1. Introdução
A propriedade é, certamente, o mais amplo de todos os direitos reais[1]. É, assim, “um direito complexo, se bem que unitário, consistindo num feixe de direitos consubstanciados nas faculdades de usar, gozar, dispor e reivindicar a coisa que lhe serve de objeto”. O artigo 170, da Constituição Federal, elenca a função social da propriedade como um princípio informador da ordem econômica.
1.1 Análise da expressão “função social da propriedade”
O acesso à propriedade é direito fundamental garantido pela Constituição de 1988. Tal direito fora positivado pelo constituinte no artigo 5º, inciso XXII.
Não se olvide, entretanto, que a mesma Constituição de 1988 consagra o direito de propriedade – direito subjetivo por excelência na ordem patrimonial – como uma complexa situação jurídica subjetiva, ativa e passiva[2]. É o que leciona Gustavo Tepedino:
A propriedade, portanto, não seria mais aquela atribuição de poder tendencialmente plena, cujos confins são determinados externamente, ou, de qualquer modo, em caráter predominantemente negativo, de tal modo que, até uma certa demarcação, o proprietário teria espaço livre para suas atividades e para a emanação de sua senhoria sob o bem. A determinação da propriedade, ao contrário, dependerá de centros de interesses extraproprietários, os quais vão ser regulados no âmbito da relação jurídica de propriedade. Tal conclusão oferece suporte teórico para a correta compreensão da função social da propriedade, que terá, necessariamente, uma configuração flexível, mais uma vez devendo-se refutar os apriorismos ideológicos e homenagear o dado normativo. A função social modificar-se-á de estatuto para estatuto, sempre em conformidade com os preceitos constitucionais e com a concreta regulamentação dos interesses em jogo[3].
Com efeito, faz-se necessário analisar em cada caso concreto se a propriedade em espeque está ou não corroborando os propósitos constitucionais de promoção dos direitos humanos. Por óbvio, seria inaceitável que esta prerrogativa fosse, por exemplo, estendida a um latifúndio improdutivo ou a propriedades urbanas subutilizadas ou sequer utilizadas.
Nesse sentido, Cristiano Chaves[4] afirma que “a dimensão positiva do direito de moradia consiste em uma política agressiva de conversão de excluídos em autônomos cidadãos proprietários, com aptidão plena de usufruir e dispor de bens jurídicos”. Ainda conforme o mesmo autor, o Estado Democrático de Direito tem por objetivo a “transformação do status quo”, evitando, assim, a eternalização do estado das coisas. É preciso entender que a propriedade formal não é simplesmente um instrumento de apropriação, mas o meio de motivar as pessoas a criar mais-valia real e útil.
Segundo André Ramos Tavares[5], foi Leon Duguit “quem considerou a propriedade como uma função, abandonando a concepção de que se trataria de um direito subjetivo”. Diz-se que o jurista francês “pode ser considerado o pai da ideia de que os direitos só se justificam pela missão social para a qual devem contribuir e, portanto, que o proprietário se deve comportar e ser considerado, quanto à gestão de seus bens, como um funcionário[6]”.
Léon Duguit[7] ensina que “o homem que vive em sociedade tem direitos; mas esses direitos não são prerrogativas que lhes pertençam na sua qualidade de homem; são poderes que lhes pertencem porque, sendo homem social, tem um dever a cumprir e deve ter o poder de cumprir tal dever”. Discorrendo, mais especificamente sobre o direito de propriedade, o mesmo autor pondera:
A propriedade individual deve ser compreendida como um fato contingente produto momentâneo da evolução social; e o direito do proprietário, como justificado e ao mesmo tempo limitado pela missão social que lhe incumbe em consequência da situação particular em que se encontra[8].
Dentro desta perspectiva, o intérprete menos cauteloso poderia incorrer no equívoco de considerar a propriedade unicamente como função, olvidando-se o seu caractere de direito subjetivo.
A concepção exclusivamente funcional apenas encontra amparo na doutrina socialista, pois nesta a propriedade existe para assegurar o desenvolvimento do Estado e alcançar o bem comum[9].
