RESUMO: Este trabalho tem por objetivo a análise dos aspectos doutrinários, legais e jurisprudenciais que envolvem a correção monetária no ressarcimento do crédito escritural, almejando distingui-la da hipótese em que há a repetição do crédito tributário. Por sua vez, identificou-se que apenas é devida a correção monetária de crédito escritural quando há resistência injustificada da administração tributária.
Palavras-chave: Crédito. Escritural. Correção. Monetária. Repetição. Indébito.
SUMÁRIO: Seção inicial – 2. Repetição do indébito tributário – 3. Da correção monetária na repetição do indébito tributário – 4. Do ressarcimento do crédito escritural e sua diferenciação em face da repetição do indébito tributário – 5. Conclusão – Referências.
1. SEÇÃO INICIAL (INTRODUÇÃO)
O tema escolhido resume-se à possibilidade de a correção monetária incidir sobre o ressarcimento de créditos escriturais.
Sinteticamente, o ressarcimento de créditos escriturais difere da repetição do indébito tributário, a qual surge como direito do sujeito passivo da obrigação tributária, quando ele tenha pago por tributo indevido ou maior que o devido.
Almejou-se visualizar, como problemática, os pedidos de correção monetária sobre créditos escriturais realizados por sujeitos passivos de tributos.
Desta feita, resolveu-se estudar os aspectos doutrinários, legais e jurisprudenciais que envolvem a temática, tomando uma posição geral e única acerca da incidência da correção monetária, que apenas pode existir quando houver resistência injustificada da administração fiscal.
2 REPETIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO
O Código Tributário Nacional trata da repetição do indébito na seção III (pagamento indevido) do seu capítulo IV (extinção do crédito tributário), mais precisamente dos arts. 165 a 169.
A repetição do indébito deriva do princípio civilista da vedação ao enriquecimento sem causa, tendo como máxima o direito à restituição a quem pagou indevidamente, como fundamento de justiça, pois não pode auferir vantagem financeira quem não concorreu para tanto.
Com efeito, a devolução do indevido ganha ainda mais força no Direito Tributário, haja vista que nas suas relações ninguém age por liberalidade, mas em decorrência de lei. Veja-se a lição de Leandro Paulsen:
Efetuado pagamento indevido, surge o direito ao ressarcimento. Isso porque, em matéria tributária, ninguém age por liberalidade, mas estritamente por força de lei, sendo que o pagamento indevido implica enriquecimento sem causa do suposto credor em detrimento do suposto devedor. (PAULSEN, Leandro, 2012, p. 210).
Justamente pela relação tributária derivar de lei, não se faz necessário, para pleitear a repetição do indébito, que o contribuinte pague o tributo contra a sua vontade. Do mesmo modo, o sujeito passivo da obrigação tributária não precisa de prévio protesto para obter a restituição, tendo direito, independente do mesmo, à devolução total ou parcial do tributo, seja qual for o meio de pagamento.
No entanto, desde logo, o art. 165 do Código Tributário Nacional cria duas restrições às respectivas restituições. A primeira, explicitada no art. 162, § 4º, do CTN, comina na perspectiva de que, nos casos em que o pagamento restar efetuado por meio de estampilhas, não terá direito o sujeito passivo à repetição do indébito quando houver erro no pagamento, salvo nos casos expressamente previstos na legislação tributária, ou nas situações em que o erro seja imputável à autoridade administrativa.
A segunda restrição reside no fato de o art. 165 limitar, como regra geral, a cobrança do tributo indevido ao sujeito passivo da relação jurídico-tributária, ou seja, à pessoa obrigada ao pagamento do tributo ou da penalidade pecuniária, seja sob a forma de contribuinte, seja sob o manto da responsabilidade tributária. Analise-se o art. 165 do CTN:
Art. 165. O sujeito passivo tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, ressalvado o disposto no § 4º do artigo 162, nos seguintes casos:
I – cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;
II – erro na edificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;
III – reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória.
