RESUMO: A homossexualidade humana existe desde o surgimento da humanidade. Na medida em que o homem se civilizou e aprendeu hábitos sociais que iam além das suas necessidades básicas, incorporando o sexo como fonte de prazer e não como simples meio de procriação. Com isto fez surgir novas formas de afeto, unindo pessoas em convivência duradoura independentemente de seus sexos, criando novos conceitos de família, obrigando os legisladores a fornecer ferramentas jurídicas ao judiciário, para que o mesmo pudesse agir em nome da pacificação social, dando vazão aos direitos surgidos com os novos hábitos. As uniões entre pessoas de mesmo sexo trouxeram para o arcabouço jurídico, direitos de convivência equiparado à união estável: Adoção, Pensão, Partilha de Bens e outros. E são estes direitos que o presente trabalho defende e pretende demonstrar de forma clara, permitindo ao leitor sem conhecimentos jurídicos, a sua compreensão.
Palavras-chave: Homossexualidade, União Estável, Direitos equiparados.
ABSTRACT: Human homosexuality has existed since humankind appeared. Insofar as man became civilized and learned social habits which went beyond his basic needs, he incorporated sex as a source of pleasure and not as a simple means of procreation. So he made possible the appearance of new forms of affection, uniting people in a lasting living together regardless of their sexes, creating new concepts of family, forcing the legislators to provide juridical tools
to judiciary, so that it can act on behalf of social pacification, giving vent to the rights which
appeared with the new habits. The unions between people of the same sex brought to the juridical framework the rights of living together equal to stable union: Adoption, Alimony, Distribution and others. And these are the rights which the present work defends and intends to demonstrate clearly, thus allowing the reader to understand it even without juridical knowledge.
Key words: Homosexuality, Stable Union, Equal Rights
1 INTRODUÇÃO
Da Efetividade do Direito como Instrumento de Dignidade Humana nas Uniões entre Iguais, mostra uma questão social e especialmente jurídica extremamente controversa.
Não obstante ao que representa este tema para a nossa sociedade, vale dizer que se trata de algo que atinge direta e intensamente milhões de brasileiros. Isto para não nos referirmos aos familiares dos homossexuais, que também sofrem as conseqüências de uma legislação ausente e de um Estado omisso.
O homem não apenas vive, mas convive. Divide com todos e qualquer um, as diferentes formas de pensamentos e atitudes, que é inerente a sua própria condição humana.
O respeito a essa diversidade de comportamentos e pensamentos foi o que nos levou a abordar tal tema, e a contribuição que possamos dar ao combate às diversas formas de discriminações e mesmo agressões físicas e morais aos homossexuais.
Este trabalho pretende trazer à luz da discussão racional os direitos inerentes à liberdade, igualdade, e o respeito à orientação sexual de qualquer cidadão ou cidadã.
Não se trata de analisar a qualidade da orientação sexual, mas sim de afirmar que tais orientações e uniões entre indivíduos de mesmo sexo sob o ponto de vista jurídico, são inteiramente legítimas e como tal devem ser protegidas pelo poder judiciário e pela sociedade civil organizada.
A Constituição Federal brasileira invoca princípios jurídicos e humanísticos, sendo que o princípio da liberdade é visto em muitos momentos da nossa Constituição Federal, logo no início do artigo 3° inciso I, que traz como objetivo fundamental da República Federativa, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Ainda no inciso IV do mesmo artigo, diz que promoverá o bem estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. A Constituição Federal continua a sua defesa em prol do cidadão no artigo 5° e seus incisos, bem como em muitos outros artigos deste mesmo livro.
Não estamos aqui inovando em absolutamente nada em defender o cidadão ou cidadã como sujeito de direitos, apenas reafirmando a sua necessária aplicação em favor destes, na medida que tenham orientação sexual diversa da maioria. A importância da discussão do tema não esta somente no nascimento de uma legislação infraconstitucional específica para as uniões entre pessoas de mesmo sexo, mas demonstrar de forma simples e clara, que os fundamentos para a defesa dos efeitos jurídicos para as parcerias homossexuais encontram-se encartados nos princípios da nossa Constituição Federal, principalmente assegurando a todos o direito à diferença.
Quanto aos procedimentos técnicos, esta pesquisa é predominantemente documental com o estudo de acervo doutrinário, jurisprudencial, além de livros, artigos e resoluções.
No capítulo primeiro deste trabalho, expusemos um panorama histórico ao longo dos tempos, demonstrando que o comportamento homossexual do ser humano, desde a antiguidade era tido como natural e também empregado como forma de ensinamento para os mais jovens.
No capítulo segundo, tratamos de abordar as diversas formas de família e suas conseqüências com a união estável e o casamento junto ao Direito Sucessório.
O capítulo terceiro se encarregou de mostrar como se comporta a adoção no Direito brasileiro e sua possibilidade para casais de mesmo sexo.
Por fim no capítulo quarto, cuidamos de trazer à discussão a questão mais importante deste trabalho, que é a anomia e conseqüente desproteção com o cidadão homossexual na sociedade e o que se tem feito em favor destes.
2 CAPÍTULO I
2.1 Aspectos Históricos da homossexualidade
Percorrer o histórico da homossexualidade e os seus significados ao longo dos tempos, remete-nos para a compreensão dos acontecimentos desde a era mais primitiva até a idade contemporânea.
O homem da antiguidade era nômade e guerreiro. Para garantir a sua sobrevivência precisava conquistar novos territórios. Nas batalhas, que empreendia para as novas conquistas territoriais, as mulheres dos vencidos eram tomadas pelos vencedores como troféus pelo bom desempenho dos soldados e muitas vezes, possuídas no próprio campo de batalha. Deixadas para trás, largadas à própria sorte, muitas destas mulheres engravidavam, tinham seus filhos completamente sozinhas e abandonadas, sem sequer saber quem era o pai daquela criança ou se ainda estava vivo ou morto.
O homem daquela época também praticava sexo com outros homens, explorando o simples prazer do sexo. Para isso se utilizava de adolescentes ou escravos mais jovens, que poderiam ser levados aos campos de batalha, para que servissem aos seus senhores nos momentos em que lhes faltassem as mulheres. (GEOCITIES, 2006).
O ato sexual entre duas pessoas de mesmo sexo, não tinha a conotação que tem na atualidade, nem era visto como relação homossexual ou mesmo pecaminosa. O sexo entre dois homens, era utilizado para o prazer e para o ensinamento da prática sexual aos mais jovens.
A idéia, e a palavra homossexual, só veio existir e ser usada, a partir do século XIX,(WIKIPEDIA, 2006) por uma necessidade de se classificar e defender um comportamento sexual, que mais uma vez sofria perseguições e condenações capitais.
2.2 Sociedades Primitivas
O relacionamento sexual entre os primatas do mesmo gênero, era considerada uma forma de pacificação para a rivalidade entre os machos jovens e os mais velhos, afirma o escritor britânico COLIN SPENCER, autor do livro “Homossexualidade: Uma História”.
Spencer (GEOCITIES, 2006) usa a palavra “gênero”, pois para ele a distinção entre os sexos é uma construção cultural, uma invenção da sociedade com forte indução da igreja, para justificar, avalizar ou reprovar determinada prática sexual.
Entre os primatas havia uma simulação do ato sexual sem penetração. As fêmeas se relacionavam entre si, como forma de exibição sexual com a finalidade de atrair os machos.
A homossexualidade entre os animais está relacionada à organização social do grupo, com os machos praticando o coito como forma de afirmação da hierarquia, determinando assim quem manda naquele grupo.
2.3 Antiguidade Oriental
No mundo muçulmano, entre os islâmicos, referem-se alguns escritos referindo-se às relações homossexuais, notadamente pela reunião de contos eróticos que formam a obra “Mil e uma Noites”. Mais tarde, os muçulmanos expurgariam por completo tal prática, condenando qualquer envolvimento entre pessoas de mesmo sexo.
No Oriente antigo, não se tem notícia de condenação às práticas homossexuais, inclusive com ênfase ao sexo oral. No Budismo, há referências a estas práticas até mesmo entre os Lamas do Tibete.
No século XVII, Saikakou Ebara, famoso escritor japonês, escreveu “Esplêndidas Histórias da Homossexualidade”, descrevendo hábitos sexuais dos samurais. Obra semelhante à “Mil e Uma Noites”, voltada à rotina do Extremo Oriente, mostrando a homossexualidade entre os samurais, que era estimulada e dita como abençoada, tratando o amor heterossexual como forma de enfraquecimento aos homens.
Os jovens rapazes amantes dos samurais, não podiam ter relações com outras pessoas que não seus mestres, até se tornarem homens quando então, cortavam o cabelo, mudavam de roupas e, por vezes, também mudavam de nome.
2.4 Antiguidade Clássica
O termo Antiguidade Clássica se refere a um longo período da História da Europa que se estende aproximadamente do século VIII a.C., com o surgimento da poesia grega de Homero, até a queda do Império Romano do ocidente no século V d.C., mais precisamente no ano 476. No eixo condutor desta época, que a diferencia de outras anteriores ou posteriores, estão os fatores culturais das suas civilizações mais marcantes, a Grécia e a Roma antiga.
Na Grécia antiga, segundo o helenista Inglês KENNETH J. DOVER (1994), autor do estudo “Homossexualidade Grega”, baseou sua análise das contradições do homossexualismo masculino nas representações de ânforas, “vasos ilustrados” que os Gregos eram mestres em produzir.
Dover demonstrou que a sociedade Grega era favorável ao relacionamento entre dois homens, aquele que penetrasse era visto como o mais viril, sem desonra a sua masculinidade. O homem adulto procurava os mais jovens, já que o sexo entre homens de mesma idade era algo escandaloso. O normal dessas relações entre pessoas de mesmo sexo, era acontecer entre um adulto e um adolescente.
Dentro do próprio exército os mais jovens serviam aos mais velhos e mais fortes, nessas relações homossexuais ao parceiro passivo não era permitido o prazer sexual, somente ao parceiro ativo, fato aceito moralmente e com incentivo para a busca de meninos que lhes servissem aos prazeres da carne.
No entanto, com o aparecimento dos primeiros sinais de puberdade não era mais aceitável que o menino continuasse na condição de passivo, esse então, preparava-se para entrar na condição de ativo se fosse o seu desejo.
