Resumo: É notório que as operadoras de planos de saúde comercializam seus serviços através de contratos de adesão que pela sua própria natureza é elaborado de maneira unilateral pelos referidos prestadores de serviço. Nesse passo, os contratos de adesão são ofertados aos consumidores contendo diversas cláusulas abusivas na forma do Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90. Desse modo, restará ao beneficiário consumidor provocar o Judiciário vislumbrando sanar tal irregularidade. Insta aqui registrar como exemplo às cláusulas abusivas que muitas vezes geram negativas em atendimentos médicos o que poderá trazer graves danos ou de difícil reparação aos consumidores.
Palavra – Chave: Consumidor, contrato de adesão, cláusulas abusivas, Código de Defesa do Consumidor, Lei Nº 9.656/98.
1. INTRODUÇÃO
Por que a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS, permite a comercialização de contratos com inúmeras cláusulas abusivas, em especial as que permitem negar atendimentos médico-hospitalar?
Ora, cabe aqui pontuar que todos os contratos que as Operadoras de Assistência à Saúde comercializam, devem ser previamente autorizados pela ANS.
Mesmo assim, persiste a problemática das cláusulas abusivas nos contratos de adesão das operadoras de planos de saúde.
A título de exemplo, veja-se a questão da negativa de procedimento com base na cláusula de carência de doença e lesão pré-existente?
Em que pese os contratos de planos de saúde serem previamente revisados e autorizados pela ANS, os mesmos são comercializados contendo algumas cláusulas abusivas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que colocam o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.
É valido mencionar que o acesso à saúde pública no Brasil é demasiadamente complicado e demorado. Inúmeras pessoas morrem no aguardo de atendimento nas portas de hospitais públicos.
Nessa esteira, torna-se necessário a utilização do sistema de saúde privado, através das Operadoras de Plano de Saúde, para tentar obter um atendimento rápido e eficaz.
Com efeito, tal problemática não é costumeira em outros países, visto que em alguns países desenvolvidos sequer existe sistema de saúde privado, devido a excelência dos atendimentos prestados pela saúde pública, a exemplo de Portugal.
Todavia, o consumidor continuamente vem encontrado enormes dificuldades, falhas nos serviços prestados que não tem solução na esfera administrativa, como por exemplos diversas cláusulas restritivas de direitos que somente podem ser questionadas no poder judiciário.
2. RELAÇÃO DE CONSUMO NOS CONTRATOS DE PLANOS DE SAÚDE
Inicialmente cabe pontuar que o Código de Defesa do Consumidor nos primeiros artigos cuida de conceituar a figura do Consumidor e a figura do Fornecedor.
Conforme art. 2º do CDC, consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Insta frisar que esse é o entendimento para os doutrinadores do denominado consumidor standard ou stricto sensu.
Ocorre que a expressão “destinatário final” ensejou uma enorme divergência doutrinaria que originou duas correntes, os maximalistas e os finalistas.
A corrente maximalista é definida por ser uma posição doutrinaria mais ampla na qual para figurar como consumidor basta apenas a realização de um ato de consumo, ou seja, o simples fato de retirar do mercado um produto ou serviço, ser um destinatário de fato já configura-o como consumidor, encerrando naquele ato a cadeia produtiva. Cumpre destacar que o doutrinador Leonardo de Medeiros Garcia [1] se posiciona no mesmo sentido:
“Para teoria maximalista, o destinatário final seria somente o destinatário fático, pouco importando a destinação econômica que lhe deva sofrer o bem. Assim, para os maximalistas, a definição de consumidor é puramente objetiva, não importando a finalidade da aquisição ou do uso do produto ou serviço, podendo até mesmo haver intenção de lucro.”
De outro modo, a corrente finalista não é tão abrangente quanto a maximalista. A corrente finalista ou subjetivista caracteriza-se pela conceituação de consumidor vinculada com a satisfação da necessidade pessoal do adquirente.
Nesse sentido é o entendimento do ilustre doutrinador Sergio Cavalieri Filho[2]:
“A corrente finalista ou subjetivista, a seu turno, entende ser imprescindível à conceituação de consumidor que a destinação final seja entendida como econômica, isto é, que a aquisição de um bem ou a utilização de um serviço satisfaça uma necessidade pessoal do adquirente ou utente, pessoa física ou jurídica, e não objetive o desenvolvimento de outra atividade negocial. Não se admite, destarte, que o consumo se faça com vistas à incrementação de atividade profissional lucrativa, isto é, ressalte-se, quer se destine o bem ou serviço à revenda ou à integração do processo de transformação, beneficiamento ou montagem de outros bens ou serviços, quer simplesmente passe a compor o ativo fixo do estabelecimento empresarial. Consumidor, em síntese, é aquele que põe fim a um processo econômico.”
De igual modo o CDC em seu art. 3º conceitua a figura do fornecedor, toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Dessa forma, se faz necessário tecer uma resumida distinção entre produto e serviço.
O produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial, enquanto serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Assim, é mais fácil compreender que a relação de consumo é composta por elementos subjetivos e objetivos.
Os subjetivos são aqueles relacionados aos sujeitos da relação jurídica, consumidor e fornecedor. E os elementos objetivos são aqueles relacionados ao objetivo das prestações ali surgidas.
