RESUMO: Trata-se de estudo acerca da (im)possibilidade de concessão de isenções tributárias pela União, através de tratados internacionais, de tributos de outros entes federativos, ante a proibição contida no art. 151, III da Constituição. É sabido que tal dispositivo é de suma importância no que tange a manutenção do federalismo brasileiro, sendo assim, resta impossível a União isentar tributos estaduais ou municipais. A questão, porém, merece reflexão quando trazida ao âmbito do direito internacional, mais especificamente, quando se trata de acordos e tratados internacionais. É que a Constituição confere a competência privativa para tratar de acordos e tratados internacionais à União. Sendo assim, tratados internacionais que versem sobre isenções a tributos municipais ou estaduais poderiam a uma primeira análise confrontar com a regra descrita no art. 151, III da Constituição Federal. No entanto, de acordo com o princípio da unidade da Constituição, que afirma neste diploma não pode haver regras conflitantes, se faz necessário uma análise do supracitado artigo de acordo com o sistema jurídico.
Palavras-chaves: Isenção heterônoma. Tratados Internacionais. Federalismo.
1. INTRODUÇÃO
O tema das isenções heterônomas firmadas através de tratados internacionais é de grande relevância no mundo globalizado em que vivemos. É certo que a integração entre as nações é inegável, e que vivemos em uma era de grandes fluxos comerciais e econômicos. Os bens e riquezas circulam entre as nações em uma velocidade cada vez maior, demonstrando uma necessidade de harmonização dos sistemas tributários utilizados por cada país. Disso decorre um aumento significativo de acordos, tratados e convênios em matéria tributária internacional.
A questão envolve ainda grandes discussões paralelas, como por exemplo, a responsabilidade do Estado brasileiro frente a compromissos firmados internacionalmente, a análise da estrutura do federalismo brasileiro, a relação existente entre o direito internacional e interno e o sistema de isenções tributárias.
No que tange ao federalismo brasileiro é necessário adentrar nas origens para entender a sistemática atual. Neste sentido, temos que o federalismo brasileiro foi construído de uma forma bastante peculiar que o distancia do modelo clássico norte-americano.
O Federalismo no Brasil resultou de um movimento centrífugo, de dentro para fora, de um Estado centralizador para uma República descentralizada. Nos Estados Unidos, observou-se o contrário: houve um movimento de aglutinação entre os Estados que, antes independentes, cederam sua soberania para a construção de um único Estado. Em decorrência desta razão histórica é possível entender porque os Estados norte-americanos detém mais autonomia que os Estados brasileiros.
Outra peculiaridade do federalismo brasileiro é a sua divisão, dado que neste sistema inclui não somente os Estados-membros e União como também os Municípios. Sendo assim, participam da organização político-administrativa da República a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios (conforme prescreve o artigo 18 da Lei Fundamental).
Foi conferida à União, soberania, esta inerente a todas as nações. Sendo assim, o Estado brasileiro, assim como qualquer outro, não deve obediência a nenhum outro Estado. É uma característica essencial da qualidade de Estado independente. Aos outros entes da federação brasileira, foi atribuída apenas a autonomia, ou seja, entes como os Estados-membros, Distrito Federal e Municípios, possuem o poder de auto-organização dentro de seus respectivos territórios.
A União, ente dotado de soberania, é a única que pode participar de decisões atinentes ao campo do Direito Internacional. A Constituição Federal fixou a competência para resolver tratados, acordo e convenções internacionais à este ente, visto que é o que representa a República Federativa do Brasil.
O problema surge então quando confrontamos esta natureza com a norma contida no artigo 151, III da Constituição que veda expressamente à União a instituição de isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou Municípios. É que pode acontecer que a União, em nível de tratado internacional, venha a isentar tais tributos que não são de sua competência.
Neste momento é necessário atentar para a divisão de competências tributárias assim como a natureza dúplice da União.
Em relação às competências tributárias, veremos que estas podem ser nacionais, neste caso deve ser observada por todos os entes políticos, ou federais, estaduais, distritais e municipais, que nestes casos, devem atuar dentro dos limites conferidos pela Constituição.
A União tanto possui a competência tributária nacional como a competência tributária federal. Tal fato se deve a sua natureza dúplice, que ora se comporta em pé de igualdade com os demais entes da federação, fazendo às vezes de pessoa jurídica de direito público, ora atua como representante da República Federativa do Brasil, e neste sentido encontra-se em um patamar acima dos entes políticos.
É necessário atentar que quando a União atua como representante da República, ela está revestida de competência nacional, devendo observar os interesses da nação, nação esta que não é só composta pela União, pessoa jurídica de direito público, mas como também todos os outros entes políticos. Sendo assim, quando a União firma tratado internacional, ela está representando os interesses do conjunto, do Estado brasileiro, da nação e não os seus interesses pessoais.
Neste ínterim, a jurisprudência vem se firmando no sentido de afastar a regra do artigo 151, III da Lei Maior quando a União atuar como representante do Estado brasileiro. Entende os Tribunais Superiores com liderança do Supremo Tribunal Federal que tal regra se limita aos casos em que a União, como pessoa jurídica de direito público interno, venha a invadir a competência dos outros entes federativos de forma a ferir diretamente o federalismo brasileiro e a autonomia dos entes políticos.
Por outro lado há doutrina no sentido de não permitir isenções firmadas pela União através de tratados internacionais. Entendem que mesmo neste sentido seria uma forma de invasão de competência dos entes federados, ofendendo de forma direta o pacto federativo. Atentam também para o fato de que no processo de confecção de um tratado internacional não é levado em conta a vontade dos Estados, Distrito Federal e Municípios, e em contrapartida, são esses que vão sofrer os efeitos danosos advindos de uma possível isenção.
É de se ver que o assunto apesar de já encontrar pacífico na jurisprudência, ainda é campo fértil para debates e discussões, principalmente no que tange a harmonização entre o modelo federal adotado pelo Brasil e as exigências de uma participação cada vez maior no Brasil no campo internacional.
2. CONSIDERAÇÕES ACERCA DO FEDERALISMO BRASILEIRO
O federalismo tem as suas origens firmadas nos Estados Unidos. Seu surgimento teve como causa principal a união de colônias independentes com o intuito de se fortalecer para garantir a independência frente à Inglaterra.
Os Estados se reuniram inicialmente na forma de confederação. Desta forma, as unidades que a compunham, por serem soberanas, poderiam a qualquer momento, desvincular-se do pacto, exercendo o direito de secessão. Sendo assim, a adoção da forma confederativa não firmava uma união estável entre os Estados. É que uma das características da confederação é a sua fragilidade, uma vez que não há neste tipo de união um poder político único, central.
Sendo assim, para a manutenção da independência seria necessário criar um ente, que fosse responsável por esta união e, ao mesmo tempo, garantisse a autonomia dos Estados. O federalismo americano, então, entregou a nova entidade, a União, poderes para exercer tarefas que fossem de interesse comum da nação, enquanto os Estados, que antes eram soberanos, passaram a ter somente autonomia.
Neste sentido, explica Dallari[1]:
A união faz nascer um novo Estado e, concomitantemente, aqueles que aderiram à federação perdem a condição de Estados. No caso norte americano, como no brasileiro e em vários outros, foi dado o nome de Estado a cada unidade federada, mas apenas como artifício político, porquanto na verdade não são Estados.
Ainda, o federalismo demonstrou ser capaz de dificultar a centralização do poder e por consequência o aparecimento de governos totalitários e antidemocráticos. É que a ampla participação política, com o advento da criação de mais de um poder, propiciou um ambiente muito mais dinâmico no sentido em que houve uma nítida aproximação entre governantes e governados.
Temos então que a experiência americana abriu as portas para um novo modelo de Estado: o Estado Federal. Sobre o assunto, leciona Bonavides[2] que o Estado Federal está intrinsicamente ligado à ideia de um poder constituinte dotado de soberania. Explica o autor que a Constituição Federal é responsável por dispor sobre os lineamentos básicos da organização federal, traçando a competência do Estado Federal, inclusive quanto à atividade legislativa. Esta não possui como destinatário direto e imediato os Estados-membros, mas as pessoas que ali vivem, sendo assim, os cidadãos do Estado Federal deverão observar leis de caráter nacional bem como as de caráter local. Além disso, a Constituição também garante ao Estado Federal a competência para o exercício de atribuições administrativas.
Este foi o modelo seguido por muitos Estados, inclusive o Brasil. É importante ressaltar que existem inúmeros modelos de Estados Federados, visto que, cada Estado ao incorporar o modelo norte-americano, teve de fazer alguns ajustes no sistema, devido as suas peculiaridades, advindas principalmente de diferenças históricas na sua construção.
Explica Mendes et al.[3] que a razão para os Estados assumirem a forma federal advém da formação cultural da comunidade bem como da geografia. Desta forma, um território amplo se torna mais propício para haver diferenças de desenvolvimento de cultura e paisagem geográfica. O federalismo contribui no sentido de permitir a convivência entre diferentes grupos étnicos e culturais, como é o caso do Canadá, que possuem duas línguas como oficiais. Sendo assim, este sistema atende aos interesses nacionais, bem como os locais, originários de territórios com características próprias.
O Brasil, por exemplo, ao contrário dos Estados Unidos, passava por um período de império, na qual já havia um poder central. Em 1889, com a proclamação da República, assume definitivamente a forma de Estado Federal. O Brasil então, ao contrário da experiência americana, precisava antes de tudo, fortalecer os poderes dos Estados-membros. Logo, o federalismo brasileiro, foi por demais importante para a descentralização do poder.
Conti[4] explica que no Brasil o impulso pelo modelo federativo está em situação oposta ao americano. Sendo assim, tivemos uma “União” antes de ter Estados, tivemos o todo antes das partes. Não fomos uma federação de povos até ontem separados e reunidos de ontem para hoje, como ocorreu nos Estados Unidos. Ao contrário, foi da União que partimos. A palavra federalismo possui no Brasil um sentido inverso da norte-americana, ou seja, quer dizer apego ao espírito da autonomia e nos Estados Unidos, associação de estados para defesa comum.
No entanto, tal descentralização não tornou os Estados tão independentes como no sistema norte-americano. Neste sentido, temos que uma das características do federalismo brasileiro é uma maior importância do interesse nacional sobre os locais.
Ainda no que tange a história do nascimento do federalismo brasileiro, a Constituição de 1891 criou um federalismo dualista, neste contexto, não existia a cooperação entre União e os entes federados, que só havia em caso de calamidade pública. Desta forma, num primeiro momento podemos vislumbrar a forte necessidade de autonomia por parte dos Estados-membros, visto que nunca na história do Brasil, tais entes tiveram tanta independência.
Após anos com seguinte o modelo dualista, a Constituição de 1934 traz a tona o federalismo cooperativo no Brasil, facultando a União e aos Estados a celebração de acordos para melhor coordenação e desenvolvimento de serviços públicos e especialmente para a uniformização de leis, regras e arrecadação de impostos.
Com o advento do golpe militar de 1964, surgiu um movimento centralizador na esfera da União. Pode-se afirmar que neste período o federalismo praticamente desapareceu. Somente com a Constituição de 1988, voltou ao federalismo cooperativo, iniciado com a Carta de 1934.
O professor José Afonso da Silva[5] ensina que hoje a federação brasileira consiste na união de unidades regionais autônomas chamadas de Estados federados, Estados-membros ou simplesmente Estados. Na composição do Estado brasileiro também temos os Territórios Federais e o Distrito Federal. Ainda, há a presença dos Municípios, que também estão incluídos na estrutura político administrativa da Federação brasileira[6].
Destaca Mello[7]:
A federação compreende três ordens jurídicas distintas: a coletividade central, as coletividades-membros e a comunidade total. As duas primeiras ordens são juridicamente iguais, porque estão, na mesma medida, subordinadas à ordem jurídica superior – a da comunidade total. Elas são ordens jurídicas parciais, pois as suas competências se circunscrevem somente a certas matérias que lhes foram conferidas pela ordem jurídica total. As ordens jurídicas parciais, ao passo que se acham subordinadas à ordem jurídica total – que possui a suprema competência – encontram-se entre si numa relação de coordenação. A coletividade central e as coletividades-membros compreendem dois sistemas harmônicos que se encerram na coletividade total. Esta constitui verdadeiramente o Estado federal, pois, como ordem jurídica total, abarca as duas ordens jurídicas parciais – união e membros – e, surge na sua completa integridade. A chamada ‘constituição federal’ pode ser desdobrada em duas cartas distintas: a constituição total e a constituição da União. A constituição total compreende a verdadeira constituição federal e regula, portanto, os poderes do Estado federal. A constituição da União dispõe somente sobre as competências da coletividade central, delegadas pela constituição total. Ela se encontra em plano idêntico ao das constituições dos Estados-membros, que regem as competências outorgadas pela Constuição total às coletividades parciais – e o Estado federal – a comunidade total.
