RESUMO: O presente trabalho visa demonstrar que a filiação sociafetiva deve ser reconhecida pelo Poder Judiciário, ainda que após a morte do genitor, resguardando-se os direitos sucessórios decorrentes deste estado de filiação.
Palavras-chave: Paternidade Sociafetiva. Filiação. Direito Sucessório.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 DA PATERNIDADE. 3 RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIAFETIVA “POST MORTEM”. 4. DIREITO SUCESSÓRIO DECORRENTE DA PATERNIDADE SÓCIOAFETIVA. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
Com o advento da Constituição Federal de 1988, a família passou por várias mudanças benéficas, vez que abandonou seu caráter austero, baseado no patriarcalismo e no matrimônio para, finalmente, tornar-se uma família ligada pelos laços do afeto. Isso devido em muito ao avanço da sociedade e à valorização da dignidade humana.
Além dessa mudança ocorrida na família, trouxe também a Nossa Carta Magna de 1988, a igualdade entre filhos e, assim, ou, em outras palavras, a equalização entre os filhos havidos dentro do casamento com os filhos havidos fora do casamento.
Com efeito, convive nos dias atuais, a paternidade ficta, derivada da presunção “pater is est”, a paternidade biológica cujo alcance tornou-se viável com o avanço da ciência genética, através do exame de DNA e a paternidade sócioafetiva consubstanciada na posse de estado de filho.
Todavia, há distinção entre o que é ser pai e o que é ser genitor, posto que ser pai é proporcionar e viver junto a seu filho momentos de alegria, ensinamentos, educação, respeito, compreensão, ou seja, é uma relação decorrente de uma convivência baseada acima de tudo nos elos de amor de um para com outro, e, ser genitor é ser o fornecedor do material genético para a procriação.
Importante questionamento refere-se à possibilidade do reconhecimento da paternidade sociafetiva “Post Mortem”, resguardando-se os direitos sucessórios decorrentes deste estado de filiação, tendo em vista que a paternidade sociafetiva é concepção jurisprudencial e doutrinária recentes, ainda não prevista expressamente em lei.
O objetivo deste trabalho é demonstrar que o reconhecimento da paternidade sociafetiva “Post Mortem” e a legitimação do filho sociafetivo para a sucessão dos bens deixados pelo genitor/de cujus, é possível no ordenamento jurídico brasileiro, encontrando-se respaldo na jurisprudência pátria.
2 DA PATERNIDADE
O sistema de presunção de paternidade, num primeiro momento, primordialmente a “pater is est quem justae nuptiae demonstrant” consagrada no Código Civil de 1916, tinha por objetivo a preservação da família e estabelecia uma paternidade jurídica ao dispor que o filho da mulher casada presumia-se concebido pelo marido dela.
Por oportuno, cabe trazer a colação as palavras da eminente Maria Berenice Dias:
Ninguém questiona que pai é quem, por meio de uma relação sexual, fecunda uma mulher que, levando a gestação a termo, dá a luz a um filho. A lei, no entanto, desvincula-se da verdade biológica, gera uma paternidade jurídica baseada exclusivamente no fato de alguém haver nascido no seio de uma família constituída pelos sagrados laços do matrimônio. Tal presunção busca prestigiar a família, único reduto em que a procriação sempre foi aceita como legítima[1].
Destarte, observa-se que há décadas não se dava tanta importância aos elos biológicos para estabelecer a paternidade, posto que, independente da origem genética, somente os filhos nascidos na constância do casamento tinham seus direitos garantidos, sem sofrer qualquer tipo de discriminação. Ao contrário, era o tratamento dado aos filhos ilegítimos, que mesmo sendo da origem biológica de seu genitor, sofria grandes discriminações, bem como os “filhos adotivos”.
Urge ressaltar que a Carta Magna de 1988, em seu artigo 227, §6° proibiu qualquer forma discriminatória à filiação, assim o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei n° 8069/90, também adotou todos os preceitos nela contidos garantindo ao filho o direito de, a qualquer momento, buscar a verdadeira paternidade.