Diante da análise dos elementos da relação jurídica, nota-se que a relação jurídica travada entre o consumidor e a operadora de plano de saúde é indubitavelmente de consumo.
Na medida em que as partes estão caracterizadas, em polos opostos, um consumidor e um fornecedor, tendo como objeto o serviço de prestação de assistência à saúde, adequando-se, portanto, aos conceitos estabelecidos pelos artigos 2º e 3º, § 2º, do CDC.
Ademais, a título de reforço argumentativo, visto que o assunto ora debatido nesta pesquisa trata-se de contratos de planos de saúde, é extremamente necessário informar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça na súmula nº 469, que diz:
STJ Súmula nº 469 - Aplicabilidade - CDC - Contratos de Plano de Saúde - Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.
Todavia, cabe aqui chamar atenção para o fato de que tal Súmula do STJ, não é uma súmula vinculante, tal entendimento não vincula todos os outros tribunais e juízes, bem como a Administração Pública, Direta e Indireta.
Apenas as Súmulas Vinculantes emanadas pelo Superior Tribunal Federal tem força vinculante nos julgados.
No entanto, mesmo não sendo vinculante, tal súmula trata-se de um enorme precedente que apenas ratifica o que já estava sendo constatado em inúmeros tribunais pelo país.
Dessa forma, é evidente que a relação jurídica travada entre os litigantes é indubitavelmente de consumo.
Assim, não restam dúvidas acerca da aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde.
3. AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR - ANS
As Agências Reguladoras nascem para garantir a excelência dos serviços agora prestados pelo setor privado com a “regulação” do Estado, devido ao fundado interesse público pela prestação eficiente das atividades econômicas.
Nesse sentido, leciona o ilustre doutrinador Marcos Augusto Perez[3], acerca da relevância do papel das Agências Reguladoras:
“(...)deve ser entendida dentro do contexto da redefinição do papel do Estado, que deixa de ser responsável pelo desenvolvimento econômico e social pela via da produção de bens e serviços, para fortalecer-se na função de promotor e regulador desse desenvolvimento(...)”
Dessa forma, devido a forte desestatização das atividades econômicas antes prestadas pelo poder público, emerge a necessidade da intervenção do Estado na economia, o que ocorre por meio das Agências Reguladoras, para garantir a prestação eficiente dos serviços, corrigir falhas na prestação e garantia do fornecimento de certos bens e serviços essenciais para a sociedade.
Ocorre que a escolha administrativa do governo foi pela criação de entes desprovidos de subordinação, com autonomia perante as ingerências políticas, com funções técnicas delimitadas, para tais serviços essenciais à sociedade fossem prestados com qualidade e eficiência pelas empresas privadas.
O doutrinador Marcos Juruena Villela Souto[4] cuida de explicar com maestria o programa de desestatização ocorrido no Brasil:
“Os programas de desestatização, capitaneados pelos processos de privatizações e concessões e liquidação de empresas, buscam corrigir tais distorções, repensando o papel do Estado e sua estrutura. Assume, ainda especial relevância a função de fomento, pela qual o Estado incentiva os particulares a desenvolver razões de interesse público ao invés dele próprio incorporar estruturas à Administração para empreedê-las. É a substituição do Estado do Bem-Estar pelo Estado-instrumento, afinal, o Estado moderno é aquele que viabiliza o adequado atendimento dos interesses da sociedade, mas não aquele que necessariamente, os presta diretamente.”
Assim, de forma resumida, regulação é a união de ações governamentais que englobam a criação de normas, controle e fiscalização de segmentos de mercado então explorados pelo setor privado para garantir a primazia do interesse público.
Nesse caminhar cumpre salientar o art. 174 da Constituição Federal que disserta de forma límpida o quanto acima narrado:
Art. 174 - Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.
Cabe aqui registrar que a Agência Reguladora responsável pelo setor de planos de saúde no Brasil é a ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar.
A ANS é uma autarquia, criada pela Lei nº 9.961/2000, vinculada ao Ministério da Saúde com atuação em todo o território nacional, como órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde.
Nesse passo, cabe aqui pontuar o art. 1 da Lei nº 9.961/2000 que criou a ANS, in verbis:
Art. 1º - É criada a Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, autarquia sob o regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede e foro na cidade do Rio de Janeiro - RJ, prazo de duração indeterminado e atuação em todo o território nacional, como órgão de regulação, normatização, controle e fiscalização das atividades que garantam a assistência suplementar à saúde.
Parágrafo único - A natureza de autarquia especial conferida à ANS é caracterizada por autonomia administrativa, financeira, patrimonial e de gestão de recursos humanos, autonomia nas suas decisões técnicas e mandato fixo de seus dirigentes.
A competência da ANS é elencada no art. 4º da Lei nº 9.961/2000, e é bastante extensa, no entanto para o objeto e importância da pesquisa acerca dos contratos de planos de saúde, vale ressaltar a competência para: (i) autorizar o registro dos planos privados de assistência à saúde; (ii) monitorar a evolução dos preços de planos de assistência à saúde, seus prestadores de serviços, e respectivos componentes e insumos.
Nota-se que a referida Agência é quem detêm a autoridade para autorizar o registro dos planos privados, ou seja, para que uma operadora possa comercializar um determinado plano através de um contrato de adesão, tal contrato deve ser autorizado e registrado perante a ANS.
