RESUMO: O presente trabalho visa demonstrar de forma simples e objetiva, o que são as chamadas Medidas de Salvaguardas, e como elas se inserem no âmbito internacional da harmonização fiscal. Serão demonstrados, ao longo do presente trabalho, as características, requisitos, formas de aplicação e principais características que tornam as Medidas de Salvaguardas um dos instrumentos de comércio mais utilizados pela Comunidade Internacional, com o aval, inclusive, da Organização Mundial do Comércio – OMC.
ABSTRACT: This study aims to demonstrate a simple and objective way, which are called the Safeguard Measures, and how they fall within the scope of international tax harmonization. Will be demonstrated, throughout this work, the characteristics, requirements, application forms and main features that make the Safeguard Measures of the trade instruments most used by the international community, with the support, including the World Trade Organization - WTO .
INTRODUÇÃO
É lugar comum que subsistem inúmeros instrumentos utilizados pelas Entidades Políticas brasileiras e também por toda a comunidade internacional para harmonização das questões relacionadas às questões fiscais e comerciais.
Tendo em vista que existem trocas comerciais e atividades financeiras nas relações comerciais entre entes, sejam entre municípios, estados ou mesmo países, conflitos, por certo, existirão, tendo em vista os interesses flagrantemente opostos existentes nas relações comerciais.
Para tanto, especificamente no âmbito do comércio internacional foram criados instrumentos para apaziguar a relação entre países. Dentre elas, destacam-se as denominadas Medidas de Salvaguardas.
Estas medidas representam mecanismos de limitação às importações, de forma a preservar a indústria doméstica, bem como garantir que países importadores sejam compelidos a diminuir o lucro resultante do processo de importação.
O INSTITUTO DAS SALVAGUARDAS
As denominadas Salvaguardas, medidas de proteção comercial implementadas por inúmeros países, são nada mais que meios adotados por nações para proteger suas respectivas indústrias internas/domésticas contra atos comerciais de outros países.
A respeito, leciona Souza (2003, p. 43):
“(...) as nações dificilmente conseguem atingir os mesmos níveis globais de eficiência e crescimento quando participam sozinhas dos fluxos internacionais de trocas. Assim, com a formação de blocos comerciais, promove-se a liberalização do comércio, maior integração na região e ampliação do mercado intra-regional diante da concorrência internacional.”.
Estas medidas, pois, de cunho eminentemente econômico – inseridas como instrumentos de harmonização fiscal – possuem características singulares, o que as diferem de outros métodos de proteção econômica entre Estados da Comunidade Internacional.
Dentre tais características, evidencia-se pela doutrina a transitoriedade e excepcionalidade das Salvaguardas. Isto porque essas as medidas devem ser instituídas de forma não permanente, de forma a equilibrar, durante determinado período, a indústria doméstica de determinado país que esteja sendo afetado economicamente com o aumento das importações.
Em outras palavras, na hipótese de a indústria doméstica se encontrar em flagrante ameaça de prejuízo ou grave dano, diante de um outro país exportador de produtos similares ou concorrentes, poderá o país importador lançar mão das medidas de Salvaguardas, de forma a dificultar ou mesmo impedir temporariamente determinada importação ameaçadora ou prejudicial.
A previsão legal das Salvaguardas fora realizada em 1947, no Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GGAT). Posteriormente, houve o aperfeiçoamento desta medida excepcional, como de deu em 1994, pelo Acordo sobre Salvaguardas realizado no Uruguai, no âmbito da Organização Mundial do Comércio – OMC, ocasião em que se detalhou objetivamente requisitos para implementação das medidas de Salvaguardas.
Segundo a OMC, existem três tipos de salvaguardas: As transitórias - ou de transição, caracterizadas para aplicabilidade nos períodos de transição da GGAT; As especiais – cuja implementação se deve a situações de mercado deflagradas de maneira especial pelos Estados, de forma a orientar e atenuar as distorções contidas sobretudo nas importações de produtos agrícolas; e as Urgentes, que visa amenizar os danos comerciais extraordinariamente trazidos por questões de força maior/caso fortuito.
Doutrinariamente, tem-se entendido que as medidas de salvaguardas podem ser aplicadas de três formas, quais sejam: a primeira forma de concretização de uma medida se salvaguarda é a restrição tarifaria. Através desta medida, o país importador realiza um aumento na tarifa de determinado produto, acarretando na diminuição na destinação de produtos por parte do país importador, que se vê obrigado a limitar as suas importações.
Uma outra maneira usual de se implementar salvaguardas em prol da indústria doméstica é através da chamada Limitação Quantitativa. Aqui, diferentemente do que ocorre na primeira forma sobredita, não há uma majoração nos valores de importação, mas sim um restrição quantitativa.