Ora, em tempos atuais, não se admite ignorar o direito subjetivo à propriedade. Da mesma forma, não pode esse direito alçar tamanha importância que exclua a função social que lhe é imanente[10]. Mais uma vez, a técnica de compatibilização de institutos demonstra imprescindível valia.
Portanto, também aqui a solução sobre a problemática deverá decorrer da compatibilização de concepções. Embora não se possa mais falar em direito subjetivo de propriedade em termos absolutamente liberais, a realidade é que esse direito permanece, agora, contudo, com conteúdo diverso, voltada que está também a propriedade para o atendimento ao interesse social [...].
Fosse apenas uma função (e não um direito) e certamente não se falaria em indenização no caso de desapropriação. O direito assegurado ao proprietário àquela indenização demonstra a sua característica de direito individual, que, uma vez violentado, reverte necessariamente em perdas e danos[11].
Também não é correto afirmar que a função social advém de uma concepção intimamente socialista, pelo contrário, é conceito próprio do sistema de mercado, pois corrobora o lucro e a propriedade privada dos bens de produção quando conforma a atividade do produtor de riquezas e o interesse de toda a coletividade.
A propriedade privada é, portanto, considerada elemento essencial ao modo de produção capitalista[12] e essa “energia moral da concepção de que a propriedade é uma função social não tem, entretanto, inspiração socialista, como se supõe, por desinformação, particularmente os socialistóides levianos ou contrabandistas de ideias[13]”.
O estudo da função social da propriedade imprescinde da análise de cada um dos termos componentes da locução. Reputando-se ao primeiro vocábulo – função – Orlando Gomes traz a preciosa lição de Rodotá[14]:
[...] Esclarece o citado professor que o termo função contrapõe-se à estrutura e que serve para definir a maneira concreta de operar de um instituto ou de um direito de características morfológicas particulares e notórias. A partir do momento em que o ordenamento jurídico reconheceu que o exercício dos poderes do proprietário não deveria ser protegido tão somente para satisfação de seu interesse, a função da propriedade tornou-se social.
Desta análise, Orlando Gomes[15] conclui que “o novo esquema manifestou-se pela consistência da função sob tríplice aspecto: 1º) a privação de determinadas faculdades; 2º) a criação de um complexo de condições para que o proprietário possa exercer seus poderes; 3º) a obrigação de exercer certos direitos elementares do domínio”.
A função é, assim, um poder cujo exercício não se dá exclusivamente em prol de seu titular, mas também no interesse de terceiros. Isso quer dizer que a função social concretiza-se em um comportamento positivo do proprietário – um fazer, e não apenas o de um não fazer em prejuízo de outrem.
É certo que a propriedade é também um direito subjetivo[16] e como tal, trata-se de uma permissão jurídica para o uso da facultas agendi, que não deve extrapolar os limites dessa autorização.
Sendo assim, “[...] a permissão ou autorização jurídica para o uso da faculdade relacionada à propriedade – da aptidão à propriedade – pode ou não ser definida, juridicamente, como função. Se tal ocorrer, o direito subjetivo em causa é, concomitantemente, função[17].”
Analisando-se, por ora, a adjetivação “social”, verifica-se louvável a interpretação que não enxerga neste termo qualquer equivalência com o não-individualístico. A melhor doutrina acena para a definição de “social” como “critério de avaliação de situações jurídicas ligadas ao desenvolvimento de determinadas atividades econômicas, para maior integração do indivíduo na coletividade[18]”.
Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald[19] concluem que a expressão função social advém do latim functio, que significa “cumprir algo”, “desempenhar um dever ou uma atividade”. Os vocábulos indicam, portanto, uma finalidade, um modo de operar um determinado instituto que, consoante a natureza da situação ora discutida, perfaz-se em um instituto jurídico.
Orlando Gomes[20], por sua vez, destaca a necessidade de reconhecimento de dois problemas quando da análise da função social da propriedade. O primeiro gira em torno da distinção entre propriedade que tem função social e propriedade que é função social.
