal construção é necessário que haja colisão, no entanto, é perigoso uma regra depender de princípio, pois este não é uma razão definitiva para um juízo concreto.
A máxima sobre postulações das regras no ordenamento germânico-romano:
Lex posteriori revogat lex priori. Lex specialis derogat legi generali
A questão sobre a estrutura normativa da revogação e especificação; os princípios teriam a mesma aplicação? Obviamente a resposta é a negativa, afinal, princípios são meras diretrizes normativas que fundamentam e constituem a razão essencial das normas jurídicas. A questão é: a real possibilidade do Juiz ultrapassar sua interpretação normativa daquilo que foi extraído da lei mediante princípio. Ainda que os princípios possuem a finalidade em assegurar a unidade sistemática de um ordenamento jurídico.
No art. 4 da introdução ao Código Civil: “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”. Portanto, como o autor Marcelo neves estabeleceu a diferencia entre discricionariedade e arbitrariedade, como consta na própria lei um sentido de discricionariedade, assim que houver omissão legislativa. A questão é: a discricionariedade pode tornar-se uma arbitrariedade na dependência interpretativa do juiz.
Referente a questão da revogação e segurança jurídica, mais uma vez João Maurício Adeodato se preocupa com o distanciamento entre texto e norma (de decisão), afirma sobre a separação dos poderes – modelo aperfeiçoado por Montesquié – a principal preocupação referente ao significado (texto de lei), para o significante (texto de decisão). Na medida em que se afasta a lei da decisão judicial, a tripartição dos poderes é comprometida. Pois o poder legislativo com a finalidade de legislar, não mais o faz, porque o judiciário se torna um porta-voz do significado da lei mediante um princípio.
Ainda João Maurício Adeodato faz uma crítica profunda acerca do uso da linguagem como instrumento de dominação política (2002, p. 40):
O cerne da função de domínio político exercida pela linguagem jurídica está em seu distanciamento da realidade, na abstração que leva a efeito para absorver a contingência, conforme exposto na análise da dogmática. O perigo desse tipo de generalização está na perda de controle, por parte de quem pretende uma visão científica do direito, do conteúdo da sua própria terminologia. A advertência não é nova e para ser encontrada no chamado “realismo jurídico” de Ross e Olivecrona, por exemplo, que chamam atenção para as “palavras ocas”. A vantagem da utilização de tais palavras pela dogmática jurídica é que elas provocam emoções reais nas pessoas e consequente ação por parte delas. Controlando o conteúdo dado à palavra “propriedade”, por exemplo, a dogmática pode provocar uma aceitação tácita diante de situações diametralmente diferentesm transferindo a discussão para o nível meramente conceitual, qualificando e assim controlando: a propriedade capitalista é uma, a socialista é outra, há a propriedade urbana e rural, a pública e privada, etc.
Para uma questão de tamanha profundeza sobre cláusulas gerais, eis que o presente estudo invoca a força científica da dogmática jurídica. Esta que por sua finalidade é de criar condições razoáveis ao operador do direito para um maior domínio e compreensão da norma. Pois a ciência jurídica permite a descoberta através da descrição do significado objetivo que na norma é conferida. Na lição de Tércio Ferraz, sobre a dogmática jurídica: (2003, p.68):
Em suma, ao distinguir, definir, classificar, sistematizar a ciência dogmática está às voltas com a identificação do direito, tendo em vista a decidibilidade de conflitos. Estudar a ciência jurídica é aprender a elaborar esses sistemas, é dominar-lhe os princípios de construção, é saber distinguir para depois integrar de forma coerente. Para realizar essa construção é que o jurista elabora seus conceitos, que têm ostensiva função operacional. Eles servem para operacionalizar a tarefa de sistematização. São por isso conceitos operativos: com eles se operam definições, classificações, sistemas.
É preciso, então, criar um sentido de decidibilidade para manter um ordenamento jurídico coeso e coerente. Tal estrutura do ordenamento possa não afetar na interpretação de um princípio com carga de alta generalidade. Tanto a certeza e a segurança jurídica são essenciais para manter o domínio teórico da matéria normativa.
A certeza, segundo Tércio (2003, p.112) é para evitar o máximo de ambiguidades e vaguidades de sentido. Pois um sentido é ambíguo quando se conceito é impreciso, tendo as qualificações tanto do significado e do significante indeterminadas. A imprecisão limitável das palavras que se aplica ao caso específico, é o que caracteriza o sentido vago.
Eis que a dogmática analítica (FERRAZ, JR. 2003, p.139), ajuda na absorção de um conceito operacional para um princípio de cláusula geral como a função social do contrato. Tal conceito operacional pode ser encontrado em conjunto com a integração de normas jurídicas válidas Pois, a dogmática capta o ordenamento jurídico cujo complexo elemento normativo de forma sistemática para atender a exigência da decibilidade pura, ou seja, certa e segura.
Após uma abordagem diversa acerca da filosofia do direito e da dogmática jurídica como interpretação do princípio, segue adiante a conclusão do presente trabalho acadêmico:
Conclusão
O debate entre princípios e regras demonstra didaticamente uma perfeita alegoria sobre o alcance na norma e a decisão judicial, precisamente, o momento exato em que o Direito se configura como um instrumento de justiça, questiona-se: que tipo de justiça?
A alusão ao mito do embate entre Hércules e a Hidra se faz numa síntese da moral da história: Hércules equipara-se ao juiz, enquanto que a Hidra, o princípio a ser interpretado. O prognóstico é simples: A Hidra por ser um animal mitológico fantástico cuja tinha várias cabeças e não bastava Hércules arrancar uma delas, mas deveria saber qual a cabeça arrancar, porque o ponto fraco consistia justamente em uma cabeça que delimitava a Hidra, e consequentemente atribuía a vitória do embate à Hércules.