Em Esparta, quando um adolescente estava em dificuldades com as autoridades locais, essas autoridades procuravam saber quem era o seu “erastes” ou seja o amante, reconhecendo-o como sendo o responsável pelo mesmo. A pederastia era parte da educação, sendo recomendado aos jovens da aristocracia que tivessem amantes do mesmo sexo.
Aos senhores, era dado a incumbência de ensinar a sexualidade aos mais jovens, hábito inclusive indicado pelas próprias famílias. Freqüente também em sociedades guerreiras, onde o guerreiro que se encontrava entre 18 e 25 anos, levava um adolescente e não uma mulher para os acampamentos de guerra, até porque, lá não se permitia a presença de mulheres.
O caráter institucional da homossexualidade na Grécia, ocupava uma posição de destaque na sociedade. O que chama a atenção, ao analisar a homossexualidade daquela época, é que grandes nomes de: políticos, filósofos, soldados, poetas, entre eles: Platão, Aristóteles, Sócrates, Alexandre “O Grande”, serem citados como adeptos das relações homossexuais ou tratarem, em algumas obras, com bastante receptividade. A Grécia foi a maior expressão da homossexualidade da civilização antiga, não só por ter sido o berço da pederastia, mas também por ter sido o centro da homossexualidade feminina enfatizada por guerreiras Amazonas (tribo feminina), que teriam habitado às margens de um rio na Ásia Menor.
A essas Amazonas era permitido manter relações sexuais com homens uma vez por ano, com a finalidade de procriarem. Com o nascimento dos filhos, eram separados os meninos para serem sacrificados ou enviados as tribos de seus pais, não podendo permanecer junto com as mães ou mesmo com as outras mulheres em hipótese alguma. A prática homossexual entre essas guerreiras era um ato religioso, fundamentado como necessidade para desenvolver nas mulheres as qualidades masculinas de independência e força tão necessárias, para a sua sobrevivência.
Em 612 a.C., nascia na ilha Lesbos, a poetisa Safos, que originaria os termos lesbianismo e safismo. E em seus versos glorificava o homossexualidade reconhecida e elogiada por ilustres personagens da época. Boa parte de sua obra foi destruída pelos cristãos, que acreditavam tratar-se de grave ameaça à moralidade da qual se sentiam guardiões.
Entre os Romanos, a homossexualidade não era reprovada, mas tinha que obedecer a regras. A sociedade se encarregava de separar rigidamente os escravos dos cidadãos e considerava inaceitável que um dos seus membros fosse passivo em uma relação sexual com um escravo que era mantido exclusivamente para esse fim.
Alguns dos Romanos mais ilustres como Nero, conhecido por suas façanhas e orgias sexuais, era aceito pela sociedade. Adriano “O Imperador”, cultivou uma grande paixão por seu escravo Antínuo, que, inconformado com a morte do mesmo, colocou-o na constelação dos deuses do império e ainda mandou construir a cidade de Antinuópolis para eternizar o escravo. Não satisfeito, mandou erguer em diversos lugares, dezenas de estátuas do seu amado. Sua história é narrada em “Memórias de Adriano”, escrito pela romancista francesa Marguerite Yourcenar. (WIKIPÉDIA, 2006).
Na China antiga, entre 960 e 1127 aceitava-se o lesbianismo, já que as muitas esposas conviviam em seus aposentos dando origem ao que era conhecido como efeito “harém”, mas a homossexualidade masculina era condenada.
Os Maias, na América Central consideravam a homossexualidade tanto feminina como masculina um fato natural. Os Incas e Astecas tinham conceito completamente diferente condenando e considerando passível de penalidades. A lei dos Astecas incluía a pena de morte para os homossexuais.
No Brasil, o relato a respeito das relações homossexuais remonta ao pré-descobrimento Português. Em 1576, o português Pedro Magalhães de Gândavo, relatava que os índios se entregavam ao vício da sodomia. A medicina indígena, muitas vezes exercida através do relacionamento do pajé com seus enfermos, incluía o intercurso anal como forma de levar a cura para os seus males. Manuel da Nóbrega que chegou ao Brasil em 1549, relata a prática indiscriminada de relações homossexuais em que os colonos tomavam os índios como suas mulheres.
A permissividade dos índios brasileiros logo se espalhou junto aos colonizadores do território, intensificando a prostituição na Bahia e Rio de Janeiro, chegando a ser considerada incontrolável, infiltrando-se inclusive no corpo eclesiástico, onde padres se envolviam com prostitutas e em menor número com índios e escravos negros, levando o Conde Suzanne em 1845, declarar que não havia nada mais desprezível do que um padre brasileiro.
2.5 Idade Média (Era Cristã)
A derrocada do Império Romano se deu no século V da Era Cristã. O cristianismo então, começou a ganhar força junto ao povo judeu dando origem aos cristãos. Os judeus pregavam regras rígidas em relação a sexualidade, tendo como base a defesa da família.
A moralidade do cristianismo passou a considerar os desejos carnais fonte do pecado, se tais desejos não fossem empregados somente com o objetivo de procriar.
Apoiada em sua crescente influência religiosa, a igreja católica, passou a exercer importante papel político na sociedade medieval, funcionou como órgão supranacional, conciliadora das elites dominantes, contornando os problemas das rivalidades internas da nobreza feudal, conquistou imensas riquezas materiais, tornando-se dona de aproximadamente um terço das áreas cultiváveis da Europa Ocidental, quando as terras significavam a principal base da riqueza do homem.
No plano espiritual, a igreja católica traçou um quadro em que a fé cristã era o pressuposto da própria vida, tendo como irrestritas e incondicionais as verdades reveladas por Deus (segundo a sua pregação), especialmente para a salvação do espírito do homem, usando máximas como: “toda verdade dita por quem quer que seja, somente é verdade, se for a verdade do espírito santo”, (WIKIPEDIA, 2006).
Assim qualquer investigação filosófica ou científica não poderia de modo algum, contrariar as verdades estabelecidas pela fé católica.
Segundo essa orientação, os filósofos não precisavam se dedicar à busca da verdade, pois ela já havia sido revelada por Deus. Os religiosos católicos desprezavam a filosofia grega ou qualquer contrariedade aos seus pensamentos e pregações, pois a consideravam como uma forma muito perigosa para a entrada do pensamento pagão e pecaminoso, bem como para o descaminho e a heresia.
Também surgiram pensadores cristãos que defendiam o conhecimento humano através da filosofia grega, utilizando-a a serviço do cristianismo, possibilitando o enfrentamento dos descrentes e hereges com as armas racionais da argumentação lógica, fazendo assim os descrentes aceitarem a imensidão dos mistérios divinos, somente acessíveis à aqueles que possuíam a verdadeira fé. (WIKIPEDIA, 2006)
Com o desenvolvimento do cristianismo surgiram algumas necessidades, como por exemplo, explicar seus preceitos às autoridades romanas e ao povo. Sabedores de que deveriam ser bastante convincentes, passaram a fazer um trabalho de pregação e conquista espiritual, nascendo assim muitos textos sobre a fé e a revelação cristã, escritos pelos grandes padres da igreja católica.
Santo Agostinho questionava a fé e a razão, afirmando que a fé nos faz crer em coisas que nem sempre entendemos pela razão, dizia que a fé ilumina os caminhos da razão. Afirmava que o homem tem uma inclinação natural para o mal, para os vícios e para o pecado, considerando o mal como um afastamento de Deus. Defendia a necessidade de uma intensa educação religiosa como forma de aproximação com Deus.
A busca de fé cristã e a razão, mantinha-se como problema a ser resolvido, retomando as idéias de Aristóteles, “sobre o ser e o saber”, Santo Tomás de Aquino filósofo escolástico, empreendeu uma sistematização da doutrina cristã, apoiada em parte na filosofia aristoliana, donde se pregava, que Deus é ato puro, é o ser, e quem não estiver nele não se salvará.
Com esse tipo de pregação, a igreja levou ao povo sua filosofia, com força e imposição nas pregações apoiadas pela nobreza, firmou-se ditando normas e comportamentos, abominando a homossexualidade, sendo esta uma das formas pecaminosas a serem perseguidas.
2.6 Idade Moderna
Período que vai de meados do século XV a fins do século XVIII, sendo a história européia sua principal referência, dando conta do surgimento de novo tempo histórico-social e comercial, com a transição do feudalismo para o capitalismo e a emergência da burguesia. Ocorre a centralização do poder através da monarquia absoluta, desenvolve-se o mercantilismo como forma de fortalecimento das economias, levando um impulso da navegação e a descoberta do Novo Mundo e conseqüente o estabelecimento de novas colônias.
Emergindo assim um novo tempo, surge um movimento de reforma que rompe com a concepção passiva do homem, entregue unicamente aos desígnios divinos e reconhece o trabalho como fonte da graça divina e a origem legítima da riqueza e da felicidade, além de conceber a razão humana como extensão do poder divino, o que coloca o homem em condições de pensar livremente e responsabilizar-se por seus atos.
Mais tarde, o desenvolvimento da ciência natural e a criação de novos métodos científicos, impulsionados pela confiança da razão humana e pelo questionamento da submissão da razão aos dogmas do cristianismo, faz com que o Estado perca parte de seu poder de dominação sobre o pensamento e influência sobre o homem.
O surgimento da imprensa, que possibilitou a impressão de textos clássicos romanos e gregos, contribuindo para uma modificação na mentalidade humanista renascentista e o desenvolvimento industrial, contribuíram para a modificação do modo de ser e viver em grande parte dos europeus. Nas artes, nas ciências e na filosofia surgiram novas idéias, concepções e valores, diminuindo a supervalorização da fé cristã, e do teocentrismo (Deus como centro de todas as coisas), levando a uma tendência social antropocêntrica (homem como centro), valorizando a obra humana, trazendo o desenvolvimento do racionalismo de uma filosofia laica (não religiosa), que se mostraram de modo otimista em relação a capacidade da razão de intervir no mundo, organizando a sociedade e aperfeiçoando a própria vida.
Não se pode esquecer também que nessa época, surgiu o Tribunal Católico Romano, conhecido como Tribunal de Inquisição. A inquisição foi um método ou forma de castigar os acusados de heresia e crimes contra a Igreja Católica, inclusive os homossexuais, geralmente as vítimas sofriam penas atrozes, através de instrumentos de tortura, a fim de que o sacrífio purificasse suas almas. Esse instituto criado pela igreja católica dizimou aproximadamente nove milhões de pessoas por diversas partes do mundo, sendo na sua maioria mulheres.( GEOCITIES, 2006).