Citando Perlingeri[21], o mesmo autor afirma que a propriedade que tem função social consubstancia-se na permanência do pleno domínio do proprietário. Somente ocasionalmente o interesse particular será mitigado por força da função social.
Continua a sua explanação ponderando que a propriedade é função social quando for atribuída ao proprietário com o objetivo precípuo de atender o interesse público ou coletivo.
O segundo problema apontado[22] reside em saber se a função social da propriedade é uma limitação ao direito do proprietário, de modo a impô-lo um fazer ou não fazer em prol de interesses maiores ou, se, de outra forma, é uma figura autônoma, cujas restrições antes citadas caracterizam-se como meros elementos de sua justificação.
A resposta segundo a qual a qual a função social da propriedade se identifica com o conjunto de limitações impostas ao proprietário pelo ordenamento jurídico confunde a ratio das leis restritivas com o seu texto. [...] Não é contudo sob esses aspectos que o problema deve ser abordado para a conceituação de função social da propriedade. [...]. A diferença está em que as limitações atingem o exercício do direito de propriedade, não a sua substância, e em que só se justificam se uma nova concepção do direito de propriedade é aceita.
A resposta segundo a qual a função social da propriedade é antes uma concepção com eficácia autônoma e incidência direta do próprio direito consente elevá-la à dignidade de um princípio que deve ser observado pelo intérprete [...]. O preceito constitucional que atribui função social à propriedade, não tem valor normativo porque não se consubstancia nas normas restritivas do moderno direito de propriedade, mas simplesmente se constitui no seu fundamento, na sua justificação, na sua ratio[23].
A função social da propriedade deve ser, portanto, entendida como elemento constitutivo do próprio direito de propriedade, “não é um elemento externo, um mero adereço do direito de propriedade, mas um elemento interno sem o qual não se perfectibiliza o suporte fático do direito de propriedade[24]”.
Analisando a problemática, aponta Gilberto Bercovici[25], que “a função social da propriedade torna-se o fundamento do regime jurídico do instituto da propriedade, de seu reconhecimento e sua garantia, dizendo respeito ao seu próprio conteúdo”.
Aponta, ainda, que o Direito deve ser encarado e entendido como um ordenamento, cujas regras devem correlacionar-se. Assim, “o Direito é um todo articulado, determinado pelas exigências da sociedade, cujo ordenamento é dotado de caráter orgânico[26]”.
Esse caráter orgânico leva à inquestionável conclusão de que os institutos de direito privado estão inexoravelmente imbricados com os de direito público, logo, apenas quando nesta condição estejam, alcançam sua plena eficácia. Neste sentir, “[...] a propriedade é ineficaz sem o ordenamento jurídico à sua volta, sendo conformada pelas disposições de direito público[27]”.
Quando se fala em função social não se está fazendo referência às limitações negativas do direito de propriedade, que atingem o exercício do direito de propriedade, não a sua substancia. As transformações pelas quais passou o instituto da propriedade não se restringem ao esvaziamento dos poderes do proprietário ou à redução do volume do direito de propriedade, de acordo com as limitações legais. Se fosse assim, o conteúdo do direito de propriedade não teria alterado, passando a função social a ser mais uma limitação[28].
Não se pode atribuir à função social o caráter de mais um instituto limitador do direito de propriedade advindo da transição de paradigmas que ensejaram a linha de pensamento de Direito contemporâneo. A função social é, por consequência, mais que uma limitação negativa; é princípio geral que compõe o próprio direito de propriedade.
Findando a análise da expressão “função social”, não se olvide a importante e clara constatação de que este instituto atinge apenas a propriedade privada, nunca a propriedade pública, isso porque “[...] a idéia [sic] da função social como vínculo que atribui à propriedade um conteúdo específico, de sorte a moldar-lhe um novo conceito, só tem sentido e razão de ser quando referida à propriedade privada[29]”
Com efeito, a Constituição de 1988 consignou a função social da propriedade no artigo 5º, inciso XXIII e no artigo 170, inciso III. Neste, elevara o instituto a fundamento da ordem econômica e naquele tratara da matéria dentro das disposições atinentes aos direitos fundamentais.
