Professor orientador:
RODRIGO FRESCHI BERTOLO
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo estudar a comercialização dos alimentos transgênicos, confrontando os dispositivos legais estatuídos pelo CDC, especificamente no que tange ao direito à informação e, por via de consequência, à liberdade de escolha. O Biodireito tutela tanto interesses de ordem pública, como também de ordem particular, quando alcança o ser humano, em sua individualidade enquanto sujeito de direito. Muito se tem falado sobre novas tendências do direito. Isso se deve, principalmente, ao avanço tecnológico, que faz surgir questões polêmicas, de grande repercussão na sociedade e no mundo jurídico.
Palavras- Chaves: Alimentos Transgênicos, Biodireito, Direito do Consumidor, Rotulagem.
ABSTRACT: This article aims to study the marketing of GM foods , comparing the legal provisions statutory CDC , specifically with respect to the right to information and , in consequence , freedom of choice. The Biolaw protection of both public interests, as well as particular order , when it reaches the human being in his individuality as a subject of law. Much has been said about new trends in the law. This is due mainly to technological advances , which raises controversial issues of great impact on society and the legal world .
Words- keys: Transgenic Food, Biolaw, Consumer Law, Labelling.
A Engenharia Genética nunca esteve tão em pauta como nos dias atuais. As suas inovações tecnológicas, cada vez mais, afetam a vida quotidiana das pessoas.
Os polêmicos Organismos Geneticamente Modificados, mais conhecidos como Transgênicos, são fruto desse ramo do conhecimento humano.
O enfoque do presente artigo consiste em uma tentativa de analisar a comercialização dos alimentos geneticamente modificados no mercado de consumo nacional, dentro dos padrões atuais, traçando-se um paralelo com a Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), especificamente no tocante ao direito elementar da informação e, como conseqüência, à liberdade de escolha.
Sendo destacados os direitos elementares do consumidor à informação e à liberdade de escolha. Demonstrando, outrossim, que a comercialização dos alimentos transgênicos, sem um mecanismo que possa efetivamente identificá-los como tal, encerra uma subversão dos já mencionados direitos do consumidor, além de configurar oferta viciada e publicidade enganosa.
1. ORGANISMO GENETICAMENTE MODIFICADOS
Os organismos geneticamente modificados (OGMs), também conhecidos como “transgênicos”, nunca foram alvo de tantas discussões e polêmicas como nos dias atuais. De um lado, estão as grandes multinacionais detentoras das patentes dos aludidos inventos, veementes defensoras da sua proliferação e consumo. Do lado diametralmente oposto, encontram-se os ambientalistas, que abominam o cultivo e consumo de tais produtos, sobretudo em razão de potenciais riscos ao meio ambiente e à saúde humana.
No meio desta tábula de discussões estão o governo brasileiro, que ainda não adotou uma efetiva posição a respeito do assunto e os consumidores, que, infelizmente, não são suficientemente informados para que possam formar uma opinião e há muito consomem alimentos transgênicos sem saber que o fazem.
Segundo Maria Rafaela J. B. Rodrigues, “os organismos geneticamente modificados (OGMs) são aqueles obtidos pela técnica do DNA recombinante, nos quais são inseridos genes, em geral de outra espécie ou mesmo reino.”.
1.1 ALIMENTOS GENETICAMENTE MODIFICADOS: DISCUSSÃO PARA TODA A SOCIEDADE
Os impactos da influência dos alimentos transgênicos atingem toda a sociedade, incluindo consumidores, produtores, empresários do agronegócio, pesquisadores, centros de pesquisas, governos e diversas instituições sociais.
É um assunto atual, polêmico e que diz respeito a todos os cidadãos, seja por sua influência direta nos alimentos, seja pela correlação com o problema de sustentabilidade do Planeta no longo prazo em termos de biodiversidade, ecossistema, qualidade de vida, direitos econômicos e pessoais e crença na natureza como patrimônio da humanidade.
Segundo o químico e especialista em genética Flávio Lewgoy revela que já há vários casos comprovados no mundo de graves danos à saúde humana e animal provocados pelo uso de transgênicos. “O que os críticos dos transgênicos sempre disseram está aparecendo, e em grau exponencial, mostrando que se tratam de produtos de alto risco”, afirmou o cientista.
Na índia, em seis aldeias, os trabalhadores de plantações do algodão Bt. (transgênicos) tiveram afecções de pele, olhos e aparelho respiratório. Detalhe importante que todos tinham, anteriormente, trabalhado com algodão não geneticamente modificado (convencional), sem apresentar esses problemas de saúde.
Outro caso relatado por Lewgoy, em Hesse, Alemanha, onde doze vacas leiteiras de um rebanho, alimentadas com folhas e sabugos de milho Bt. (transgênicos) morreram. A fornecedora das sementes pagou 40 mil euros de indenização ao fazendeiro mas as amostras coletadas para exames de laboratórios sumiram, misteriosamente. Por outro lado em fazenda dos Estados Unidos constatou-se que, entre ração transgênicas e não- transgênicas, os animais preferem a última.
