RESUMO: A Responsabilidade Civil do advogado é uma responsabilidade que decorrente das obrigações assumidas na condução da defesa processual de seu cliente. A prestação dos serviços advocatícios é atividade meio, ou seja, o advogado não está obrigado a alcançar o resultado, contudo tem o dever de aplicar toda a sua diligência habitual nos seus serviços advocatícios para alcançar o resultado. Lado outro, quando o advogado se comporta negligentemente como, por exemplo, no processo judicial não se manifesta no prazo legal, não propõe ação no momento hábil, deixa de interpor recursos e outros. Nestes casos, a negligência do advogado pode ocasionar a perda de uma chance ao seu cliente de ter êxito na demanda. Dessa forma, poderá ocasionar uma lesão as expectativas do seu cliente, que teve o curso normal da demanda interrompida pelo ato ilícito do advogado. Neste diapasão, o presente estudo buscou refletir a responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance nas obrigações constituídas nos contratos de prestação de serviços advocatícios.
PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade Civil. Advogado. Perda de Uma Chance.
Sumário: 1. Introdução. 2. Desenvolvimento. 3. Considerações finais. 4. Referências.
1. Introdução
A responsabilidade civil, de forma genérica, é a conseqüência jurídica e patrimonial de reparar o dano causado a alguém.
Importante registrar os ensinamentos dos professores Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho acerca da responsabilidade civil, vejamos:
“De tudo o que se disse até aqui, conclui-se que a noção jurídica de responsabilidade pressupõe a atividade de alguém que, atuando a priori ilicitamente, viola uma norma jurídica preexistente (legal ou contratual), subordinando-se, dessa forma, às conseqüências do seu ato (obrigação de reparar).Trazendo esse conceito para o âmbito do Direito Privado, e seguindo essa mesma linha de raciocínio, diríamos que a responsabilidade civil deriva da agressão a um interesse eminentemente particular, sujeitando, assim, o infrator, ao pagamento de uma compensação pecuniária à vitima, caso não possa repor in natura o estado anterior de coisas”.( GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009, p.09).
Sobre a responsabilidade civil de danos causados no exercício da profissão GAGLIANO e PAMPLONA FILHO (2009) destacam:
“partindo do pressuposto de que o sujeito realiza a atividade em decorrência de sua atuação profissional, estaremos, sempre, em regra, no campo da responsabilidade civil contratual. Isso porque o exercício do oficio pressupõe, em condições normais, a interatividade da realização de um negócio jurídico, em que o profissional se obriga a realizar determinada atividade pactuada. Para sua devida compreensão, é preciso distinguir s obrigações de meio de resultado, pois ambas podem ser derivadas de um contrato. A obrigação meio é aquela em que o devedor se obriga a empreender a sua atividade, sem garantir, todavia, o resultado esperado. (GAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2009, p.204).
Neste sentido, a responsabilidade civil do profissional liberal é uma responsabilidade objetiva. Assim se insere a responsabilidade civil do advogado. A prestação dos serviços advocatícios é atividade meio. O advogado compromete a empregar todos os meios para atingir o resultado, mas não está obrigado a chegar ao resultado.
Segundo José de Aguilar Dias:
O advogado responde contratualmente perante seus clientes. Nem seria possível negar o contrato existente entre ambos como autêntico exemplo do mandato. Tanto que é indiferentemente chamado de mandatário ou procurador judicial. Suas obrigações contratuais, de modo geral, consistem em defender as partes em juízo e dar-lhes conselhos profissionais. (DIAS, 2006, p. 410)
Lado outro, quando o advogado se comporta negligentemente, como por exemplo no processo judicial não se manifesta no prazo legal, não propõe ação no momento hábil, deixa de interpor recursos e outros. Nestes casos, a negligência do advogado pode ocasionar a perda de uma chance ao seu cliente de ter êxito na demanda. Destarte, o presente estudo, em uma perspectiva mais detalhada, analisou a responsabilidade civil pela perda de uma chance oriunda das obrigações na prestação de serviços advocatícios.