No Estado Federal convivem, então, entidades parciais (a exemplo da União, Estados, Distrito Federal e Municípios) que atuam inseridos no todo, que é o Estado Federal. Neste sentido, na estrutura de Estado Federal brasileiro, percebe-se que a autonomia é atributo específico dos Estados-membros e Municípios, enquanto que a soberania é característica e fundamento do poder central, no caso, o próprio Estado Federal. Para melhor esclarecimento do assunto, veremos cada atributo a seguir.
2.1. A SOBERANIA E A AUTONOMIA
Introduz Jefferson Brandão Rios[8] :
O termo “soberania” vem de supra, superãnus, aquele que tem poder, grau, ou autoridade suprema, acima do qual não há nenhum outro poder, é preeminente, indiscutível, absoluto. Nesse sentido, o Estado é senhor de si e de outros, surgido de forma originária, através da Lei Máxima como ato fundamental de um novo ordenamento. Ele não depende da vontade de quem quer que seja, autoridade ou poder; somente ele decide sobre a eficácia de seu Direito, autorrestringindo-se e demarcando, sponte propria, os limites de sua esfera de atuação. Ademais, somente ele interage com outros Estados, reconhecendo-os em pé de igualdade ou antagonismo e traçando o tipo de relação que com eles travará.
Podemos perceber que a ideia de soberania está intimamente ligada a de responsabilidade internacional. No meio externo, aparece quem detém a soberania. Esta dá o poder para o Estado de se relacionar, contratar, com outros Estados no meio internacional. Nesse sentido, a soberania é a independência frente à vontade de outros Estados. É a garantia de que nenhum outro Estado irá interferir em seu direito interno.
Albuquerque[9] entende que a soberania diz respeito à forma como o Estado se apresenta na ordem internacional como entidade suprema, sem limitar-se por nenhum ordenamento jurídico que lhe seja superior, apenas se submetendo por vontade própria a regras formuladas por meios inerentes ao Direito Internacional. Então, a soberania é o poder máximo de que está dotado o Estado para fazer valer suas decisões e autoridade dentro do seu território. Entretanto, esse poder não é absoluto.
Azambuja[10] entende que a soberania designa, não o poder, mas uma qualidade do poder do Estado. A soberania é o grau supremo no sentido de não reconhecer outro poder juridicamente superior a ele, nem igual a ele dentro do mesmo Estado. Quando se diz que o Estado é soberano, deve-se entender que na esfera da sua autoridade, na competência que é chamado a exercer para realizar a sua finalidade, que é o bem público, ele representa um poder que não depende de nenhum outro poder, nem é igualado por qualquer outro dentro do seu território. Esta soberania pode ser considerada sob dois aspectos: interno e externo. A soberania interna quer dizer que o poder do Estado, nas leis e ordens que edita para os indivíduos que habitam em seu território não pode ser limitado por nenhum outro poder. Sob o aspecto externo temos que a soberania existe nas relações recíprocas entre os Estados, ou seja, não há subordinação nem dependência, e sim igualdade.
O descumprimento de obrigações internacionais podem acarretar sanções por parte de outros Estados. No entanto, a existência de tais sanções decorrentes de uma sociedade internacional não é incompatível com a ideia de soberania. É que tais sanções são somente resultados do princípio de que os compromissos internacionais do Estado derivam do consentimento deste[11].
O Estado então assume voluntariamente obrigações internacionais, que devem ser cumpridas. A submissão a regras internacionais se faz através da vontade soberana. Vontade esta, que como visto, só pode ser manifestada, a ponto de gerar efeitos, pelo ente detentor da soberania.
Quanto ao sujeito detentor deste poder, temos que historicamente este era vinculado a pessoa do soberano, por meio do Estado Absoluto. Com o advento do Estado Constitucional Moderno, quem detém a soberania é a Nação.
Vale salientar que no plano internacional, a soberania é compartilhada por todas as nações, não podendo existir uma com maiores competências jurídicas que outras. Elas devem ser iguais. Essa igualdade não significa que na comunidade internacional não exista Estados dotados de grande força política, militar ou econômica enquanto outros são mais inexpressivos, mas sim de uma garantia de não intervenção no ordenamento jurídico interno por parte das nações alienígenas. Nesta mesma linha, a ordem internacional não diferencia o regime de tratamento do Estado Federal e do Estado Unitário, dado que ambos possuem soberania, independente de terem formação complexa ou de outorgarem autonomia interna a determinados entes.
No Brasil, a soberania é conferida ao Estado Federal Brasileiro. Este é representado por autoridades e órgãos da União. Sendo assim, é comum afirmar que a União detém competência para representar o Estado Brasileiro frente a outros Estados. Logo, somente a União detém soberania.
É que a federação brasileira incumbe a União o exercício das atribuições soberanas, uma vez que reza a Constituição da República em seu artigo 21, inciso I “compete a União, manter relações com Estados estrangeiros (...)”. Sendo assim, a União poder agir em nome próprio, sendo vista como pessoa jurídica de direito público interno, ou em nome da República Federativa do Brasil, quando será considerada pessoa jurídica de direito público externo.
Moraes[12] afirma que a União é entidade federativa autônoma em relação aos Estados-membros e municípios, constituindo pessoa jurídica de direito público interno. Não se confunde, portanto, com o Estado Federal, este sim pessoa jurídica de direito internacional. No entanto, a União poderá agir em nome próprio ou em nome de toda a federação, quando, neste último caso, relaciona-se internacionalmente com os demais países.
O Direito Internacional Público confere somente a personalidade de direito internacional ao Estado brasileiro. Neste sentido, somente a União é conferida esta personalidade, visto que é ela quem representa a República Federativa do Brasil nas relações internacionais, carecendo de tal condição as entidades federativas (Estados, Distrito Federal e Municípios).
Os Estados-membros, Distrito Federal, Municípios, e a própria União, quanto pessoa jurídica de direito público interno, como visto, em regra, não gozam de soberania. Gozam, portanto, de autonomia.
Há na autonomia dois aspectos marcantes. O primeiro deles resulta da delegação de competência de um órgão detentor de determinadas atribuições, para outro que executa atividades inerentes a um órgão central, trata-se, portanto, da autonomia administrativa. O segundo aspecto diz respeito a capacidade dos entes políticos se auto-organizar – autonomia política, portanto.
A autonomia decorre da descentralização do poder. Descentralização esta que deve ser vista não sob o âmbito administrativo, como também político. Neste sentido, os Estados-membros podem executar e elaborar leis próprias. Disto resulta uma dúplice esfera de poder normativo sobre um mesmo território. É necessário destacar também o poder de autoconstituição dos Estados-membros, ou seja, o poder que a Constituição Federal confere a estes de confeccionar Constituição própria. Tal poder, visto que conferido pela própria Constituição Federal, não se resume a uma mera concessão da União[13].
Neste sentido, sintetiza SILVA[14]:
A autonomia federativa assenta-se em dois elementos básicos: (a) na existência de órgãos governamentais próprios, isto é, que não dependam dos órgãos federais quanto à forma de seleção e investidura; (b) na posse de competências exclusivas, um mínimo, ao menos, que não seja ridiculamente reduzido. Esses pressupostos da autonomia federativa estão configurados na Constituição (arts. 18 a 42).
Temos então que os entes que compõe a Federação são reciprocamente autônomos. Sendo assim, estes se subordinam a Constituição Federal e atuam dentro das competências estabelecidas por este diploma, é a Lei Maior então que valida, os atos jurídicos praticados por esses entes.
Carrazza et al.[15] afirma que em decorrência do princípio federativo, no Brasil convivem harmonicamente a ordem jurídica global, representada pelo Estado brasileiro e as ordens jurídicas parciais que são: a União (ordem central) e os Estados-membros (ordens periféricas). Essas múltiplas ordens só são possíveis graças a limitação de competências firmadas na Constituição Federal, que em hipótese alguma atritam ou se superpõem.
As limitações atribuídas pela Constituição Federal aos Estados-membros são conferidas através de princípios nesta estabelecidos. Em primeiro lugar temos os princípios ditos sensíveis, uma vez que, se violados, podem acarretar intervenção federal, tais princípios são os que garantem a forma republicana, direitos da pessoa humana entre outros elencados no artigo 34 da Constituição Federal. Além destes, há regras e princípios de reprodução obrigatória nas Constituições Estaduais[16].
Podemos então afirmar que as principais diferenças entre a soberania e a autonomia, elementos que como vimos, são obrigatórios em um Estado Federal, são: a) a soberania é característica intrínseca ao poder central enquanto que a autonomia decorre do processo de descentralização política, atribuída, portanto aos entes federados; b) a soberania atua precipuamente sobre a ordem internacional e a autonomia se refere a ordem interna; c) o Estado Federal goza de soberania, por outro lado, os entes federados gozam de autonomia.
2.2. UNIÃO FEDERAL E ESTADO BRASILEIRO
A República Federativa do Brasil é um Estado complexo[17], ou seja, possui entes políticos bem definidos e dotados de autonomia, tais como a União, Estados e Distrito Federal e Municípios, e ao mesmo tempo protege uma unidade. O presente capítulo tem como objetivo frisar a diferença entre a União vista como ente dotado de autonomia e o Estado brasileiro quanto unidade que representa a nação no exterior.
Nos termos do artigo 40 do Código Civil as pessoas jurídicas podem ser classificadas em pessoas de direito público interno ou externo ou de direito privado. As pessoas jurídicas de direito público interno, segundo o artigo 41 do mesmo diploma legal são: a União, os Estados, o Distrito Federal e os Territórios, os Municípios, as autarquias e associações públicas e as demais que a lei venha a criar. Para efeito do presente trabalho focaremos nas pessoas políticas, quais sejam União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Já as pessoas jurídicas de Direito Público externo são, segundo o artigo 42 do Código Civil, “os Estados estrangeiros e todas as que forem regidas pelo direito internacional público”.
A União como visto, possui duas facetas: ora age como pessoa jurídica de direito público interno, ora representa o Estado Federal brasileiro. Sendo assim, dependendo da ocasião, aplicam-se a este ente as regras referentes às pessoas jurídicas de direito público externo ou as regras pertencentes ao Estado soberano. Assim, a União age tanto na qualidade de ente da federação brasileira, quanto na qualidade de organização política dos poderes nacionais considerado em seu conjunto, representando, o Estado brasileiro.
Temer[18] elucida que ora a União age em nome próprio ora em nome da Federação. Esta se manifesta por si, como pessoa jurídica de capacidade política e em nome do Estado Federal. No plano internacional, representa a Federação quando mantém relações com Estados estrangeiros e revela deste modo, a soberania nacional, exercendo-a. No entanto, a União não titulariza, dado que a soberania é nota tipificadora do Estado.
Azambuja[19] ensina que a as pessoas políticas, assim como a União quando revestida do caráter de pessoa jurídica de direito público interno, possui um território, um governo próprio, mas não é Estado. O poder próprio do Estado apresenta um caráter de evidente supremacia sobre os indivíduos e as sociedades de indivíduos que formam sua população, e, além disso, é independente dos demais Estados.
Assim, embora o território e a população da União sejam o mesmo da República Federativa, a União possui a característica de ser uma pessoa jurídica de direito interno, neste caso, está no mesmo patamar dos demais entes políticos. No entanto, pode por ocasião de acordos e tratados internacionais, representar a República Federativa no exterior, neste caso a União será revestida pela qualidade de pessoa jurídica de direito internacional.
A diferença se faz necessária no sentido de que o Estado Federal não possui órgãos e autoridades próprias, sendo assim, se utiliza da estrutura da União. Logo, quando firmados tratados internacionais através de autoridades pertencentes a União, em realidade, estas estarão cobertas pelo interesse nacional, e portanto, representando a República Brasileira.
Sendo assim, é possível antecipar que caso a União celebre tratado internacional que implique na concessão de isenção referente a tributos estaduais e municipais, não estará, em tese, afrontando as competências tributárias contidas na Constituição, uma vez que a União estará revestida pelo interesse nacional.