Assim, cumpre registrar que todos os contratos de planos de saúde são previamente autorizados e registrados na ANS.
4. DA LEI Nº 9.656/98
Em 1988 a Constituição Federal, atribui ao Estado a competência de assegurar o direito à saúde dos cidadãos através da criação de um sistema nacional de saúde.
Além de garantir que a iniciativa privada possa também explorar e ofertar o setor de assistência médico-hospitalar, sob a intervenção e controle do Estado.
A lei nº 9.656 de 1998 foi um marco na saúde nacional, e adveio de uma serie de fatos ocorridos desde a década dos anos 50.
Foi a referida lei que definiu as regras para o funcionamento do setor de saúde suplementar, antes de sua promulgação o Estado brasileiro não dispunha dos instrumentos necessários para a regulação do ramo de planos privados de assistência à saúde, já organizado e funcionando há décadas no país.
A lei referida instituiu diversas garantias aos usuários, em especial: (i) tornar obrigatório às operadoras o oferecimento do Plano Referência; (ii) proibir a rescisão unilateral de contratos e submeter à aprovação do governo os índices de reajuste anuais.
Como já foi visto no tópico 3, a criação da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) veio logo em seguida pela Lei 9.961/00, que resultou na exigência da sociedade para a necessidade de se regular o setor.
Assim, o primeiro grande desafio enfrentado pela ANS foi regulamentar e fiscalizar um setor que envolvia 30 milhões de usuários, 2.200 operadoras e milhares de profissionais da área da saúde e movimentava 23 bilhões de reais por ano, conforme dados fornecidos pela Agência Nacional de Saúde Suplementar[5].
5. DAS OBRIGAÇÕES ABUSIVAS IMPOSTAS PELOS PLANOS DE SAÚDE
As operadoras de planos de saúde somente podem comercializar seus contratos, após registrarem os mesmos perante a Agência Nacional de Saúde.
Ocorre que tais contratos são de adesão, ou seja, contratos que não permite ao autor, consumidor, discutir as cláusulas gerais quando da realização do negócio. Não existe nesta modalidade de contrato uma fase de tratativas.
Assim, os consumidores são forçados a assinar tais contratos mesmo com a imposição de obrigações abusivas.
Ora, a relação ora travada entre beneficiários e operadoras de planos de saúde é indubitável de consumo, como já foi exaustivamente demonstrado nos tópicos anteriores. Assim, logicamente, a imposição de tais obrigações abusivas vão dar ensejo a aplicação dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor.
É certo falar ainda que muito embora os contratos de planos de saúde sejam previamente registrados, e, em tese avaliados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, muitos destes contratos são registrados contendo em seu conteúdo diversas cláusulas abusivas.
Evidente que resta ainda configurado uma hipossuficiência do consumidor perante as Operadoras de Planos de Saúde, visto que o beneficiário encontra-se em uma situação de impotência na relação de consumo, ou seja, está em extrema desvantagem em relação ao fornecedor, decorrente de diversos fatos, como por exemplo: (i) da falta de condições de produzir as provas em seu favor; (ii) imensa dificuldade de comprovar a veracidade do fato constitutivo de seu direito.
O beneficiário nesta relação fica totalmente vulnerável, haja vista que quando surge uma real necessidade de utilização da assistência, o que está em risco é a sua própria vida.
Como exemplo, é valido citar algumas situações de impasse, na qual, o dano pode ser irreversível ao beneficiário que está com sua vida em risco, a seguir transcrito uma ementa que retrata bem tal situação:
“EMENTA: AÇÃO DE RESSARCIMENTO - DANOS MATERIAIS - PLANO DE SAÚDE - TRATAMENTO NÃO AUTORIZADO - APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – PRAZO DE CARÊNCIA - URGÊNCIA DO TRATAMENTO – DOENÇA PREEXISTENTE - ÔNUS DA PROVA DA COOPERATIVA MÉDICA - PROCEDÊNCIA DO PEDIDO - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA - RECURSO NÃO-PROVIDO.
A relação formada entre os associados e os convênios de saúde subsume-se aos ditames insculpidos no Código de Defesa do Consumidor - Lei 8.078/90. Ao contratar o seguro de saúde, pretende o contraente, através do pagamento de uma quantia mensal, a garantia de prestação de serviços médicos e hospitalares em caso de necessidade, incluído aí, sem dúvida, o início imediato do tratamento que diminua o seu risco de morte advindo do seu acometimento por câncer no sistema nervoso central, apurado em laudo médico. O início imediato do tratamento de uma doença grave e letal como câncer deve ser considerado procedimento de urgência, a se submeter ao prazo de carência de 24 (vinte e quatro) horas, conforme previsto no contrato firmado entre as partes, não se aplicando, portanto, a carência de 24 (vinte e quatro) meses prevista no art. 11 da Lei 9.656/98.
(Proc. n. 1.0024.04.373577-8/001(1) Rel. Sebastião Pereira de Souza, j. 16/05/2007)”
Nota-se que no caso do processo acima mencionado, o beneficiário estava acometido por um câncer, e necessitava iniciar um tratamento com extrema urgência, no entanto encontrou óbice na negativa por parte da operadora, sob a alegação de ferir a cláusula contratual que trata das carências.
É valido mencionar que nesta balança está de um lado a vida do beneficiário e do outro a intensa busca por lucros e contenção de gastos da operadora de saúde.