Consoante a lição de Fábio Konder Comparato[30], estas disposições não devem ser concebidas como meras diretrizes ao legislador, que deverá atuar estabelecendo limites ao direito de propriedade. Destarte, não se pode idealizar a função social como simples recomendação, mas sim como vinculação jurídica, tanto para o Estado, como para os particulares.
Esta fora a mesma constatação de Orlando Gomes[31], que cita o artigo 14, alínea 2 da Constituição da Alemanha de 1929 como a melhor ilustração da recepção do conceito de função social no direito positivo. Este dispositivo determina que “a propriedade obriga. O uso da propriedade deve concorrer também para o bem da coletividade.”
O texto constitucional de 1988 “inovou de forma provavelmente sem precedentes, quase quinze anos antes do codificador de 2002, isso porque funcionalizou a propriedade aos valores sociais e existenciais[32]”.
Carlos Alberto Dabus Maluf destaca que pela primeira vez uma Constituição tratou, em capítulos apartados, da propriedade rural e da propriedade urbana:
É verdade já existir, desde 1964, o Estatuto da Terra[33] regulando os direitos e obrigações concernentes aos bens imóveis rurais, para fins de reforma agrária e promoção da política agrária. [...] Mas, em sede constitucional, a separação da matéria ainda não havia ocorrido[34].
Nesta esteira, o artigo 186 consigna condições a serem atendidas pelo proprietário rural. Estas condições acabarão por atender interesses que ultrapassam a sua esfera de individualidade. São, portanto, requisitos ao atendimento da função social do imóvel rural: “I – aproveitamento racional e adequado; II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho; IV – exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e dos trabalhadores”.
Tratando da função social da propriedade urbana, o artigo 182 § 2º da Carta Magna estabelece que esta desempenha sua função social ao obedecer as delimitações de ordenação da cidade estabelecidas no plano diretor.
É imprescindível ressaltar que, não obstante ambos os dispositivos convoquem o legislador a instituir o conteúdo da função social[35], a omissão daquele no que tange a esta regulamentação não ilide o proprietário do dever de promovê-la[36].
[...] quando a Constituição reconhece que as normas definidoras de direitos fundamentais têm aplicação imediata, ela está implicitamente reconhecendo a situação inversa; vale dizer, a exigibilidade dos deveres fundamentais é também imediata, dispensando a intervenção legislativa. É claro que o legislador pode, nesta matéria, incorrer em inconstitucionalidade por omissão, mas esta não será nunca obstáculo à aplicação direta e imediata das normas constitucionais[37].
2. Conclusão
Como se vê, o regime constitucional da propriedade estabelecido em 1988 cria para o proprietário um dever em relação ao imóvel, uma obrigação que irradia verdadeiro caráter propter rem. Essa nova situação desloca, de uma vez por todas, a compreensão do direito de propriedade como um poder privativo do titular sobre a coisa, oponível, em quaisquer circunstâncias a todos, para compreendê-lo também sob uma ótica passiva. Essa nova situação tornou-se aceitável em razão de a função social impor-se como um ônus ao proprietário de forma a atender um interesse social da comunidade.
Referências
BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e Desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros
COMPARATO, Fábio Konder. Direitos e deveres fundamentais em matéria de propriedade. A questão agrária e a justiça. São Paulo: RT, 2000. Disponível em: <http://ns1.dhnet.org.br/direitos/militantes/comparato/comparato_direitos_deveres_fundamentais_materia_propriedade.pdf>. p. 5. Acesso em: 06 maio 2011.
COMPARATO, Fábio Konder. Direitos e deveres fundamentais em matéria de propriedade. A questão agrária e a justiça. São Paulo: RT, 2000. Disponível em: <http://ns1.dhnet.org.br/direitos/militantes/comparato/comparato_direitos_deveres_fundamentais_materia_propriedade.pdf>. p. 6. Acesso em: 06 maio 2011.