É relevante a contribuição de Maria Berenice Dias, quando sustenta reiteradamente que:
A nova ordem jurídica introduzida em 1988 pela Constituição Federal de 1988 priorizou a dignidade da pessoa humana e proibiu qualquer designação ou discriminação relativa à filiação assegurando os mesmos direitos e qualificações aos filhos havidos ou não da relação de casamento, como também ao vinculo gerado pela adoção.[2]
Portanto, permitiu-se a busca da paternidade biológica em detrimento da paternidade registraria ou jurídica, pois com as descobertas e avanços alcançados pela engenharia genética foi possibilitada a confirmação da paternidade biológica por meio do exame de DNA, atingindo quase absoluta certeza da origem genética do ser humano.
Mister ressaltar, nos dizeres do insigne Sílvio de Salvo Venosa[3], que as dificuldades enfrentadas para a descoberta da paternidade biológica foram todas sanadas com exame de DNA. Atualmente, o problema enfrentado pelos magistrados não é mais definir a paternidade e sim encontrar a melhor solução para o filho, diante da verdade fática ou da verdade axiológica.
Consigne-se, observar que, por inúmeras vezes, a realidade biológica é idêntica a realidade jurídica e social, o nome do pai que consta no registro é o que concebeu e cria o filho. Todavia, nem sempre ocorreu assim, pois tem muitos casos que não há uma igualdade entre o estado de fato e o estado jurídico. Senão, vejamos o que asseriu Rose Melo Vencelau:
Todavia, a relação paterno filial muitas vezes se funda em bases outras que não o critério biológico. Assim, a filiação jurídica pode não ser a biológica. A paternidade analisada sob o prisma civil-constitucional também não se pode desprender da filiação afetiva. Mas a paternidade afetiva pode ser a jurídica, (...) e a biológica pode não ser afetiva. Diante disso se percebe a insuficiência de um desses critérios para um consistente vínculo paterno filial, o qual somente se completa com o equilíbrio entre os critérios, jurídicos, biológico e afetivo[4].
Acerca desse aspecto também cabe trazer à baila a consideração de Rodrigo da Cunha Pereira:
Para o Direito, pai é aquele que empresta o seu nome na certidão de nascimento do filho. Se nascido dentro do casamento, presume-se que o marido seja o pai, e a certidão de casamento é o documento hábil para se proceder ao registro de nascimento do filho com o nome do pai - marido. Uma vez estabelecida a paternidade por meio de registro civil, decorrem daí os direitos e obrigações, como o sustento, guarda e educação. Mas será que o ordenamento jurídico tão vinculado a elementos biológicos para a paternidade pode garantir o estabelecimento da paternidade? Podemos definir o pai como genitor, o marido ou o companheiro da mãe, ou aquele que cria os filhos e assegura-lhes o sustento, ou aquele que dá seu sobrenome ou mesmo seu nome?[5]
Urge salientar que, ao contrário da maternidade, a paternidade quase sempre é questionada, posto que a ligação entre pais e filhos sempre necessitou de bases identificadoras, levando em conta que o referido vínculo, não é tão evidente quanto à maternidade.
Por este fato, como mencionado pelo renomado mestre Rodrigo da Cunha Pereira, na assertiva acima, observa-se que se a mãe é casada presume-se que o marido seja o pai, como ocorria no Código Civil de 1916, vindo também a ser preconizado pelo Código Civil de 2002, porém em termos não tão restritos como no referido código anterior.
Nesta linha, cabe demonstrar as presunções de paternidade preconizada pelo Código Civil de 2002, em seu artigo 1597. Vejamos:
Artigo 1597- Presume-se concebidos na constância do casamento os filhos:
I - Nascido cento e oitenta dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal;
II - nascidos nos trezentos dias subseqüentes à dissolução da sociedade conjugal, por morte, separação judicial, nulidade e anulação do casamento;
III - havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido;
IV - havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga;
V - havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.[6]
Diante do disposto supra, constata-se que, mesmo se tendo a presunção de paternidade na constância do casamento, o pai tem o direito, em caso de dúvida acerca da paternidade, fazer o exame de DNA, para a busca da origem genética da prole. Insta salientar, como já explanado, que pode haver também o reconhecimento voluntário ou judicial.