2.3. O SISTEMA DE COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS
No exercício da soberania o Estado exige dos seus cidadãos os recursos que necessita para a sua manutenção. Sendo assim, nasce o poder de tributar, que nada mais é do que uma faceta da soberania. O poder de tributar é imprescindível em um Estado Democrático de Direito, pois é através deste que se conseguem recursos suficientes para que o Estado não tenha que intervir na esfera privada, garantindo a liberdade de iniciativa, bem como é indispensável para satisfazer os direitos que demandam uma atuação positiva do Estado. Da mesma forma, este poder garante a isonomia, uma vez que é objetivo do Estado redistribuir as riquezas, garantindo um mínimo existencial à população.
Afirma Coêlho[20] que o exercício da tributação é fundamental ao interesse do Estado, tanto para auferir as receitas necessárias à realização de seus fins quanto para utilizar o tributo como instrumento extrafiscal. Assim, se por um lado o poder de tributar apresenta-se vital para o Estado, por outro a sua disciplina é essencial à sociedade civil. Nos Estados politicamente organizados em repúblicas federativas, a Constituição não somente institui o poder de tributar como também deve reparti-lo entre as pessoas políticas que convivem na federação.
É necessário, no entanto, distinguir o poder de tributar conferido pela soberania, com a chamada competência tributária. Neste sentido, sintetiza bem o professor Machado[21] que a expressão “poder” possui um significado que transcende a ideia de Direito, enquanto que esta está presente na palavra “competência”. O poder existe, com ou sem lei, já a competência só existe onde houver Direito. Sendo assim, tem competência quem recebe esta pelo Direito, está, portanto, no mundo das normas.
Organizado através do Direito, o poder de tributar fica então condicionado aos ditames legais. A Constituição Federal determina rígida repartição de competências entre os entes federativos, quais sejam a União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios – importante notar que os territórios federais não gozam de competência tributária, visto que não são dotados de Poder Legislativo. Portanto, é pelo exame da Carta Federal que se chega à conclusão de quais exações podem ser criadas pelas pessoas políticas.
Ao poder juridicamente delimitado de cada ente é denominada a palavra competência tributária. É necessário frisar que esta decorre do princípio federativo e do exercício da autonomia constitucional.
Merece referência também, com o objetivo de não se confundir com a competência, a chamada capacidade tributária. Neste sentido, Machado[22] explica que a competência é atribuída pela Constituição a um ente dotado de poder legislativo, já a capacidade tributária é feita por meio da Lei Fundamental ou de lei infraconstitucional a um ente não dotado de poder legislativo.
A competência tributária, em regra, engloba a capacidade tributária. O mesmo ente que legisla é aquele que arrecada e fiscaliza. No entanto, a arrecadação e fiscalização podem ser delegadas a outros entes, como por exemplo, a administração indireta. A competência, por sua vez, é indelegável.
A Constituição, por meio dos arts. 153 a 156 entregam à União, aos Estados, Distrito Federal e Municípios suas competências tributárias. Como visto, o grande objetivo de tal delimitação é a descentralização do poder político, logo, sendo a competência intrasferível, nenhum dos entes políticos podem delegar a outro sua competência tributária. Sendo assim, não podem os mesmos tomar para si a competência de instituir tributos que pertençam a outros. O Estado, por exemplo, não poderá instituir o ISS, visto que tal tributo é conferido aos Municípios[23]. Do mesmo modo, os Municípios não podem instituir o ICMS, dado que quem possui a competência para tanto são os Estados[24]. Neste sentido, leciona Carvalho[25]:
Por certo, se admitimos a tese de que nossa Constituição é rígida e que o constituinte repartiu, incisivamente, as possibilidades legiferantes entre as entidades dotadas de personalidade política, cuidando para que não houvesse conflitos entre as sub-ordens jurídicas estabelecidas no Estado Federal, a ilação imediata é em termos de reconhecer a vedação da delegabilidade, bem como a impossibilidade de renúncia. Que sentido haveria numa discriminação rigorosa de competências, quando se permitisse que uma pessoa delegasse a outra as habilitações recebidas? Em pouco tempo, no manejo das utilizações concretas, quando se manifestasse o direito no dinamismo do seu estilo peculiar, o desenho das atribuições competências passaria por diferentes e imprevisíveis configurações, dissipando a rigidez e a estabilidade pretendidas pelo legislador constituinte. Advém daí o entendimento perante o qual a indelegabilidade e a irrenunciabilidade seriam prerrogativas inafastáveis do exercício competencial, no sistema brasileiro.
A competência tributária é então o poder conferido pela Constituição Federal para editar leis que instituam tributos. Não deve ser confundido, portanto, com a competência para legislar sobre matéria tributária. Trata-se de uma competência para editar leis que tratem de matérias genéricas. Neste sentido, o art. 146, III da Constituição confere à lei complementar o poder de estabelecer normas gerais em matéria tributária. Sendo assim, tais normas devem ser respeitadas por todos os entes da federação. Ou seja, há mais um limite à competência tributária dos entes federados: devem eles atuar dentro dos limites conferidos por meio de lei complementar. A União é quem possui competência em matéria tributária, restando aos demais entes a competência suplementar.
A competência para legislar sobre direito tributário funciona da seguinte maneira: à União possui a competência para estabelecer normas gerais em direito tributário; aos Estados e Municípios compete suplementar as normas gerais editadas pela União, através da criação de leis próprias. Vale frisar que caso a União não exerça sua competência de criar normas gerais, os Estados, Distrito Federal e Municípios exercerão a competência legislativa plena, ou seja, editarão normas gerais e específicas que visem atender suas peculiariedades. Ou seja, o que existem no Brasil são três ordens jurídicas parciais que se subordinam pela ordem jurídica constitucional formando a ordem jurídica nacional. Desta forma, a lei complementar possui caráter nacional (advém da ordem jurídica nacional) subordinando as ordens jurídicas parciais. Todavia, caso a ordem jurídica nacional não exerça seu papel, as ordens jurídicas parciais o assumem.
Outra característica da competência tributária é a sua facultatividade, sendo assim, a Constituição não impõe aos entes a criação dos impostos nela previstos. Aos entes é dado o poder de instituir tributos, este poder pode ser utilizado ou não.
É relevante notar que a Lei de Responsabilidade Fiscal trouxe algumas inovações no que tange a instituição de tributos previstos na Lei Maior. O art. 11 da referida Lei afirma que são requisitos essenciais da responsabilidade na gestão fiscal a instituição, previsão e efetiva arrecadação de todos os tributos da competência constitucional do ente da Federação. No parágrafo primeiro do artigo supramencionado, temos que a não observância desta regra acarreta a proibição da realização de transferências voluntárias para os entes federados que deixem de instituir tributos de sua competência. Logo, a competência, apesar de ser uma faculdade, se não utilizada, poderá sofrer restrições administrativas.
Quanto à regra adotada no Brasil no que tange a competência tem sido utilizada a da predominância do interesse, concedendo às unidades federadas matérias relativas a interesses regionais ou locais (Estados-membros e Municípios respectivamente) e à União são destinadas as matérias de caráter geral. Dessarte, a Lei Fundamental prevê os poderes da União, deixando os poderes remanescentes aos entes federais.
2.3.1. O exercício da competência tributária por meio de normas nacionais, federais, estaduais e municipais
Foi visto que a Constituição Federal determina rígida a repartição de competências entre os entes federativos. A competência decorre, então, do princípio federativo e do exercício da autonomia legislativa das pessoas políticas, dentre as quais poderão editar leis federais, estaduais, municipais e distritais.
O poder que os entes federativos possuem para instituir impostos enumerados exaustivamente na Constituição Federal, através de normas federais, estaduais ou municipais está imbricado à noção de competência exclusiva. O exercício desta competência atribui à União, Estados, Distrito Federal e Municípios a criação de tributos em abstrato, por meio de leis próprias e encontra limite no âmbito do exercício da competência tributária.
A Carta Federal enumera os impostos federais (art. 153) de competência exclusiva da União, os impostos estaduais, de competência exclusiva dos Estados e Distrito Federal (art. 155) e os impostos municipais, de competência exclusiva dos Municípios e Distrito Federal (arts. 156 e 147, parte final). Neste sentido, tais impostos são instituídos ou majorados por meio de lei própria, conforme o processo legislativo previsto na Constituição. Sendo assim, a lei tributária referida irá compor o sistema de normas tributárias federais, ou estaduais, ou municipais, ou distritais.
Além do sistema de competência exclusiva que versa sobre a feitura de normas de caráter federal, estadual, municipal ou distrital, cabe ainda a União, como visto, a possibilidade de instituir limitações ao poder de tributar, por meio de normas gerais ou nacionais, introduzidas no ordenamento jurídico por meio de lei complementar.
Coêlho[26] elucida que a lei complementar deve ter vigência e validade em todo o território nacional para poder realizar em seus objetivos. Quanto ao órgão legislativo de sua emissão, só pode ser o Congresso Nacional. Este, ao lado das suas funções normais de órgão legislativo da União Federal (ordem jurídica parcial), outras exerce que não são do exclusivo interesse desta. É o caso, por exemplo, das emendas à Constituição, que são feitas pelo Congresso Nacional em prol da Nação. O mesmo se pode dizer da lei complementar, que é lei nacional de observância obrigatória pelas ordens parciais.
Neste sentido, a lei complementar obriga todos os entes da federação, ou seja, as leis de caráter nacional são de observância obrigatória por parte da própria União, bem como os Estados Distrito Federal e Municípios.
Os tratados internacionais podem possuir também o caráter de norma nacional. É que não há nenhum impedimento de serem incorporados no direito interno estatal, no nível de norma nacional, se observadas às regras decorrentes do tratado internacional incorporado no direito brasileiro, mesmo que o instrumento seja um decreto legislativo.
No campo das isenções tributárias poderá o tratado internacional, em tese, firmar concessão de isenção. É que a União, uma vez firmando acordo internacional e tendo este sido internalizado no direito brasileiro com a roupagem de norma nacional, poderá isentar tributos que não sejam de sua competência, dado que é previsto à lei complementar regular as limitações constitucionais ao poder de tributar.
3. O DIREITO INTERNACIONAL E O ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
O Direito Internacional Público que antes se limitava regular as relações entre Estados independentes e distribuir suas competências, vem abrindo espaço para um sistema que tende ao desenvolvimento dos povos e indivíduos por meio da cooperação entre os Estados. Diversas matérias[27], antes só reguladas pelo direito interno, assumem nível internacional, necessitando um regulamento exterior. Para tanto, se faz necessária a colaboração do direito interno de cada Estado.
Os direitos internacionais dependem em grande parte, da lealdade com que o ordenamento interno se ajuste e cumpra as normas internacionais. Neste sentido, as possibilidades de conflito entre os direitos internos e internacionais, hoje, é maior.
Vignali e Arrighi[28] explicam que o Direito Internacional evoluiu nos últimos anos, podendo citar como exemplo o aparecimento de novos sujeitos, de novas fontes e novos objetos. Sendo assim, a multiplicidade de acordos internacionais e participação dos Estados em numerosos organismos internacionais ficariam sem valia se apenas tivessem como sanção a responsabilidade internacional e não tivessem o efetivo cumprimento na ordem interna.
Diferentemente do direito interno, o direito internacional não possui um conjunto de instituições centralizadas. Não há um legislativo centralizado, um órgão judiciário com jurisdição compulsória e uma autoridade executiva. No Direito Internacional, os Estados são considerados entidades soberanas, logo, a relação é horizontal e não hierárquica. Do mesmo modo, a produção de normas é feita pelos Estados, que são os destinatários. Neste caso, o direito interno cumpre papel fundamental no que se refere à eficácia das normas de direito internacional.
A problemática, então, gira em torno da determinação da hierarquia entre o direito interno e o direito internacional. Há o surgimento dos seguintes questionamentos: as regras jurídicas internacionais se impõem automaticamente ou devem sofrer algum tipo de transformação? Existirá um dualismo entre direito internacional e interno ou ambos fazem parte do mesmo sistema? Qual o direito se apresenta com prioridade?
Observa Soares[29] que partindo da concepção do direito internacional como um direito coordenador e do direito interno como uma expressão de soberania interna do Estado, qualquer solução parece defensável. No entanto, com o abandono do conceito de soberania absoluta[30], foi rechaçada a ideia de irresponsabilidade do Estado, sendo indispensável a harmonização da legislação interna com as normas de direito internacional.
3.1. TEORIA DUALISTA E MONISTA
A discussão entre Direito Internacional e Direito Interno envolve, em um primeiro momento, a questão referente à existência ou não de conexão entre tais sistemas. O ponto se torna relevante na medida em que podem gerar muitos problemas de ordem prática, especialmente em caso de conflito de normas. Foi pensando em harmonizar as ordens jurídicas mencionadas que a doutrina se dividiu entre a escola do dualismo e a do monismo.