6. DOS CONTRATOS DE ADESÃO DE PLANOS DE SAÚDE
Inicialmente cumpre aqui ressaltar com bastante ênfase, que há de se notar que o princípio do pacta sunt servanda, perde o seu caráter de intangibilidade, cedendo espaço ao respeito e à dignidade, não somente das partes contratantes, mas também o respeito por todos os que serão afetados pela avença.
De igual modo, é valido lembrar que tais contratos ofertados ao Consumidor são contratos de adesão, cujas cláusulas são preestabelecidas unilateralmente, não se possibilitando ao consumidor qualquer oportunidade de manifestação de vontade, no sentido de opinar, discutir, ou mesmo incluir qualquer outra cláusula a seu modo e vontade, restando-lhe tão somente, submeter-se ao que determinou a operadora de plano de saúde.
.Devido a este fato, tais contratos de adesão ofertados ao consumidor são portadores de algumas cláusulas que vão realçar um desequilíbrio entre as partes, colocando o consumidor em nítida desvantagem.
Nesse passo, é forçoso destacar os princípios norteadores das relações consumeristas.
O Código de Defesa do Consumidor determina em seu art. 4, III, que as relações de consumo deveram ter como base a boa-fé e o equilíbrio entre consumidores e fornecedores, in verbis:
Art. 4º - A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
(...)
III - harmonização dos interesses dos participantes das relações de consumo e compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, de modo a viabilizar os princípios nos quais se funda a ordem econômica (art. 170, da Constituição Federal), sempre com base na boa-fé e equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores;
Nesse sentido, cabe aqui destacar alguns julgados que ratifica este entendimento:
Seguro-saúde. Contrato de adesão. O princípio do pacta sunt servanda está relativizado pelo advento da Lei 8078/90. Cláusula restritiva de direito implícito do consumidor redigida sem destaque. Nulidade de pleno direito. Sentença mantida. Recurso improvido.
(Rec. Nº JDC02-TAT-01855/96. Julgado em 05.04.99. Rela. Juíza JANETE FADUL DE OLIVEIRA).
Da mesma forma, o ilustre doutrinador Sergio Cavalieri Filho[6], ensina que o princípio da boa-fé deve ser o pilar central dos contratos de seguro em geral:
“ (...) se não possível discutir previamente as suas cláusulas, uniformemente estabelecidas nas condições gerais da apólice; enfim, se o seguro, para atingir a sua finalidade social, tem que ser rápido, eficiente, não podendo ficar na dependência de burocráticos processos de fiscalização, nem de morosas pesquisas por parte das seguradoras, então, a sua viabilidade depende da mais estrita boa-fé de ambas as partes. Se cada um não usar de veracidade, o seguro se torna impraticável.
É nítido que a boa-fé, além de ser evidentemente a própria alma do seguro, é também o seu elemento jurídico.
Cumpre aqui destacar também que devido a tal importância do principio da boa-fé, o Código Civil exige expressamente em seu art. 765, a mais estrita boa-fé e veracidade do segurado e do segurador, tanto a respeito do objeto do seguro, como das circunstâncias e declarações a ele concernentes.
Nota-se que tratando do principio da boa-fé, emerge a necessidade de explanar acerca da boa-fé objetiva e subjetiva.
A boa-fé subjetiva está diretamente ligada a fatores psicológicos, estado de espírito ligado a valores éticos da pessoa natural. Enquanto a boa-fé objetiva é o comportamento ético, perante determinadas situações, ou seja, é a conduta leal e respeitosa que deve pautar as relações entre segurado e segurador.
Na mesma linha leciona o doutrinador Sergio Cavalieri Filho[7]:
“Boa-fé subjetiva é fato psicológico, estado de espírito ligado a valores éticos. Correspondente a um estado de espírito em harmonia com a manifestação de vontade que vinculou as partes contratantes, na bela definição de Pedro Alvim.
Boa-fé objetiva é o comportamento ético, padrão de conduta, tomado como paradigma o homem honrado.”
Contudo, infelizmente o que nota-se no cotidiano é constantes violações por ambas as partes ao princípio da boa-fé no cumprimento dos contratos de planos de saúde.