Todavia, cabe ressaltar, tendo por base ainda os dizeres do insigne Rodrigo Cunha Pereira, bem como dos fundamentos e ressalvas feitas pelas doutrinas e jurisprudências pátrias, que a primazia conferida à paternidade biológica não é elemento essencial por si só capaz de preencher o que se espera da relação de paternidade, vez que somente os vínculos do sangue sem nenhum elo de afeto é frágil demais para evidenciar o que efetivamente é capaz de formar uma relação de paternidade.
Por derradeiro, essa nova diretriz da paternidade coaduna-se com a atual formação do núcleo familiar, cujo ideal consiste em satisfazer os interesses de cada um de seus componentes, num diapasão de realização pessoal, obtendo a partir daí um desenvolvimento conjunto e ligado pelos laços afetivos.
Destarte, levando em consideração o princípio da dignidade da pessoa humana e a proteção dos filhos, torna-se imperioso a valorização do afeto no que diz respeito à relação entre pai e filho, seja essa relação proveniente do instituto da adoção, da paternidade biológica, da presumida ou da sócioafetiva, pois somente desta maneira se alcançará uma proteção integral para os filhos, ou seja, para as crianças e adolescentes.
3 RECONHECIMENTO DA PATERNIDADE SOCIAFETIVA “POST MORTEM’
Em que pese às diversas transformações pelas quais o direito de família vem passando, sobretudo no que diz respeito à filiação sócioafetiva, ainda é minoria os que se arriscam a defender e a enfrentar questões relativas a esse assunto, sobretudo quando se trata do reconhecimento judicial após o falecimento do pai.
Os defensores que negam o reconhecimento da paternidade sócioafetiva “Post Mortem” argumentam que se o pretenso pai, efetivamente reconhecesse o suposto filho como tal, teria em vida manifestado a vontade de que esse filho fosse reconhecido, ou ainda, teria deixado testamento que beneficiasse esse filho sócioafetivo.
Inúmeros, podem ser os motivos pelos quais não houve o reconhecimento expresso. Todavia, isso não muda o fato de que, durante sua vida, o pai sócioafetivo esteve presente e foi decisivo para a criação daquele filho.
Embora o ordenamento jurídico já tenha evoluído muito no que diz respeito ao direito de família, muitas ainda são as lacunas existentes em nosso sistema.
Nesse sentido nos ensina, o professor Rolf Hansen Madaleno:
A Carta Política de 1988 garante a todos os filhos o direito à paternidade, mas este é o sutil detalhe, pois que se limita ao exame processual e incondicional da verdade biológica sobre a jurídica. Entretanto, adota um comportamento jurídico perigoso, uma vez que dá prevalência à pesquisa da verdade biológica, olvidando-se de ressaltar o papel fundamental da verdade sócioafetiva, por certo, a mais importante de todas as formas jurídicas de paternidade, pois, seguem como filhos legítimos os que descendem do amor e dos vínculos puros de espontânea afeição e, para esses caracteres a Constituição e a gênese do futuro Código Civil nada apontam, deixando profunda lacuna no roto discurso da igualdade, na medida em que não protegem a filiação por afeto, realmente não exercem a completa igualização.[7]
Sendo assim, a paternidade sócioafetiva gera efeitos por si só, desde que comprovados o “trato, a fama e eventualmente o nome.” Contudo, enquanto a “posse de estado de filho”, base da filiação sócioafetiva, não for expressamente reconhecida pelo ordenamento jurídico, cabe à doutrina e à jurisprudência assegurar que o filho sócioafetivo seja reconhecido e protegido, sobretudo, após o falecimento daquele que o criou.
Assim, a jurisprudência do Egrégio Superior Tribunal de Justiça consagrou o entendimento quanto à plena possibilidade e validade do reconhecimento da paternidade Sociafetiva “Post Mortem”. Vejamos:
É possível o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem, ou seja, mesmo após a morte do suposto pai socioafetivo.