2. Desenvolvimento
A responsabilidade civil pela perda de uma chance cresce cada vez mais na atualidade. Segundo TARTUCE (2012), diante desta possibilidade a V jornada de Direito Civil reconhece a reparação como dano material ou Imaterial.( enunciado 444).
444) Art. 927. A responsabilidade civil pela perda de chance não se limita à categoria de danos extrapatrimoniais, pois, conforme as circunstâncias do caso concreto, a chance perdida pode apresentar também a natureza jurídica de dano patrimonial. A chance deve ser séria e real, não ficando adstrita a percentuais apriorísticos.
A perda de uma chance deve ser algo concreto, razoável. Não é razoável , por exemplo, uma pessoa que recebe a obrigação de fazer uma aposta em um jogo da mega sena e deixa de realizá-la.
A chance de uma pessoa ganhar na loteria é uma em milhões, sendo assim esta “ chance perdida” pela ausência da aposta não pode ser enquadrada como obrigação de indenizar por perda de uma chance.
Neste sentido é o julgado do Superior Tribunal de Justiça, publicado no informativo 466, referente à chance de um candidato excluído de um concurso público.
“ Teoria. Perda. Chance. Concurso. Exclusão. A turma decidiu não ser não ser aplicável a teoria da perda de uma chance ao candidato que pleiteia indenização por ter sido excluído do concurso público após a reprovação no psicotécnico. De acordo com o Min. Relator , tal teoria exige que o autor do ilícito implique em perda de oportunidade e o lesado obter situação futura melhor, desde que a chance seja real, séria e lhe proporcione efetiva condição pessoal de concorrer a esta situação. No entanto, salientou que, in casu, o candidato recorrente foi aprovado apenas na primeira da primeira etapa do certame, não sendo possível estimar sua probabilidade em ser, além de aprovado ao final do processo, também classificado dentro da quantidade de vagas estabelecidas no edital” (STJ no REsp 1.220.911/RS, Rel. Min. Castro Meira, j.17.03.2011)
Assim, também, aplicou a razoabilidade, a jurisprudência de destaque nacional no caso do programa “show do milhão”.
TARTUCE (2012) explica que:
“Uma participante do programa, originária do Estado da Bahia, chegou à última pergunta, a ‘pergunta do milhão’, que se respondida corretamente, geraria o prêmio de um milhão de reais. A pergunta então formulada foi a seguinte.’A Constituição reconhece direito dos índios de quanto do território brasileiro? 1)22%, 2) 2%, 3) 4%, 4)10%’”. (Tartuce, 2012, p.471).
Na jurisprudência brasileira as aplicações mais rotineiras para perda de uma chance encontram-se muitas vezes nos profissionais liberais, como advogados, médicos.
Sobre a responsabilidade do advogado VENOSA (2002) explica:
“As obrigações do advogado consistem em defender a parte em juizo e dar lhe conselhos profissionais. A responsabilidade do advogado, na área litigiosa, é de uma obrigação de meio. Neste diapasão, assemelha-se à responsabilidade do médico em geral, conforme estudamos. O advogado está obrigado a usar de sua diligencia e capacidade profissional na defesa da causa, mas não obriga pelo resultado, que sempre é falível e sujeito às vicitudes intrínsecas ao processo”. (VENOSA,2002, p.163).
O artigo 32 do Estatuto da Advocacia assim dispõe:
“Art.32. O advogado é responsável pelos atos que, no exercício profissional, praticar com dolo ou culpa. Parágrafo único. Em caso de lide temerária, o advogado será solidariamente responsável com seu cliente, desde que coligado com este para lesar a parte contrária, o que será apurado em ação própria.” (Brasil, 2016).
Geralmente o dever de indenizar, no caso da aplicação da perda de uma chance, deve ser analisado com cautela, pois tem-se danos hipotéticos ou eventuais.