Basta apenas realizar uma rápida pesquisa na jurisprudência em diferentes regiões deste país para verificar tal situação de violação. Cabe aqui trazer alguns julgados abaixo ementados:
PLANO DE SAÚDE. DESPESAS REFERENTES A PRÓTESES,MATERIAIS DESCARTÁVEIS E BANCO DE SANGUE.PRETENDIDO RESSARCIMENTO DAS DESPESAS PAGAS DIRETAMENTE AO HOSPITAL, COM BASE EM SENTENÇA POSTERIOR QUE DECLAROU A NULIDADE DE CLÁUSULA RESTRITIVA. NÃO CABIMENTO. AUTORA QUE, AO PAGAR, ACEITOU A NEGATIVA DA RÉ. DECLARAÇÃO DE NULIDADE QUE NÃO PODE FAZER EFEITO SOBRE OS NEGÓCIOS JÁ ACABADOS. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. SENTENÇA REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. LITIGANCIA DE MA-FE. INOCORRENCIA. PRETENDIDA CONDENAÇÃO EM SEDE DE APELO. PENA, CONTUDO, QUE DEVE SER RESERVADA AO COMPORTAMENTO DOLOSO. HIPÓTESE EM QUE NÃO SE VISLUMBRA AS HIPÓTESES DO ARTIGO 17 DO CPC. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.17CPC
(330445820108260003 SP , Relator: Vito Guglielmi, Data de Julgamento: 14/01/2011, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/01/2011)
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AGRAVO DE INSTRUMENTO -CIVIL- PROCESSUAL CIVIL. ACAO ORDINARIA COM PEDIDO DE ANTECIPACAO DE TUTELA – CONTRATO DE SEGURO SAUDE - NEGATIVA DE COBERTURA DE PROCEDIMENTO, SOB ALEGACAO DE NAO POSSUIR A AGRAVADA INDICACAO PARA O TRATAMENTO PLEITEADO RELAT6RIOS MEDICOS ATESTANDO CONDICOES DE ALTA. INTERRUPCAO DO TRATAMENTO PELO PLANO DE SAUDE.PIORA NO ESTADO DE SAUDE DA AGRAVADA - DEMONSTRADA A NECESSIDADE DE TRATAMENTO DE HOME CARE. APLICABILIDADE DAS NORMAS PROTETIVAS DO CDC -PRINCIPIO DA BOA-FE OBJETIVA E CONFIANCA NAS RELACOES EM FOCO – DIREITO À SAÚDE COMO DIREITO BÁSICO DO CONSUMIDOR – LEGALIDADE DA DECISAO PROFERIDA EM PRIMEIRO - GRAU PARA GARANTIR AO CONTRATANTE TRATAMENTO ADEQUADO. PERICULUM IN MORA CONFIGURADO. RECURSO IMPROVIDO.
(Agravo De Instrumento N.° 69858-6/2008 – BA, Relator: DES. ANT6NIO ROBERTO GONCALVES, Quinta Câmara Cível, Data do Julgamento: 03/03/2009)
Nota-se que infelizmente as operadoras de plano de saúde têm perpetrado em maior número que os consumidores tal conduta de violação do princípio da boa-fé.
6.1 - DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS
Como já foi demonstrado anteriormente, muito embora os contratos de adesão das operadoras de saúde sejam previamente analisados e autorizados pela ANS, cumpre destacar que tais contratos, ainda assim, são comercializados contendo algumas cláusulas que ofendem o digesto consumerista, sendo abusivas ao consumidor.
De logo cumpre destacar que toda cláusula que se mostre abusiva ou que possa causar desequilíbrio contratual, são consideradas abusivas, em consonância com o art. 51 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
Art. 51. - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
Ademais, como já foi visto, o princípio da boa fé objetiva também é consagrado pela legislação consumerista, devendo ser classificada como justa a expectativa do consumidor quanto à cobertura de todo o tratamento médico necessário e adequado à sua doença.
No presente trabalho de pesquisa, será abordado em especial às cláusulas de carência, reajuste, cobertura a cirurgias com implante de próteses e limitações de internação.
Evidente que tais espécies de cláusulas RESTRITIVAS colocam o consumidor em situação de extrema vulnerabilidade.
Inicialmente vamos abordar às cláusulas de carência, em especial a de doenças e lesões pré-existentes, que é comumente utilizada como fundamento para recusa e negativas de procedimentos médicos solicitados pelos beneficiários das operadoras.
O art. 12 da Lei nº 9.656, abordada em tópicos anteriores, determina os parâmetros e exigências mínimas que devem ser adotados pelas operadoras de planos de saúde para fixar períodos de carência, in verbis:
Art. 12. São facultadas a oferta, a contratação e a vigência dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1o do art. 1o desta Lei, nas segmentações previstas nos incisos I a IV deste artigo, respeitadas as respectivas amplitudes de cobertura definidas no plano-referência de que trata o art. 10, segundo as seguintes exigências mínimas:
(...)
V - quando fixar períodos de carência:
a) prazo máximo de trezentos dias para partos a termo;
b) prazo máximo de cento e oitenta dias para os demais casos;
c) prazo máximo de vinte e quatro horas para a cobertura dos casos de urgência e emergência;
Acerca da carência referente a doenças e lesões pré-existentes o art. 11 da mesma Lei, estabelece o limite máximo de 24 (vinte e quatro) meses, a seguir transcrito:
Art. 11 - É vedada a exclusão de cobertura às doenças e lesões preexistentes à data de contratação dos produtos de que tratam o inciso I e o § 1º do art. 1º desta Lei após vinte e quatro meses de vigência do aludido instrumento contratual, cabendo à respectiva operadora o ônus da prova e da demonstração do conhecimento prévio do consumidor ou beneficiário.
Pois bem, a principal problemática está evidenciada em dois fatos: (i) de ser tecnicamente impossível delimitar o momento exato do surgimento da maioria das doenças; (ii) a problemática acerca do conceito de doença pré-existente.
A Lei dos Planos de Saúde define doença preexistente como aquela que é do conhecimento do consumidor, a qual deve ser declarada na assinatura do contrato.
De modo contrário ensina a doutrinadora Karyna Rocha Mendes[8] da Silveira que tal definição legal não merece ser adotada:
“Com essas premissas verificamos o quão antijurídico e inconstitucional é o conceito de doença preexistente. A rejeição do Conselho Federal de Medicina a esse conceito equivaleria a uma “revolta dos fatos”, uma vez que nem a seara da medicina consegue definir quais seriam as doenças preexistentes. Logo, esse conceito assume um caráter dogmático, distanciado dos mais conhecidos princípios constitucionais.”