A teoria dualista surgiu com H. Triepel, que em sua obra Volkerrecht und Landesrechti concluiu que os sistemas jurídicos interno e internacional se comportam de maneira independente. Explica Soares[31] que enquanto o direito interno tem como fundamento a vontade do Estado e como destinatários os indivíduos e as pessoas morais, apresentando uma estrutura de subordinação, o direito internacional teria um caráter coordenador, destinado a regular apenas as relações interestaduais.
Esclarece Silva[32] que segundo Triepel, uma norma internacional somente se aplica no ordenamento jurídico interno dos Estados após se transformar em Direito interno. Destarte, os tribunais do Estado só aplicam a legislação interna que põe em vigor o tratado, e não o próprio tratado.
A doutrina de Triepel gerou inúmeras críticas, das quais podemos apontar: a) a não inserção de outros sujeitos de Direito Internacional, tais como as organizações internacionais e a pessoa humana, visto que a ideia apresentada somente leva em conta o Estado como sujeito de Direito Internacional; b) tal doutrina não consegue explicar a validade dos costumes internacionais; c) diferentemente do que preconiza Triepel, é possível a aplicação de normas internacionais (à exemplo das decisões de cortes e organizações sociais) independente de serem incorporadas ao sistema jurídico interno.
Lembra Moreira e Lech[33], que a doutrina de Triepel sofreu algumas modificações através de Dionisio Anzilotti. Tal doutrinador admitia que o Direito Internacional fosse aplicado pelo Direito Interno sem que para isso devesse sofrer transformações. Esta teoria é decorrente do voluntarismo, e foi justificada pela diversidade de fontes e de sujeitos que o Direito Internacional estava sofrendo bem como pela diferença na estrutura e condições de validade entre as duas ordens jurídicas.
A crítica que se faz a este segundo modelo é justamente o fato de não explicar a obrigatoriedade da aplicação do costume internacional sem que este necessite de incorporação ao direito interno em muitos casos.
Em oposição às teorias dualistas surge a teoria do monismo. Esta sustenta a não existência de ordens jurídicas diversas, mas de apenas uma. Neste caso, há primazia de um sistema sobre outro: ora o direito interno predomina sobre o internacional, ora o direito internacional predomina sobre o interno.
O monismo de direito interno entende que o Estado, dotado de soberania absoluta, não está sujeito a nenhum outro sistema jurídico que não lhe seja próprio. Sendo assim, o chamado direito internacional público nada mais é do que um “direito estatal externo”. O direito internacional, então, provém da própria vontade do Estado e só é eficaz porque é todo ele um direito interno.
Soares[34] afirma que esta corrente, na medida em que se funda num voluntarismo radical, acaba por negar todo o direito internacional público, ficando inteiramente cega ao fato de que o direito internacional geral faz parte da ordem jurídica de cada Estado, mesmo sem que a vontade deste se manifeste em tal sentido. É através deste entendimento que os tribunais de todos os Estados aplicam, por exemplo, a imunidade diplomática, mesmo sem terem ratificado o direito convencional sobre tal matéria.
Esta teoria também não se coaduna com a prática internacional, pois, caso estivesse, qualquer mudança na vontade de um Estado, como no caso de um golpe, ocasionaria a ruptura dos tratados internacionais anteriormente celebrados.
O monismo de direito internacional, sustentada por Kelsen, alega que a ordem jurídica é homogênea, sendo o direito internacional o centro de tudo. O direito internacional se põe em um plano superior. As normas internacionais que estende sua eficácia ao interior dos Estados, não podem ser contrariadas. Sendo assim, os monistas de direito internacional chegam a seguinte conclusão: o poder dos órgãos estaduais é delegado pela comunidade internacional.
Critica Soares[35] que a presente doutrina desmente a história, visto que o Estado é anterior à sociedade internacional. Ademais, costuma-se dizer que a lei interna que contraria lei internacional não é nula.
Moreira e Lech[36] concluem que o predomínio do dualismo ou do monismo repercute em soluções práticas exigidas pelo convívio internacional. O predomínio, então, se manifesta na aplicação, em seara interna, do direito internacional.
Há Estados que adotam em seu ordenamento uma cláusula geral de adoção pura e simples do direito costumeiro. Outros indicam a supremacia sobre o direito interno. Há também aqueles, como o Brasil, que silenciam sobre o tema.
A verdade é que as construções expostas têm como objetivo a explicação da realidade jurídica. No entanto, como lembra Soares[37], torna-se dificílima a tomada de posição, tendo em vista que a sociedade internacional está a cada dia se aperfeiçoando e em transformação contínua. A solução deve procurar-se a partir da distinção que terá em conta os princípios constitucionais do direito internacional, os princípios ou normas que constituem patrimônio comum da humanidade, e outros princípios ou normas de origem convencional.
As matérias são divididas tendo em vista aquelas que devem o direito internacional versar sobre, não podendo o direito interno dispor a respeito (a exemplo de normas sobre interpretação dos tratados); aquelas que são próprias do direito interno e aquelas de competência concorrente, que são a grande maioria.
A adoção de um posicionamento estatal a respeito de como devem ser tratadas as normas internacionais, como se vê, é imprescindível. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 não estatuiu de forma clara a respeito do assunto[38], deixando margem à interpretação dos tribunais e doutrina.
Em relação ao ordenamento jurídico brasileiro, Ribeiro[39] vê que no caso de conflito entre normas internacionais e a Constituição brasileira, duas questões devem ser lembradas: a recepção[40] e a incorporação das normas internacionais pelo ordenamento jurídico pátrio. Como visto, a atual Constituição em nada dispôs sobre a recepção e hierarquia das normas internacionais. Contudo, há regramento sobre a elaboração dos tratados internacionais que possibilitam deduzir a regra da incorporação.
Partindo do pressuposto que a Constituição brasileira está situada no vértice do nosso sistema jurídico, sendo considerada norma nacional suprema, firmou-se o entendimento de que as convenções e tratados devem se ajustar ao texto constitucional.
Na ADI nº 1.480 MC/DF[41], o Supremo se pronunciou no sentido de que é na Constituição da República que se busca a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais no sistema jurídico interno.
Diz ainda que no sistema jurídico brasileiro, os tratados ou convenções internacionais estão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. O exercício do chamado treaty-making power, está sujeito à necessária observância das limitações jurídicas impostas pelo texto constitucional. Sendo assim, no ordenamento jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre o regramento jurídico interno. O conflito entre tais sistemas devem ser resolvidos através do critério cronológico (lex posterior derogat priori) ou, quando cabível, do critério da especialidade.
Por fim, finaliza o entendimento do Supremo pelo primado da Constituição, que é oponível ao princípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso, o problema da concorrência entre os tratados internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja autoridade normativa deverá sempre prevalecer sobre os atos de direito internacional público.
Ribeiro[42] lembra que, possuindo a Constituição supremacia sobre o regramento internacional, o Estado ao celebrar um tratado internacional, deve antes verificar se há incompatibilidades entre o mesmo e a Constituição. Havendo conflito, não é conveniente que o Estado assine o tratado, prevenindo-o de futuras controvérsias.
O problema se refere à aprovação de um tratado que posteriormente venha a ser considerado inconstitucional pelo judiciário. Neste caso, temos que o mesmo não poderá ser aplicado na ordem interna brasileira, continuando a possuir validade na ordem internacional. O Estado (lembrando que o Brasil o faz através da União) deve, então, proceder à denúncia do tratado, manifestando a sua vontade de rompimento do compromisso internacional que assumira, sujeitando-se eventualmente às sanções existentes na comunidade internacional.
Rangel[43] reconhece as dificuldades que conduziriam o reconhecimento do primado completo do direito internacional sobre a Constituição Federal, uma vez que a afirmação desse primado pode conduzir ao desconhecimento da realidade social, política e humana que cada Estado encarna. Ressalta que os interesses do Estado devem harmonizar com os da sociedade internacional, sendo errônea a tese que pretende exaltar uma ordem ao preço da destruição de outra. Afirma que a aprovação de um tratado que seja conflitante com a constituição deve obedecer à tramitação da emenda constitucional e não de lei ordinária, já que admitir a primazia do tratado conflitante com o texto constitucional seria modificar a Lei Fundamental.
Como visto no Brasil a questão não é pacífica. Contudo, o entendimento que coloca a Constituição acima do ordenamento internacional prevalece, o que, em certas ocasiões, acarretam algumas dificuldades ao ordenamento internacional, principalmente no que se refere à vigência dos tratados.
A supremacia da Constituição Federal implica na harmonização entre os tratados e suas normas. De acordo com o Supremo, e grande parte da doutrina, os tratados somente possuirão validade no plano interno enquanto não conflitarem com os ditames estabelecidos na Constituição.
3.1.1. A hierarquia entre direito interno e internacional em matéria tributária
Como visto a Constituição brasileira não dispõe acerca da adoção da teoria monista ou dualista. No mesmo sentido, inexistem quaisquer normas específicas à hierarquia dos tratados internacionais que envolvam matéria tributária com relação às normas de direito interno.
A regra geral mencionada é que as normas de Direito Internacional para que sejam incorporadas no ordenamento jurídico brasileiro devem necessariamente estar em conformidade com a Constituição. No direito brasileiro, os tratados internacionais são hierarquicamente inferiores à Lei Fundamental de modo que o seu conteúdo deve ser compatível esta, podendo até sofrer declaração de inconstitucionalidade caso não a observe.
Partindo da regra geral, observa-se que as normas internacionais em matéria tributária também são subordinadas à Constituição Federal. A análise necessária é, então, a posição hierárquica que estas normas ocupam em relação à legislação infraconstitucional tributária.
Segundo o art. 146, inciso III da Constituição Federal, cabe à lei complementar dispor sobre normas gerais em matéria tributária. É sabido que no Brasil, quem faz às vezes de lei complementar neste caso é o Código Tributário Nacional, que foi recebido pela Constituição de 1988 com o status de lei complementar. Tal Código faz menção à hierarquia das disposições normativas tributárias internacionais em seu art. 98, que assim dispõe: “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e, serão observados pela que lhes sobrevenha”.
Torres[44] explica que o referido dispositivo possui duas funções claramente definidas: a de declarar a recepção das normas convencionais no sistema jurídico nacional e a de informar o princípio da prevalência das normas internacionais em matéria tributária, proibindo o legislador ordinário de criar leis incompatíveis com o disposto nessas normas.
Entende o autor supracitado que a superioridade hierárquica dos tratados internacionais tributários não advém do fato de serem normas internacionais, mas de possuírem um caráter de norma especial em relação às normas internas, atendendo, portanto, ao postulado lex specialis derrogat generalis.
Ressalta Amaro[45] que se, por exemplo, a lei interna tributa certa situação e o tratado não permite a tributação dessa mesma situação quando ela envolve um residente de outro Estado contratante, o conflito normativo, então, resolve pela aplicação do tratado, uma vez que a lei interna será norma geral enquanto o tratado versa sobre questão especial. Neste sentido, a norma especial convive com a norma geral, independente de uma ser posterior a outra. O que faz é aplicar os preceitos do tratado em harmonia (e não em confronto) com a legislação interna. Dessa maneira, não se põe a questão de o tratado “revogar” ou não a lei interna.
Observa Carvalho[46] que os tratados e convenções internacionais não possuem idoneidade jurídica para revogar ou modificar a legislação interna, uma vez que quem faz isto são os decretos legislativos que o ratificam.
Machado[47] entende que um tratado internacional não revoga nem modifica a legislação interna. É que denunciado um tratado a lei interna com ele incompatível estará restabelecida, em pleno vigor. Então, o que a regra do art. 98 pretende dizer é que os tratados e convenções internacionais prevalecem sobre a legislação interna, seja anterior ou posterior. Sendo assim, os tratados internacionais não podem ser revogados pela legislação interna em matéria tributária.
A importância deste entendimento se revela pelo fato que os tratados em matéria tributária observam obrigações e benefícios recíprocos, criam normas que produzem efeitos sobre os seus interesses. Desse modo, caso fosse admissível a revogação de uma norma internacional por uma interna, através de ato unilateral e sem a observação do procedimento de revogação previsto no tratado, estaria sendo afetado o compromisso internacional estabelecido.
Há aqueles doutrinadores que veem no art. 98 do CTN a inconstitucionalidade. O cerne da controvérsia reside no fato de que em sendo aplicado o artigo em questão, os Estados-membros e os Municípios não poderão legislar contrariamente as disposições contidas em tratados que impuserem isenções de tributos de suas competências. Sendo assim, eventuais leis estaduais ou municipais que não observem tratados internacionais tributários, afrontaria de forma direta o texto do Código Tributário Nacional, que é lei geral de aplicação obrigatória. Sendo assim, entende esta corrente doutrinária que a aplicação do art. 98 do CTN afetaria o pacto federativo.