Durval de Noronha bem explicita:
“Para alguns, tal fato se deve às exigências feitas aos países importadores no sentido de ter que comprovar o grave prejuízo às suas indústrias e de ter que negociar concessões para compensar as medidas ou, ainda, em razão do princípio da não-seletividade que ao impedir a aplicação de medidas apenas àqueles importadores que estão causando prejuízo, faz com que, em certos casos, se prefira recorrer a mecanismos discriminatórios ou às medidas antidumping. No caso brasileiro, durante o período em que existiram altas barreiras tarifárias, o pouco uso se explica em razão das próprias tarifas exercerem o papel de protetor das indústrias nacionais.”.
É dizer, o país importador faz o uso desta medida de Harmonização Fiscal para limitar a quantidade de produtos que ingressarão no seu território. Um clássico exemplo das salvaguardas quantitativas é a adotada pelo Brasil limitando o números de brinquedos que poderiam ingressar no país, prestigiando, com efeito, as indústrias locais de fabricação de brinquedos.
Por fim, aparecendo como a terceira forma de implementação de salvaguardas, está justamente a fusão das duas primeiras medidas, que podem também agir conjuntamente. Nessa esteira, poder-se-ia adotar, ao mesmo tempo, uma salvaguarda de limitações tarifarias e quantitativas, preservando de forma ainda mais rígida a indústria interna do país importador.
Outro ponto característico das medidas de Salvaguardas, como forma de harmonização Fiscal entre nações, é o fato de tais medidas decorrerem de práticas ilegais na comercialização entre Estados.
Quando um país adota uma medida de salvaguarda, após o cumprimento de todos os requisitos previamente estipulados e da concordância da comunidade internacional, não significa que está acontecendo qualquer irregularidade na comercialização internacional. Muito pelo contrário.
As salvaguardas, diferente de outras medidas de proteção comercial – a exemplo do antidumping, são adotadas em uma situação de total regularidade comercial. Diga-se, o país exportador nenhum ilícito está cometendo em ter uma aceitação comercial alta no país importador.
Malgrado, mesmo sem existir irregularidade, por ter sua indústria local ameaçada ou em situação concreta de crise financeira, poderá o país importador adotar uma medida de salvaguarda, no corolário de restabelecer e fortificar a indústria nacional contra a forte concorrência internacional.
Tal realidade não se vê, todavia, quando da prática de ilícitos comerciais, como o dumping. Nesta modalidade ilícita, uma determinada empresa reduz sua margem de lucro, visando unicamente aniquilar seus concorrentes e emergir tranquilamente no mercado consumidor.
Em outras palavras, a medida antidumping, diversamente da salvaguarda, combate um ilícito comercial. À guisa de exemplo, é possível citar, na indústria brasileira, o dumping como o ato de multinacionais que reduzem drasticamente o valor de determinada linha de produção – diminuindo em certos casos até o próprio lucro da instituição – visando tão somente prospectar os consumidores das marcas concorrentes e, por conseguinte, dominar o mercado através de práticas comerciais vedadas pela Organização Mundial do Comércio – OMC.
Sobreleva registrar, em última análise, que, em regra, as medidas de Salvaguarda devem ter o prazo máximo de duração de 4 (quatro), período este tido por suficiente para o equilíbrio comercial entre as importações e a economia local.
O USO DAS SALVAGUARDAS NO MERCOSUL
O chamado MERCOSUL – Mercado Comum da América do Sul, nada mais é que uma União Aduaneira imperfeita, na qual um grupo de países (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), em comum acordo, começa a desenvolver um mecanismo comercial comum entre eles e outros países, com a adoção de medidas para o fortalecimento comercial e político nas nações celebrantes.
Visa o MERCOSUL também a integração entre os seus países, de forma a não só estabelecer diretrizes internas, mas também tem por corolário definir os parâmetros comerciais a serem estabelecido com terceiros.
E é justamente neste conjunto de relações comerciais internas e externas que se inserem as medidas de salvaguardas no âmbito do MERCOSUL.
Por meio do 19º Protocolo Adicional ao Acordo de Complementação Econômica, as Medidas de Salvaguardas foram implementadas entre os países não membros do mercado comum, determinando-se que o MERCOSUL terá a faculdade de utilizar das denominadas ¨Medidas de Salvaguardas¨ em face de nações que não se encontram dentro Sul-americano.
Sobreleva registrar que a utilização de Medidas de Salvaguardas, no âmbito do MERCOSUL, não é uma liberdade irrestrita dos países membros. Isto porque é papel da Comissão de Comércio do MERCOSUL decidir em definitivo pelo pleito deflagrado pelo país membro que esteja se sentindo prejudicado e/ ou ameaçado com determinada importação. Malgrado, quando as sobreditas medidas são pleiteadas em face de país não integrante do MERCOSUL, a decisão que concede a adoção da Salvaguarda será feita pelo órgão competente do país adotante.
Um famoso exemplo da utilização de Salvaguarda dentro do próprio bloco do MERCOSUL, foi o ocorrido no ano de 1999, ocasião na qual o Governo Argentino resolveu restringir as importações em detrimento ao setor têxtil brasileiro. Com efeito, o Brasil, em virtude da Salvaguarda em sua exportação têxtil ao parceiro de MERCOSUL, recebeu um quantitativo máximo que poderia ser importado pela Argentina. De tão famoso, tal exemplo de salvaguardas foi assunto debatido no âmbito da própria Organização Mundial do Comercio – OMC e no Tribunal Arbitral do MERCOSUL.
