RESUMO: O presente trabalho traz a lume a importância dos princípios no cenário jurídico atual. Dando um maior enfoque à seara trabalhista, apresenta a forma que os princípios gerais influenciam nesse ramo, explicando como deve ser feita a aplicação deles na relação empregado-empregador. Em seguida, destaca os mais relevantes princípios do direito do trabalho, finalizando com uma explanação acerca do princípio da proteção, tema este tão relevante em âmbito trabalhista, tendo em conta a importância que adquiriu com a Consolidação das Leis do Trabalho e com a Constituição Federal de 1988.
Palavras-chave: Princípios – Direito do Trabalho – Proteção – Trabalhador – Empregador.
1. Introdução
Realizado há muito tempo no estudo do direito, o debate de qualquer tema jurídico passa necessariamente pelo termo princípio, não sendo diferente quando tratamos de Direito do Trabalho.
Direito do trabalho é o conjunto de normas jurídicas que regem as relações entre empregados e empregadores e os direitos resultantes da condição jurídica dos trabalhadores. Neste diapasão, tendo em vista a importância do seu estudo, por albergar questões e debates inerentes da vida em sociedade, decorrentes das relações entre empregados e empregadores, este ramo também passa a se utilizar, quando necessário, dos princípios visando o alcance da melhor interpretação da norma trabalhista.
Devido a disparidade existente entre as partes que compõe a relação de trabalho, caracterizada pela hipossuficiencia do empregado em relação ao empregador, é que se passou a aplicar o princípio da proteção ao trabalhador com o intuito de compensar a mencionada diferença e garantir o respeito aos direitos fundamentais do trabalhador.
Desta forma, no correr deste estudo, se buscará demonstrar uma tentativa de conceituação de princípios, perpassando ao significado dos princípios gerais aplicáveis a Ciência do Direito, e os princípios específicos ao Direito do Trabalho, até chegar especificamente ao princípio da proteção em uma análise crítica de sua aplicação no Direito do Trabalho.
2. Os princípios gerais do direito
O Direito acha-se fundamentado em princípios universais ou restritos à sua área de estudo, os quais são relevantes para a lógica normativa e aplicação aos casos concretos. Dispõe, consequentemente, de verdades válidas próprias da sua área de saber, compondo seus enunciados lógicos.
Paulo Bonavides (2008, p. 257/258) traz em suas lições a conclusão da investigação doutrinária feita pelo italiano Ricardo Guastini na tentativa de definir princípios. Segundo Guastini princípios são normas de caráter programático, que possuem alto grau de generalidade e indeterminação, razão pela qual requerem concretização por via interpretativa, para fins de aplicação a casos concretos. Segundo ele, os princípios tem posição considerável na hierarquia das fontes de direito, tendo em conta que desempenham função relevante e fundamental no sistema jurídico ou político unitariamente considerado, ou num ou noutro subsistema do sistema jurídico conjunto. Acrescenta, ainda, que os princípios são normas direcionadas aos órgãos de aplicação, cuja especial função é fazer a escolha dos dispositivos ou das normas aplicáveis nos diversos casos.
Tendo em vista a fundamental importância conferida aos princípios no âmbito da área de estudo do direito, idealizaram-se princípios gerais que trazem a esta ciência parâmetros basilares para sua compreensão, a serem utilizados como forma orientadora de todo um sistema jurídico.
Quando se trata de princípios gerais de direito, a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 4º, reza que “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”
Da mesma forma, o Código de Processo Civil dispõe sobre os princípios gerais do direito, quando, ao tratar dos poderes, deveres e responsabilidades do juiz, traz em seu art. 126 que “o juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito” (disposição semelhante está prevista no art. 140 do Novo CPC).
Ainda, a Consolidação das Leis do Trabalho versa em seu art. 8º que:
As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.