2.7 Renascimento
Na Itália, o período renascentísta passava a atrair a atenção na área das artes e ciências, iniciando um período de maior aceitação e menores perseguições à aqueles que tinham como prática a homossexualidade. Personalidades conhecidas, já em seu tempo, ajudavam a reverter o quadro de intolerância, aderindo aos seus impulsos homossexuais, tais como, Leonardo da Vinci, Michelangelo e tantos outros.
Definitivamente, o Renascimento permitiria a emergência do homossexualismo na sociedade. Na Inglaterra dessa época, Shakespeare defendia a homossexualidade em versos, junto à aqueles que lhes eram mais próximos. Já Christofher Marlowe (1564- 1593), fundador do Teatro Elizabetano Inglês, questionava os valores morais na tragédia “Edward II”, rei apaixonado pelo seu amante Gaveston, sendo considerado o primeiro personagem homossexual de um drama teatral europeu. (GEOCITIES, 2006 ).
Na França, o rei Henrique III não escondia seus belos rapazes da sociedade. O próprio irmão de Luiz XVI, Felipe de Orléans era reconhecidamente homossexual.
2.8 Idade Contemporânea
A palavra homossexual, ao contrario do que se possa imaginar, só veio a ser criada em 1869, pelo húngaro Karl-Maria Benkert (WIKIPEDIA, 2006), que reuniu duas raízes linguísticas, homo (do grego) e sexual ( do latim). Seu objetivo inicial era combater a legislação vigente à época, que punia com prisão todos aqueles que realizavam práticas homossexuais. Benkert, para poder ajudar os homossexuais, afirmava que se tratava de indíviduos doentes e por serem pacientes psiquiátricos, não poderiam ser condenados, mas tratados.
O maior exemplo da história recente, sobre perseguições às minorias, aconteceu com a segunda guerra mundial no Terceiro Reich.. Homossexuais, judeus, ciganos e todos os que se encontravam em desvantagem numérica naquele momento da história, foram presos, torturados, castrados, muitos foram assassinados ou morreram nos campos de concentração.
Na mesma época, em 1948 nos Estados Unidos da América, Alfred Kinsey (GEOCITIES,2006)e sua equipe de trabalho publicaram um extenso estudo sobre o comportamento sexual do homem “branco” norte-americano, mais tarde veio também um estudo produzido pela mesma equipe, sobre a sexualidade da mulher.
Ambos os estudos basearam-se em dados colhidos através de questionários, preenchidos por milhares de voluntários e analisados estatisticamente. Com os dados, Kinsey, percebeu que não poderia dividir os humanos em apenas duas categorias, hetero e homo. Então criou um sistema que ficou conhecido mundialmente como “classificação Kinsey”. Essa classificação permitiu enquadrar os comportamentos sexuais em oito categorias, que vão desde os envolvimentos homossexuais mais simples, até as reações psicossexuais exclusivamente homossexuais.
Com os conhecimentos atuais, percebe-se incorreções no trabalho de Kinsey, no entanto não invalidam os seus resultados, nem lhe tiram o mérito de ter descoberto a, até então desconhecida população de pessoas não exlusivamente homossexual ou heterossexual nos Estados Unidos.
2.8.1 Delito
Um dos problemas mais complexos da dogmática penal está em apontar quais os elementos gerais que determinam quando e como um fato caracteriza expressamente um delito. Nos elementos indispensáveis ao conceito de delito estão: a ação (positiva ou negativa), a tipicidade, a antijuridicidade e a culpabilidade. Neste sentido, podemos afirmar que é um ato de violação a uma lei política ou moral. Nem todo comportamento humano constitui crime ou delito. Em face do princípio da reserva legal, é considerado crime todo ato paraticado pelo homem, tipificado em lei penal.
Até o ano de 1446 em Portugal, os homossexuais ainda eram jogados na fogueira, o que também aconteceu na Espanha até 1497, como forma de penalidade à sodomia.( DIPLOMATIQUE, 2006).
Assim os Astecas e os Incas, também puniam seus homossexuais com a morte. A Alemanha Nazista não foi diferente. Na Nicarágua, ainda hoje, criminaliza-se as relações sexuais mantidas entre pessoas de mesmo sexo em seu Código Penal, possibilitando a criminalização não apenas dos gays, mas de todos aqueles que defendem direitos em favor dos grupos de Gays, Lésbicas, Bissexuais eTransgêneros -GLBTs.
Na nossa história contemporânea, na África dos Camaroenses, apesar da Anistia Internacional considerar uma violação grave aos direitos humanos, qualquer aplicação de leis de sodomia, ainda se pune os homossexuais com prisão de seis meses a cinco anos e multas entre 30 e 300 euros moeda local.
No ordenamento jurídico brasileiro, o homossexualismo não esta caracterizado como delito. No Direito Penal, o princípio da lesividade indica que só deve ser aplicado, quando uma conduta lesiona um bem jurídico, não sendo suficiente que seja imoral ou pecaminoso. A Constituição Federal também protege as diferenças e condena a discriminação entre as pessoas. O artigo 5º caput, da C.F., indica “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se ao brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança e a propriedade, ....”.
I I - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;
2.8.2 Pecado
A Bíblia em algumas interpretações,condena o homossexualismo. Para firmar-se diante de seus seguidores, a igreja católica criou uma série de dogmas, entre eles, que o sexo só é aceitável como forma de procriação, feito dentro do casamento entre o homem e a mulher, sendo reprovável por completo o mero prazer sexual.
Portanto, a sodomia é tida como forma demoníaca e pervertida. Segundo o catecismo da igreja católica, lançado em 1992, tais relações são intrinsecamente “desordenadas, antinaturais e reprováveis”(PAPA JOÃO PAULO II, 1992).
Essa crença por parte de alguns membros das igrejas, tanto católica quanto evangélica, leva alguns dos seus seguidores a adotarem, como conseqüência, um comportamento homofóbico.
A igreja católica, ao longo de sua história adotou comportamentos ambíguos, conforme suas necessidades de momento. Quando avaliou, ser necessário para a implementação de seu dogmas, combater o homossexualismo como forma de valorização da família e da procriação, criou ali um marco para o surgimento de um grande preconceito por parte de seus seguidores em relação aos homossexuais. Assim, como as mulheres que também sofreram persseguições, quando atuavam como concubinas interferindo na constituição da família e desagregando a sociedade, segundo a visão da igreja.
A palavra pecado tem origem no vocábulo grego “imartia”, que significa afastar-se da meta. Será pecado ser homossexual?
Para a igreja, o pecado é a transgressão ou o afastamento de um preceito religioso, portanto, ao transgredi-lo, o homem ou a mulher torna-se um pecador. E a lascívia, que é a sensualidade, o prazer da carne, a luxúria, é condenável não só pela igreja católica, mas também por outras igrejas que consideram a busca do sexo, pelo simples prazer e fora do casamento, um de afastamento de Deus.
As igrejas em geral consideram a homossexualidade uma forma de pecado e pregam o seu combate. Em particular, a igreja católica classifica os atos considerados pecaminosos em três grupos: os venais, os capitais e os mortais.
Os venais, considerados mais leves e facilmente perdoados. Os capitais, como a luxúria, a inveja e a preguiça, dependendo da vontade de arrepender-se por parte de quem os praticou, poderá obter o perdão. Os pecados mortais são considerados os mais difícies de serem perdoados, podendo o pecador ser condenado ao fogo eterno. E desse grupo fazem parte aqueles que se utilizam da sodomia, praticantes do pecado mortal, profanadores do corpo do homem “templo sagrado de Deus”.
A igreja católica, através do Papa João Paulo II no século XXI, admite e pede perdão por seus erros cometidos através da história, por perseguições e maltratos, a judeus, negros, índios, protestantes, mulheres e pelos milhares de assassinatos cometidos durante a inquisição.
No entanto, o vaticano lança campanha mundial contra a legalização da união civil homossexual, com determinação de interferência direta nos parlamentares católicos de todos os países, para que se oponham publicamente a tais leis, demonstrando que os erros cometidos pela igreja no passado, não foram suficientemente trágicos, para fazer com que os dirigentes eclesiáticos se preocupassem tão somente em pregar a verdadeira palavra de Deus.
2.8.3 Doença
Os comportamentos sexuais e as próprias atitudes relacionadas a sexualidade variam nas diferentes culturas e dentro delas próprias. A exemplo da masturbação, a qual era considerada outrora uma perversão e causa de doença mental. É atualmente reconhecida como uma atividade sexual normal e recomendada por terapeutas sexuais, que indicam a masturbação para as mulheres, como forma de conhecer melhor seu corpo e adquirir uma vida sexual mais saudável.
De forma similar, a homossexualidade antes considerada como anormal pela comunidade médica, hoje não é mais considerada uma doença e é amplamente reconhecida como uma orientação sexual e que se encontra presente no indivíduo desde a mais tenra idade. Os homossexuais percebem que tem atração sexual por um indivíduo do mesmo sexo, assim como o heterossexual se vê atraído por alguém do sexo oposto, sem que para isso tenham que planejar tal sentimento.
Muito se especula a respeito da homossexualidade, mas ainda não há estudos conclusivos e definitivos por parte da ciência médica, justificando cientificamente o que determina a heterossexualidade ou homossexualidade de uma pessoa. O Conselho Internacional de Doenças – CIC, no art. 302, já em 1995, fazia mudanças importantes, alterando o emprego do sufixo “ismo”, que significa doença, para o sufixo “dade”, que significa modo de ser. Seguindo este mesmo caminho, o Conselho Federal de Psicologia editou, em 1999, normatização, abolindo por completo qualquer rotulação e mesmo a posibilidade de tratamento de homossexuais em razão de suas orientações sexuais.
3 CAPÍTULO II
3.1 Família
Pensar na formação da sociedade, é pensar primeiramente na família. A formação famíliar é o início, é a célula mater da sociedade, dar-lhe consolidação e a desenvolve, faz com que os grupos interajam. Apesar de o Direito Civil, em alguns momentos, restringir a definição de família aos membros unidos pelo matrimônio e os de parentescos, também protege e alcança os que convivem em uniões fora do casamento, filhos consangüíneos, monoparentais, afins e os civis(adotivos).