É indubitável que o único viés norteado da criação do conceito de doença e lesão pré-existente foi o caráter econômico, pois interessa à iniciativa privada.
Contudo, em regra o consumidor preenche uma declaração muitas vezes utilizada para legitimar absurdas exclusões de atendimento.
Em verdade o que ocorre é a recusa do atendimento sob a alegação arbitrária de que havia prévio conhecimento da enfermidade.
Ressalte-se ainda que, muito embora integre o setor privado, as operadoras de planos de saúde exercem atividade essencial à manutenção da vida, qual seja, a prestação de serviços de assistência à saúde, complementando atribuição pertencente ao Estado e, desta forma, assume riscos inerentes à sua condição.
A seguradora de serviços médicos não pode ser vista como apenas mais uma empresa que exerce simples atividade econômica, buscando lucros, mas como uma prestadora de serviço essencial à população, porém delegado pelo Estado.
Nesse caminhar, ainda que a Lei autorize a exigência de um longo prazo de carência para a cobertura de doenças e lesões pré-existentes, nota-se que em se tratando de emergência e urgência o art. 12, V, c da Lei nº 9.656/98 determina como prazo máximo a carência de 24 (vinte e quatro) horas. O qual deve prevalecer.
O art. 51, IV do CDC, determina que são nulas de pleno direito as cláusulas que sejam incompatíveis com os princípios da boa-fé e da equidade.
Assim. considerasse eventual possibilidade de exclusão, deveria a prestadora de serviço orientar o contratante, consumidor, sobre as consequências, esclarecendo-lhe com detalhes todas as implicações caso fosse precisar de atendimento médico em razão da doença em questão.
No entanto, como se vê no cotidiano as operadoras de planos de saúde não cuidam de esclarecer nada disso, e somente pretendem apenas eximir-se de sua obrigação de arcar com as despesas.
Ademais, muitas vezes os planos de saúde sequer cuidam de realizar exames de admissão no plano, tendentes a detectarem doenças e lesões pré-existentes.
Diante da análise da jurisprudência em diversos Estados brasileiros, percebe-se que: (i) os julgados na sua esmagadora maioria tem sido em favor dos beneficiários; (ii) utilizam como norte princípios norteadores das relações de consumo; (iii) inexistência de prova acerca das condições e consequências da cobertura de doenças e lesões pré-existentes ao consumidor.
Vejam-se algumas jurisprudências abaixo ementadas que demonstram o quanto acima argumentado:
PLANO DE SAÚDE CARÊNCIA Negativa do plano de saúde à cobertura das despesas médicas e hospitalares ao fundamento de doença preexistente à contratação a exigir o término do prazo de carência estabelecido Descabimento, pelas razões constantes do corpo do voto Violação frontal à legislação de regência Desconhecimento dos males que a acometiam à época da adesão Ciência do diagnóstico posterior à contratação mediante recomendação médica Ausência de prova em sentido contrário Art. 333, inc. II, do C.P.C. Sentença mantida Apelo improvido.333IIC.P.C.
(430628120098260000 SP 0043062-81.2009.8.26.0000, Relator: Luiz Ambra, Data de Julgamento: 25/04/2012, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 02/05/2012)
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Plano de saúde Negativa de cobertura - Seguradora que correu o risco do negócio ao deixar de solicitar os exames prévios para constatação ou negativa de doença pré-existente - Não comprovação de má-fé do autor - Sentença mantida Recurso desprovido.
(25911720098260099 SP 0002591-17.2009.8.26.0099, Relator: Moreira Viegas, Data de Julgamento: 01/08/2012, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 04/08/2012)
Por fim um julgado do SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - STJ, abaixo ementada:
PLANO DE SAÚDE. OBESIDADE MÓRBIDA. GASTROPLASTIA. ALEGAÇÃO DE DOENÇA PRÉ-EXISTENTE. PRAZO DE CARÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO.1. "O ponto omisso da decisão, sobre o qual não foram opostos embargos declaratórios, não pode ser objeto de recurso extraordinário, por faltar o requisito do prequestionamento" (Súmula 356/STF).2. A gastroplastia, indicada como tratamento para obesidade mórbida, longe de ser um procedimento estético ou mero tratamento emagrecedor, revela-se como cirurgia essencial à sobrevida do segurado, vocacionada, ademais, ao tratamento das outras tantas co-morbidades que acompanham a obesidade em grau severo. Nessa hipótese, mostra-se ilegítima a negativa do plano de saúde em cobrir as despesas da intervenção cirúrgica.3. Ademais, não se justifica a recusa à cobertura de cirurgia necessária à sobrevida do segurado, ao argumento de se tratar de doença pré-existente, quando a administradora do plano de saúde não se precaveu mediante realização de exames de admissão no plano, sobretudo no caso de obesidade mórbida, a qual poderia ser facilmente detectada.4. No caso, tendo sido as declarações do segurado submetidas à apreciação de médico credenciado pela recorrente, por ocasião do que não foi verificada qualquer incorreção na declaração de saúde do contratante, deve mesmo a seguradora suportar as despesas decorrentes de gastroplastia indicada como tratamento de obesidade mórbida.5. Recurso não provido.