2. TUTELA JURÍDICA DO CONSUMIDOR
É inconcebível a sociedade organizada dissociada do consumo. Independentemente da classe social, o homem consome desde o nascimento até os últimos dias da sua vida.
O consumo é de suma importância, seja porque visa a suprir as necessidades humanas, seja porque é o principal combustível de qualquer sistema econômico.
As relações de consumo são bilaterais, pressupondo a existência de um fornecedor em um pólo, e um consumidor no outro. O fato é que, este último, se subordina aos interesses impostos pelo primeiro, titular dos bens ou serviços, para atender às suas necessidades de consumo.
Essa imposição de interesses aliada ao conhecimento técnico e científico que detém o fornecedor, relega o consumidor a uma condição desfavorável no contexto da relação de consumo.
Com o escopo de atribuir um maior equilíbrio a essa relação jurídica, o Estado passou a intervir, por meio do Microssistema Jurídico de Proteção ao Consumidor, encabeçado pela Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor).
A partir de então, os direitos dos consumidores extrapolaram a esfera cível e passaram a ser contemplados por uma legislação mais específica.
2.1 A EVOLUÇÃO DAS RELAÇÕES DE CONSUMO
As relações de consumo evoluíram significativamente nos últimos anos, das primitivas operações de escambo (troca de mercadorias) e das primeiras operações mercantis, chegou-se progressivamente as sofisticadas operações de compra e venda, importação, leasing, etc.. Surgiram os grandes estabelecimentos comerciais e industriais, hipermercados, shopping centers.
Os bens de consumo passaram a ser produzidos em série, para um número cada vez maior de consumidores. Os serviços também se ampliaram notoriamente.
Essa radical modificação nas relações de consumo culminou em uma conscientização de que o consumidor estava desprotegido e, portanto, necessitava de respaldo legal protetivo.
O direito à informação é basilar, como não poderia deixar de ser, no sistema brasileiro de proteção do consumidor. Só um consumidor bem informado pode exercer a efetiva liberdade de escolha, pressuposto do ideal ato jurídico de consumo (consumo consciente).
Não se pode olvidar que na relação de consumo não é o consumidor que deve informar-se para o seu resguardo quanto a eventuais danos pelo fornecimento do produto ou serviço. Na verdade, à luz da atual legislação consumerista, compete ao fornecedor prestar a ampla, verdadeira e clara informação ao consumidor, sob a fiscalização do Estado.
Um dos princípios regedores das relações de consumo adotados pelo Código de Defesa do Consumidor é o da Transparência, de molde a permitir que o consumidor não só tenha consciência exata da obrigação assumida ao adquirir um produto, como, também, possa saber quais as suas características, qualidades, os fins a que se destina e os eventuais riscos que o seu uso oferece, a fim de que possa optar por consumi-lo ou não.
Todavia, entendemos que a comercialização de alimentos, que possuem na sua cadeia produtiva ingredientes de origem transgênica, sem a devida rotulação que possa individualizá-los, além de constituir um acinte aos direitos à informação e à liberdade de escolha, implica a irregularidade na oferta.
Estabelece o art. 31 do Código de Defesa do Consumidor que:
“A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores”.
As informações constantes da oferta devem ser corretas, revelando com fidelidade as propriedades dos produtos ou serviços; claras, isto é, de fácil compreensão e que prescinde de conhecimentos técnicos ou científicos por parte do consumidor; precisas, dando ao consumidor a idéia exata dos atributos do produto ofertado; ostensivas, de modo que estejam bem visíveis e de fácil localização no momento da pré–aquisição; e, por derradeiro, devem ser em língua portuguesa, por razões obvias, uma vez que nenhum consumidor brasileiro é obrigado a conhecer vários idiomas a fim de inteirar-se do conteúdo das mensagens ou informações sobre o que pretende adquirir.
Entretanto, no que tange a oferta de produtos alimentícios com ingredientes transgênicos, esses preceitos norteadores da ideal oferta não têm sido observados.
A publicidade é definida pelo art. 8º do Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária como “toda atividade destinada a estimular o consumo de bens e serviços, bem como promover instituições, conceitos e idéias”.
Estatui, ainda, o § 3º do artigo 37 do Código de Defesa do Consumidor que: “Para os efeitos deste Código, a publicidade é enganosa por omissão quando deixar de informar sobre dado essencial do produto ou serviço”.
Portanto, ao nosso sentir, a publicidade de um alimento geneticamente modificado sem a informação precisa e clara de que existem em sua composição ingredientes de origem transgênica, consiste em comunicação de informação falsa, por omissão, configurando publicidade enganosa, prática tão abominada pela legislação consumerista.
Como visto, a Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), através dos já mencionados dispositivos legais, assegura aos consumidores o direito à informação, carreando ao fornecedor a incumbência de prestá-la, de maneira mais ampla, verdadeira e clara, sobretudo para que se possa proceder a uma escolha consciente.
Também foi mencionado que o caso dos alimentos transgênicos não é uma exceção a esses mandamentos e que, portanto, a existência de ingredientes de origem geneticamente modificada em tais produtos deve ser informada, fiel e ostensivamente aos consumidores, sob pena de se subverter direitos básicos, além de configurar oferta viciada e publicidade enganosa.