É fácil perceber que não há um conceito absoluto de família, Sílvio Venosa (VENOSA, 2003, p.2), tráz essa idéia também em seu livro VI de Direito Civil, na parte de introdução ao Direito de Família, demonstrando que o conceito de família para os organismos sociais e jurídicos se altera no curso dos tempos, adaptando-se às modificações sociais e que a família deve ser examinada primordialmente, sob o ponto de vista sociológico.
A igreja católica sabedora da importância da formação da família, para a implementação e manutenção das suas pregações e dogmas, criou um cerimonial “ o casamento”, que é usado no mundo inteiro para justificar as uniões entre o homem e a mulher, com o objetivo de dar exclusividade à formação monogâmica da família.
A família brasileira que surgiu sob os princípios herdados da Roma Antiga, nos quais a autoridade do pai era absoluta, sobre os seus filhos e a sua esposa, inclui também os servos, os netos dos filhos masculinos, as mulheres casadas com os seus descendentes e logicamente os seus escravos.
Atualmente, resta pouco desta autoridade absoluta, a responsabilidade esta dividida entre o homem e a mulher e não raras vezes, a mulher assume sozinha a responsabilide de manutenção e condução da família.
Um dos conceitos jurídicos de família corresponde a um grupo de pessoas ligadas entre si pelo nexo de parentesco incluindo-se aí, os ascendentes, descentes e colaterais de uma linhagem, juntamente com os ascendentes e descendentes e colaterais do cônjuge, que chamamos de parentes afins.
A Constituição Federal também nos traz um conceito no art. 226 § 4°, prevendo como entidade familiar, a formação com qualquer dos pais e seus filhos, que vivam sob o poder familiar.
Recentemente, a sociedade Brasileira passou a admitir, o que estamos chamando de família monoparental ou paternidade monoparental, para abrigar aqueles que são adotados por uma única pessoa, ou que vivam sob o manto de um dos companheiros ou companheiras sem a participação do outro.
A ciência médica, evoluindo na direção da reprodução e fecundação humana, permitiu que qualquer pessoa possa realizar o sonho de ter filhos e formar uma família no sentido mais amplo e original possível, independentemente de sua orientação sexual, e nesse sentido, com a participação efetiva da jurisprudência, que viu maior aceitabilidade das famílias homoafetivas por parte da sociedade brasileira, dando vínculo jurídico paterno-filial para ambos os genitores, sejam dois pais ou duas mães.
A legitimidade dos filhos havidos fora do casamento e a facilitação para as adoções são fatores que contribuiram para a alteração do conceito de família, fazendo-a existir mesmo sem a presença dos dogmas católicos e tradicionais.
Hoje, tem-se a família de fato. Aquela que se origina à margem do matrimônio, ligada unicamente pelo afeto e vontade de permanecer como uma formação familiar.
Por orientação da igreja católica, durante muito tempo, os nossos legisladores tinham no casamento a única via para a formação familiar, negando efeitos jurídicos a qualquer outra que não fosse a indicada pela igreja tradicionalista.
Atualmente, a assimilação legal das uniões mantidas sem a regularização oficial do casamento, culminou com a aprovação da Lei 9.278 de 10 de Maio de 1996, que regulou o § 3º do art. 226 da Constituição Federal, que determina “para efeito da proteção do Estado, o reconhecimento da União Estável entre homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
Também a Lei 10.406, de 10 de Janeiro de 2002, que instituiu o Código Civil, reconheceu como entidade familiar a União Estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituir família.
Outras mudanças não menos importantes, também foram trazidas pela modernização das decisões judiciais. O homem passou a ter a seu favor a guarda de seus filhos, tanto porque a mulher abdicou dessa tarefa ou mesmo porque o homem demonstrou estar melhor condicionado para o feito, fazendo desse conjunto de fatores uma atualização e modernização do conceito de família, dando causa a grandes benefícios para toda a sociedade civil brasileira.
3.2 União de Pessoas de Mesmo Sexo, como Formação Familiar.
A união de pessoas homossexuais há muito é encontrada nas mais diversas sociedades, de forma aberta ou velada. Em algumas, vem sendo considerada como fato natural e em outras como transgressão a natureza humana e a moral.
A organização de movimentos pró homossexuais, combatendo o preconceito e a discriminação, reivindicando a proteção legal para as uniões entre pessoas de mesmo sexo, “casamento gay” e o direito à adoção por casais homossexuais, obrigou a formação de um novo panorama social mundial.
O primeiro país, a permitir a união legal entre pessoas de mesmo sexo, foi a Dinamarca com um projeto de lei onde havia previsão de adoção de crianças pelos casais homossexuais, porém essa previsão foi vetada como medida para aprovação do restante da lei.
Hoje já são mais de dezessete países que permitem as uniões civis entre pessoas do mesmo sexo, a maioria deles, sem a permissão explícita de adoção de crianças. Esse comportamento no entanto demonstra que o preconceito ainda persiste e não está localizado somente nas uniões de pessoas de mesmo sexo, mas na falsa impressão de que tais pessoas não podem criar e educar uma criança.
No Brasil a primeira autoridade política que concretamente trabalhou um projeto de lei, tentando aprová-lo na Câmara Federal, foi a então deputada federal Marta Suplicy, (PROJETO DE LEI, 1.151/95).
A convivência de pessoas do mesmo sexo com ânimo de permanência é um fato social inegável e repercute no campo do direito. Podem ser citadas as repercussões na área da previdência, da família, da sucessão e todos os negócios jurídicos decorrentes dessa união. A mais polêmica, como conseqüência jurídica dessa convivência pública e permanente é aquela que a jurisprudência vem acatando e definindo como entidade familiar, expurgando todas as formas de preconceito, reconhecendo a união estável também entre pessoas de mesmo sexo, equiparando direitos próprios das uniões heterossexuais às uniões homossexuais.
Muitas têm sido as decisões judiciais nesse sentido nos mais diversos Estados brasileiros, como podemos citar: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Espírito Santo, e alguns outros.
A discussão sobre a natureza jurídica da convivência estável, duradoura, pública, entre pessoas de mesmo sexo e sua semelhança com a união estável ou o casamento heterossexual é infindável, por parte das autoridades judiciárias que precisam proferir sentenças do casos em concreto.
De um lado, temos a Constituição Federal no art. 226 §3°, confere a família especial proteção do Estado, e no § 4°, dá à união estável entre o homem e a mulher o caráter familiar e protetivo, excluindo por completo qualquer outra forma de convivência com feições familiares.
No entanto, a exclusão de direitos para uma formação familiar diversa da explicitada no § 4° do art. 226 da Constituição Federal, coloca em xeque valores Constitucionais, das garantias e direitos fundamentais do homem, como por exemplo, o caput do art. 3°, inciso IV da Constituição Federal, que traz como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, a promoção do bem estar de todos, livre de preconceitos de raça, cor, sexo e idade.
O art. 5° da Constituição Federal, que trata da igualdade de todos perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garante aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, que se alicerça no princípio da isonomia. Tratando a todos com paridade, não podendo a lei ou o seu aplicador, injustificadamente, deixar de observar para os casos em que se fizer necessário, o tratamento desigual para os desiguais.
O inciso I, também do art. 5° da Constituição Federal do Brasil, diz que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, no inciso VIII, nos dá conta de que ninguém será privado de direitos por motivos de crença religiosa, de convicção filosófica ou política. Ainda no inciso XLI do mesmo artigo temse, que a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.
O Supremo Tribunal Federal, já declarou que é impossível interpretar o arcabouço normativo, diverso do que preceitua o art. 3° inciso IV da nossa Constituição Federal, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”.
Também o Superior Tribunal de Justiça considerou discriminatório excluir, da proteção do Estado, aqueles que vivem relações homoafetivas, reconhecendo o direito ao recebimento de pensão entre companheiros de mesmo sexo.
A Lei 8.112/90 “Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União”, no art. 217, inciso I, alínea c, inclui como benefiário de pensão: “ o companheiro ou companheira designado, que comprove união estável como entidade familiar”, considerando que a proteção da lei, independe da orientação sexual do servidor público, que contribui para o regime previdenciário como qualquer outro, não cabendo exclusão de direito que justifique a não contemplação a companheiro de mesmo sexo
A Previdência Social concede benefício através do INSS – Instituto Nacional do Seguro Social, aos companheiros ou companheiras homossexuais, como dependentes dos segurados do Regime Geral de Previdência Social, bastando para tanto a comprovação da união pública e duradoura.
Desta forma, o judiciário vem reconhecendo os direitos atribuídos aos homossexuais que convivem em uniões públicas e estáveis, com decisões divorciadas das tradições religiosas, ampliando o conceito jurídico de família, incluindo-os no abrigo da lei, para fins de proteção do Estado.
O judiciário também já admite pedido de pensão de alimentos por companheiro homossexual, inclusão em plano de saúde, direito a permanecer no imóvel em que viviam antes da morte do companheiro ou companheira, enfim, dando dignidade as pessoas que viviam relações amor, e em convívio pacífico e ordeiro com a sociedade.
3.3 União Estável
Nos ensina César Fiuza, que a união estável é a convivência, sob o mesmo teto ou não, entre o homem e a mulher, não ligados entre si pelo casamento, com convivência idêntica ao do casamento, ou seja, com a continuidade, a constância da relação, e a publicidade e que não estejam sob os impedimentos dirimentes públicos, como: incesto, bigamia e homicídio. ( FIUZA, 2003, p.824).
Em 1916, a sociedade brasileira, ainda não estava preparada para reconhecer como um fato social natural, a união entre os casais de forma mais livre e aberta, e não admitia que um homem e uma mulher se unissem sem as bênçãos da igreja, com o ritual religioso para o casamento e com aprovação e verificação legal do Estado.
Daí, o legislador do Código Civil daquela época ignorou a família ilegítima, apenas dando ínfimo valor ao concubinato, mas desprezando qualquer direito às uniões de fato.
Esta união entre homem e a mulher com “status” de casamento, instituiu-se na Constituição Federal de 1988, com o art. 226 § 3° “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. A união estável é a convivência do homem e da mulher, sob o mesmo teto ou não, assim entende a súmula 382 do Supremo Tribunal Federal: “A vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, (como se houvesse casamento), não é indispensável à caracterização do concubinato”, portanto a união estável pode acontecer sem que haja a coabitação e a vida idêntica ao do casamento.