Miguel Reale define princípios gerais de direito como sendo “enunciações normativas de valor genérico, que condicionam e orientam a compreensão do ordenamento jurídico, quer para a sua aplicação e integração, quer para a elaboração de novas normas” (2002, p. 304). São eles as “bases teóricas ou as razões lógicas do ordenamento jurídico” (2002, p. 317), um modelo teórico ou dogmático que diz qual é o significado do modelo jurídico (legais, costumeiros, jurisprudenciais ou negociais) (2002, p. 316).
Para Luiz Regis Prado “os princípios gerais de direito não são normas jurídicas stricto sensu e não integram o repertório do ordenamento jurídico, mas tomam parte em sua estrutura, isto é, na relação entre as normas de um sistema, conferindo-lhes coesão” (2006, p. 188)
Segundo o civilista Sílvio de Salvo Venosa, “por meio dos princípios gerais do direito o intérprete investiga o pensamento mais elevado da cultura jurídica universal, buscando orientação geral do pensamento jurídico” (2004, p. 162)
Na óptica de Castro, citado por Plá Rodriguez (1993, p. 67), os princípios gerais de direito têm três funções:
Informadora, ou seja, a que serve de inspiração ao legislador e de fundamento para o ordenamento jurídico; normativa, atuando como fonte supletiva, na ausência da lei, nesse caso constituindo meio de integração do direito; e interpretadora, para orientar o intérprete ou o julgador. A conseqüência imediata dessa tríplice função é que alguns mais servem como inspiradores do legislador, do criador da lei, e outros melhor são aproveitados pelo intérprete, evidenciando a utilidade e a eficácia dos princípios.
Neste sentido, percebe-se que os princípios gerais do direito são enunciações de caráter normativo que dão sustentação ao sistema jurídico, apresentando-se como um modelo primordial para a compreensão e interpretação do direito quando aplicado ao caso concreto.
3. Princípios jurídicos gerais aplicados ao Direito do Trabalho
Os princípios gerais do direito, por se irradiarem a todos os segmentos da ordem jurídica, aplicam-se, segundo as lições de Maurício Godinho Delgado, a todos os segmentos especializados do Direito, preservando a noção de unidade da ordem jurídica e mantendo o Direito como um efetivo sistema, isto é, um conjunto de partes coordenadas (2010, p. 177).
Portanto, tendo em vista a importância da utilização dos princípios para o alcance da interpretação e aplicação da norma jurídica, analisar-se-á a óptica de como os princípios gerais do direito são aplicados no âmbito especializado do Direito do Trabalho.
Desta maneira, cabe evidenciar que quaisquer destes princípios aplicados ao Direito do Trabalho deverão compatibilizar-se com os princípios e regras próprias a este ramo jurídico especializado, de forma que aqueles não venham a chocar-se com os preceitos estabelecidos pelo Direito Trabalhista.
Um dos princípios gerais do direito mais importante e aplicável ao Direito do Trabalho é o da inalterabilidade dos contratos, ou pacta sunt servanda, no qual aduz que uma vez celebrado o contrato, com observância de todos os pressupostos e requisitos necessários à sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais imperativos. Adaptado a aplicabilidade no Direito Trabalhista, este principio passou a chamar-se de princípio da inalterabilidade contratual lesiva.
Outros três importantes princípios também aplicáveis ao ramo justrabalhista são os princípios da lealdade e boa-fé, da não alegação da própria torpeza e do efeito lícito do exercício regular do próprio direito. O primeiro e o terceiro são encontrados em normas que tratam dos limites impostos à conduta de uma parte em confronto com os interesses da outra parte contratual daquela relação trabalhista. O segundo, ao ser adequado a este ramo do direito e a ser aplicado apenas em certas situações trabalhistas, aduz que a bilateralidade da conduta irregular não inviabiliza, necessariamente, a alegação judicial do ilícito perpetrado, já que, diferentemente do Direito Civil, no Direito do Trabalho imperam as normas a ele inerentes e o princípio da proteção ao trabalhador.
