Orientador (a):
GEISA CAVALCANTE CARBONE SATO
RESUMO: O presente trabalho procura fazer uma breve análise a respeito do Exercício do Poder Familiar por quem o detenha, como tratado no artigo 1.634 do Código Civil. A análise tem a pretensão de lançar luz a imensa importância em que consiste este poder, bem como de suas consequências, impactos sociais, legais, etc. É de suma importância trazer em questão tão pertinente assunto partindo-se do pressuposto de que é no seio familiar que se desenvolve o indivíduo e onde tão logo se constitui uma unidade da sociedade. Partindo desta premissa o exercício deste poder como positivado em nosso ordenamento, busca a construção solida e prospera da família, do indivíduo e da sociedade. Será inevitável no decorrer do trabalho lidar com certas mistificações, que serão tratadas oportunamente.
Palavras-chave: família, poder familiar, núcleo familiar, Responsabilidade Parental.
ABSTRACT: The present work seeks to make a brief analysis about the exercise of Family Power those who owns, as discussed in Article 1634 of the Civil Code. The analysis has the pretension to shed light on the immense importance that is this power and its consequences, social, legal, etc. It is very important to bring in question as so pertinent issue starting from the premise that it is in the family environment that develops the individual and where so early is constituted a unit of society. From this premise the exercise of that power as positivised in our planning, quest the solid construction and prospers family, the individual and society. It will be inevitable in the course of work dealing with certain mystification, which will be addressed in due course.
Key-words: family, family power, family nucleus, Parental Responsibility.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. Transição do Pátrio Poder ao Poder Familiar. 2. O Exercício do Poder Familiar. 3. Aspectos históricos e Conceito da Unidade Familiar. 3.2 Modelos Familiares na Atualidade. 4. Responsabilidade Civil e Criminal. 5. Conteúdo do Instrumento Legal. 5.1 Dever de criar e educar. 5.2 Dever de tê-los em sua companhia e guarda. 5.3 Do consentimento ou negativa para casarem. 5.4 Dever de nomear-lhes tutores. 5.5 Representá-los ou assisti-los judicial ou extrajudicialmente. 5.6 Reclamá-los de quem ilegalmente os detenha. 5.7 Exigir-lhes obediência, respeito e colaboração. 8. Descontinuação do Poder Familiar. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
INTRODUÇÃO
Pensar em uma sociedade sem leis, é exercitar uma utopia. Ainda que não positivadas, toda e qualquer sociedade carrega valores morais e éticos que norteiam a convivência dos indivíduos de determinado grupo.
Além destes valores fez-se necessário a positivação de outras normas que, mais impositivas, direcionassem, limitassem e por vezes obrigassem cada elemento da sociedade ao comportamento mediano, só assim foi possível manter a evolução até os dias atuais, a civilidade, e a harmonia entre os povos.
Dentre as normas que se propõem a organizar a vida em sociedade, será objeto deste estudo o artigo 1.634 do Código Civil, sobre o Exercício do Poder Familiar, que trata de forma sucinta e abrangente das competências dos genitores para com seus filhos, e por analogia, de quem mais detenha essa responsabilidade como será tratado a diante.
É muito assertiva a citada norma legal pois incumbe os pais ou responsáveis de suprir necessidades de suma importância aos filhos, não deixando a cargo unicamente do Estado o zelo em diferentes situações, para com a criação, desenvolvimento e instrução destes menores.
Veremos a frente que o texto legal tem previsões claras que devem de fato ser exercidas pelo Poder Familiar, e não pelo Estado. É a autonomia positivada que os pais devem exercer sobre seus filhos. Não se pode, portanto, se eximir destas competências os pais que afirmam não possuir uma situação conjugal formal, pois adianta a lei da seguinte forma, que o pleno exercício do poder familiar compete a ambos os pais qualquer que seja a situação conjugal.
1. Transição do pátrio poder ao poder familiar
Importante mudança deve ser observada a respeito da denominação poder familiar, uma vez que anteriormente denominava-se pátrio-poder, o que claramente demonstrava ser esta uma prerrogativa do marido, pois era o chefe da família, numa família sob o poder marital.
É unanime a entendimento de que o este instituto surgiu na Roma antiga, momento no qual o homem ocupava todos os cargos de maior importância da sociedade, sendo ao mesmo tempo que pai, sacerdote, político e juiz. O poder do homem era tamanho sobre seus filhos, que decidia todos os atos relacionados à vida no seio familiar, a aplicação de castigos até mesmo corporais. Podia o pai vende-los. E por fim cabia a este de forma impensável, decidir sobre a vida dos filhos, podendo tirá-la se julgasse necessário.