Outro ponto que merece destaque em relação a esta corrente doutrinária é o entendimento de que o art. 98 do CTN não é norma geral de direito tributário. É que tal artigo não obedece aos limites que a Constituição consagrou para a lei complementar. Destarte, o artigo mencionado vulnera outros dispositivos constitucionais, tais como a repartição de competência entre os entes federados. Ademais, o CTN extravasa sua competência criando prevalência entre tratado e lei que somente o legislador constituinte poderia estabelecer.
Amaro[48] em concordância com o entendimento de que o art. 98 não é norma geral de direito tributário afirma que a eficácia dos tratados e a sua inserção no ordenamento jurídico pátrio é questão de natureza constitucional. Portanto, não é com preceito infraconstitucional que se haverá de resolver se tratado pode ou não modificar a lei nacional. Não cabe ao Código Tributário Nacional negar ou afirmar o primado dos tratados. Em conclusão, entende o autor pela inutilidade do art. 98, visto que por um lado faleceria de aptidão para impor o primado dos tratados, e de outro, seria negada a valia para explicitar a necessidade de harmonizar-se a lei interna (como norma geral) com a disciplina do tratado (como norma especial).
Em relação à jurisprudência, encontra-se em tramitação o Recurso Extraordinário de 460320/PR[49] que dentre outros assuntos, trata sobre a hierarquia da legislação internacional frente a interna em matéria tributária. É necessário fazer a observação que tal processo somente recebeu até o momento da conclusão do trabalho o voto do Ministro Gilmar Mendes, relator do caso. Todavia, é de grande importância tal decisão para a matéria, uma vez que foi a primeira vez que o art. 98 esteve em confronto com a Carta Federal no âmbito do Supremo.
O Ministro Gilmar Mendes entende que no âmbito tributário, a cooperação internacional deve viabilizar a expansão das operações transnacionais que impulsionam o desenvolvimento econômico, o combate à dupla tributação internacional e à evasão fiscal internacional e contribuir para o estreitamento das relações culturais, sociais e políticas entre as nações.
Frisa o relator que os tratados internacionais em matéria tributária demandam extenso e cuidadoso processo de negociação, com a participação de diplomatas e funcionários das respectivas administrações tributárias, de modo a conciliar interesses e a permitir que esse instrumento atinja os objetivos de cada nação, com o menor custo possível para a receita de cada qual.
Aponta que a cooperação internacional deve ser garantida essencialmente pelo pacta sunt servanda. Assim, o Estado Constitucional Cooperativo pode reivindicar a manutenção da boa-fé e da segurança dos compromissos internacionais, ainda que diante de legislação infraconstitucional, notadamente no que se refere ao direito tributário, que envolve garantias fundamentais dos contribuintes e cujo descumprimento colocaria em risco benefícios de cooperação cuidadosamente articulada no cenário internacional.
Diz que a tese da legalidade ordinária, na medida em que permite às entidades federativas internas do Estado brasileiro o descumprimento unilateral de acordo internacional, conflita com os princípios internacionais fixados pela Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados. Sendo assim, a possibilidade de afastamento da incidência de normas internacionais tributárias por meio de legislação ordinária, inclusive em sede estadual e municipal, estaria defasada com relação às exigências de cooperação, boa-fé e estabilidade do atual panorama internacional.
Por fim, ressaltou inexistir justificativa para a restrição da cooperação internacional pelo Brasil por motivos de regramentos típicos de âmbito interno e concluiu pela compatibilidade do art. 98 do Código Tributário Nacional com a nova ordem constitucional vigente.
4. DO TRATADO INTERNACIONAL
Silva e Accioly[50] elucidam que a palavra “tratado” se refere a um acordo regido pelo direito internacional, qualquer que seja a sua denominação. Dizem que “tratado” é expressão genérica. Sendo assim, são inúmeras as denominações utilizadas segundo a sua forma, seu conteúdo, o seu objeto ou o seu fim, neste sentido temos então: as convenções, os protocolos, os convênios, as declarações etc.
Husek[51] esclarece que a variedade de nomes não guarda relação com o teor substancial do tratado, dado que este pode se referir a uma gama imensa de assuntos. Algumas tentativas têm sido feitas no sentido de vincular os termos ao tipo de tratado, sem êxito. No entanto, a prática leva a fixar nomes mais aplicáveis num ou noutro caso, à exemplo: o compromisso arbitral que é o tratado em que os Estados submetem à arbitragem certo litígio em que são partes ou então a carta, normalmente reservado para tratados institucionais, como a Carta da ONU, ainda, a concordata em que uma das partes é a Santa Sé. Como se observa, não há qualquer lógica, apenas a prática e a adaptação do nome à noção de compromisso de teor científico.
Rezek[52] ensina que o tratado é um acordo formal. Ele se exprime com precisão em um dado momento histórico e seu conteúdo tem contornos bem definidos. Essa formalidade implica a escritura. Sendo assim, a oralidade é contrária à própria noção histórica de tratado, isso não importando, a negação de sua serventia para exprimir outros atos jurídicos, porventura também propícios a criação de obrigações.
Os tratados podem sofrer várias classificações, sendo uma das mais utilizadas a conforme o número de partes contratantes, ou seja, os tratados podem ser bilaterais quando celebrado entre duas partes, ou multilaterais, quando as partes são mais numerosas.
Sustentam Silva e Accioly[53] que a melhor classificação é a que tem em vista a natureza jurídica do ato. Neste sentido, os tratados podem ser: tratados-contratos, tratados-leis ou tratados-normativos. Os tratados-leis são aqueles celebrados entre vários Estados e tem como objetivo fixar normas de Direito Internacional Público. Os tratados-contratos têm como fulcro regular interesses recíprocos entre Estados e são geralmente de natureza bilateral. Estes podem ser executados ou executórios. Os primeiros devem ser logo executados e dispõem sobre a matéria permanentemente. Já os executórios são os que preveem atos executados regularmente, toda vez que apresentem as condições necessárias.
Dentre as condições de validade de um tratado, podemos citar: a capacidade das partes contratantes, que os agentes estejam habilitados, o consentimento mútuo e que o objeto do contrato seja lícito e possível.
Em relação às partes tem-se que devem ser necessariamente pessoas jurídicas de direito internacional, o que significa dizer que devem ser Estados soberanos ou organizações internacionais.
Com relação ao Estado soberano, já vimos que este é representado pelo chefe de Estado. Neste sentido, sustenta Rezek[54] que a autoridade do chefe de Estado no domínio da celebração de tratados internacionais não conhece limites: ela ostenta, em razão do cargo, idoneidade para negociar e firmar acordo, e ainda para exprimir o consentimento estatal definitivo. Não importa a questão constitucional doméstica, ou seja, a limitação constitucional de poder não prejudica a plenitude da representatividade exterior.
No caso brasileiro, vimos que a representação no exterior se faz através da União. Esta faz às vezes de Chefe de Estado e é responsável pela celebração de acordos internacionais. Sendo assim, no âmbito internacional não cabe a discussão a respeito da competência deste ente para a celebração de acordos ou não, nem mesmo a investigação a respeito dos limites da matéria que lhe foi conferida pela Constituição. Destarte, não cabe à comunidade internacional, por exemplo, impedir a celebração de tratados internacionais em matéria tributária que envolva tributos estaduais ou municipais com fulcro no art. 151, III da CF.
No que se refere ao consentimento mútuo, a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados de 1969 em seu artigo 11[55] dispõe sobre os meios da manifestação de um Estado a obrigar-se por um tratado. Neste sentido o acordo entre as partes não deve sofrer nenhum vício que possam contaminar o tratado, tais como: o erro, dolo, a corrupção de representante de estado, a coação exercida sobre representante de um estado e a coação exercida sobre um estado pela ameaça ou emprego da força.
Moser[56] afirma que para que um tratado seja válido é necessário também que seu objeto seja lícito e possível. Com efeito, a Convenção de Viena (art. 53[57] ) dispõe que é nulo o tratado que conflitar, por exemplo, com uma norma imperativa de direito internacional geral, o chamado jus cogens.
Segundo Gonzaga[58] para que um tratado ou convenção internacional faça parte do ordenamento jurídico de um país é necessário observar ainda dois aspectos: os mandamentos do Direito Internacional e, em seguida, aos requisitos de validade presentes no direito constitucional de cada país signatário.
No que tange aos tratados em matéria tributária, é necessário observar ainda a regra de que estes não devem criar tributos, mas apenas os autorizam dentro dos limites que estabelecerem. Logo, o tratado em matéria tributária terá sempre um efeito negativo, limitando por via convencional as competências tributárias dos Estados cujo fundamento está na lei interna. Neste ínterim, o tratado firmará, por exemplo, que os Estados signatários não poderão cobrar um dado tributo em tais hipóteses.
A Constituição brasileira disciplina nos artigos 49, inciso I[59] e 84, inciso VIII[60] sobre a celebração de tratados internacionais. Destes dois dispositivos resulta a conclusão que a incorporação de um tratado no Brasil é complexo e resulta da participação do Presidente da República, que age como representante máximo da Nação e do Congresso Nacional que possui o dever de verificar a legalidade do Tratado Internacional.
4.1. DO PROCESSO DE INCORPORAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
Como já mencionado, a celebração de um tratado internacional constitui ato complexo. Sendo assim, é dividido em fases, quais sejam: a fase de negociações, a celebração, o referendo, a ratificação e a eficácia. Trataremos estas separadamente a seguir.
A fase inicial para a celebração de um acordo internacional são as negociações. É nesta fase que são ponderadas a oportunidade e conveniência da celebração do tratado, bem como esboça um modelo inicial de como ficará o tratado no futuro.
As negociações são realizadas por meio de uma ou mais pessoas com aptidão para tanto, que são designados pelo Estado, geralmente são pessoas que pertencem ao corpo diplomático, com o auxílio de especialistas do setor público e privado. É que as negociações são feitas as vezes sobre temas que possuem um alto grau técnico e especializado, logo se faz necessário não só a presença de Estados soberanos como também devem levar em conta os interesses de diversos atores sociais, como as ONGs, o empresariado e o mundo acadêmico.
Destaca Portela[61] que no Brasil, a competência para a negociação repousa do ponto de vista orgânico, na União, à qual cabe, segundo o art. 21, I “manter relações com os Estados estrangeiros e participar de organizações internacionais”. Em termos de autoridades competentes, ao Presidente da República, a quem cabe, em caráter privativo “manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos” e “celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional” (art. 84, VII e VIII da CRFB).
A celebração é a expressão da vontade dos acordantes e ocorre por meio da assinatura do documento que já contém as cláusulas pactuadas. Frise-se que a regra é que a exigibilidade dos tratados dependam de atos posteriores. A assinatura, deste modo, não gera efeitos jurídicos, mas tem como fulcro o encerramento das negociações, a expressão da concordância dos acordantes com o teor do acordo e o encaminhamento para a ratificação. Neste sentido, a assinatura pode ser vista como uma anuência preliminar que não vincula as partes a observar os termos do acordo. Contudo, enquanto o tratado não entra em vigor, não podem os signatários atuar de modo contrário a seu objeto. Outro efeito da assinatura é o impedimento que o tratado seja alterado unilateralmente. Assim, eventuais mudanças só podem ser feitas em reabrindo a fase de negociações. No Brasil, como visto, é o Presidente da República que possui a competência privativa para tal ato (art. 84, VIII da Lei Fundamental).
Segundo o art. 49, I da Constituição Federal, o Congresso Nacional é competente para aprovar o texto do tratado assinado pelo Presidente da República. Neste sentido, o Congresso Nacional irá analisar a compatibilidade do tratado com a Constituição da República, a sua validade em relação aos valores encontrados nesta e a eficácia para com a sociedade brasileira. Tal análise que pode resultar em futura aprovação é chamada de referendo. O referendo autoriza a ratificação do tratado pelo Presidente da República, uma vez que caso o Congresso Nacional não aceite o acordo previamente firmado não poderá ocorrer a ratificação. Contudo, caso isto ocorra, poderá o Presidente da República reapresentar o tratado na próxima sessão legislativa para nova apreciação.