Tais princípios citados no parágrafo anterior, de acordo com as palavras do já aludido Maurício Godinho Delgado, sintetizam a noção de que “a ordem jurídica deve apenas acolher e conferir conseqüências compatíveis em favor de uma pessoa com respeito a condutas lícitas e de boa-fé por ela praticadas” (2010, p. 178).
Outro princípio geral largamente utilizado no Direito do Trabalho é o da razoabilidade, determinando a obediência a um juízo de verossimilhança, ponderação, sensatez e prudência na avaliação das condutas das pessoas.
Há também o princípio da tipificação legal de ilícitos e penas, que define que não pode haver ilícito nem a respectiva penalidade sem a prévia norma legal que os determine. Há, contudo, uma exceção a aplicação deste princípio quando se trata da penalidade advertência, já que não se encontra prevista na CLT. Tal punição foi essencialmente criada pelos costumes trabalhistas e trazida por poucas legislações heterônimas estatais.
Por fim, também são bastante aplicados ao ramo justrabalhista os princípios da dignidade da pessoa humana, da não discriminação, da proporcionalidade, entre tantos outros.
4. Princípios específicos ao Direito do Trabalho
Os princípios do direito apresentam-se como guias para a elaboração, interpretação e aplicação das leis. Neste sentido, o Direito do Trabalho, assim como os demais ramos do direito, também é orientado por princípios jurídicos próprios.
Assim, faz-se referência ao conceito de Manuel Alonso Garcia citado por Alice Monteiro de Barros (2006, p.168), explicitando que “os princípios de Direito do Trabalho são linhas diretrizes ou postulados que inspiram o sentido das normas trabalhistas e configuram a regulamentação das relações de trabalho conforme critérios distintos dos que podem encontrar-se em outros ramos do Direito”.
Como o Direito Material do Trabalho distingue-se em dois ramos, o individual e o coletivo, cada um apresenta-se possuindo regras, institutos e princípios próprios.
Na esfera do Direito Individual do Trabalho a norma jurídica é estruturada pela constatação fática da diferenciação social, econômica e política básica entre os sujeitos da relação jurídica central. Ou seja, o trabalhador apresentando-se como um ser individual e subordinado de um lado e o empregador e sua superioridade econômica e jurídica do outro.
Nesta perspectiva, como o trabalhador não é capaz, individualmente, de produzir ações de impacto coletivo, é que surgiu a necessidade, segundo Maurício Godinho Delgado, de “emergir um Direito Individual do Trabalho largamente protetivo, caracterizado por métodos, princípios e regras que buscam reequilibrar, juridicamente, a relação desigual vivenciada na prática cotidiana da relação de emprego” (2010, p. 181).
Em contrapartida, o Direito Coletivo do Trabalho consubstancia-se pela relação em que ambos os pólos são seres coletivos, ou seja, teoricamente equivalentes. De um lado o empregador e do outro os trabalhadores coletivos, representados pelas organizações sindicais. Diante a mudança nas características desta relação jurídica, é que se justifica a aplicação de princípios diferentes daqueles aplicados ao ramo individual.
A razão de ser das relações coletivas está na necessidade de união dos trabalhadores para que possam defender, em conjunto, as suas reivindicações perante o poder econômico. Não se pode olvidar que em toda a história do direito do trabalho, o trabalhador, individualmente, não tem a necessária força para defender seus interesses, o que, em conjunto, aumenta muito o seu poder de ação.
5. Princípios do direito individual do trabalho
O trabalhador, no que tange ao vínculo de subordinação com o empregador, sempre se manteve em situação delicada, sofrendo com a inaplicabilidade de suas garantias. Essa realidade é decorrente, principalmente, da desigualdade econômica existente entre as partes, pois enquanto trabalhador só tem a oferecer a sua força de trabalho, o empregador detém o capital aplicado o que causa um vínculo de subordinação deste para com aquele. Atento a esse fato, o legislador procurou traçar um rol de normas públicas que devem ser cumpridas nas relações trabalhistas com o intuito de compensar a mencionada disparidade e garantir o respeito aos direitos fundamentais do trabalhador, que dessa maneira, não fica totalmente a mercê da vontade de seu patrão.