STJ. 3ª Turma. REsp 1.500.999-RJ, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016 (Info 581).[8]
No mesmo sentido, verifica-se o seguinte julgado:
TJ-SC - Apelação Cível AC 20140571708 SC 2014.057170-8 (Acórdão) (TJ-SC) Data de publicação: 12/11/2014 Ementa: DIREITO DE FAMÍLIA. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. DEMANDA POST MORTEM. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO. - INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. (1) PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. AUSÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. INTERPRETAÇÃO SOCIOLÓGICA DO ART. 1.593 DO CC . RESPALDO DOUTRINÁRIO. PRECEDENTES DO STJ E DESTA CORTE. - A possibilidade jurídica do pedido, define-se "na formulação de pretensão que, em tese, exista na ordem jurídica como possível, ou seja, que a ordem jurídica brasileira preveja a providência pretendida pelo interessado" (GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2003. p. 84). Inexistente vedação no ordenamento, presente a condição da ação referida. - Havendo precedentes e lição doutrinária dando conta da possibilidade jurídica de investigar e reconhecer a paternidade socioafetiva, urge desconstituir o ato judicial de extinção, de plano exarado. (2) PAI SOCIOAFETIVO FALECIDO. AÇÃO POST MORTEM. RECONHECIMENTO NÃO REALIZADO. IRRELEVÂNCIA. - "Nada obsta o reconhecimento da filiação após a morte dos pretensos pai e mãe socioafetivos. Se ao filho biológico é franqueado o acesso à justiça na hipótese de investigação de paternidade ou de maternidade post mortem, ao filho socioafetivo, por força do princípio da igualdade entre as filiações (art. 227 , par.6º, da Constituição da República), deve ser assegurado idêntico direito de ação." (TJSC, Apelação Cível n. 2008.064066-4, rel. Des. Eládio Torret Rocha, j. em 01-12-2011) SENTENÇA DESCONSTITUÍDA. RECURSO PROVIDO.[9]
Logo, apesar da paternidade sociafetiva “Post Mortem” não se encontrar expressamente prevista em lei, verifica-se que, cada vez mais, os nossos Tribunais Superiores tem primado pelo seu reconhecimento.
4 O DIREITO SUCESSÓRIO DECORRENTE DA PATERNIDADE SÓCIAFETIVA
Impende salientar que, uma vez reconhecido os laços de afetividade paterno-filial, cabe ao filho afetivo ter os mesmos direitos sucessórios que qualquer outro filho, já que segundo a nossa Constituição Federal de 1988, todos os filhos são iguais e têm os mesmos direitos, independentes de sua origem.
Assim, o filho sócioafetivo deve ser considerado herdeiro necessário, tal como dispõe o art.1845 do Código Civil.
Dizer que um filho sócioafetivo só teria direito a herança se o pai o reconhecesse expressamente, pelos meios legais, seria o mesmo que reconhecer que a paternidade sócioafetiva não gera efeitos, o que é um equívoco.
Sendo a paternidade sócioafetiva a única capaz de identificar a verdadeira relação paterno-filial, não é aceitável que o filho sócioafetivo, reconhecido como tal pela sociedade e por àqueles que o criaram, possa ser preterido, nem em relação aos filhos biológicos e, muito menos, em relação aos chamados parentes colaterais.