Após a autorização do legislativo, o Presidente da República pode fazer a ratificação do tratado. Portela[62] entende que esta é o ato pelo qual o Estado, após reexaminar um tratado assinado, confirma seu interesse em concluí-lo e estabelece, no âmbito internacional, o seu consentimento em obrigar-se por suas normas. É, então, a aceitação definitiva do acordo. O autor explica que o fundamento deste instituto é o pressuposto básico do Estado Democrático de Direito de limitar as ações dos órgãos de poder. A ratificação permite resguardar um ente estatal contra mudanças na ordem internacional que possam tornar desinteressante um acordo para um Estado.
A ratificação é um ato discricionário, no entanto, uma vez firmado é irretratável e confere vigência ao tratado. Ratificado o acordo o Estado está obrigado perante os outros Estados envolvidos e perante a Comunidade internacional, a cumprir os termos firmados. Caso o Estado em momento posterior desista do acordo, caberá somente a denúncia do tratado que pode sujeita-lo a sanções de direito internacional.
Há na ratificação outro ponto importante: é ela que dá o início da vigência e eficácia do tratado, que pode ocorrer também em uma data estipulada pelas partes contratantes. No âmbito brasileiro a vigência e eficácia ocorrem por meio de Decreto Presidencial. Neste caso, o tratado adquire executoriedade. O Decreto Presidencial é seguido por um decreto legislativo que tem como objetivo conferir publicidade, eficácia interna ao tratado e ainda constitui ato de promulgação oficial do tratado.
4.2. DA RESPONSABILIDADE INTERNACIONAL PELO NÃO CUMPRIMENTO DO TRATADO
É sabido que uma vez ratificado o tratado, este é de cumprimento obrigatório entre as partes. Portanto, lei interna não pode se sobrepor aos tratados firmados. Para que isto ocorra, é necessário que o Estado que não irá executar o acordo firmado, dê ciência a(s) outra(s) parte(s) envolvida(s) através da denúncia. No entanto, o Estado não está a salvo de possíveis sanções internacionais, caso acarrete prejuízo aos outros contratantes. É que há no direito internacional também uma responsabilidade pela não execução dos tratados.
Miranda[63] explica que sempre que um sujeito de Direito viola uma norma ou um dever a que está obrigado com relação a outro sujeito ou sempre que o outro sofra prejuízo, incorre em responsabilidade, ou seja, fica constituído um dever específico para com o lesado. Neste sentido, tem-se que assim como, na ordem interna o Estado e qualquer entidade pública se responsabiliza pelos prejuízos causados em decorrência de ação ou omissão de seus órgãos ou agentes, na ordem internacional o Estado e os demais sujeitos de Direito internacional também respondem pelos atos ilícitos que pratiquem.
A responsabilidade é característica de um sistema jurídico, no Direito internacional esta, então, consiste em uma obrigação de reparação como consequência do não cumprimento de uma norma internacional, fruto de um sistema internacional de regras de conduta. Portanto, os Estados que reivindicam o cumprimento de tratados, não podem se beneficiar de seu descumprimento.
No que tange aos sujeitos que podem ser responsabilizados em caso de ilícito relativo a ações ou omissões temos os Estados e também as organizações internacionais, como a ONU. Neste sentido, a responsabilidade podem ser entre Estados, entre estes e organizações internacionais e entidades afins ou até mesmo perante o indivíduo.
No caso de estados federais, mesmo que as unidades federadas possam de alguma forma celebrar tratados com Estados soberanos, a responsabilidade por eventual norma internacional recairá sobre o Estado Federal. Assim sendo, no Brasil, quem irá responder perante o Direito Internacional será sempre o Estado soberano, na figura da União.
Há a responsabilidade internacional também no caso do Poder Judiciário negar aplicação da norma de direito internacional em benefício da norma nacional. Neste caso, a aplicação de normas vigentes no ordenamento jurídico interno pode violar uma obrigação internacional por parte do Estado, gerando, portanto a sua responsabilidade. É importante observar que o fato de se defender a impossibilidade de isenção de tributos estaduais e municipais através de tratado internacional pode de alguma forma converter em prejuízo para o Estado, fazendo com que este se responsabiliza perante a comunidade internacional.
As sanções que o Estado pode estar sujeito em caso de não cumprimento de um dever perante a sociedade internacional são aplicadas pelos próprios interessados, como por exemplo, o rompimento de relações diplomáticas, a retorsão, as represálias, entre outras.
5. DA ISENÇÃO TRIBUTÁRIA
Pode-se dizer que a isenção possui grande papel social. É através dela que a autoridade legislativa enfrenta situações difíceis como, por exemplo, no caso de problemas econômicos e sociais que fazem com que a capacidade contributiva de certo segmento seja prejudicado. Além disso, a isenção pode ser utilizada como instrumento para grandes iniciativas de interesse público, incrementando a produção, o comércio e o consumo.
Amaro[64] explica que há incidência de tributo quando determinado fato, por enquadrar-se no modelo abstratamente previsto pela lei, se juridiciza e irradia o efeito de dar nascimento a uma obrigação de recolher tributo. A par disso, outros fatos há que podem ser matizados por normas de legislação tributária sem que haja incidência de tributos sobre eles. É o caso das normas de imunidade ou isenção, que juridicizam certos fatos, para o efeito não de dar a eles a aptidão de gerar tributos, mas ao contrário, nega-lhes expressamente esta.
A isenção tributária ocorre quando a pessoa jurídica de direito público titular da chamada competência tributária se autolimita de modo a não incidir o tributo sobre pessoas que preenchem determinadas características. Neste ínterim, a isenção faz com que o titular renuncie parcela de sua competência, autolimitando-se no exercício da mesma.
É importante destacar que a isenção não se confunde com a imunidade. Esta não faz parte do campo da competência, visto que a Constituição não reconhece a criação de tributos sobre determinadas situações, que se firmam no que se chama de não-incidência. Já a isenção encontra-se amparada na competência tributária dos entes legislativos, só que estes estabelecem em regra a tributação do universo e através da exceção afirmam quais situações ficarão de fora da incidência.
Ensina Amaro[65] que a diferença entre a imunidade e a isenção é apenas formal, dizendo respeito a técnica utilizada pelo legislador. Nesse contexto, a isenção possui notáveis virtudes simplificadoras e é por meio destas que podem ser excepcionadas situações que pela natureza dos fatos, ou dos bens, ou das pessoas, ou em função da região, ou o setor de atividades etc., o legislador não quer onerar o tributo. São várias as razões que podem fundamentar esse tratamento diferente, em atenção as características da situação, às condições da pessoa, a razões de política fiscal etc. Há de haver um critério válido de discrimem para justificar a isenção, a fim de harmonizá-la com o preceito constitucional da isonomia.
A teoria clássica que acredita que isenção é um favor legal consubstanciado na dispensa do pagamento do tributo devido. A autoridade legislativa desonera o sujeito passivo da obrigação de recolher o tributo por fatores éticos, sociais ou econômicos. Tem-se então que o fato jurídico ocorre normalmente, nascendo o vínculo obrigacional. Após a obrigação, por força de norma isentante, opera-se a dispensa do débito tributário. É esta a adotada pelo Código Tributário Nacional.
Entende Amaro[66] que a teoria clássica não é adequada no sentido de que o termo “dispensa” mais seria amoldado para o caso de se falar em remissão de um tributo mas nunca para isenção. É que aplicado à isenção, suporia que o fato isento fosse tributado, para que, em seguida o tributo fosse dispensado pela lei. Esse raciocínio é ilógico e ofende o princípio da não-contraditoriedade das normas jurídicas, um fato não pode ser, ao mesmo tempo tributado e não tributado.
Carvalho[67] entende que a regra de isenção investe contra um ou mais dos critérios da norma-padrão de incidência, mutilando-os parcialmente. Não pode haver supressão total do critério, uma vez que equivaleria a destruir a regra-matriz, inutilizando-a como norma válida no sistema. O que a isenção faz é subtrair parcela do campo de abrangência do critério do antecedente ou do consequente. Um exemplo é a regra de que estão isentos do imposto de renda e proventos de qualquer natureza os rendimentos do trabalho assalariado dos servidores diplomáticos de governo estrangeiros. Neste caso, a norma jurídica que isenta o IR vai de encontro com a regra-matriz de incidência daquele imposto, mas não exclui esta completamente, uma vez que subtrai apenas no domínio dos possíveis sujeitos passivos, o subdomínio dos servidores diplomáticos de governos estrangeiros.
Machado[68] afirma que a isenção sempre decorre de lei por força do art. 97, IV[69] do CTN. Desta forma, a lei que concede a isenção deve especificar as condições e requisitos exigidos para a sua concessão, os tributos a que se aplica e, sendo o caso, o prazo de sua duração (art. 176 do CTN). Referida lei atua geralmente num sistema normativo em que é possível distinguir a regra e a exceção. Sendo assim, temos o exemplo de uma norma versar sobre a tributação dos rendimentos do trabalho ao mesmo tempo em que excepciona (ou isenta) os rendimentos de aviso prévio.
Sendo obrigatória lei para a concessão de isenção, indaga-se: será possível a instituição de isenção através de tratados internacionais? É sabido que o tratado internacional é recepcionado pelo ordenamento jurídico interno através de decreto legislativo. O art. 98 do CTN versa que os tratados internacionais revogam ou modificam a legislação interna. Sendo assim, podemos pensar através de uma interpretação sistemática que os tratados, quando recepcionados pelo ordenamento jurídico interno, podem isentar tributos. Todavia, há parte da doutrina que não aceita o posicionamento exposto.
A isenção não deve se estender as taxas e contribuições de melhorias, muito menos aos tributos instituídos posteriormente, é o que diz o art. 177 do CTN: “salvo disposição de lei em contrário, a isenção não é extensiva: I – às taxas e às contribuições de melhoria; II – aos tributos instituídos posteriormente à sua concessão”.
Segundo o art. 176, parágrafo único, do Código Tributário a isenção pode ser restrita a determinada região da entidade tributante, em função das condições a ela peculiares, trata-se das chamadas isenções regionais. A princípio pode-se pensar que esta regra fere o princípio da uniformidade dos tributos federais, estampado no art. 151, I da Constituição Federal. Contudo, o mesmo diploma legal consagra como fundamento da República Federativa do Brasil reduzir as desigualdades regionais (art. 3º, III), sendo assim, é possível que se conceda isenção se o objetivo final for à redução das desigualdades entre regiões.
As isenções também podem se classificar em objetivas ou subjetivas. As primeiras referem-se a uma situação material, por exemplo, um produto “y” que por razões de política fiscal o Estado decida não tributar. Já as isenções subjetivas se referem à condição pessoal do indivíduo ligado a uma situação material (ex. uma pessoa idosa).
Podem ainda ser setoriais quando contemplam determinado setor de atividade econômica (ex. turismo) e condicionadas que dependem o cumprimento de certos requisitos. Geralmente este segundo tipo de isenção é concedido por um certo prazo, o que a qualifica como temporária.
Fala-se ainda nas isenções autonômica e a heterônoma. A primeira consiste na isenção de tributos promovidos pelo ente competente para criar in abstrato referido tributo. Decorre, então, da autonomia, assim, cada ente federativo com base nas suas competências tributárias pode isentar tributos de suas atribuições. A isenção heterônoma, por sua vez, é a possibilidade de um ente federativo instituir a isenção de tributos de outra entidade da Federação. Assim, se a União editar uma lei criando uma isenção de ISS teríamos uma isenção heterônoma.
A Constituição veda expressamente a chamada isenção heterônoma (art. 151, III), entretanto, não há dúvida de que a isenção referida abarca não somente a União como as demais pessoas políticas. É que apesar de não expressa, a própria competência tributária, inclui não só a capacidade de editar leis para instituir e disciplinar tributos, mas também para isentar ou dispensar o seu pagamento. Ademais, a competência conferida aos entes federados é uma das principais garantias de existência da Federação, pois assegura a autonomia econômico-financeira. Portanto, o princípio contido no art. 151, III que veda isenções heterônomas teria que ser respeitado mesmo que não fosse expresso, pois decorre diretamente do princípio federativo.
Contudo, é preciso frisar que se houver regra constitucional que permita a isenção heterônoma, esta será válida. Na Lei Fundamental temos dois dispositivos que preveem concessão de isenção heterônoma pela União. O primeiro deles é o art. 155, §2º, XII, “e” que autoriza a União através de lei complementar a excluir da incidência do ICMS (imposto de competência dos Estados e Distrito Federal) serviços e outros produtos exportados para o exterior. A segunda hipótese está prevista no art. 156, §3º, II da Constituição que autoriza a União, por meio de lei complementar, excluir da incidência do ISS as exportações e serviços para o exterior.