Nesse ínterim, aplicam-se os princípios de direito individual do trabalho que, segundo leciona Maurício Godinho Delgado (2010, p. 182), “por possuírem abrangência ampliada e generalizante, não se confrontam de modo generalizado com os importantes princípios jurídicos gerais, externos ao ramo jurídico especializado”.
6. O princípio da proteção ao trabalhador
Dentre os princípios que permeiam o âmbito trabalhista, destaca-se o da proteção ao trabalhador, na medida em que é considerado, pela maioria dos juristas, o guardião dos direitos fundamentais do obreiro. Tal concepção decorre de seu conteúdo permitir a existência e concretização de outros princípios do direito do trabalho. Renato Saraiva (2013, p.62) chega até a afirmar que o princípio da proteção desmembra-se em três outros, o in dubio pro operário, o da aplicação da norma mais favorável e o da condição mais benéfica. Maurício Godinho Delgado (2010, 183/184), por sua vez, opta por conceituar cada princípio em sua individualidade, não deixando, todavia, de afirmar que os princípios em sua totalidade formam o corpo normativo trabalhista. É importante analisar o motivo pelo qual alguns doutrinadores optam por sistemática semelhante à adotada pelo primeiro jurista supra citado, o que se fará adiante.
Ao se tratar o princípio da proteção ao trabalhador em sua individualidade, pode-se conceituá-lo como aquele que assegura uma rede mínima de garantias ao hipossuficiente, através da edição por parte do Estado de normas de ordem pública, cujo propósito é diminuir a desigualdade no pacto de emprego celebrado com o empregador, impedindo a exploração de capital em cima do trabalho humano e possibilitando melhoria na qualidade e no bem estar social dos obreiros.
Verifica-se que a conceituação desse princípio, por si só, caracteriza a razão de existência do Direito do Trabalho. Justamente por isso ele é considerado o mais importante dos princípios. Nesse âmbito, argumenta com propriedade o Procurador Regional do Ministério Público do Trabalho, Carlos Henrique Bezerra Leite (2006, p. 3 apud OLIVEIRA):
O princípio da proteção deriva da própria razão de ser do processo do trabalho, o qual foi concebido para realizar o Direito do Trabalho, sendo este ramo da árvore jurídica criado exatamente para compensar a desigualdade real existente entre empregado e empregador, naturais litigantes do processo laboral.
No que tange a relação contratual existente entre empregado e empregador, verifica-se que “impera o dirigismo contratual, que nada mais é do que a proteção conferida pelo Estado ao dispor regras mínimas em determinadas espécies de contrato, buscando a equidade” (SCANDOLIERI, 2004, p. 36). Nesse âmbito, é importante deixar claro que a interferência do Estado nas relações trabalhistas como meio equacionar a disparidade presente entre trabalhador e empregador, através de aparato jurídico, não agride a esfera do princípio da igualdade, uma vez que se encontra em total consonância com o conceito atual de isonomia, segundo o qual é necessário tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida em que eles se desigualam[1].
A desigualdade na relação trabalhista já foi por demais explanada, cabendo acrescentar, ainda, que o princípio da proteção, com o objetivo de ver sua efetividade alcançada, se faz presente no ordenamento jurídico como um todo, seja na Constituição Federal (arts. 6º a 8º), na Consolidação das Leis de Trabalho (normas que regulam a duração da jornada de trabalho, o salário mínimo, férias, segurança do trabalho, dentre outras), bem como na legislação esparsa.