Sobre o direito sucessório decorrente da paternidade sociafetiva, vejamos a jurisprudência da Corte Superior de Justiça:
20110210037040APC - (0003632-76.2011.8.07.0002 - Res. 65 CNJ) - Segredo de Justiça Registro do Acórdão Número: 895903 Data de Julgamento: 16/09/2015 Órgão Julgador: 1ª TURMA CÍVEL Relator: ROMULO DE ARAUJO MENDES Revisor: TEÓFILO AETANO Data da Intimação ou da Publicação: Publicado no DJE : 06/10/2015 . Pág.: 183 Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE SOCIOAFETIVA POST MORTEM. INEXISTÊNCIA DE PAI REGISTRAL/BIOLÓGICO. EXISTÊNCIA DE RELAÇÃO PATERNO-FILIAL QUE CARATERIZA A PATERNIDADE SOCIOAFETIVA. INCLUSÃO DO NOME PATERNO. ANULAÇAO DE ESCRITURA PÚBLICA DE INVENTARÁRIO E PARTILHA. RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS. SENTENÇA MANTIDA. 1. Os apelantes pretendem a modificação da r. sentença da instância a quo para que seja julgado improcedente o pedido de reconhecimento de paternidade socioafetiva e, por consequência seja declarada a legalidade da partilha dos bens anteriormente registrada. 2. Os adquirentes dos direitos sobre o imóvel, objeto do pedido de anulaçãoda Escritura Pública de Inventário e Partilha, alegam, em sede preliminar, a ilegitimidade passiva, sob entendimento de não ser possível incluir o espólio no pólo passivo, mas somente os herdeiros. A preliminar não merece prosperar em virtude da superveniência defato modificativo do direito que pode influir no julgamento da lide, conforme art. 462 do Código de Processo Civil, com a possibilidade da ocorrência da evicção. 3. Apaternidade socioafetiva é construção recente na doutrina e na jurisprudência pátrias, segundo o qual, mesmo não havendo vinculo biológico alguém educa uma criança ou adolescente por mera opção e liberalidade, tendo por fundamento o afeto. Encontra guarida na Constituição Federal de 1988, § 4º do art. 226 e no § 6º art. 227, referentes aos direitos de família, sendo proibidos quaisquer tipos de discriminações entre filhos.
4. A jurisprudência, mormente na Corte Superior de Justiça, já consagrou o entendimento quanto à plena possibilidade e validade do estabelecimento de paternidade/maternidade socioafetiva, devendo prevalecer a paternidade socioafetiva para garantir direitos aos filhos, na esteira do princípio do melhor interesse da prole.
5. No caso dos autos resta configurado o vínculo socioafetivo entre as partes, que se tratavam mutuamente como pai e filho, fato publicamente reconhecido por livre e espontânea vontade do falecido, razão pela qual deve prevalecer o entendimento firmado na sentença quanto à declaração do vinculo paterno-filial, resguardando-se os direitos sucessórios decorrentes deste estado de filiação, e respectiva anulação da Escritura Pública de Inventário e Partilha anteriormente lavrada.6. Recursos conhecidos e não providos. Sentença mantida integralmente.[10] Grifo nosso.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Não se pode ignorar, que a paternidade biológica é aquela decorrente do vínculo da consangüinidade e reflete na fisionomia e na identidade pessoal do indivíduo. Portanto, verificamos que esta por si só não garante à prole o amor de pai. Noutra vertente, a paternidade sócioafetiva é a relação estabelecida por pura escolha e se revela no reconhecimento do afeto como valor jurídico.
À vista disto, podemos verificar que, nos tempos hodiernos, a paternidade, na realidade, é uma relação de afeto que se constrói dia-a-dia, vez que não adianta somente o vínculo biológico para garantir uma real relação paterna. No entanto, podemos concluir que não se trata de preponderância de uma paternidade sob a outra. O ideal seria que a paternidade biológica e afetiva se caracterizasse em uma única pessoa que desempenharia o papel de pai em sua integralidade (pai biológico e afetivo). Porém, não é essa sempre a realidade em que vivemos.
Na presente pesquisa, constatou-se que a jurisprudência, tem sido bastante favorável à paternidade sócioafetiva. Todavia, quando se trata do reconhecimento da paternidade sócioafetiva, após o falecimento do pai sócioafetivo, são poucos os que se arriscam a defender esse reconhecimento. Merecendo destaque a recente jurisprudência do STJ (20110210037040APC - (0003632-76.2011.8.07.0002 - Res. 65 CNJ) - Segredo de Justiça Registro do Acórdão Número: 895903 Data de Julgamento: 16/09/2015).
Com efeito, configurada a filiação sócioafetiva, resta possível a legitimação do filho sócioafetivo para a sucessão dos bens deixados pelo pai. Afinal, a verdadeira paternidade só é alcançada através do afeto.