5.1. ISENÇÃO HETERÔNOMA VIA TRATADO INTERNACIONAL
Os tratados internacionais em matéria tributária podem ter por conteúdo normas isentivas de tributos estaduais, distritais ou municipais. Essas normas de isenção quando estabelecidas por tratado podem acarretar uma série de problemas, dentre eles o incurso no art. 151, III da Constituição Federal que versa: “é vedado à União instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios”. Tal dispositivo trata da proibição da chamada isenção tributária heterônoma.
Observa Amaro[70] que a questão da isenção de tributos estaduais ou municipais através da União sempre esteve mal disciplinada. Na Constituição brasileira de 1967 permitia que a União, sob certas condições, concedesse isenção de tributos estaduais e municipais[71]. A atual Constituição diz o contrário. Na essência modificou-se apenas a extensão do preceito constitucional. O que a Constituição anterior previa é a possibilidade de lei complementar dispor sobre isenções de tributos estaduais ou municipais em determinadas situações. A Constituição atual, em certa medida autoriza algo análogo[72]. Em resumo, em casos mais estritos a Constituição vigente continua autorizando a lei complementar a excluir certas situações da incidência de tributo estadual ou municipal.
Neste sentido, leciona Coêlho[73]:
Todavia, em substância, nada mudou quanto à existência de isenções heterônomas no Direito Constitucional brasileiro. Mas a matéria, embora verbalmente mal cuidada, estreitou as possibilidades da isenção heterônoma.
No Brasil, a doutrina se divide quanto à adoção das isenções heterônomas veiculadas através dos tratados internacionais. É que tem se procurado saber se esta vedação imposta a União se estende quando se trata de acordo firmado internacionalmente.
A corrente doutrinaria que entende ser impossível a União através de tratados firmados internacionalmente isentar tributos estaduais ou municipais argumenta que tal fato usurpa a competência dos entes federados, ofendendo, assim, o pacto federativo. Neste sentido, admite-se a interferência da União somente para tratar de tributos da competência estadual ou municipal quando previstos na Constituição e por intermédio de lei complementar.
Além disso, esta corrente defende que a competência de resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional conferida ao Congresso Nacional não presume a representação da vontade dos Estados, Distrito Federal e Municípios, uma vez que se assim fosse, poderia justificar a isenção heterônoma instituída por lei ordinária, já que no exercício desta competência o Congresso Nacional representa a vontade do povo brasileiro.
Outro argumento utilizado seria que o texto contido no art. 150, §6º da Carta Federal que versa que “qualquer subsídio ou isenção (...) relativos a impostos, taxas ou contribuições só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas (...)” impediria a isenção através de tratados internacionais.
O citado parágrafo não prevê a denominada lei nacional, impedindo que a isenção fosse de aplicação obrigatória por parte dos entes federados. O tratado firmado pela União, como foi explanado em capítulos anteriores, não é ato que se limite a esfera federal, visto que quem atua no plano internacional com soberania é o Estado Federal, produzindo assim, norma de esfera nacional.
Amaro[74] anota que alguns autores desta corrente vislumbram como solução para o equacionamento do tormentoso problema a convocação dos Estados-membros, Distrito Federal e Municípios para a aprovação e aplicação de tratados internacionais a tributos de seu interesse. Todavia, o autor explica que a solução seria inviável por razões de ordem prática e legal. Basta lembrar que o Brasil comporta mais de cinco mil e quinhentas entidades políticas integrando a Federação, tornando impossível a ratificação por todos. Ademais, os entes da Federação não tem autoridade para comparecer como entes soberanos perante nações estrangeiras.
Aos que defendem a possibilidade da isenção tributária através de tratados internacionais o fazem por diversas razões, dentre as quais a necessidade do país comercializar com outras nações. Neste contexto, o país é representado pela União no plano internacional e a Constituição teve a preocupação de reservar ao Legislativo Federal a disciplina de tributos estaduais e municipais que possam afetar nosso comércio com outras nações.
Para esta doutrina, a vedação contida no inciso III do art. 151 da Lei Fundamental se refere apenas a União na condição de pessoa jurídica de direito público interno, quando da sua atuação no âmbito interno. Por outro lado, na atuação perante a comunidade internacional a União assume a faceta de pessoa jurídica de direito público externo, com atuação no interesse nacional.
A União possui o poder implícito, quando atua externamente, de cuidar de tratados internacionais, de tributos não só federais, como também estaduais, distritais e municipais, podendo até mesmo isentar ou conceder outros benefícios fiscais, sem que se possa considerar que estaria adentrando em matéria de competência privativa dos Estados, do Distrito Federal e Município.
É que a União como visto no decorrer do trabalho possui duas facetas: a de pessoa jurídica de direito público interno e a de pessoa que representa a República Federativa no exterior. No primeiro caso, o exercício de sua competência pode ser contrastado com a da competência estadual e municipal, dado que são ordens jurídicas parciais. Neste sentido, é proibida a instituição de isenções de impostos estaduais e municipais pela União. Tal repartição de competências não deve ser transposta para o plano das relações interestatais. Nesse campo, a Constituição dá a União competência para vincular o Estado brasileiro em nome dela e também dos Estados-membros e Municípios.
O tratado internacional que reduz a aplicação de uma norma estadual, distrital ou municipal é, de acordo com esta doutrina, válido. O fundamento está na eficácia natural dos tratados, visto como instrumento que objetiva firmar normas de conduta entre o Estado brasileiro e outros Estados soberanos. Se a União é a única detentora de soberania no país, é a única com o poder de firmar tratados, sendo assim, revestida pelo interesse nacional. Logo, é possível este ente, dentre as suas atribuições para firmar tratados internacionais firmar acordos internacionais que isentem os tributos estaduais ou municipais.
5.2. POSICIONAMENTO DOS TRIBUNAIS SUPERIORES
O Supremo Tribunal Federal seguiu a corrente doutrinária que entende ser possível a concessão de isenção de impostos estaduais e municipais através de tratados internacionais. Entende esta Corte que a cláusula de vedação inscrita no art. 151, III da Constituição é inoponível ao Estado Federal brasileiro, incidindo, unicamente, no plano das relações institucionais domésticas que se formam entre as pessoas políticas de direito público interno. Neste sentido, o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário de nº 543.943/PR[75]:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO – GASODUTO BRASIL- -BOLÍVIA –ISENÇÃO DE TRIBUTO MUNICIPAL (ISS) CONCEDIDA PELA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL MEDIANTE ACORDO BILATERAL CELEBRADO COM A REPÚBLICA DA BOLÍVIA – A QUESTÃO DA ISENÇÃO DE TRIBUTOS ESTADUAIS E/OU MUNICIPAIS OUTORGADA PELO ESTADO FEDERAL BRASILEIRO EM SEDE DE CONVENÇÃO OU TRATADO INTERNACIONAL - POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL – DISTINÇÃO NECESSÁRIA QUE SE IMPÕE, PARA ESSE EFEITO, ENTRE O ESTADO FEDERAL BRASILEIRO (EXPRESSÃO INSTITUCIONAL DA COMUNIDADE JURÍDICA TOTAL), QUE DETÉM “O MONOPÓLIO DA PERSONALIDADE INTERNACIONAL”, E A UNIÃO, PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO INTERNO (QUE SE QUALIFICA, NESSA CONDIÇÃO, COMO SIMPLES COMUNIDADE PARCIAL DE CARÁTER CENTRAL) - NÃO INCIDÊNCIA, EM TAL HIPÓTESE, DA VEDAÇÃO ESTABELECIDA NO ART. 151, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, CUJA APLICABILIDADE RESTRINGE-SE, TÃO SOMENTE, À UNIÃO, NA CONDIÇÃO DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO INTERNO – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. - A cláusula de vedação inscrita no art. 151, inciso III, da Constituição - que proíbe a concessão de isenções tributáriasheterônomas - é inoponível ao Estado Federal brasileiro (vale dizer, à República Federativa do Brasil), incidindo, unicamente, no plano das relações institucionais domésticas que se estabelecem entre as pessoas políticas de direito público interno. Doutrina. Precedentes. - Nada impede, portanto, que o Estado Federal brasileiro celebre tratados internacionais que veiculem cláusulas de exoneração tributária em matéria de tributos locais (como o ISS, p. ex.), pois a República Federativa do Brasil, ao exercer o seu treaty-making power, estará praticando ato legítimo que se inclui na esfera de suas prerrogativas como pessoa jurídica de direito internacional público, que detém - em face das unidades meramente federadas - o monopólio da soberania e da personalidade internacional. - Considerações em torno da natureza político-jurídica do Estado Federal. Complexidade estrutural do modelo federativo. Coexistência, nele, de comunidades jurídicas parciais rigorosamente parificadas e coordenadas entre si, porém subordinadas, constitucionalmente, a uma ordem jurídica total. Doutrina.
O Ministro Celso de Mello, em seu voto, ressalta que há uma relação de coalescência entre uma ordem jurídica total (que emana do Estado Federal, enquanto comunidade jurídica total, e que se proclama, formalmente, nas leis nacionais) e uma pluralidade de ordens parciais, que derivam da União Federal, dos Estados-membros, do Distrito Federal e Municípios.
Nesse sentido, as comunidades jurídicas parciais são responsáveis por ordens normativas igualmente parciais, sendo algumas de natureza central, imputáveis à União, enquanto pessoa política de caráter central e outras de natureza regional (Estados e Distrito Federal) ou de caráter local (Municípios) enquanto comunidades periféricas revestidas de autonomia institucional.
Sendo assim, é o Estado Federal que possui o monopólio da personalidade internacional e não se confunde com a União, pessoa jurídica de direito público interno que se qualifica como ordem parcial.
A vedação contida no art. 151, III da Constituição, dessa forma, atinge somente a União Federal vista sob o enfoque de pessoa jurídica de direito público interno, responsável pela instauração de uma ordem normativa autônoma meramente parcial, inconfundível com o Estado Federal brasileiro que ostenta, este sim, a qualidade de sujeito de direito internacional público e constitui, no plano da organização política, a expressão de uma comunidade jurídica global, investida do poder de gerar uma ordem normativa de dimensão nacional e total, diferente daquela consubstanciada nas leis e atos de caráter simplesmente federal.
Nada impede, então, que o Estado Federal brasileiro, representado pela União, celebre tratados internacionais que veiculem cláusulas de exoneração tributária em matéria de tributos locais ou regionais, pois a República do Brasil está praticando ato legítimo no que tange a sua esfera de prerrogativas como pessoa jurídica de direito internacional público, que detém, em face das unidades meramente federadas, o monopólio da soberania e da personalidade internacional.
No mesmo sentido, temos o Recurso Extraordinário de nº 229.096/RS[76] que entendeu pela aplicação do Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), no que tange a tributos estaduais. Eis a ementa:
DIREITO TRIBUTÁRIO. RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988 DO ACORDO GERAL DE TARIFAS E COMÉRCIO. ISENÇÃO DE TRIBUTO ESTADUAL PREVISTA EM TRATADO INTERNACIONAL FIRMADO PELA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. ARTIGO 151, INCISO III, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. ARTIGO 98 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE ISENÇÃO HETERÔNOMA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. 1. A isenção de tributos estaduais prevista no Acordo Geral de Tarifas e Comércio para as mercadorias importadas dos países signatários quando o similar nacional tiver o mesmo benefício foi recepcionada pela Constituição da República de 1988. 2. O artigo 98 do Código Tributário Nacional "possui caráter nacional, com eficácia para a União, os Estados e os Municípios" (voto do eminente Ministro Ilmar Galvão). 3. No direito internacional apenas a República Federativa do Brasil tem competência para firmar tratados (art. 52, § 2º, da Constituição da República), dela não dispondo a União, os Estados-membros ou os Municípios. O Presidente da República não subscreve tratados como Chefe de Governo, mas como Chefe de Estado, o que descaracteriza a existência de uma isenção heterônoma, vedada pelo art. 151, inc. III, da Constituição. 4. Recurso extraordinário conhecido e provido.
O Ministro Ilmar Galvão, neste julgado, reforça a constitucionalidade do art. 98 do Código Tributário Nacional. Observa que o Código mencionado foi recepcionado pela Carta Federal com o status de lei complementar, reunindo as normas gerais em matéria de legislação tributária. Consequentemente, possui caráter nacional, com eficácia para a União, os Estados e os Municípios. E disserta:
Diante de conceitos tão nítidos e incontestáveis, resulta possível a afirmação de que o referido art. 98 do CTN, ao proclamar a supremacia dos acordos internacionais, em torno de matéria tributária, sobre a lei, indistintamente, outra coisa não fez senão explicitar a realidade jurídica, seja, o caráter geral e, pois, nacional dos tratados em matéria tributária, assinalando que não expressam eles ato normativo emanado da União, como mera ordem central, mas da União, como ordem total e, como tal, endereçado a todos os brasileiros.