O homem detinha tamanho poder no âmbito familiar, que até a vigência do Estatuto da Mulher Casada, o artigo 6º do Código Civil previa a mulher como relativamente incapaz, pois esta, após o casamento não possuía mais liberdade sobre a administração de seus bens e sofria também outras limitações em clara posição de inferioridade. No mesmo diploma legal de 1916, o artigo 233 previa: “O marido é o chefe da sociedade conjugal”.
Preleciona o entendimento do legislador os autores José Lamartine Correia de Oliveira e Francisco José Ferreira Muniz: “O modelo de família que o legislador teve em vista, ao elaborar o Código Civil em sua versão original, corresponde a uma família dominada pelo princípio da unidade de direção. A família tem um chefe: o marido. Sua estrutura é diferenciada, baseada no princípio de repartição de funções, e hierarquizada”.
Somente com o advento do Estatuto da Mulher Casada instituído pela Lei 4.121, de 27 de agosto de 1962, que a mulher inicia sua emancipação à medida que deixa de ser considerada relativamente incapaz, sendo suprimido o inciso II do artigo 6º do Código Civil de 1916 que a tratava de tal forma. Nesse momento a mulher passa a ter papel no ambiente familiar
2. O exercício do poder familiar
O poder familiar tem como titulares os pais, e o mesmo não decorre da guarda e sim da condição de genitores, sendo obrigados a exercer esse poder baseado no princípio da Responsabilidade Parental.
O indivíduo como si próprio, é reflexo de uma série de orientações dos mais variados tipos que o cercam. E o grupo primário onde essas orientações serão experimentadas é o núcleo familiar. É neste ambiente onde se dará a transferência de valores (preceitos morais ou regras sociais) e crenças (religiosa, ceticista, convicção intima).
Cuidando deste momento de formação do indivíduo o legislador buscou incumbir os genitores e assegurar aos gerados, o exercício de um poder que circundasse esse ambiente de desenvolvimento pessoal. Assim traz o artigo 1.364 do Código Civil:
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos:
I - dirigir-lhes a criação e a educação;
II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584;
III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem;
IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior;
V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município;
VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar;
VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento;
VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha;
IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição.
3. Aspectos históricos e conceito da unidade familiar
Seria inevitável a discussão deste assunto sem fazer referência à máxima que diz que a família é a célula mater (matriz, mãe) da sociedade. Nesse contexto a reflexão paira sobre a constatação de que toda a sociedade só se fez possível pelo agrupamento de pessoas ligadas por laços sanguíneos ou afetivos. Esta pode ser resumida como um grupo doméstico, que se une afetivamente, mais contemporaneamente sem o fator biológico como condicionante.
Historicamente, família deriva de termo latim famulus, que significa “escravo doméstico”, e criado na Roma Antiga para designar os grupos sociais da época e também a situação dos escravos legais.
3.1 Modelos familiares na atualidade
A realidade social moderna possui várias noções novas de família, são elas a homoafetiva, constituída por genitores do mesmo sexo. A anaparental, que admite a que a família não abrange somente o marido, esposa e filhos, podendo ter agregados na sua composição, como duas amigas viúvas que se unem para o convívio em sua velhice, ou os irmãos de sexo oposto que solicitam na justiça a adoção de um menor.
Há a monoparental, onde está presente somente um dos genitores e seus descendentes. Mais diversificada e também comum nos dias atuais é a família mosaico ou pluriparental onde o marido é divorciado e tem seus filhos morando com ele, enquanto a esposa tem filhos de outro casamento, sem ter sido casada e estes moram com o pai.
A família eudomonista é a qual o vínculo entre os indivíduos é pura e simplesmente a comunhão afetiva, o respeito e consideração. Sendo o afeto no entendimento da jurisprudência o elemento primordial para a filiação tratando-se da posse do filho.
E por último a família paralela, quando um indivíduo se coloca concomitantemente em duas entidades familiares diversas. Esse paralelismo parental pode ocorrer pelos filhos de pais divorciados, mas também no caso em que a pessoa mantém uma simultaneidade conjugal matrimonial ou fática.
4. Responsabilidade civil e criminal
Em nossa Constituição Federal está estabelecido que a penalidade por crime praticado não pode ser aplicada a outrem que não o condenado. Dessa forma o artigo 5º, inciso XLV traz que “... nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;”.
Desta forma a imposição de pena ao menor em nosso sistema penal não é aplicável, ficando a cargo de uma legislação a parte esta atribuição, a saber a Lei 8.069 que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente. Neste estatuto, nos termos do artigo 103 comete ato infracional, a conduta descrita como crime ou contravenção penal. A infração por este cometida será, portanto, sujeita ao artigo 101 que determina uma série de medidas a serem determinadas pela autoridade competente.