Destarte a paternidade sócioafetiva gera efeitos e deve ser reconhecida. No entanto, enquanto não houver um reconhecimento expresso por parte do ordenamento jurídico, caberá ao magistrado identificar e proteger essa relação fática de filiação, vez que é de grande proeminência para a estruturação do ser humano e para a formação da família, sendo assim, de grande valor jurídico.
REFERÊNCIAS
Apelação Cível 20110210037040APC - (0003632-76.2011.8.07.0002 - Res. 65 CNJ), Data de Julgamento: 16/09/2015. Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/institucional/jurisprudencia/informativos/2015/informativo-de-jurisprudencia-n-316/paternidade-socioafet. Acesso em: 25 de novembro de 2016.
Apelação Cível, AC 20140571708, SC 2014.057170-8 (TJ-SC). Julgamento: 01/12/2011. Disponível em: HTTP://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25323624/apelacao-civil-ac-20140571708-sc-2014057170-8-acordao-stsc. Acesso em: 25 de novembro de 2016.
DIAS, Maria Berenice. Entre o ventre e o coração. .Disponível em: <http://www.mariaberenicedias.com.br>. Acesso em 28 de outubro de 2016.
DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Editora Saraiva, 2004.
MADALENO, Rolf Hansen. Novas Perspectivas no Direito de Família. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2000.
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PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família: Uma abordagem psicanalista. Belo Horizonte: Del Rey, 1999.
VENCESLAU, Rose Melo. Do Código Civil entre a verdade jurídica, biológica e afetiva no estabelecimento do vinculo paterno-filial. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito de Família. 6ª Ed, São Paulo: Editora Atlas, 2006.
REsp 1.500.999-RJ. STJ. 3ª Turma. Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 12/4/2016. Disponível em: Disponível em: HTTP://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25323624/apelacao-civil-ac-20140571708-sc-2014057170-8-acordao-stsc. Acesso em: 25 de novembro de 2016. Acesso em: 25 de novembro de 2016.
[1] DIAS, Maria Berenice. Entre o ventre e o coração. .Disponível em: <http://www.mariaberenicedias.com.br>. Acesso em 28 de outubro de 2016.
[2] DIAS, Maria Berenice Op. cit.
[3]VENOSA, Silvio de Salvo. Direito de Família. 6ª Ed, São Paulo: Editora Atlas, 2006, p.249.
[4] VENCESLAU, Rose Melo. Do Código Civil entre a verdade jurídica, biológica e afetiva no estabelecimento do vinculo paterno-filial. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 89-90.
[5] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito de Família: Uma abordagem psicanalista. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, p. 143-144
[6] MATIELLO, Fabrício Zamprogna. Código Civil Comentado. São Paulo: LTR, 2003.
[7] MADALENO, Rolf Hansen. Novas Perspectivas no Direito de Família. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2000.
[8] Disponível em: http://www.dizerodireito.com.br/2016/06/reconhecimento-de-paternidade.html. Acesso em: 25 de novembro de 2016.
[9] Disponível em: HTTP://tj-sc.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/25323624/apelacao-civil-ac-20140571708-sc-2014057170-8-acordao-stsc. Acesso em: 25 de novembro de 2016.
[10] Disponível em: http://www.tjdft.jus.br/institucional/jurisprudencia/informativos/2015/informativo-de-jurisprudencia-n-316/paternidade-socioafet. Acesso em: 25 de novembro de 2016.
Analista do Ministério Público de Minas Gerais. Graduada em Direito pelo Instituto de Ensino Superior de João Monlevade. Especialista em Direito Notarial e Registral, Direito de Família e Sucessões, Direito Processual Penal e em Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALVERNAZ, Andréa de Cássia Penna. O reconhecimento da paternidade sociafetiva "post mortem" e sucessão dos bens deixados pelo genitor Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 dez 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/48487/o-reconhecimento-da-paternidade-sociafetiva-quot-post-mortem-quot-e-sucessao-dos-bens-deixados-pelo-genitor. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
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