A visualização do fenômeno jurídico dos tratados sob esse prisma conduz à conclusão, inafastável, de que o tratado que dispõe sobre a isenção tributária, como o de que tratam os autos – o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT) – não ofende a norma do art. 151, III, da Constituição, segundo a qual ‘é vedado à União: ... “III – instituir isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios.
Conclui-se que o posicionamento da nossa Corte Constitucional é no sentido de permitir a isenção heterônoma via tratados internacionais. Entende o Supremo que a União quando celebra acordos internacionais nada mais faz do que agir segundo o interesse nacional, como representante, portanto, da República Federativa do Brasil, sendo assim, é legítima a isenção de tributos estaduais e municipais feita por meio de tratados internacionais.
Em que pese o tema tratado envolver matéria eminentemente constitucional, o Superior Tribunal de Justiça também posicionou-se pela legalidade da isenção heterônoma decorrente de tratado internacional. Neste sentido, o REsp 3143/SP[77]:
TRIBUTARIO. ICM. IMPORTAÇÃO DE PRODUTO CUJO SIMILAR NACIONAL GOZA DE ISENÇÃO DO IMPOSTO. LEI N. 3991/83, DO ESTADO DE SÃO PAULO, QUE INSTITUIU O TRIBUTO COM BASE NA COMPETENCIA EXPLICITADA E AMPLIADA PELA EC N. 23/83, AO ADITAR O PAR-11 DO ART. 23 DA CF/67. DIPLOMA LEGAL QUE HA DE SER INTERPRETADO EM CONSONANCIA COM O PRINCIPIO DA EQUIVALENCIA DE TRATAMENTO FISCAL, CONSAGRADO NO TEXTO DO GATT (PARTE II, ART. III), POR FORÇA DO QUAL AS ISENÇÕES TRIBUTARIAS QUE CONTEMPLAM O SIMILAR NACIONAL DEVEM SER ESTENDIDAS AO PRODUTO IMPORTADO DE PAISES SIGNATARIOS DO TRABALHO EM APREÇO, SOB PENA DE OFENSA ART. 98 DO CTN. PRECEDENTES DO STF. RECURSO PROVIDO.
O Superior Tribunal de Justiça também firmou seu entendimento nas súmulas 20 (“a mercadoria importada de país signatário do GATT é isenta do ICM, quando contemplado com esse favor o similar nacional”) e 71 (“o bacalhau importado de país signatário do GATT é isento do ICM”).
Logo, tem-se que os Tribunais Superiores fazem uma leitura de acordo com o que defende a doutrina que entende ser possível a isenção heterônoma via tratado internacional.
6. CONCLUSÕES
Os tratados internacionais em matéria tributária ganham cada vez mais importância no contexto atual em que vivemos. O fluxo de riquezas encontra-se cada vez maior a nível internacional e saber como tributá-las é imprescindível para que não ocorram problemas como a pluritributação. Ademais, o ganho de competitividade frente à concorrência internacional em relação ao valor de bens e serviços faz com que se busque por um sistema tributário mais eficaz no plano internacional. Os tratados internacionais, então, normatizam certas situações que o direito interno não consegue regular sozinho.
No Brasil, como visto, quem detém a competência privativa para firmar tratados internacionais é a União, visto que é o único ente dotado de soberania. Neste sentido, tal ente representa a República Federativa do Brasil, a nação. Neste contexto, não há que se falar em interesses pessoais da União, mas de interesses da nação brasileira considerando todos os entes federativos.
Por ocasião da celebração de tratados internacionais em matéria tributária com o objetivo de se adequar ao sistema internacional pode ocorrer da União celebrar acordos que findem por isentar alguns tributos de competência municipal ou estadual. Neste caso, há quem diga que tal fato não é permitido pela Constituição vez que esbarra na regra contida no artigo 151, inciso III, que veda à União a instituição de isenções de tributos da competência dos Estados, do Distrito Federal ou Municípios.
Se tomarmos uma interpretação sistemática da Constituição temos que a regra supramencionada deve se adequar com a competência, conferida pela mesma Carta, da União em celebrar tratados internacionais. É que a Constituição cria exceções as suas próprias regras. Isto pode ser observado ao longo do texto constitucional como, por exemplo, na situação em que a Lei Fundamental, em seu artigo 34, veda a intervenção da União nos Estados e Distrito Federal, mas cria situações especiais em que seria possível. Neste sentido, com o objetivo de harmonizar as regras constitucionais, temos que o artigo 151, III só abarca situações em que a União atua como pessoa jurídica de direito público interno.
A União, então, possui uma dupla personalidade, visto que ora atua como representante da República Federativa do Brasil e ora como ente federativo se igualando aos Estados, Municípios e Distrito Federal. Neste contexto, a União não pode isentar tributo que não seja de sua competência sob pena de estar violando a autonomia dos entes federativos. No entanto, ao celebrar tratados internacionais a União automaticamente se reveste da condição de nação e neste caso dos interesses de todos os entes federativos.
É necessário frisar que quando a nação firma tratado internacional ela deve observar o interesse da nação, ou seja, de todos os entes federativos. Sendo assim, não há que se falar em não participação na feitura do tratado, somente nos seus efeitos. É que permitir a participação de todos os entes seria um tanto quanto inviável e terminaria por postergar ao infinito a confecção de tratados internacionais.
Sabemos que a economia flui com rapidez, sendo assim, ao aceitar a participação dos demais entes da federação estaríamos inviabilizando o comércio no campo internacional.
Ademais, do ponto de vista jurídico-internacional temos que somente celebra tratados quem possui soberania, e no Brasil esta é conferida à União.
Em conclusão, temos que andou bem a jurisprudência do Tribunais Superiores ao excetuar a regra do artigo 151, III em relação a tratados internacionais celebrados pela União.
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[1] 2010, p. 258.
[2] 2006, p.197.
[3] 2010, p.273.
[4] 2004, p.273.
[5] 2006, p. 100.
[6] Sobre o assunto é interessante notar o caput do art. 1º da Constituição brasileira de 1988 que diz: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos”. Ainda nesse sentido temos o caput do art. 18 do mesmo diploma legal: “Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição” (grifei)
[7] 1937, p. 45-46 apud ATALIBA, 1976, p. 142-143.
[8] 2010, p. 443.
[9] 2005, p. 17.
[10] 1998, p. 50.
[11] PM Cruz e CVOA Cruz, 2007, p. 56.
[12] 2003, p. 269.
[13] MENDES et al., 2010, p. 930.
[14] 2006, p. 100.
[15] 1989, p. 26.
[16] Neste sentido temos o caput do art. 11 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias: “cada Assembleia Legislativa, com poderes constituintes, elaborará a Constituição do Estado, no prazo de um ano, contado da promulgação da Constituição Federal, obedecidos os princípios desta”.
[17] O Estado complexo diferencia-se do Estado simples. Este é visto como ente indivisível, ou seja, somente existe um Poder Legislativo, um Poder Executivo e um Poder Judiciário, todos centrais. Já o Estado simples é divisível em partes internas que merecem o nome de Estados e são unidas entre si por um vínculo de sociedade.
[18] 2002, p. 77-78.
[19] 1998, p. 49.
[20] 2004, p. 39.
[21] 2010, p. 33.
[22] 2010, p. 34.
[23] Constituição Federal, art. 156: Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar.
[24] Constituição Federal, art. 155: Compete aos Estados e ao Distrito Federal impostos sobre: (...) II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.
[25] 2007, p. 237.
[26] 2004, p.102.
[27] Têm-se como exemplos as áreas comercial, cultural e tecnológica, as relações diplomáticas e consulares, o uso dos espaços marítimo, terrestre e cósmico.
[28] 1992, p. 419.
[29] 1996, p. 65.
[30] A soberania absoluta é aquela em que todos os Estados são iguais no âmbito internacional. Todavia, é necessário observar que a soberania não deve ser óbice para a existência de um caráter coordenador entre os Estados.
[31] 1996, p. 66.
[32] 2008, p. 156.
[33] 2004, p. 50.
[34] 1996, p. 69.
[35] 1996, p, 69.
[36] 2004, p. 51.
[37] 1996, p. 71-72.
[38] A única exceção que se faz neste caso é quanto a posição hierárquica dos direitos internacionais que dizem respeito a proteção dos direitos humanos, neste caso versa o art. 5º, §§2º e 3º, respectivamente: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” e “Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”.
[39] 2001, p. 116.
[40] Partindo do princípio da existência de dois ordenamentos jurídicos – um nacional e um internacional – podemos afirmar que a recepção ocorre na medida em que a ordem jurídica interna “recebe” a internacional. O termo “recepção” é ainda verificado como forma do ordenamento interno incorporar uma regra ligada ao direito internacional.
[41] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ADI 1.480 MC/DF. Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade. Relator Min. CELSO DE MELLO. Julgado em 04 de setembro de 1997. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=347083). Acesso em: 01 de novembro de 2011.
[42] 2001, p. 120.
[43] P. 57 apud RIBEIRO, 2001, p. 121.
[44] p. 44 apud GONZAGA, 2010, p. 259.
[45] 2006, p. 178-179.
[46] 1999, p. 78.
[47] 2010, p. 92.
[48] 2006, p. 182.
[49] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 460320. Recurso Extraordinário. Relator: Min. GILMAR MENDES. Disponível em:http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2322387. Acesso em: 28 de outubro de 2011.
[50] 1998, p. 23.
[51] 2000, p. 52.
[52] 1993, p. 17.
[53] 1998, p. 24.
[54] 1993, p. 37.
[55] Neste sentido, é interessante observa o inteiro teor do artigo supramencionado: “O consentimento de um Estado em obrigar-se por um tratado pode manifestar-se pela assinatura, troca de instrumentos constitutivos do tratado, ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, ou por quaisquer outros meios, se assim acordado”.
[56] 2005, p. 22.
[57] Art. 53 da Convenção de Viena: “É nulo um tratado que, no momento de sua conclusão, conflite com uma norma imperativa de Direito Internacional geral. Para os fins da presente Convenção, uma norma imperativa de Direito Internacional geral é uma norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza”.
[58] 2010, p. 252.
[59] Constituição Federal. Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: I - resolver definitivamente sobre tratados, acordos ou atos internacionais que acarretem encargos ou compromissos gravosos ao patrimônio nacional;
[60] Constituição Federal. Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
[61] 2011, p. 108.
[62] 2011, p. 110.
[63] 2006, p. 327.
[64] 2006, p. 279.
[65] 2006, p. 280-281.
[66] 2006, p. 283.
[67] 2007, p. 504.
[68] 2010, p. 244.
[69] CTN, art. 97. Somente a lei pode estabelecer: IV - a fixação de alíquota do tributo e da sua base de cálculo, ressalvado o disposto nos artigos 21, 26, 39, 57 e 65;
[70] 2006, p. 185.
[71] Neste sentido, é interessante observar o que dizia o art. 20, § 2º da Constituição brasileira de 1967: “a União, mediante lei complementar, atendendo, a relevante interesse social ou econômico nacional, poderá conceder isenções de impostos federais, estaduais e municipais.”
[72] A Constituição Federal atual traz no art. 155, §2º, XIII e 156, §3º, II a possibilidade da intervenção da União nos impostos estaduais e municipais mediante lei complementar.
[73] 2004, p. 356.
[74] 2006, p. 187.
[75] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 543943 AgR. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário. Relator Min. CELSO DE MELLO. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28543943%2ENUME%2E+OU+543943%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos. Acesso em: 31 de outubro de 2011.
[76] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE nº 229096. Recurso Extraordinário. Relator Min. ILMAR GALVÃO. Julgado em 16 de agosto de 2007. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28229096%2ENUME%2E+OU+229096%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos. Acesso em: 01 de novembro de 2011.
[77] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp nº 3134/SP. Recurso Especial. Relator Min. ILMAR GALVÃO. Julgado em 20 de junho de 2006. Disponível em: http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=(('RESP'+ou+'REsp')+adj+3143).suce.+ou+(('RESP'.clas.+ou+'REsp'.clap.)+e+@num='3143'). Acesso em: 01 de novembro de 2011.
Advogada. Pós-graduada em direito tributário pela Universidade Federal do Estado do Rio Grande do Norte.<br><br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VIDAL, Júlia Brilhante Portela. Isenção heterônoma por via de tratados internacionais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 maio 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46588/isencao-heteronoma-por-via-de-tratados-internacionais. Acesso em: 22 nov 2024.
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