Concluída a conceituação e caracterização do princípio tratado, faz-se necessário expor a forma como tal norma se exterioriza. Adotando a definição do já citado Renato Saraiva, também defendida por Amauri Mascaro do Nascimento, Américo Plá Rodriguez, Júlio Ricardo de Paula Amaral e Alfredo J. Ruprecht, far-se-á a fixação dos conceitos dos sub-princípios in dúbio pro operario, da aplicação da norma mais favorável e da condição mais benéfica.
Em consonância com o princípio in dúbio pro reo abordado pelo direito penal e com o princípio favor debitoris do direito civil, o in dubio pro operário estabelece que o intérprete, ao analisar um preceito trabalhista em que haja dúvida sobre qual o seu sentido e alcance, deve sempre optar pela interpretação mais favorável ao empregado, seja mediante restrição de um prejuízo ou ampliação de um benefício. Essa definição, por si só demonstra a relação do sub-princípio com o principio da proteção, uma vez que é um meio de beneficiar o hipossuficiente no que tange ao seu direito material.
É importante verificar que a aplicação desse princípio depende do preenchimento de determinados requisitos, quais sejam: é necessário que realmente haja dúvida sobre o alcance da norma e a interpretação não pode ir contra a vontade do legislador. Nesse quesito, preceitua Júlio Ricardo de Paula Amaral (2000, p. 3) que:
Não pode o intérprete estabelecer interpretação extensiva onde essa não é cabível, nem pode procurar interpretações que fujam da sistemática da norma, já que somente poderá ser aplicada a regra in dúbio pro operário, quando efetivamente existir uma dúvida acerca do alcance da norma legal e, ainda assim, sempre em consonância com a mens legislatoris.
No que tange a possibilidade de se aplicar essa norma quanto à prova de fatos, verifica-se uma divergência doutrinária. A corrente majoritária rechaça tal aplicação, alegando que não há como se aceitar a aplicação de um princípio de direito material no campo processual.
O sub-princípio da aplicação da norma mais favorável estabelece que nos casos em que há pluralidade de normas aplicáveis a uma relação de trabalho, deve-se optar pela que for mais favorável ao trabalhador. É importante verificar que esse preceito normativo não se atém a escala hierárquica das normas jurídicas, já que em se tratando de Direito do Trabalho o objetivo é beneficiar o hipossuficiente, bastando que a norma que cumpra esse papel esteja válida.
A aplicabilidade dessa norma deve usada com precaução, com o intuito de evitar que o empregado seja considerado isoladamente, pois é necessário que haja preservação do bem coletivo e de sua classe profissional, não sendo permitida, ademais, afronta ao interesse público em prol do operário individual.
Por fim, o princípio da condição mais benéfica estabelece que as condições mais vantajosas estabelecidas nas cláusulas do contrato do trabalhador e do regulamento da empresa devem prevalecer nos casos em que haja norma superveniente que trate da mesma matéria. A superveniência de outra cláusula só é permitida nos casos em que a primeira for suplantada por cláusula posterior ainda mais benéfica. A título exemplificativo pode-se citar as súmulas 51 e 288 do Tribunal Superior do Trabalho, que determinam, respectivamente:
Súmula 51: I - As cláusulas regulamentares, que revoguem ou alterem vantagens deferidas anteriormente, só atingirão os trabalhadores admitidos após a revogação ou alteração do regulamento; II – Havendo a coexistência de dois regulamentos da empresa, a opção do empregado por um deles tem efeito jurídico da renúncia às regras do sistema do outro [2].
Súmula 288: I - A complementação dos proventos da aposentadoria é regida pelas normas em vigor na data da admissão do empregado, observando-se as alterações posteriores desde que mais favoráveis ao beneficiário do direito. II - Na hipótese de coexistência de dois regulamentos de planos de previdência complementar, instituídos pelo empregador ou por entidade de previdência privada, a opção do beneficiário por um deles tem efeito jurídico de renúncia às regras do outro.