Nesse sentido, importante citar a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
RESPONSABILIDADE CIVIL. ADVOCACIA. PERDA DO PRAZO PARA CONTESTAR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS FORMULADA PELO CLIENTE EM FACE DO PATRONO. PREJUÍZO MATERIAL PLENAMENTE INDIVIDUALIZADO NA INICIAL. APLICAÇÃO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. CONDENAÇÃO EM DANOS MORAIS. JULGAMENTO EXTRA PETITA RECONHECIDO. 1. A teoria da perda de uma chance (perte d'une chance) visa à responsabilização do agente causador não de um dano emergente, tampouco de lucros cessantes, mas de algo intermediário entre um e outro, precisamente a perda da possibilidade de se buscar posição mais vantajosa que muito provavelmente se alcançaria, não fosse o ato ilícito praticado (...). (REsp 1190180/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/11/2010, DJe 22/11/2010)
E mais,
PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE DE ADVOGADO PELA PERDA DO PRAZO DE APELAÇÃO. TEORIA DA PERDA DA CHANCE. APLICAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. ADMISSIBILIDADE. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. NECESSIDADE DE REVISÃO DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7, STJ. APLICAÇÃO. - A responsabilidade do advogado na condução da defesa processual de seu cliente é de ordem contratual. Embora não responda pelo resultado, o advogado é obrigado a aplicar toda a sua diligência habitual no exercício do mandato.(...) Recurso Especial não conhecido. (REsp 1079185/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 04/08/2009)
3. Considerações Finais
A responsabilidade civil do advogado pela perda de uma chance cresce cada vez mais na atualidade. A prestação dos serviços advocatícios é atividade meio, ou seja, o advogado não está obrigado a alcançar o resultado, contudo tem o dever de aplicar toda a sua diligência habitual nos seus serviços advocatícios para alcançar o resultado. Com relação a responsabilidade civil pela perda de uma chance decorrente das obrigações constituídas nos contratos de prestação de serviços advocatícios não e aplicável a qualquer conduta negligente do advogado. E quando aplicada, não ocorre de forma automática, devendo ser analisada no caso concreto e indenizável segundo critérios de razoabilidade.
4. Referencias
BRASIL. Lei n. 8906 de 04 de julho de 1994.
Dispõe sobre o Estatuto da Advocacia e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8906.htm. Acesso em: 30 de novembro de 2016.
BRASIL. Lei n. 10406 de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12318.htm->. Acesso em: 02 de outubro 2016.
BRASIL. Lei n. 10406 de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp: 436869 SP 2002/0054493-7, Relator: Ministro João Otávio de Noronha. Pub. no DJ 01.02.2006 REsp 1079185/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 11/11/2008, DJe 04/08/2009. Disponível em: < http://stj.jusbrasil.com.br ->. Acesso em: 02 de janeiro 2016.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1190180/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 16/11/2010, DJe 22/11/2010. Disponível em: < http://stj.jusbrasil.com.br ->. Acesso em: 02 de janeiro 2016.
DIAS, José de Aguilar.Da Responsabilidade Civil. Rio de Janeiro: 2006.
GAGLIANO, Pablo Stolze e PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo Curso de Direito Civil: Responsabilidade Civil. São Paulo: Saraiva. 2009.
GONÇALVES, Carlos Roberto, Responsabilidade Civil– 16ª Ed. São Paulo: 2015.
SAVI. Sergio.Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo. Atlas. 2006.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros Editores:2008.
SILVA. Rafael Peteffida Responsabilidade civil por perda de uma chance. São Paulo Atlas 2007
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Rio de Janeiro. Método:2012
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. São Paulo. Atlas. 2002.
Graduação em Direito pela Pontifícia Católica de Minas Gerais, Pós Graduação em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes, Servidora Pública do Estado de Minas Gerais. Pós-Graduanda em Educação nas Unidades Prisionais junto a Universidade Cândido Mendes.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VALERIANO, Vivian Moreira. A responsabilidade civil pela perda de uma chance decorrente das obrigações constituídas nos contratos de prestação de serviços Advocatícios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 mar 2017, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49632/a-responsabilidade-civil-pela-perda-de-uma-chance-decorrente-das-obrigacoes-constituidas-nos-contratos-de-prestacao-de-servicos-advocaticios. Acesso em: 11 dez 2024.
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