O Direito brasileiro conceitua fato jurídico como qualquer acontecimento que gere conseqüência jurídica. A união estável é um fato jurídico, previsto na lei 9.278/96, que a regulamentou, estabelecendo parâmetros para que a união possa ser entendida como entidade familiar. E são exigidos quatro requisitos fundamentais: que a convivência seja duradoura, contínua, pública e que a união tenha o objetivo de constituir família.
A convivência duradoura não deixa dúvidas quanto à intenção por parte dos envolvidos, de manter um relacionamento forte e comprometido. A publicidade traz a idéia de que não se trata de uma aventura furtiva. A continuidade leva aos efeitos jurídicos da lei, ao contrário da intermitência do relacionamento, que não leva à segurança jurídica.
No ânimo de constituir família, a lei não exige que se tenha filhos dentro dos relacionamentos amorosos e muito menos que os filhos, se por ventura existirem, sejam biológicos.
O legislador provavelmente tenha tentado passar para os casais que se encontrem nessa condição, a idéia de um comprometimento moral com a sociedade e a família. Além de reconhecer a união estável como entidade familiar, a lei também traz aos conviventes a obrigação de respeito e consideração mútuos, a assistência moral e material recíprocas, além da guarda, sustento e educação dos filhos comuns.
As uniões de amor paulatinamente deixam de ser somente aquelas realizadas através do matrimônio com o ritual religioso que caracteriza de forma tão marcante a união de um homem e uma mulher, para a formação familiar.
A diversidade de sexo não é condição para a percepção conceitual de família. O que une as pessoas em torno do fogo familiar é o afeto, que une também as pessoas de mesmo sexo, na busca da constituição da família, seja apenas com o casal, seja com a prole biológica ou civil. A união estável homossexual está claramente evidenciada e aceita pela sociedade civil, ou pelo menos não é rejeitada. Elas vêm acontecendo de forma pacífica, principalmente nas maiores cidades brasileiras. Cabe então aos magistrados, advogados, doutrinadores e legisladores trabalharem em favor da regulamentação deste novo fenômeno social.
3.4 Casamento
Segundo Maria Helena Diniz, o casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher, livres, que se unem, segundo as formalidades legais, para obter o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica, e a constituição de família. (DINIZ 2003. p.006).
Já, César Fiúza em seu livro de Direito Civil curso completo (2002, p.798), ao menos faz referência a um ponto importantíssimo do Código Civil Brasileiro, dizendo “Apesar de o Código Civil não mencionar explicitamente, que o casamento deve ser contraído entre homem e mulher, isto é, entre pessoas de sexo genital oposto...”, se referindo ao texto de lei do artigo 1.514 do Código Civil, “ O casamento se realiza no momento em que o homem e a mulher manifestam, perante o juiz, a sua vontade de estabelecer vínculo conjugal, e o juiz os declara casados”.
Fica claro, que o texto de lei deixou a desejar quando, não disse que o casamento se dava “entre” o homem e a mulher.
Assim este instituto, vem sofrendo modificações literais e práticas, na medida em que a sociedade evolui e adiciona novos comportamentos em seu meio. O casamento já foi considerado indissolúvel, hoje já permite sua dissolução e um novo casamento, contrariando orientação da igreja católica.
Mesmo com essas modificações, continua sendo o objeto central do Direito de Família. Antes da existência do divórcio, o casamento era um sacramento e também um contrato decorrente da natureza humana, onde os direitos e deveres, não podiam ser alterados pelas partes. Ainda hoje a Igreja prega que, o que Deus uniu o homem não separa, deixando claro que não concorda com as novas regras jurídicas.
Para o Direito Civil Brasileiro, o casamento entre o homem e a mulher, é um negócio jurídico bilateral, um acordo de vontades que busca a segurança jurídica para os pares e sua prole. O Código Civil detalha todos os procedimentos legais e cumprimentos de deveres dos nubentes para se chegar à realização de um casamento entre duas pessoas inclusive com: dia, hora, e local designados pela autoridade que houver de presidir o ato solene. Cuida dos efeitos de ordem pessoal e patrimonial e dá especial atenção ao regime de bens a ser adotado para o pacto antenupcial.
É interessante salientar que no capítulo I das disposições gerais, “Do Direito De Família do C.C.B”., a partir do art. 1.511, que trata do casamento civil, não há qualquer aspecto proibitivo da realização do casamento civil, entre pessoas de mesmo sexo.
O legislador certo de que se tratava de um dispositivo legal envolvendo pessoas de sexos opostos, não fez referências à proibição para as pessoas de mesmo sexo, impondo um rol de situações que torna o casamento nulo ou anulável e com algum tipo de sanção, para o caso de descumprimento das formalidades legais tais como:
No Capítulo III “Dos Impedimentos”, que traduz legitimação para o casamento e que não se confunde com capacidade para contrair o matrimônio, assim o C.C.B., diz claramente:
Art. 1.521 do C.C.B. Não podem casar.
I – Os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
II – Os afins em linha reta;
II – O adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem foi do adotante;
IV – Os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau inclusive;
V – O adotado com o filho do adotante;
VI – As pessoas casadas;
VII – O cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra seu consorte.
No Capítulo IV Das Causas Suspensivas, no C.C.B., proíbe especificamente: (2002. p.145).
Art. 1.523 do C.C.B. Não devem casar.
I – O viúvo ou a viúva que tiver filho do cônjuge falecido, enquanto não fizer inventário dos bens do casal e der partilha aos herdeiros;
II – A viúva, ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo ou ter sido anulado, até dez meses depois do começo da viuvez, ou da dissolução da sociedade conjugal;
III – O divorciado, enquanto não tiver sido homologada ou decidida a partilha dos bens do casal;
IV – O tutor ou o curador e os seus descendentes, ascendentes, irmãos, cunhados ou sobrinhos, com a pessoa tutelada ou curatelada, enquanto não cessar a tutela ou curatela, e não estiverem saldadas as respectivas contas. (2002 p.145)
Fácil observar que o Código Civil Brasileiro não traz qualquer impedimento ou suspensão para a realização do casamento entre pessoas de mesmo sexo. Poucos são os autores de Direito Civil, que se encorajam em afirmar, que não há impedimento explicito, positivado, colocado em lei, que proíba a união civil entre pessoas de mesmo sexo, como é o caso, do autor César Fiúza, em seu livro Direito Civil – Curso Completo,( 2003 p.798) que faz esta afirma com muita clareza. Naturalmente, o que os impede de ter suas uniões civis, realizadas pela forma legal como qualquer cidadão, é a lei suprema do preconceito. Para os casais formados por homem e mulher, os requisitos enumerados pela lei, devem ser observados tanto pelos nubentes, quanto pelo oficial do registro civil, e até mesmo por outros interessados, que poderão prestar informações sobre os vícios que couberem e que de alguma forma possam dar causa a impedimento ou suspensão do casamento civil. Por último, é necessário que cada qual confirme de viva voz, o propósito de casamento por livre e espontânea vontade, ou firme do mesmo modo, em procuração.
A solenidade e formalidade do casamento, não se compara com a liberdade e informalidade da união estável, que se dá com a simples vontade de duas pessoas de viverem juntas de forma pública, contínua e duradoura.
3.5 Direito Sucessório
De acordo com o conceito de Sílvio de Salvo Venosa, suceder é substituir, tomar o lugar de outrem no campo dos fenômenos jurídicos. (VENOSA 2006). Na Sucessão existe uma substituição do titular de um direito, que tem por objeto, a transmissão de direitos e de patrimônio de uma pessoa que morre para outra, e se dá em favor dos herdeiros legítimos ou testamentários. O testador poderá reservar até a metade de seu patrimônio para distribuí-lo na forma de testamento, que é negócio jurídico, gratuito, solene, revogável e que somente produzirá efeitos, com morte do testador.
Legítimos são os herdeiros nomeados na lei, não precisam constar de testamento, são herdeiros independentemente da vontade do testador, conforme preconiza o C.C.B., no seu art. 1.829, “a sucessão legítima defere-se na ordem seguinte”:
I – Aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens, ou se no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares.
II – Aos ascendentes, em concorrência com o cônjuge.
III - Ao cônjuge sobrevivente.
IV – Aos colaterais.
A legítima se dá com o cônjuge (casado) e os herdeiros da linha reta ou colaterais, e inclui ainda o Município, para os casos de herança vacante. A eles se acrescenta o companheiro ou companheira sobrevivente da união estável, com previsão legal da Lei 8.971/94, para homem e mulher.
Não se inclui nesta categoria, o companheiro ou companheira homossexual, para uniões entre pessoas de mesmo sexo, por não estarem protegidos pela citada lei e pela própria Constituição Federal Brasileira, conforme prescreve o art. 226 § 3°.
Cabe ao companheiro ou companheira homossexual direito à herança, somente se estiver contemplado no testamento, podendo abranger a totalidade da herança ou cinqüenta por cento, se houver outros herdeiros necessários.
Não se enquadrando em nenhuma das hipóteses mencionadas, teria ainda o companheiro ou companheira homossexual, direito à condição de meeiro, se comprovada sua participação na aquisição onerosa do patrimônio. Fica demonstrado, dessa forma, que as uniões homoafetivas ficaram totalmente desprotegidas das sucessões hereditárias.
Novos conceitos jurídicos de ”família”, o advento da Constituição Federal Brasileira de 1988, o respeito às diferenças e o combate às discriminações, a compreensão da sociedade em defesa das minorias homossexuais, devem levar ao nascimento de leis que verdadeiramente tragam justiça a quem somente deseja respeito aos seus direitos, privacidade e liberdade sexual.
3.6 Direito Obrigacional nas Uniões Homossexuais.
Sílvio de Salvo Venosa, ensina que a relação jurídica se estabelece justamente em função da escala de valores do ser humano na sociedade. Em nossa existência, somos estimulados a praticar ações em razão dos valores que outorgamos às necessidades da vida: trabalhamos, compramos, vendemos, alugamos contraímos matrimônio, etc. (VENOSA, 2003, p.73).
O ponto central do Direito das Obrigações está, no credor em exigir o cumprimento da prestação do devedor. Para tanto se faz necessário que haja um vínculo obrigacional entre ambos, dando luz ao direito pretendido, e neste contexto o Direito Privado é o que regula as relações entre as pessoas físicas e jurídicas, e inclui os negócios que acontecem no âmbito da família.