Finda a explanação acerca dos sub-princípios do princípio da proteção ao trabalhador, cabe a título conclusivo ressaltar que, em alguns casos, é necessário que ocorra a sobreposição de uma norma de direito coletivo do trabalho ao mencionado preceito normativo. Isso decorre do fato da aplicação absoluta e desprovida de adequação ao caso concreto do referido princípio muitas vezes poder vir a acarretar uma desigualdade ainda maior, beneficiando aquele que não faz jus a tutela pleiteada.
O trabalhador é, de fato, considerado parte hipossuficiente. Isso, todavia, não significa que em todos os casos ele está com a razão, motivo pelo qual cabe ao magistrado, quando se encontrar diante de uma lide composta por empregador e empregado, analisar os fatos, decidindo, ao fim, se deve imperar as normas de direito coletivo ou o disposto no princípio da proteção ao trabalhador, evitando, portanto, possíveis injustiças.
A esse respeito, Fábio Fernandes Scandolieri (2003, p. 40) estabelece que:
O Princípio da Proteção deve ser aplicado com bom senso. Baseado nele não se pode fazer qualquer ato a favor do trabalhador, nem mesmo substituir o legislador ou contrariar normas de direito. O Princípio da Proteção “tem um campo de aplicação limitado e, mantendo-se dentro dele, não conspira contra a segurança, porém assegura a eficaz e adequada aplicação das normas” (RODRIGUEZ, 2000, p. 101).
Verifica-se, desta feita, que a aplicação do princípio da proteção ao trabalhador, embora essencial para garantir a igualdades na relação empregado-empregador, face a hipossuficiência daquele, deve ser realizada com cautela, a fim de evitar que sejam realizadas injustiças na contramão do referido princípio ao beneficiar o trabalhador nos casos em que este não se encontra com razão.
7. Considerações Finais
Chegando a parte final do presente trabalho, faz-se mister ressaltar a importância que os princípios têm no ordenamento brasileiro, agindo como norte na aplicação das regras e embasando todo o âmbito jurídico, seja em caráter geral ou em caráter específico.
Os princípios do direito do trabalho, assim como os dos demais ramos do direito, devem ser usados de modo a conferir uma regulação específica, devendo, no entanto, sempre haver uma preocupação, garantir que eles estejam em consonância com os gerais, evitando desse modo, que haja um embate inconciliável entre esses e aqueles.
No que tange ao principio da proteção ao trabalhador, cumpre ressaltar que o seu objetivo é proporcionar uma igualdade entre empregado e empregador, evitando que o hipossuficiente fique em posição de desigualdade. O respeito a tal princípio tende a garantir maior estabilidade nas relações trabalhistas, com o intuito que nenhum dos pólos seja prejudicado.
Por fim, observa-se ordenamento brasileiro ainda possui muitos déficits no que tange ao respeito aos direitos do trabalhador, mas a compreensão do princípio da proteção, considerado por muitos o mais importante em âmbito trabalhista, já é um passo para evolução e melhoria.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Carolina Lobato Goes. O princípio da proteção do trabalhador no contexto dos direitos fundamentais. Disponível em: < http://anamatra.org.br/index.php/artigos/o-princ-pio-da-protec-o-do-trabalhador-no-contexto-dos-direitos-fundamentais-013881483686977517 >. Acesso em 30 jan. 2016.
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho, São Paulo: LTR, 2006.
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 22ª ed., São Paulo: Malheiros, 2008.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho, 9ªed., São Paulo: LTr, 2010.
OLIVEIRA, Carlos Nazareno Pereira. Princípios da seara trabalhista, direitos fundamentais dos obreiros e a ótica do protecionismo: breves comentários. Disponível em: < http://www.abdir.com.br/doutrina/ver.asp?art_id=1421&categoria=Trabalho >. Acesso em 10 fev. 2016.
PLÁ RODRIGUEZ, Américo - Princípios de Direito do Trabalho, tradução portuguesa por Wagner Giglio, 1ª ed., 2ª tiragem, São Paulo, Editora LTr, 1993.
PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro, Volume I – Parte Geral, arts. 1º a 120, 6ª ed., rev., atual. e ampliada, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.
REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito, 27ª ed. ajustada ao novo Código Civil, São Paulo: Saraiva, 2002.
SARAIVA, Renato. Direito do Trabalho – Série Concursos Públicos – e-book, 15ª ed. São Paulo: Editora Método, 2013.
SCANDOLIERI, Fábio Fernandes. O princípio da proteção no direito do trabalho. Disponível em: <http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/181/182 >. Acesso em 30 jan. 2010.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Introdução ao estudo do direito: primeiras linhas, São Paulo: Atlas, 2004.
[1] EMENTA: COOPERATIVA DE CRÉDITO. EMPREGADO EQUIPARADO AO TRABALHADOR BANCÁRIO. Tendo em vista o exercício de atividades análogas à dos trabalhadores em bancos, considerada exaustiva e penosa, deve o trabalhador de cooperativa de crédito ser a eles equiparado para fins de perceber a totalidade de suas conquistas, notadamente porque a cooperativa de crédito faz parte do sistema financeiro. A mera diferença de natureza jurídica entre as cooperativas de crédito e as instituições bancárias não se sobrepõe à realidade das atividades desenvolvidas pelo trabalhador. Ao contrário, as condições de trabalho do empregado, juridicamente hipossuficiente, devem ser consideradas sob pena de violação ao princípio da igualdade das partes, da proteção e da primazia da realidade, sem falar nos princípios do não-retrocesso social e da função social do contrato. (TRT 12ª R.; RO 00194-2008-015-12-00-2; Primeira Turma; Rel. Juiz Jorge Luiz Volpato; Julg. 08/03/2010; DOESC 06/04/2010) (grifos nossos)
[2] EMENTA: FUNÇÃO COMISSIONADA. REDUÇÃO DA GRATIFICAÇÃO PROPORCIONAL À DIMINUIÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO. ILEGALIDADE. O Direito do Trabalho é regido pelos princípios da proteção ao trabalhador e da inalterabilidade do contrato, que acarrete prejuízo àquele. O empregado figura na condição de hipossuficiente, na medida em que precisa do trabalho para fazer face à sua sobrevivência e dos familiares, presumindo-se a coação, ao que decidido, pelo empregador.Com efeito, prevê o inciso VI do artigo 7º da Constituição Federal a garantia fundamental de "irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo". De igual forma, o princípio da inalterabilidade contratual, encontrado no artigo 468 da CLT, é motivo jurídico mais do que suficiente para coibir a prática efetivada pela empresa pública federal, com atividade no ramo bancário, de reduzir o valor da paga pelo exercício do cargo no curso do pacto laboral. Diante disto, são nulas, de pleno direito, todas as transações e alterações, que causam prejuízo ao empregado (artigos 9º e 462, da CLT), o que, na hipótese, se evidencia, uma vez que continuou a autora a exercer mesma função, com as mesmas atribuições e sem solução de continuidade. Portanto, configura-se ilegal a redução do valor da gratificação correspondente. (TRT 6ª R.; RO 0027500-73.2009.5.06.0021; Segunda Turma; Relª Juíza Ana Catarina Cisneiros Barbosa de Araújo; DEJTPE 25/03/2010)
Graduada em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte; Pós-graduada em Direito Público pelo Complexo Educacional Damásio de Jesus.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PIRES, Camilla Motta Meira. O princípio da proteção e sua aplicação no Direito do Trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 fev 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45995/o-principio-da-protecao-e-sua-aplicacao-no-direito-do-trabalho. Acesso em: 26 nov 2024.
Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
Por: Beatriz Ferreira Martins
Por: MARCIO ALEXANDRE MULLER GREGORINI
Por: Heitor José Fidelis Almeida de Souza
Por: JUCELANDIA NICOLAU FAUSTINO SILVA
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