DUGUIT, Léon. Fundamentos do Direito. São Paulo: Servanda, 2008.
FARIAS, Cristiano Chaves de, ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009.
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2007
MALUF, Carlos Alberto Dabus. Limitações ao Direito de Propriedade. 2. ed. São Paulo: Saraiva.
SILVEIRA, Domingos Sávio Dresch da. A propriedade agrária e suas funções sociais In Domingos SILVEIRA, Domingos Sávio Dresch da. e XAVIER, Flávio Sant’Ánna (coord.). O Direito Agrário em Debate. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998
TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Método, 2006.
TEPEDINO, Gustavo, Contornos Constitucionais da Propriedade Privada. Temas de Direito Civil. 4. ed. São Paulo: Renovar.
[1] GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p.109.
[2] GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p. 124.
[3] TEPEDINO, Gustavo, Contornos Constitucionais da Propriedade Privada. Temas de Direito Civil. 4. ed. São Paulo: Renovar, 2008. p. 337-338.
[4] FARIAS, Cristiano Chaves de, ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 185.
[5] TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Método, 2006. p. 155.
[6] GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p. 126.
[7] DUGUIT, Léon. Fundamentos do Direito. São Paulo: Servanda, 2008. p. 25.
[8] Ibid. p. 27.
[9] TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Método, 2006. p. 156.
[10] Ibid., loc. cit.
[11] Ibid., loc.cit.
[12] TAVARES, André Ramos. Direito Constitucional Econômico. 2. ed. São Paulo: Método, 2006. p. 156.
[13] Mostra-se pertinente a colocação de Orlando Gomes: “[...] Muito pelo contrário. Se não chega a ser uma mentira convencional, é um conceito ancilar do regime capitalista, por isso que, para os socialistas autênticos, a fórmula função social, sobre ser uma concepção sociológica e não um conceito técnico-jurídico, revela profunda hipocrisia, pois ‘mais não serve do que embelezar e esconder a substância da propriedade capitalística’. É que legitima o lucro ao configurar a atividade do produtor de riqueza, do empresário, do capitalista, como exercício de uma profissão no interesse geral. Seu conteúdo essencial permanece intangível, assim como seus componentes estruturais. A propriedade continua privada, isto é, transmissível livremente. Do fato de poder ser desapropriada com maior facilidade e de poder ser nacionalizada com maior desenvoltura não resulta que sua substância se estaria deteriorando”. (grifos do autor). GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p. 126.
[14] “Proprietà, verb. in novíssimo Digesto Italiano, vol. XIV” In: Ibid. p. 124-125.
[15] Ibid., p.125.
[16] Eros Roberto Grau destaca que, inobstante alguns enxerguem a impossiibilidade em conceber, concomitantemente, a ideia de propriedade como direito subjetivo e como função social. Tratam-se de elementos plenamente conciliáveis. Para o jurista, não deve prevalecer a opinião daqueles que se insurgem “[...] contra a concepção da função social, entendo-a como fórmula ambígua, na qual se exprime a contradição dogmática de inserir no conceito de direito subjetivo uma função, que supõe, precisamente, obrigações e ônus.” GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 241.
[17] Ibid., p. 242.
[18] GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p. 125.
[19] FARIAS, Cristiano Chaves de, ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 6. ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2009. p. 198-199.
[20] Op. cit., p. 127-128.
[21] Perlingieri, Introduzione alla Problematica della Proprietà, Camerino Jovene, p. 75. In GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p. 125.
[22] Ibid., p. 127-128.
[23] Ibid., p. 128.
[24] SILVEIRA, Domingos Sávio Dresch da. A propriedade agrária e suas funções sociais In Domingos SILVEIRA, Domingos Sávio Dresch da. e XAVIER, Flávio Sant’Ánna (coord.). O Direito Agrário em Debate. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p. 11-25. p. 13.
[25] BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e Desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros: 2005. p. 145.
[26] BERCOVICI, Gilberto. Constituição Econômica e Desenvolvimento: uma leitura a partir da Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros: 2005. p. 146.
[27] Ibid., loc. cit.