A rotulagem nas embalagens ou recipientes dos referidos alimentos é uma das formas mais efetivas de prestar informações sobre as suas peculiares propriedades.
No Brasil, a questão da rotulagem atualmente é regulamentada pelo Decreto n.º 4.680 de 24 de abril de 2003. Tal norma regulamenta o direito à informação, assegurado pelo Código de Defesa do Consumidor, quanto aos alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, sem prejuízo do cumprimento das demais normas aplicáveis à espécie.
O diploma legal estabelece em seu art. 2º que:
“Na comercialização de alimentos e ingredientes alimentares destinados ao consumo humano ou animal que contenham ou sejam produzidos a partir de organismos geneticamente modificados, com presença acima do limite de um por cento do produto, o consumidor deverá ser informado da natureza transgênica desse produto”. (grifo nosso).
De início, infere-se que a rotulagem é obrigatória apenas para os produtos alimentícios que, na sua composição, detenham mais de 1% de ingredientes ou componentes de origem transgênica.
Por outro lado, quem garante que esse limite será fielmente respeitado. A tarefa de examinar os produtos para aferir se existem, na sua composição, ingredientes transgênicos em quantidades tão pequenas é complexa e não existem no Brasil laboratórios suficientes que sejam habilitados pela ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária, para fazer este tipo de análise que, normalmente, é encomendada em laboratórios estrangeiros.
O símbolo oficialmente definido para identificar o produto com percentual acima do limite de 1% de ingrediente transgênico é um “T” de cor negra, inserido dentro de um triângulo eqüilátero com fundo amarelo e de bordas pretas. Foi elaborado ainda um símbolo semelhante, porém com fundo interno em branco, para ser utilizado em rótulos a serem impressos em preto e branco. A idéia é que a identificação padronize a informação sobre a presença de transgênicos nos produtos.
O dispositivo legal em comento estabelece, ainda, as expressões específicas a serem utilizadas, a fim de que haja uma padronização também na forma escrita de rotular os alimentos transgênicos.
CONCLUSÃO
Os alimentos transgênicos são aqueles oriundos de uma planta que teve o seu material genético artificialmente alterado, para agregar-lhes características peculiares, como resistência a pragas e herbicidas, tornar seus frutos mais tolerantes a condições desfavoráveis de clima e transporte, além de proporcionar uma maior durabilidade.
A controvérsia que recai sobre os referidos alimentos diz respeito ao desconhecimento acerca das conseqüências que podem ser causadas, pela sua produção e consumo, ao meio ambiente e à saúde humana.
Em que pese às incertezas que permeiam os transgênicos, a sua produção, cultivo e comercialização já são legalizados. Mas, foi com a efetiva liberação para o consumo que se acirraram as maiores discussões a respeito do assunto.
É cediço que o microssistema jurídico de defesa do consumidor tem por fim precípuo intervir nas relações de consumo, as quais são imprescindíveis à sociedade, com vistas a atribuir um equilíbrio à relação jurídica estabelecida entre consumidor e fornecedor.
Isso porque, sendo o consumidor médio hipossuficiente em relação ao fornecedor, sobretudo em razão de disparidades econômicas e de conhecimento técnico, faz-se imprescindível a tutela jurídica protecionista capaz de impedir abusos e imposições arbitrárias.
É com esse ímpeto que a Lei n.º 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) assegurou algumas prerrogativas e direitos básicos ao consumidor.
Guarnecido de todas as informações essenciais acerca do produto, o consumidor tem condições de exercer o seu direito de escolha, pressuposto da ideal relação de consumo, isto é, o consumo consciente.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, João Batista de. A Proteção Jurídica do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2000.
GARCIA, Lenise A. Martins. Plantas Transgênicas (http://www.mindware.com.br/edutecnet/edtransg.htm). 10 de Abril de 2005.
MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. São Paulo: Saraiva, 2000.
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor: direito material. São Paulo: Saraiva, 2000.
RIECHMANN, Jorge. Cultivos e Alimentos Transgênicos: um guia crítico. Tradução de Ricardo Rosenbusch. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
RODRIGUES, Maria R. J. B. Bio Direito – Alimentos Transgênicos. São Paulo: Lemos e Cruz, 2002.
SOUZA, Valdomiro José de. Projeto Genoma Humano: utopia do homem geneticamente perfeito. Franca: Ribeirão Gráfica, 2001.
http://www.agrisustentavel.com/ogm/2007/230707.html
Estagiária da 2ª Vara Criminal da Comarca de Fernandópolis/SP, estudante do 9º semestre (5º ano) do curso de Direito na Universidade Camilo Castelo Branco- UNICASTELO, campus Fernandópolis/SP.<br><br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FELTRIN, Daise Cristina. Os alimentos transgênicos e o direito à informação assegurada ao consumidor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jun 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46825/os-alimentos-transgenicos-e-o-direito-a-informacao-assegurada-ao-consumidor. Acesso em: 22 nov 2024.
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