Assim, também o Direito de Família alcança a tutela das obrigações nas relações econômicas, pessoais e patrimoniais, e nas relações entre pais e filhos, vínculo de parentescos e por fim a dissolução da família. Abrange a união entre pessoas do mesmo sexo, que apesar de não ter o escopo de constituir família, recebe abrigo jurídico do Direito de Família e do Direito das Obrigações. Daí, conforme a corrente das autoridades judiciárias, as uniões entre pessoas do mesmo sexo, ora são atendidas pelo Direito das Obrigações ora pelo Direito de Família. Estas uniões que para o Direito de Família não podem existir pela via do casamento, não por um impedimento legal, como vimos anteriormente, mas tão somente por impedimentos de ordem moral e religiosa.
Estas relações humanas encontram-se num momento curioso da história jurídica brasileira, da completa desatenção e descaso de outrora, para decisões de adoção para casais homossexuais, participação no patrimônio do de cujus, pensão do INSS por morte do companheiro, direito a participação no plano de assistência médica, reconhecimento das uniões através de contrato de convivência efetuado nos Cartórios Notariais, equivalendo à união estável dos casais heterossexuais.
O art.1.723 do C.C.B., é específico, determinando que a união estável se dá entre o homem e a mulher, nas formas da lei. (2002, p.165), oferecendo assim cobertura jurídica apenas aos casais heterossexuais.
Daí, as uniões, entre pessoas de mesmo sexo, precisarem se socorrer ao Direito Obrigacional, que liga duas ou mais pessoas a uma obrigação contratual, reconhecendo-se em princípio, uma sociedade de fato entre pessoas que mutuamente se obrigam com esforços ou recursos em torno de um objetivo. Trata de direitos de índole patrimonial, portando uma lei fria, longe de atender as necessidades de pessoas que se unem com sentimento de amor e que organizam suas vidas em conjunto, exercem todos os negócios jurídicos decorrentes desta união, permitindo que comprem de forma conjunta bens móveis e imóveis, inclusive adotem filhos de forma comum ou separadamente.
Há verdadeiramente necessidade de se criar uma lei específica, para atender as pessoas que estão fora do abrigo do Código Civil Brasileiro, ou de lei específica que às socorra. Esta lacuna faz com que o judiciário haja por forma oblíqua usando a lei 9.278/96, que regulou a união estável entre pessoas de sexo diferentes.
Independentemente do que se chama “opção sexual”, o cidadão homossexual é sujeito de direitos e obrigações como qualquer outro.
O instituto da Sociedade de Fato, presente no Código Civil Brasileiro, preserva parte do patrimônio amealhado durante a existência das uniões homoafetivas, mas não é o bastante. Não atende os casos em que um dos parceiros é o provedor financeiro e outro cuida dos afazeres domésticos, como acontece com muitos casais heterossexuais. Para estes casais, quando de uma eventual separação, a lei cuida de dar total abrigo, seja para providenciar uma pensão temporária, seja para dividir o patrimônio conforme a opção do regime de casamento.
A falta de uma legislação, que atenda as uniões homoafetivas para esse fim, faz com que haja situações constrangedoras e traumáticas para as pessoas envolvidas, já que a dissolução das uniões se dá por vários motivos, inclusive pela morte de um dos parceiros. Quando isso acontece, muitas vezes, a família do falecido não aceita que o patrimônio deixado fique com o companheiro sobrevivente, não observando que a construção do patrimônio se deu com a participação de ambos, independentemente de quem tenha feito o aporte financeiro.
Como já mencionamos anteriormente, a sucessão se dá em favor de herdeiros legítimos ou testamentários. Se o companheiro sobrevivente não está em testamento, e não é aquele que fez o aporte financeiro para a construção do patrimônio do casal, ficará ao desabrigo da lei, dependendo de favores de terceiros.
4.1 Adoção
Conforme Maria Helena Diniz conceitua, a adoção é o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para a sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. (DINIZ, 2003, p.1108).
A adoção de crianças e adolescentes é tratada, em nosso Código Civil e na Lei 8.069/90 -ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente, em ambas, a adoção é prevista para pessoas maiores de 18 anos, que tenham no mínimo 16 anos de diferença com o adotado, que seja casal casado ou separado, ou mesmo solteiro, sempre referindo-se a homem ou mulher, conjunta ou separadamente.
Os orfanatos estão lotados de crianças abandonadas, privadas de estímulos e vínculos afetivos, e de atenção emocional. As que se encontram nesses depósitos, são crianças carentes de conhecimento, de integração social e, via de regra, apresentam problemas de linguagem e aprendizado, em razão dos graves traumas psicológicos sofridos.
Muitas destas crianças são recusadas pelos seus pais, porque foram geradas em uma situação não planejada. Outras são filhos de prostitutas, drogados, mendigos ou ainda de pai ou mãe, que se encontram presos. Algumas, sem qualquer outro amparo, vêem-se jogadas às ruas, conhecendo desde logo a fome e a desnutrição, a falta de carinho e o desamparo. São mal tratadas, estupradas, corrompidas, sem qualquer tipo de oportunidade na vida.
A lei não permite que adoções sejam realizadas por duas pessoas do mesmo sexo, para figurarem como pais ou mães de um menor, para acolherem, educarem, dar carinho, proteção, atenção, respeito e dignidade.
As alegações são as mais variadas, que vão, desde a dúvida quanto ao desenvolvimento saudável da criança, até a afirmação de que o adotado possa se tornar homossexual pelo simples fato da convivência, como se a homossexualidade fosse algo contagioso.
Não raro também são os casos, onde um dos parceiros ou parceiras é pai ou mãe natural, e como não há na lei restrição quanto à orientação sexual, mas sim quanto a adoção conjunta por duas pessoas de mesmo sexo, os homossexuais têm requerido individualmente e obtido a adoção de crianças.
O drama do abandono de crianças e adolescentes, o amadurecimento da sociedade brasileira e o avanço visionário do judiciário vêm oferecendo solução para os casos de requerimento de adoção conjunta, usando a Constituição brasileira e a interpretação extensiva da lei 8.971/94 – Da União Estável entre homem e mulher, repassando o direito aos casais de mesmo sexo.
Já temos decisões favoráveis de adoção por casais homossexuais, nos Estados do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro, São Paulo.
O processo de n° 700138015922005 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, teve negada por unanimidade, a apelação movida pelo Ministério Público, com os seguintes fundamentos:
APELAÇÃO CÍVEL. ADOÇÃO. CASAL FORMADO POR DUAS PESSOAS DE MESMO SEXO. POSSIBILIDADE. Reconhecida como entidade familiar, merecedora da proteção estatal, a união formada por pessoas do mesmo sexo, com características de duração, publicidade, continuidade e intenção de constituir família, decorrência inafastável é a possibilidade de que seus componentes possam adotar. Os estudos especializados não apontam qualquer inconveniente em que as crianças sejam adotadas por casais homossexuais, mais importando a qualidade do vínculo e do afeto que permeia o meio familiar em que serão inseridas e que as liga aos seus cuidadores. É hora de abandonar de vez preconceitos e atitudes hipócritas desprovidas de base científica, adotando-se uma postura de firme defesa da absoluta prioridade que constitucionalmente é assegurada aos direitos das crianças e dos adolescentes (art. 227 da Constituição federal). Caso em que o laudo especializado comprova o saudável vínculo existente entre as crianças e as adotantes.
A Desª. Maria Berenice Dias diz em seu voto que as crianças desde que nasceram, foram entregues pela mãe biológica ao casal de lésbicas e por elas são criadas. E como forma de criarem um vínculo jurídico, para assumirem a responsabilidade decorrente da maternidade, fizeram uso do que a lei permite, a adoção por pessoa solteira e uma das mulheres assim figurou como mãe das crianças.
No entanto as crianças eram criadas por ambas as mulheres, reconhecidas como mães pelas crianças, que assim as chamavam, estabelecendo-se com as “mães”, vínculos de filiação. Ao final de seu voto, a Desª. Maria Berenice Dias completa afirmando o que é muito conhecido no meio jurídico; que a falta de lei não é motivo para a justiça deixar de julgar ou de fazer justiça. A omissão do legislador não serve de fundamento para deixar de reconhecer a existência de direitos, e que a justiça precisa estar rente a realidade da vida.
A Constituição Federal, em seu art. 5° caput, assegura que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza e o inciso II, que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
O Estatuto da Criança e do Adolescente não indica como requisito para a adoção, qualquer elemento referente a sexualidade do adotante. Assim, a faculdade de adotar é concedida a homens e mulheres, em conjunto ou separadamente, bastando para tanto, que preencham as exigências contidas no art. 39 e seguintes do Estatuto da Criança e do Adolescente, importando para a adoção conforme art. 43 do E.C.A., “A adoção será deferida quando apresentar reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”.
Portanto, não há que se falar em motivos legais para negar que parceiros unidos de forma afetuosa e estável, em lar digno e respeitável, onde se cultiva a fidelidade e assistência recíproca, independentemente de sua orientação sexual, não possam exercer o direito de adoção.
A concepção moderna de família abrange as concebidas fora das formalidades do casamento civil e religioso. As uniões estáveis entre homem e mulher começaram por dar um novo rumo ao conceito de família, com a permissão da lei para um novo casamento civil. Também o surgimento de uma nova concepção de família, a monoparental, e a aceitação por parte da sociedade para as uniões de pessoas de mesmo sexo, que habitam um lar da mesma forma que um casal heterossexual, mesmo que a revelia de uma lei que dignifique essa união.
Muito já se avançou, mas o ponto mais polêmico das uniões homoafetivas ainda é a adoção de crianças, como forma de complementar verdadeiramente para um lar familiar. E todos sabemos que, para a maioria das pessoas, sejam homens ou mulheres, independente de suas orientações sexuais, a família só se completa com a adição de filhos naturais ou não, como forma de continuação consangüínea ou mesmo para se ter a quem deixar um legado.
O Direito necessita ser inclusivo, atender ao cidadão onde ele não esta sendo amparado ou respeitado, buscando-lhe existência digna, fulcrado no ordenamento jurídico, alicerce de uma sociedade justa.