(980326 RN 2007/0195089-0, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 01/03/2011, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 04/03/2011)
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PROCESSUAL CIVIL. CITAÇÃO EPISTOLAR. AGÊNCIA BANCÁRIA PERTENCENTE AO MESMO GRUPO ECONÔMICO. VALIDADE. DOENÇA PREEXISTENTE. MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA. É eficaz a citação epistolar entregue em agência bancária integrante do grupo econômico a que pertence o citando, tanto mais quando a correspondência é recebida pelo preposto que firma contratos em nome da demandada. Sem a exigência de exames prévios e não provada a má-fé do segurado, é ilícita a recusa da cobertura securitária, sob a alegação de doença preexistente à contratação do seguro”
(REsp 533404/RO, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 01/05/2006, DJ 26/06/2006, p.131)
Cabe aqui registrar que o art. 47 do Código de Defesa do Consumidor, determina que “As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”, não sendo demais lembrar que constitui direito básico do consumidor a informação clara a respeito do que está sendo contratado, conforme art. 6, III do CDC.
Nesse sentido leciona a ilustre doutrinadora Claudia Lima Marques[9] leciona:
“(...) a jurisprudência brasileira geralmente lança mão não só do recurso de interpretação mais favorável ao consumidor, com base no art. 47 do CDC, mas também da ideia de interpretação do contrato teoricamente, com cláusulas claras, conforme sua função econômica. Logo, as cláusulas claras serão interpretadas conforme as expectativas que aquele tipo de cláusula desperta nos consumidores, conforme as novas imposições da boa-fé”
De igual modo figuram como cláusulas abusivas as que não concedem cobertura às cirurgias com implante de próteses.
Nestes casos, muito se vê que o plano de saúde autoriza a cirurgia, no entanto, nega a cobertura da prótese que era imprescindível ao ato cirúrgico necessário para sanar o problema de saúde que estava sendo tratado.
Ora, se a prótese aparece como indispensável ao ato, sua cobertura não podia ser negada.
Tal recusa de cobertura, em tais casos, ofende diretamente a boa-fé objetiva que deve nortear as relações jurídicas.
Nesse sentido adverte o doutrinador Humberto Theodoro, citado pela nobre promotora e professora Joseane Suzart[10]:
“ofende-se o princípio da boa-fé quando o contrato, ou a maneira de interpretálo ou de executá-lo redundam em prejuízo injusto para uma das partes”
Frise-se, também, que as cláusulas contratuais que tratam da inexistência de cobertura para alguns serviços, por serem restritivas de direitos e implicarem desvantagem ao aderente, devem ser redigidas de forma destacada, evitando-se, assim, risco de lesão ao consumidor.
Nesse passo, é a determinação do art. 54, §§ 3 e 4 do Código de Defesa do Consumidor, a seguir transcritos:
Art. 54.- Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
(...)
§ 3º - Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.
§ 4° - As cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão.
A título exemplificativo acerca da jurisprudência cabe aqui colacionar um julgado nesse sentido:
OBRIGAÇÃO DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA DE PRÓTESE NECESSÁRIA À CIRURGIA DE QUADRIL. INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E DA LEI DOS PLANOS DE SAÚDE. COBERTURA AO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO QUE INCLUÍA, INEVITAVELMENTE, OS MATERIAIS INTRINSECAMENTE LIGADOS A ELE, COMO A PRÓTESE QUE VISAVA A REPARAÇÃO DA ARTICULAÇÃO COXO-FEMURAL DO AUTOR. PRECEDENTES DESTA C. CÂMARA. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
(543144120108260002 SP 0054314-41.2010.8.26.0002, Relator: Paulo Alcides, Data de Julgamento: 21/06/2012, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/06/2012)
Por fim, para sanar está situação que em muitos momentos vão colocar a vida dos beneficiários em risco, é necessário fazer a interpretação concomitante de quatro dispositivos do CDC, quais sejam: (i) art. 6, III; (ii) art. 47; (iii) art. 51, IV; e, (iv) art. 54, §§ 3 e 4.
Entretanto, visto que tais contratos portadores destas cláusulas abusivas são previamente autorizados pelo órgão competente, ANS, deveria a mesma restringir de logo tais cláusulas que podem colocar a vida dos beneficiários de planos de saúde em risco.
7. DA CONCLUSÃO
Como foi demonstrado em tópicos anteriores a saúde pública no Brasil não tem qualidade que garanta um nível mínimo de satisfação dos beneficiários.
Assim, é inevitável que muitas pessoas façam a escolha pelos serviços oferecidos pelas operadoras de planos de saúde, empresas privadas que exploram atividade pública essencial.
No entanto, vimos que muito embora os contratos de adesão comercializados pelas operadoras de saúde sejam previamente avaliados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar, o que se vê são contratos de adesão portando inúmeras cláusulas abusivas.
O Código de Defesa do Consumidor, estabeleceu normas e princípios que devem nortear às relações de consumo, como por exemplo o principio da boa-fé objetiva.
Ocorre que pautado em tais cláusulas abusivas, por muitas vezes as operadoras de planos de saúde tem negado atendimentos aos consumidores em evidente desrespeito às normas jurídicas e aos próprios consumidores.