Não se fala aqui de punição propriamente dita, mas de uma série de medidas que buscam repreender com caráter educativo a conduta do menor, sendo o primeiro inciso o encaminhamento aos pais ou responsáveis relembrando a aplicação do poder familiar.
Quando da prática do ato infracional o artigo 112 do citado ECA prevê uma série de medidas socioeducativas:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
No inciso II está descrito o a penalidade que pode ser aplicada sobre o menor, mas este artigo é disciplinado pelo Código Civil onde se trata da Responsabilidade Civil, capítulo Da Obrigação de Indenizar, propriamente o artigo 932, que estipula o seguinte: “São também responsáveis pela reparação civil: I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia”, e em continuação a esta previsão legal, o artigo seguinte diz que os pais e outros responsáveis específicos respondem pelos atos dos terceiros ali referidos, mesmo sem culpa de vossas partes.
5. Conteúdo do Instrumento Legal
Façamos aqui uma análise mais pormenorizada do artigo 1.634, para a compreensão de cada obrigação conferida ao poder familiar.
5.1 Dever de criar e educar
No inciso I do referido artigo, está descrita a obrigação dos pais com a criação e educação, lembrando que o mesmo se encontra previsto na Constituição Federal em seu artigo 229: “Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”.
Quanto a criação entende-se por isso a assistência e o asseguramento dos direitos fundamentais da pessoa humana, como o bem-estar físico, moral e social elencados no artigo 227 da Constituição Federal e repetidos no artigo 4º do ECA, in verbis:
É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
O texto legal é abrangente ao ponto de abarcar a alimentação, a assistência médica odontológica, o vestuário, o lazer e a cultura, bem como proporcionar a combinação de um ambiente seguro ao seu desenvolvimento, livre de discriminantes, violentas ou opressoras.
A respeito da educação há também muita abrangência no sentido de que esta não se restringe apenas ao encaminhamento do menor a escola, mas a todo um estímulo e transmissão de valores e crenças já citados anteriormente, como os religiosos, filosóficos, morais e sociais, formadores de caráter.
5.2 Dever de tê-los e sua companhia e guarda
O segundo inciso complementa o anterior na medida em que só é possível prover todo o necessário ao menor sobre o qual se tem o poder familiar, estando próximo a este, e se fazendo presente, seja por meio de guarda unilateral ou por meio de guarda compartilhada nos termos do artigo 1.584 do mesmo diploma legal. Compreende aqui também a situação de mantê-los sobre vigilância quanto ao que praticam e com quem se relacionam, e seu descumprimento, quando da pratica pelo menor de ato ilícito pode acarretar a responsabilização dos genitores de culpa in vigilando.
Os artigos se complementam de tal forma, que só pela convivência, assegurada pela guarda e companhia é possível aos pais acompanhar rendimento escolar, vocabulários adotados, hábitos de vida, condutas adequadas ao convívio social, e todo o mais que se segue ao desenvolvimento deste como cidadão.
É importante lembrar que em nossa sociedade moderna comumente ocorrem divórcios e separações, somadas ao ritmo intenso de trabalho de ambos os pais, o que se faz necessário assegurar a presença destes na vida do menor a despeito do desfazimento dos laços afetivos ou matrimoniais do casal, impedindo que haja uma criação falha e ausente.
5.3 Do consentimento ou negativa para casarem
A respeito do casamento o artigo 1.517 do Código Civil trata: “O homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil”.
Portanto, até que se complete a maioridade, o menor depende de quem detenha o poder familiar para a autorização de se contrair matrimonio. Isso se aplica pela responsabilidade que se adquire na iminência do casamento, e não se pode afirmar com clareza que qualquer menor tem condições de se casar, constituir família, prover moradia, sustentar uma convivência, construir ambiente familiar, criar e sustentar filhos e o que mais se relacionar à esta realidade. É imprescindível que se tenha capacidade plena de sustentar tal condição.
Caso haja recusa injusta para a autorização de se casarem a mesma pode ser requerida por via judicial nos termos dos artigos 1.517, 1.519 e 1.550, II do Código Civil e artigo 148, parágrafo único, c, da Lei nº. 8.069 de 90 do Estatuto da Criança e do Adolescente que trata da competência da Justiça da Infância e da Juventude, na citada alínea fica disposto: “suprir a capacidade ou o consentimento para o casamento”.