O Brasil questionou a aplicação da Medida de Salvaguarda alhures descrita por entender ter sido a mesma não compatível com as bases do mercado comum, razão pela qual, após inúmeros debates, os países mutuamente resolveram definitivamente extinguir a medida de salvaguardas incidentes da importação de produtos têxtis.
No que tange especificamente a adoção de Medidas de Salvaguardas, é de grande destaque o histórico existente entre o Brasil e a Argentina.
Não obstante o já explicitado caso sobre produtos têxteis, houve também um embate comercial de grande repercussão entre os referidos países integrantes do MERCOSUL, no tocante a fogões, refrigeradores, máquinas de lavar roupa e televisores oriundos da Zona Franca de Manaus.
Em meados de 2004, foi dito pelo Governo Argentino que, em defesa da indústria local, os supramencionados produtos exportados pelo deveriam ser importados pela Argentina com um imposto acima de 20%.
Desta forma, defendia o Governo Argentino que a indústria local, diretamente afetada pela crise econômica que assolou a economia argentina na época, deveria adotar esta modalidade de salvaguarda ( aumento tarifário) para dificultar a entrada de produtos brasileiros similares e concorrentes dos já fabricados no país.
A UTILIZAÇÃO DAS SALVAGUARDAS EM FACE DA república popular da china
Em virtude do vultoso crescimento industrial da China, a Organização Mundial do Comércio, no ano de 2001, pactuou um termo de inclusão que autorizou a diversos países da comunidade internacional lançar mão de medidas de salvaguardas para limitar a importação de inúmeros produtos Chineses.
Isto porque este pais asiático caracterizou-se na ultima década pela produção industrial em grande escala e a um custo baixo – tendo em vista a mão de obra quase sempre mal remunerada e em escalas desumanas de trabalho.
Com efeito, diversos Estados membros pertencentes a OMC passaram a aplicar Medidas de Salvaguardas notadamente aos objetos produzidos na China.
Existe, malgrado, uma maior possibilidade para o uso desta medida de harmonização fiscal sem a exigência de tantos requisitos. As exigências para aplicar salvaguardas à China são menores – basta que haja desorganização ou ameaça de desorganização de mercado que prejudique os produtores nacionais de produtos similares. As medidas de salvaguarda, nesse caso, só recaem sobre produtos de origem chinesa.
Não se trata, portanto, de uma defesa diretamente contra prática desleal, mas de mecanismo temporário de proteção de setores industriais domésticos frente à competitividade criada por instrumentos de uma economia que não é de mercado como a China.
As investigações para aplicação de medidas de salvaguarda transitória, a pedido do setor produtivo doméstico, serão conduzidas pelo Departamento de Defesa Comercial (DECOM) da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) que observará, necessariamente, as seguintes condições, nos termos do Decreto n° 5.556/05: existência de surto de importações de origem chinesa; ameaça ou desorganização de mercado doméstico; e anexo causal entre o surto de importação chinesa e a desorganização de Mercado, com prazo de oito meses, a partir da abertura do processo.
As medidas de salvaguarda transitória contra a China extinguem-se em 2013, quando, de acordo com o protocolo de adesão da China à OMC, essa possibilidade de defesa comercial extingue-se.
CONCLUSÃO
A convivência pacífica no comércio internacional, como se viu, depende sobremaneira de medidas como as da Salvaguarda, cuja implementação decorre de vários requisitos e tende a proteger a indústria local contra determinado tipo de importação.
Ademais, além da parte conceitual das Medidas de Salvaguardas, procurou também o presente trabalho mostrar na prática alguns exemplos de medidas de salvaguardas utilizadas em todo o planeta.
Demonstrou-se a aplicação de tais medidas em mercados como o MERCOSUL, a UNIAO EUROPEIA e a República Popular da China – centros de notória importância no mercado.
Desta forma, com a inclusão conceitual e prática do tema, buscou-se demonstrar a importância das medidas de salvaguardas e de como os países do globo podem lançar mão desse instrumento de harmonização fiscal.
REFERÊNCIAS
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Advogado da União (AGU), lotado no Ministério da Justiça e Segurança Pública. Mestre em Direito pelo Instituto de Direito Público de Brasília - IDP, Especialista em Direito Público (Constitucional, Administrativo e Tributário) pela Escola de Magistratura de Pernambuco - ESMAPE, Bacharel em Direito pela UNINASSAU e Graduado em Comunicação Social pela UNICAP.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTANA, Felipe Augusto Viégas Alves e. As salvaguardas como forma de harmonização fiscal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 20 jul 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47030/as-salvaguardas-como-forma-de-harmonizacao-fiscal. Acesso em: 22 nov 2024.
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