Em especial, foi demonstrada a cláusula de carência acerca de doenças e lesões pré-existentes que é muito utilizada para justificar inúmeras negativas de atendimento médico/cirúrgico.
Tais situações colocam os consumidores em uma posição de total hipossuficiência perante às empresas de planos de saúde.
Toda essa problemática, culmina em um volume crescente de ações judiciais na tentativa de sanar e frear tais condutas perpetradas pelas empresas de planos de saúde em face de seus consumidores.
Após o choque inicial produzido pelo CDC, as empresas fornecedoras, sequer cogitando a ideia de diminuir parcialmente seus lucros para oferecer um serviço adequado para os consumidores passaram a analisar quanto representa, economicamente, agir de acordo com o ordenamento jurídico e qual o valor econômico do patente desrespeito às normas jurídicas.
E tristemente concluíram que é mais barato desrespeitar as normas e indenizar depois.
É obvio que atitudes enérgicas devem ser tomadas, e, sem duvidas, condenações judiciais mais severas seria um elemento tendente a mudar esta atual situação.
De igual modo, levando em consideração o papel e a autoridade da Agência de Saúde Suplementar, é evidente que a mesma deveria utilizar-se também dos critérios dispostos no CDC para autorizar a comercialização de determinados contratos de adesão ofertados pelas operadoras.
O risco do empreendimento é a teoria adotada pelo digesto consumerista, assim, não se pode transmitir ao beneficiário do plano de saúde o ônus de tal empreendimento, na medida em que inclui inúmeras cláusulas abusivas e restritivas nos contratos de adesão.
Isto posto, sempre que identificada, as cláusulas abusivas constantes dos contratos de adesão devem ser declarada nulas de pleno direito.
8. BIBLIOGRAFIA / REFERÊNCIAS
- MEDEIROS GARCIA, Leonardo de. Direito do Consumidor, Editora JusPODIVM, 3ª edição, 2009.
- CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Direito do Consumidor, Editora Atlas, 2ª edição.
- PEREZ, Marcos Augusto. As agências reguladoras no direito brasileiro: origem, natureza e função. Revista Trimestral de Direito Público, n. 23. São Paulo: Malheiros, 1998.
- SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências reguladoras. Revista de Direito Administrativo, n. 216, Rio de Janeiro, Editora Renovar, 1999.
- http://www.ans.gov.br/portal/site/_destaque/artigo_complementar_11375.asp
- CAVALIERI FILHO, Sergio, Programa de Responsabilidade Civil, 9ª Edição, Editora Atlas.
- ROCHA MENDES, Karyna. Doença Preexistente nos Planos de Saúde, Editora Saraiva, 2009
- LIMA MARQUES, Claudia, HERMAN V. BENJAMIM, Antonio e MIRAGEM, Bruno, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 3ª Ed. RT, 2010, pág. 880
- SILVA, Joseane Suzart Lopes. Planos de Saúde e Boa-fé objetiva. 1ª ed., Editora JusPodivm, Bahia: 2008 - pág. 451
- Lei nº 8.078 de 1990
- Lei nº 9.656 de 1998
[1] MEDEIROS GARCIA, Leonardo de. Direito do Consumidor, Editora JusPODIVM, 3ª edição, 2009, p. 21.
[2] CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Direito do Consumidor, Editora Atlas, 2ª edição, p. 56
[3] PEREZ, Marcos Augusto. As agências reguladoras no direito brasileiro: origem, natureza e função. Revista Trimestral de Direito Público, n. 23. São Paulo: Malheiros, 1998, p.126.
[4] SOUTO, Marcos Juruena Villela. Agências reguladoras. Revista de Direito Administrativo, n. 216, Rio de Janeiro, Editora Renovar, 1999, p. 132.
[5] http://www.ans.gov.br/portal/site/_destaque/artigo_complementar_11375.asp
[6] CAVALIERI FILHO, Sergio, Programa de Responsabilidade Civil, 9ª Edição, Editora Atlas, pág. 440
[7] CAVALIERI FILHO, Sergio, Programa de Direito do Consumidor, Editora Atlas, 2ª edição, pág. 215
[8] ROCHA MENDES, Karyna. Doença Preexistente nos Planos de Saúde, Editora Saraiva, 2009, pág. 196
[9] LIMA MARQUES, Claudia, HERMAN V. BENJAMIM, Antonio e MIRAGEM, Bruno, Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, 3ª Ed. RT, 2010, pág. 880
[10] SILVA, Joseane Suzart Lopes. Planos de Saúde e Boa-fé objetiva. 1ª ed., Editora JusPodivm, Bahia: 2008 - pág. 451
03º Tabelião Substituto do Tabelionato de Protesto de Títulos de Salvador - 04º Ofício Graduado em Bacharelado em Direito pela Faculdade 2 de Julho (2013). Pós-graduado em Direito Material e Processual do Trabalho pela Faculdade Baiana de Direito (2015) Pós-graduando em Direito Notarial e Registral pela Damásio Educacional Tem experiência na área de Direito e Processo do Trabalho,Direito do Consumidor, Direito e Processo Civil e Direito Notarial e Registral.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FONSECA, Danilo Miranda da. Cláusulas abusivas nos contratos de adesão - planos de saúde Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 mar 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46265/clausulas-abusivas-nos-contratos-de-adesao-planos-de-saude. Acesso em: 22 nov 2024.
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