5.4 Dever de nomear-lhes tutor
Prevendo que o outro cônjuge possa não sobreviver ou que o sobrevivo não possa exercitar o poder familiar, devem os pais por meio de testamento ou documento autentico estabelecer quem nesta ausência ou incapacidade irá exercer o poder familiar sobre seus filhos, ficando desde já o tutor estabelecido.
Este dever deve ser tomado em conjunto, como previsto no artigo 1.729 do Código Civil. Esta tutela põe o menor e também os bens a que tem direito aos cuidados de alguém preestabelecido em quem os pais depositam plena confiança.
Vale lembrar que esta escolha é livre, o que significa dizer que os pais podem escolher livremente um futuro tutor, mas a sua execução por parte deste é facultativa. Na ausência ou recusa do nomeado em exercitar a tutela, o artigo 1.731 do mesmo diploma legal traz os critérios que escalonam os parentes consanguíneos incumbidos de exercer o poder familiar.
5.5 Representá-los ou assisti-los judicial ou extrajudicialmente
Como prevê nosso Código Civil, até que se atinja a maioridade, o menor fica impossibilitado de celebrar determinados atoe da vida civil sendo considerado relativamente incapaz. Para suprimir esta condição, o responsável pode representar ou assistir os menores nestes atos.
Esta representação da manifestação de vontade do menor abrange bens, interesses, direitos e deveres pessoais, patrimoniais, judiciais ou extrajudiciais.
Antes que se conclua os 16 anos de idade os pais como detentores do poder familiar representam os filhos. Após esta idade, o menor será assistido pelos pais nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento.
5.6 Reclamá-los de quem ilegalmente os detenha
Diante do dever de ter os filhos em sua companhia e guarda tratado no inciso II da Lei 1.634, objeto deste trabalho, é plenamente possível que os pais requeiram busca a apreensão destes, quando detidos ilegalmente por alguém, ou seja, contra o seu consentimento, ainda que por um parente próximo, ou até mesmo pelo cônjuge, e não sendo o momento para este exerça a guarda. Dito isto, o artigo 249 do Código Penal tipifica a conduta de subtração de menor de quem o tem sob sua guarda, penalizando até mesmo pai ou tutor destituído deste poder. O referido artigo traz o seguinte:
Subtrair menor de dezoito anos ou interdito ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de lei ou de ordem judicial:
Pena - detenção, de dois meses a dois anos, se o fato não constitui elemento de outro crime.
§ 1º - O fato de ser o agente pai ou tutor do menor ou curador do interdito não o exime de pena, se destituído ou temporariamente privado do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda.
§ 2º - No caso de restituição do menor ou do interdito, se este não sofreu maus-tratos ou privações, o juiz pode deixar de aplicar pena.
Não importa se quem o subtraiu é o pai ou tutor destituído do poder familiar, tutela, curatela ou guarda, a conduta é ilegal, cabe somente a faculdade da aplicação da pena pelo magistrado quando o menor não sofreu maus tratos ou privações.
A conduta tipificada acima comumente ocorre em situações de separações judiciais onde há desacordo entre os dias de visita, e um dos ex cônjuges mantém o filho em seu domínio quando o mesmo já deveria ser entregue ao outro genitor ou responsável.
5.7 Exigir-lhes obediência, respeito e colaboração
É dever dos pais exigir que seus filhos lhes prestem o devido respeito e obediência, ao mesmo tempo em que exerçam atividades colaborativas compatíveis com sua idade e condição. Esta colaboração não pode ser prejudicial a sua formação, física ou intelectualmente.
As atividades podem ser tarefas domesticas, trabalhos adequados a sua capacidade.
E tratando-se de determinações legais, a Consolidação das Leis do Trabalho em seu artigo 403 proíbe o menor de 12 anos de trabalhar fora do lar, e veda também o menor de 18 de fazê-lo a noite.
Na condição de menor o trabalho efetivamente só poderá ser exercido na condição de aprendiz, sendo necessário que este frequente a escola, não realize a atividade das vinte e
duas horas de um dia e às cinco horas do dia seguinte. Além disso o trabalho não pode ser perigoso, insalubre ou penoso, e nem tampouco ser em local que prejudique ou impeça sua frequência escolar, nos termos da Lei 8.069, artigo 67, do Estatuto da Criança e do Adolescente:
Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é vedado trabalho:
I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e as cinco horas do dia seguinte;
II - perigoso, insalubre ou penoso;
III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;
IV - realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.
Ainda assim, entidades em defesa de menores e direitos humanos se posicionam discordantes de tal instrumento legal na alegação de que a atividade remunerada e o exercício escolar são incompatíveis nesta fase da vida, e na execução de ambos, serão um ou outro comprometidos.