5 CAPÍTULO IV
5.1 Anomia e a Desproteção com o Cidadão Homossexual na Sociedade.
Anomia “é ausência de lei ou de regra, anarquia, desorganização, estado da sociedade em que desaparecem os padrões normativos de conduta e de crença e o indivíduo, em conflito íntimo, encontra dificuldade para conformar-se às contraditórias exigências das normas sociais..” (HOUAISS, 2004, p. 226).
O conceito de anomia é usado por diversos autores da Sociologia, mas nem sempre com as mesmas aplicações. Durkheim foi o primeiro a tentar precisar este conceito que apresentou como ruptura de laços de solidariedade entre os indivíduos, mostrando que algo na sociedade não funcionava de forma harmônica: “O indivíduo não mais orienta seus atos através de valores comuns, mas segundo as próprias intenções”. Assim, quanto maior a anomia, menor a integração entre os indivíduos, criando-se um quadro de dissonância cognitiva, anulando identidades individuais e coletivas. (WIKIPEDIA, 2006).
Não obstante, conforme consagra o art. 126 do Código de Processo Civil, e o art. 4° da Lei de Introdução ao Código Civil, no que se refere ao postulado da plenitude da ordem jurídica, o juiz não se escusa de sentenciar alegando desconhecimento ou obscuridade da norma jurídica.
O Estado tem a obrigação de regular a sociedade coibindo seus excessos, punindo os delitos, protegendo-a de si mesma com a afirmação das leis, garantido seus direitos e liberdades, atendendo não só ao homossexual, que é diretamente atingido pelo sofrimento e isolamento, decorrente da falta de regulamentação, mas toda a sociedade que também sofre com seus reflexos.
Ao Estado, cabe a construção das relações humanas em patamares saudáveis, politicamente conscientes, implementando programas educacionais, garantindo a inclusão social dos chamados grupos minoritários, combatendo a discriminação de qualquer espécie, não permitindo a desagregação familiar dos seus cidadãos.
A ausência de regras por parte do Estado, ou seja, a anomia jurídica provoca no cidadão a espoliação de seus direitos, com a conseqüente marginalização e exclusão social, criando sub-cidadãos marcados pelo desrespeito e a incivilidade social.
A polêmica que envolve o encaminhamento de projeto de lei, no Congresso Nacional, que reconheça a parceria civil de pessoas de mesmo sexo, leva-nos a algumas colocações sobre a homossexualidade. O fato é que a homossexualidade se impõe no mundo inteiro, envolve milhões de pessoas e não pode ser negado e muito menos deixar de receber a tutela jurídica. É necessário enfrentar os fatos de forma honesta e abrir espaços para novos valores.
O judiciário não tendo dispositivo legal sobre a matéria, mas no cumprimento do dever de não deixar o cidadão sem resposta, em sua maioria, reconhece a eficácia dos relacionamentos estáveis entre pessoas de mesmo sexo, e utilizando-se dos mecanismos jurídicos como: analogia com a união estável, sociedade de fato, e a aplicação dos princípios constitucionais, tem-se posicionado favoravelmente a toda ordem de pedidos que se assemelham aos direitos dos casais heterossexuais.
Mas, nem todos os julgadores se sentem confortáveis para expressarem seus posicionamentos, diante da inexistência de uma lei que os legitimem nas suas decisões.
Autoridades judiciárias que são de corrente contrária a este posicionamento, fundamentam suas sentenças com claras posições religiosas e preconceituosas, tudo porque lhes falta uma lei própria, que defina e regre esta nova forma de união familiar.
Como já se disse, o Direito escreve-se com a mão da sociedade, e a sociedade tem mostrado compreensão e aceitação aos homossexuais.
Em muitos países, tem-se positivado as uniões entre pessoas de mesmo sexo, até mesmo na América do Sul, como a Argentina que nos deu o exemplo em duas de suas províncias.
Estima-se que 10% a 15% da população é homossexual, portanto estaríamos falando de 18 a 27 milhões de pessoas homossexuais no Brasil, o que nos faz pensar que não se trata de uma simples minoria.
O silêncio do legislador ou sua falta de coragem para enfrentar e resolver uma necessidade de milhões de brasileiros fica demonstrado como no caso do Projeto de Lei n° 6.960/02, de autoria do deputado Ricardo Fiúza, que tem por objeto inserir o artigo 1.727-A, no novo Código Civil, com a seguinte redação:
As disposições contidas nos artigos anteriores (1.723 -1.727 – que regulamentam a união estável entre o homem e a mulher), aplicam-se no que couber, às uniões fáticas de pessoas capazes, que vivam em economia comum, de forma pública e notória, desde que não contrariem as normas de ordem pública e os bons costumes. (grifo nosso).
A redação do artigo nos leva a interpretar que o legislador tentou dizer algo que não conseguiu, ou não conseguiu dizer o que gostaria. O fato é que a redação do artigo para o projeto de lei é muito confusa, demonstra a insegurança de nossos legisladores para uma solução urgente, necessária e verdadeira para um fato social tão presente em nossos dias.
O conservadorismo apenas mantém o que aí está, não questiona nem inova, não avança junto com o pensamento social, que discute favoravelmente ao beijo dos atores da novela das oito, ou que lotam os cinemas para verem o filme “Brokeback Mountain”, passando claramente um recado ao congresso Brasileiro.
O homossexual é seguramente, dentre os grupos minoritários discriminados, o mais atingido, mais do que o negro, do que judeu e mais discriminado do que já foi a mulher.
A falta de uma legislação protetiva, não pelo simples fato de serem homossexuais, mas pelo fato de serem cidadãos consagrados pela Constituição Federal, dignos de respeito e de direitos, faz com que estes vivam no vácuo da legislação, atingindo diretamente sua auto-estima e capacidade de se afirmarem e produzirem junto à sociedade civil. Muitos cidadãos deixam de procurar seus direitos por temerem ver-se ridicularizados e colocados na condição de réus perante seus agressores. A legalização da união civil entre pessoas de mesmo sexo no Brasil, arrasta-se desde 1975, apesar de a maioria dos políticos, quando consultados pela imprensa, expressarem seu apoio à causa homossexual.
Mantendo este posicionamento ambíguo, sem se definir claramente perante a sociedade, o Senado Federal brasileiro viu sua 1ª secretaria deferir no dia 21/06/06, pedido protocolado pela servidora e jornalista Silva Del Valle Gomide, para inclusão como dependente, para efeitos de assistência à saúde e como beneficiária de pensão de sua companheira, Cláudia de Oliveira. Esta decisão é tida como inédita na história do Senado brasileiro, visto que, na Câmara Federal, há uma decisão favorável a um casal homossexual, mas para inclusão do servidor no plano de saúde daquela casa, o que também é relevante para a defesa dos direitos da causa homossexual.
Independentemente da natureza das relações e suas implicações, trata-se de dar reconhecimento de direitos próprios da pessoa humana e do cidadão a quem de direito.
O Estado não pode omitir nem excluir qualquer cidadão do processo democrático de direito, furtando-lhe a dignidade, o tratamento igualitário, o direito à vida e a proteção das instituições públicas. Por isto mesmo, a sociedade organizada, através de suas instituições, confere bases para o nascimento de um ordenamento jurídico, oriundo de conceitos axiológicos evidenciados das relações entre as pessoas e suas comunidades. É a partir dos fatos e valores manifestados pela sociedade, que as normas são positivadas e passam a ser garantidoras do equilíbrio das relações sociais, perfazendo assim o cumprimento do papel do Estado.
5.2 Leis Estaduais e Municipais
A competência de legislar sobre as uniões homoafetivas, e especialmente com a criminalização da discriminação decorrente da orientação sexual do indivíduo, impondo sanções penais, é da União.
Alguns Municípios, e Estados da Federação têm editado leis proibindo a discriminação em virtude da orientação sexual, no entanto sem qualquer sanção penal. Desta forma, tais leis são de pouca eficácia em razão de não poderem penalizar o seu infrator, como já dissemos, sanções penais são de competência exclusiva da união.
Assim, estas leis apenas recomendam comportamentos não discriminatórios com sanções meramente administrativas, como por exemplo: suspensão de alvarás, para o caso da discriminação ter sido cometida por um comerciante.
Indicam também uma tendência por parte de alguns legisladores, funcionando como uma espécie de laboratório junto à própria sociedade e aos demais políticos.
Mas, também sabemos que estes projetos só aparecem no cenário nacional, porque são provocados por uma exigência democrática dos grupos de defesa “GLBTs”, existentes praticamente em todos os Estados da Federação.
Neste sentido, também na Câmara Federal, tramita um projeto de lei de autoria da dep. Iara Bernardi (PT) de São Paulo/SP, a exemplo de outros que têm pouca eficácia legislativa, este, apenas institui o dia nacional de combate a homofobia. Trata de um marco de defesa do direito à homossexualidade do cidadão, sem entrar no mérito dos direitos básicos da convivência, sucessão, ou adoção, não trazendo nenhuma inovação para a pacificação social dos milhões de homossexuais existentes neste país.
5.3 Direito Comparado
Já são quase duas dezenas de países a permitirem uniões civis entre pessoas de mesmo sexo. Na Argentina, a sua capital, a província de Buenos Aires, em 13 de Dezembro de 2002, foi a primeira da América do Sul a legalizar a união entre pessoas de mesmo sexo. Seus legisladores aprovaram um projeto que representa amparo legal para os casais de mesmo sexo, ainda que não lhes permita o casamento e a adoção de crianças. A Lei estabelece a união civil não matrimonial de duas pessoas, independente de seus sexos e orientação sexual, podendo seus integrantes gozar de direitos de pensão em caso de morte, plano de saúde, e outros.
Nesse mesmo sentido, a França, também aprovou projeto “Pacto Civil de Solidariedade”, estendendo para as uniões informais, sejam homo ou heterossexuais, os mesmos direitos dos casamentos formais, menos a adoção de crianças para os casais de mesmo sexo.
A Holanda, sempre demonstrando um maior avanço ao resto do mundo, no que diz respeito às liberdades e autonomia da vontade do cidadão, assim procedeu com a prostituição e o uso de drogas. E não foi diferente com as uniões homossexuais. Para tanto prevê a união de pessoas de mesmo sexo, inclusive com a adoção de filhos.
A Islândia, a Dinamarca e a Noruega reconhecem a união homossexual e a custódia conjunta sobre os filhos de um dos parceiros, mas não permitem a adoção.