[28] Ibid., loc. cit.
[29] GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de1988. 12. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 232.
[30] COMPARATO, Fábio Konder. Direitos e deveres fundamentais em matéria de propriedade. A questão agrária e a justiça. São Paulo: RT, 2000. Disponível em: <http://ns1.dhnet.org.br/direitos/militantes/comparato/comparato_direitos_deveres_fundamentais_materia_propriedade.pdf>. p. 5. Acesso em: 06 maio 2011.
[31] GOMES, Orlando. Direitos Reais. 19. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 2004. p. 130.
[32] TEPEDINO, Gustavo, Contornos Constitucionais da Propriedade Privada. Temas de Direito Civil. 4. ed. São Paulo: Renovar, 2008. p. 328.
[33] Orlando Gomes ensina que o Estatuto da Terra “não define propriamente a locução função social nem estabelece limitações ao direito do proprietário, que o comprimam. Traça o comportamento regular do proprietário, exigindo que exerça o seu direito numa dimensão na qual se realize interesses sociais sem a eliminação do domínio privado do bem que lhe assegura as faculdades de uso, gozo e disposição. Esse comportamento não implica o cumprimento de obrigações positivas, nem determina limitações ao direito sob forma negativa, devendo tê-lo também os possuidores que não sejam proprietários. São exigências que traduzem a mudança qualitativa no tratamento legislativo da propriedade agrária [...]. É, em síntese, um parâmetro do exercício do direito de propriedade.” Op. cit., p. 130.
[34] MALUF, Carlos Alberto Dabus. Limitações ao Direito de Propriedade. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 78.
[35] Art. 182 da Constituição Federal de 1988: “A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes. § 2º A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor”; art. 186 da Constituição Federal de 1988: “A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos [...]”. (grifos nossos)
[36] Embora externadas em momento anterior à vigência do Código Civil de 2002, as lições de Domingos Sávio Dresch da Silveira são bastante elucidativas: “Por outro lado, se tomarmos a posição daqueles que afirmam caráter programático do princípio constitucional em exame, vemos que nem mesmo as consequências típicas das normas programáticas são admitidas. Sabe-se que tais normas produzem, ao menos, os seguintes efeitos imediatos: (a) revogam leis anteriores com elas incompatíveis, (b) vinculam o legislador à sua realização ou condicionam a atuação da administração pública e (d) informam a interpretação e aplicação da lei pelo Judiciário. Ora, se tais consequências próprias das normas ditas programáticas fossem aplicadas à propriedade teríamos, indubitavelmente, um extraordinário avanço, pois até o momento, aos olhos, sobretudo, do Judiciário, respectivamente: (a) a norma constitucional não revogou nada do CCB nem do CPC em matéria possessória, (b) o legislador ainda não se sentiu compelido a adaptar o regime jurídico da posse à Constituição, ou sequer a aprovar o projeto de lei do Estatuto da Cidade, (c) a Administração Pública tem sido extremamente lenta e ineficiente na declaração do interesse social dos latifundiários improdutivos, e (d) o Judiciário interpreta os dispositivos do Código Civil de maneira assistemática, desconsiderando os princípios constitucionais sobre propriedade.” SILVEIRA, Domingos Sávio Dresch da. A propriedade agrária e suas funções sociais in Domingos SILVEIRA, Domingos Sávio Dresch da. e XAVIER, Flávio Sant’Ánna (coordenadores). O Direito Agrário em Debate. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p. 11-25. p. 16.
[37] COMPARATO, Fábio Konder. Direitos e deveres fundamentais em matéria de propriedade. A questão agrária e a justiça. São Paulo: RT, 2000. Disponível em: <http://ns1.dhnet.org.br/direitos/militantes/comparato/comparato_direitos_deveres_fundamentais_materia_propriedade.pdf>. p. 6. Acesso em: 06 maio 2011.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBOSA, Silvana Pereira. Considerações sobre a função social da propriedade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 mar 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46287/consideracoes-sobre-a-funcao-social-da-propriedade. Acesso em: 22 nov 2024.
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