Através desta alegoria é útil para que o juiz saiba qual “cabeça será cortada”, ou seja, quais princípios excluirá para dar prosseguimento na sua interpretação da norma ao caso específico.
O presente tema é sobre o princípio da função social do contrato. Neste tema também acompanha outros institutos jurídicos como outros princípios: (boa fé objetiva e equidade material), ademais os princípios são testemunhas de uma fase da Constitucionalização do Direito Privado. Assim, possuem o encargo de estabelece ruma conexão ontológica com a própria Constituição Federal.
Do direito Romano até o Direito contemporâneo é notório um diferente tratamento dogmático de como ser utilizado o conceito da função social no próprio contrato. Da dicotomia, parte-se de premissas interessantes e inquietantes acerca do instituto: a) O pacta sunt servanda pode sofrer uma flexibilização desde que seja para o bem estar social. b) Tal flexibilização não compromete a natureza jurídica da concretização do negócio jurídico. c) Aliás, mediante a referida flexibilização é possível dar mais segurança jurídica (ironicamente), por haver uma pessoa legítima e interessada na relação jurídica. d) Esta relação contratual não pode ser mais isolada como foi em outros tempos. e) Aponta-se uma crise contratual, porque segundo Marighetto, o contrato era utilizado como um instrumento – muitas vezes – privilegiando somente uma dar partes. f) Neste tipo de relação jurídica com uma onerosidade maior para uma das partes, quando há um desequilíbrio de obrigação – não interessa a sociedade.
Questionou-se qual a finalidade dos diversos conceitos acerca da função do contrato. Assim, é plausível ter propriedade, não somente na precisão ao delimitar o que é a função social do contrato, mas de ser peremptório em afirmar o que não pode ser a função social do contrato.
Ademais, as fundamentações doutrinárias se enriquecem na medida em que há uma correlação com a natureza jurídica do pacto sunt servanda – alinhando-se com outros princípios já supramencionados na presente conclusão, conectando-se também com fundamentação da propriedade privada e enrijecendo na própria segurança jurídica do presente ordenamento.
Apesar das inúmeras conceituações da palavra social e diversos tipos de ideologias acompanhados na semântica da palavra, só pode ser possível a utilização deste princípio específico se estiver acompanhando, ou seja, em harmonia com outros princípios que reconhecem a aplicação de um ordenamento jurídico sistemático, tal sistematização é tida como a própria constitucionalização do direito privado.
Não basta, apenas um conhecimento sobre o tema, é preciso conhecer a forma como os tribunais do país estão aplicando-o. E numa pesquisa bem objetiva, foi possível concluir que o princípio da função social do contrato foi tido como uma sustentação acessória. Ou seja, nas decisões a função social do contrato nunca esteve isolado, mas sempre acompanhando de outro argumento principal.
Se o princípio está sendo utilizando como fundamentação acessória da qual segue a motivação principal, é possível tomar duas conclusões acerca do fato: a) Ou a força normativa do princípio em questão não é límpida o suficiente ou não possui força o suficiente – por ser um princípio, talvez – ou pelo seu excesso de abrangência. b) Ou demonstra de fato uma obrigação tanto ao intérprete como no aplicador do direito, só é possível a utilização do princípio mediante o acompanhamento de outros institutos.
Tais conclusões sobre a aplicação jurisprudencial do instituto comprovam uma instabilidade, porque não são meramente conclusões, mas premissas para outras questões no tocante do próprio limite da decisão jurídica. Logo, as conclusões requerem um dilema sobre a eferverscência do significado (lei), do significante (texto da decisão). Pois não basta conhecer os conceitos jurídicos e como a sua aplicação, mas pragmaticamente sua efetiva aplicação. No entanto, antes é preciso questionar se o princípio interpretado possui o mesmo conteúdo daquilo que o legislador se dispôs mediante sua técnica legislativa.
É preciso relembrar mais uma vez da alegoria do combate de Hércules e a Hidra. Pois, de qualquer maneira o princípio da função social do contrato não deixa de ser abrangente, carregando assim um conceito jurídico indeterminado. E como tal, uma indeterminação pode ser considerada uma antinomia no ordenamento jurídico. Tal detalhamento acerca da imprecisão semântica do princípio requer uma atenção especial, motivo pelos quais tantas vezes no último tópico tratou-se de uma advertência. Ainda que o princípio se harmonize na segurança jurídica ao acompanhar outros princípios e regras do próprio Direito Constitucional; um princípio não deixa de ser maleável, ou seja, fácil de manipular.
O presente estudo, em momento algum, propôs-se em atribuir uma solução. A proposta original era ter uma verificação profunda sobre a temática. Com uma perspectiva atípica por não utiliza uma doutrina clássica, afinal novos conceitos necessitam de novos autores e principalmente de novas formas de abordagens. Assim, o presente trabalho acadêmico procurou tratar de diversos âmbitos do direito, utilizando inclusive matérias de natureza zetética. O presente tema passa fatalmente a questionar a própria índole do ordenamento jurídico uma vez que não basta a conceituação, deve-se reconhecer sua aplicação e fazer um questionamento permanente sobre o significado e significante de um princípio.
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Advogado. Especialista em direito civil e empresarial pela UFPE e especialista em Filosofia e teoria do direito pela PUC-MINAS.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VASCONCELLOS, Steel Rodrigues. A interpretação do princípio da função social do contrato Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 nov 2015, 05:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45602/a-interpretacao-do-principio-da-funcao-social-do-contrato. Acesso em: 26 nov 2024.
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