8. Descontinuação do poder familiar
A descontinuação do poder familiar tem expressas situações legais para ocorrer, e vale dizer que fora estas situações especificas o mesmo é irrenunciável, intransferível, inalienável e imprescritível. Antes de se aprofundar nas situações previstas legalmente é preciso esclarecer que são três os tipos de descontinuação, a perda, a suspensão e a extinção.
Respectivamente na ordem citada, a perda do poder familiar trata da forma mais grave da destituição, que é aplicada por meio de processo judicial, com amparo legal no artigo 1.638 do Código Civil:
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que:
I - castigar imoderadamente o filho;
II - deixar o filho em abandono;
III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes;
IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
Há que se atentar ao inciso IV, pois o comportamento reiterado previsto no artigo anterior que prevê somente a suspenção da obrigação aos detentores, como o abuso da autoridade, a falta nos deveres inerentes, ou arruinando os bens dos filhos, poderá acarretar a perda ao invés da simples suspensão. Na hipótese de reestabelecimento dos laços familiares, a suspenção será escolhida em oposição a perda.
Não cabe, porém, a quem deva este poder a alegação de que lhe faltam recursos para exercê-lo, pois há previsão legal para o que tenta se eximir desta obrigação, tratada no artigo 23 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Não sendo esta condição de falta ou carência de recursos, situação passível de suspenção ou perda do poder familiar.
Trata de forma muito clara as hipóteses de suspenção no artigo 1.637 do Código Civil, quando ocorre abuso de autoridade por pai ou mãe, havendo falta nos deveres incumbidos ou quando lhe arruinarem os bens de seus filhos. E também diante de condenação criminal por sentença irrecorrível com pena que exceda dois anos de prisão, in verbis:
Art. 1.637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça reclamada pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha.
Parágrafo único. Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.
Por último, a extinção é a situação onde a interrupção deste poder é definitiva, que ocorrem logicamente pela morte de um dos pais ou do filho, pela emancipação do filho e pela conquista da maioridade. Situação que merece destaque, também hipótese de extinção, é a adoção. Momento no qual os laços familiares da família adotante são constituídos trazendo consigo esta obrigação legal, e, portanto, o poder anterior dos genitores é extinto.
CONCLUSÃO
O presente trabalho atinge seu objetivo no momento em que permite enxergar a evolução do instrumento legal, a mudança de princípios do legislador quanto ao protagonista deste dever legal, e a importância de efetivamente exerce-lo.
A sociedade atual mais que nunca vive em uma enxurrada de conteúdo, hábitos e costumes, que moldam e orientam a formação do caráter de todos. Não afirmamos ser algo negativo, mas a constante fluidez da cultura atual deste cenário, traz a necessidade de ser aplicado uma conduta aclaradora, consciente e cívica, na criação do objeto deste instrumento legal.
O modelo de pais unicamente severos, foi superado a tempos, e estes personagens já há muito não ocupam o lugar de quem está presente apenas para tolher as vontades de seus filhos, de repreender, de questionar, numa condição quase militar. Hoje os pais devem com muita responsabilidade, estar presentes, orientar escolhas, e fazer parte, de todo o processo de crescimento, físico, intelectual e emocional de seus rebentos. O relacionamento pais e filhos hoje é extremamente aberto e conquistou para ambos os lados uma liberdade e uma franqueza que enriquece os relacionamentos quando feita de forma consciente.
O modelo de criação atual não pode ser uma relação de simples amizade, com excessos de liberdade, como não pode ser exercida também de maneira ausente ou compensadora materialista.
Voltamos a reforçar o grande siso do doutrinador em equilibrar as figuras paterna e materna e impor o dever de criar, educar e assistir os filhos menores até sua maioridade. E em uma sociedade moderna onde há mais oportunidades e razoes para o estudo, já é entendimento dos Tribunais que, mesmo após a maioridade, os filhos que continuarem estudando, mantém a obrigação dos pais em contribuir para essa educação.
Das hipóteses estudadas sobre o fim desta obrigação, a perda, suspenção ou extinção, nunca têm a pretensão de punir os pais, mas sim de proteger o menor. Vale se atentar ao fato de que questões sociais, por exemplo de miséria, vão criar um modelo de criação muito particular, e estes devem ser vistos caso a caso quanto a aplicação do fim deste poder.
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Estudante de graduação em Direito pela Universidade Camilo Castelo Branco - Unicastelo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MONEZI, Marcus Vinicius Belão. O exercício do poder familiar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jul 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46952/o-exercicio-do-poder-familiar. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
Por: Jaqueline Lopes Ribeiro
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