A Suécia permite não só a união civil de pessoas de mesmo sexo, como também a adoção de filhos, desde Fevereiro de 2003.
Os Estados Unidos, na contramão da história, tem se posicionado de forma contrária e intolerante, quanto às uniões homossexuais. Apesar disto, o Estado de Massachusetts, autoriza a união civil para casais homossexuais desde 2004, sendo acompanhado pelos Estados de Vermount e Connecticut. (FOLHA ON LINE, 2006).
Ainda assim, a presidência da República dos Estados Unidos da América tenta fazer com que a Corte Suprema considere inconstitucional a união entre pessoas do mesmo sexo, para banir de vez as uniões homoafetivas do território americano, enquanto o resto do mundo caminha em sentido contrário. Para isto, tem disponibilizado milhões de dólares para serem usados em contra-campanhas. Tal comportamento surpreende pelo fato de os U.S.A. não ser um país predominantemente católico, nem mesmo o Estado de New York conseguiu lei permitindo as uniões homoafetivas.
Por outro lado, a Inglaterra deu um grande exemplo de democracia e civilidade ao mundo, aprovando o casamento entre pessoas de mesmo sexo. Elton John foi o primeiro a usar o benefício da lei, casando-se com David Furnish, seu companheiro de muitos anos. Elton John recebeu cumprimentos de autoridades como: Tony Blair, o ex-presidente dos Estados Unidos da América Bill Clinton, a rainha da Inglaterra e outros.
Desde que entrou em vigor a lei que permite casamento entre pessoas de mesmo sexo, em Dezembro de 2005, já se realizaram mais 4.000 uniões entre casais masculinos e aproximadamente 1.500 uniões de casais femininos
Como dito, o Brasil não tem legislação que permita a união civil entre pessoas de mesmo sexo, por outro lado, também não possui nenhum instituto jurídico que proíba tais uniões. A questão reside tão somente no campo do preconceito e dos costumes. No entanto, um fato jurídico inovador está migrando para dentro do território nacional de forma silenciosa e constante, com o uso da Resolução Administrativa n° 05 de 03 de Dezembro de 2003, editada pelo Conselho Nacional de Imigração, que dispõe sobre critérios para a concessão de visto temporário ou permanente, ou permanência definitiva ao companheiro ou companheira, sem distinção de sexo.
Esta Resolução beneficia os chamados casais binacionais. Quando se trata de casal heterossexual ao contrair matrimônio em outro país “com pouquíssimas exceções”, o cônjuge estrangeiro tem direito a imigrar no país de residência do outro.
Para casais homossexuais, nos países onde é permitido o casamento entre os iguais, não há problema quanto a aceitação e imigração. Nos países onde não há tal permissão, como é o caso do Brasil, o que tem acontecido é o uso das normas específicas para a imigração que contempla o companheiro homossexual estrangeiro.
O Conselho Nacional de Imigração é o órgão responsável pela aplicação da Lei brasileira de imigração “Estatuto do Estrangeiro”, que editou a Resolução de n° 05 de Dezembro de 2005, disciplinando a imigração do companheiro ou companheira homossexual ou heterossexual estrangeiro.
Preenchidas as condições estabelecidas pela Resolução, por casal que resida fora do Brasil, ou que tenha adquirido o documento de união durante período de residência no exterior, poderá apresentar os documentos que se fazem necessário ao Consulado do Brasil e após percorridos os trâmites pertinentes, os documentos serão encaminhados ao Conselho Nacional de Imigração no Brasil, que avaliará caso a caso.
Este conselho já concedeu visto de permanência a casais homossexuais que residem no Brasil, com o fundamento para este direito no princípio internacional da reunião familiar, que prevê o cônjuge independentemente de sua orientação sexual ao lado da pessoa amada.
Alguns países adotaram primeiro normas de imigração para casais homossexuais e posteriormente com um ambiente mais favorável, concederam a união civil a estes casais, como por exemplo, a Inglaterra, Bélgica, Canadá e Nova Zelândia.
Possivelmente, o Brasil no futuro adote o mesmo caminho, já que atualmente temos cirurgias para mudança de sexo, pagas pelo Sistema Único de Saúde – SUS- pensão por morte de companheiro homossexual, direito a instrumentalizar junto aos Cartórios Notariais, contrato de convivência e outras avenças entre pessoas de mesmo sexo, estabelecendo direitos e deveres para a comunhão de vidas afetivas, mais a preocupação da Constituição Federal Brasileira, em garantir direitos iguais a todos os cidadãos, proibir discriminações e assegurar liberdade sexual, indica junto a outros aspectos jurídicos, que, proximamente os homossexuais terão a garantia de uma legislação específica que os atenda em seus anseios, e faça a necessária pacificação social.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
As parcerias homoafetivas, são uma realidade de nosso tempo, independentemente do contexto que as cerca, e da aprovação ou desaprovação de parte da sociedade civil.
Demonstramos neste trabalho, que novos fatos e valores, a respeito das parcerias homoafetivas se fazem presentes em nosso meio social. As decisões tomadas pelo o judiciário nos diversos Estados brasileiros, assim como a própria literatura daqueles que ajudam a formar uma nova consciência jurídica, são fatos que contribuem para que caminhemos para um novo panorama jurídico e social.
A homossexualidade está presente entre os homens, desde o começo de sua existência, e vem se firmando com os passar dos tempos, como uma das formas de expressão de afeto. Nos últimos anos, essa demonstração de afeto se intensificou, com a clara aceitação por parte da sociedade civil e o engajamento de grupos de defesa GLBTs.
A conseqüência natural, diante de um fato social de tamanha relevância, é a constatação do surgimento de novos valores jurídicos, com implicações diretas no Direito de Família, Direito de Sucessão, Direito das Coisas e Bens, Direitos das Obrigações, etc.
Confirma-se assim a primeira regra das sociedades, a adaptação do homem consigo mesmo e seu meio. O Direito surge, então, como vetor fiscalizador e organizacional desta mesma sociedade.
A sensibilidade e a participação do legislador neste processo é fundamental, fornecendo bases sólidas para a pacificação e o entendimento social. Em princípio, os legisladores, são pessoas que surgem das diversas camadas sociais e estão aptas a expressarem o sentimento e a vontade popular, por isto, a certeza de que a solução do problema em pauta está nas mãos desses representantes, que, deverão atender paulatinamente as reivindicações dessa parcela social.
A homoafetividade é um fenônemo mundial, que está presente também na família brasileira, e como já mencionado implica, nos mais diversos campos do Direito, atinge valores morais e religiosos de toda a sociedade, o que demonstra a sua importância como tema político e jurídico. Aliado a isto, o que estamos assistindo é a participação de legisladores Municipais e Estaduais, que vêm demonstrado interesse em legislar em favor da defesa dos homossexuais. Tais leis não contém em seu bojo cláusulas penais por tratar-se de competência da União, mas o recado chegará aos ouvidos dos deputados federais e senadores, e nos próximos anos, com certeza haverá mudanças importantes na legislação federal, concedendo direitos, mais do que justos àqueles que têm suas vidas voltadas para interesses diferentes e desprotegidos da maioria dos cidadãos brasileiros.
A sociedade brasileira já convive com casais de homens e de mulheres, morando no mesmo edifício, condomínio ou bairro, sem que isto traga qualquer desconforto para os seus vizinhos.
As boates estão repletas de casais homossexuais se encontrando com a mesma naturalidade que os casais heterossexuais se encontram. Os canais de televisão, transmitem, a todo momento, situações que envolvem pessoas homossexuais relatando seus dramas ou vivendo seus amores. A indústria cinematográfica trabalha na mesma direção, mostrando filmes que retratam com maior riqueza de detalhes os mesmos dramas.
Revistas especializadas no mundo da homossexualidade feminina, fazendo indicações de hotéis, lojas e mercadorias para consumo, estão nas bancas das grandes cidades, assim como as revistas especializadas no mundo gay masculino. O comércio, hotéis e a indústria de turismo estão investindo fortemente na exploração de produtos e serviços destinados aos homossexuais. Todos os itens citados indicam algum negócio jurídico exclusivamente voltados para os homossexuais. Esta é uma parcela tão importante da sociedade que alguns empresários estão destinando algumas dezenas de milhões de dólares, com o objetivo de exploração comercial deste seguimento.
Com tamanho interesse comercial em torno de uma categoria específica, logo um grande lobby tratará de agir junto ao Congresso Nacional, a fim de se fazer aprovar leis que atendam a esta categoria nos seus interesses.
É uma forma transversa de se chegar a uma legislação que atenda aos homossexuais em seus direitos. De uma forma ou de outra, o certo é que, sem muita demora, será uma realidade em nosso sistema jurídico. Este trabalho também participa nesta caminhada, na medida em que, enriquece a pesquisa e o estudo da problemática, debatendo com professores, colegas e interessados, confrontando opiniões, julgados e fazendo uma interpretação dos valores principiológicos do nosso ordenamento jurídico.
Neste sentido, esperamos ter alcançado uma participação importante na defesa dos direitos decorrentes da convivência homoafetiva e da temática da homossexualidade.
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Experiência na área Jurídica corporativa com atuação na gestão de processos judiciais e consultivos em Direito Ambiental, Minerário e Imobiliário, abrangendo a captação de recursos, criação e implementação de projetos ambientais, com visão macro de negócios, representando a empresa junto a órgãos regulatórios e governamentais em mediações. Atuação em processo judicial de licenciamentos ambiental, revisão e elaboração de legislação ambiental para Municípios e Estados, tais como códigos ambientais e leis ambientais. Expertise na legislação ambiental brasileira, nos âmbitos federal, estadual e municipal e acompanhamento de litígio ambiental em todas as instâncias. Atuação efetiva no atendimento às regras do novo Código Florestal, registro no Cadastro Ambiental Rural (CAR), Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (Prad) e conversão de multas administrativas em serviços ambientais. Acompanhamento de litígio Ambiental em todas as instâncias e de inquéritos civis perante o Ministério Público, com a negociação de termos de ajuste de conduta.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AGUILAR, Nathalia Lisboa de. União entre iguais como entidade familiar: reconhecimento no ordenamento jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 dez 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/48402/uniao-entre-iguais-como-entidade-familiar-reconhecimento-no-ordenamento-juridico-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
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Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
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