Dessa forma, o art. 165 do Código Tributário Nacional elenca três fundamentos para que se proponha a ação de repetição de indébito. Primeiramente, consigna ser motivo para a restituição o pagamento (espontâneo) ou cobrança de tributo indevido, total ou parcialmente, tendo em vista a legislação tributária aplicável, a natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido.
O fundamento supracitado é bastante amplo, uma vez que aborda contrariedade a toda legislação tributária, bem como à natureza ou circunstâncias da hipótese de incidência descrita em lei e ocorrida factualmente.
Desse modo, nos filiamos à corrente que enuncia estar contido o II no inciso I do art. 165 do Código Tributário Nacional, pois o erro na identificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento sempre esbarrará na ilegalidade, ou seja, na contrariedade à legislação tributária aplicável à espécie.
Já o inciso III do art. 165 do CTN, aborda os casos de reforma, anulação ou rescisão de decisão condenatória.
Por outro lado, o art. 166 do Código Tributário Nacional, ainda dispondo acerca dos casos de pagamento indevido, mas disciplinando, especificamente, as situações em que haja cobrança indevida de tributos indiretos, estabelece norma de aplicabilidade exclusiva. Analise-se:
Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.
O supramencionado artigo, sem distinguir contribuinte de fato de contribuinte de jure, dá direito à repetição do indébito àquele que prove haver assumido o encargo econômico, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, esteja expressamente autorizado por este a receber o tributo pago indevidamente.
A Súmula 546 do Supremo Tribunal Federal dispondo sobre o tema, aduz que a repetição do indébito relativa aos tributos indiretos tem como legitimado ativo o contribuinte de direito, nos casos em que seja reconhecida a não recuperação do tributo perante o contribuinte de fato. Veja-se:
Súmula 546. Cabe a restituição do tributo pago indevidamente, quando reconhecido por decisão que o contribuinte de jure não recuperou do contribuinte de facto o quantum respectivo.
Com efeito, o entendimento da jurisprudência pátria, especialmente do Superior Tribunal de Justiça, em regra, é no sentido de inadmitir que o contribuinte de fato pleiteie a repetição do indébito tributário, uma vez que, segundo o entendimento daquele Tribunal, ele não faz parte da relação jurídico-tributária, por não ser sujeito passivo do tributo.
Com efeito, segundo o supracitado entendimento jurisprudencial, a restituição do tributo indireto está restrito a duas únicas hipóteses, qual seja, a pedida pelo contribuinte de direito que tenha como comprovar a assunção dos ônus tributários, ou, tendo o contribuinte de direito repercutido o ônus econômico do tributo, esteja autorizado pelo contribuinte de fato a pleitear a repetição.
Portanto, deve-se obedecer aos preceitos legais explicitados no Código Tributário Nacional e aos delineamentos constantes dos entendimentos consolidados no STF e do STJ para a repetição do indébito tributários.
3 DA CORREÇÃO MONETÁRIA NA REPETIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO
Embora o Código Tributário Nacional não aborde sobre a correção monetária, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, consolidado na Súmula 162, é que a sua incidência ocorre a partir do pagamento indevido pelo sujeito passivo. Acompanhe-se:
Súmula 162. Na repetição de indébito tributário, a correção monetária incide a partir do pagamento indevido.
Com efeito, o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça quanto à correção monetária está em perfeita harmonia com o princípio da reparação integral, haja vista que recompõe a desvalorização da moeda, em virtude das perdas inflacionárias perenes.
Por sua vez, a Lei nº. 9.250, de 26 de dezembro de 1995, que alterou a legislação do imposto de renda das pessoas físicas e deu outras providências, enuncia que a correção monetária e incidência de juros sejam realizadas através de um único índice, a taxa SELIC:
Art. 39 (omissis)
§ 4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.
Desse modo, a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC para títulos federais passou a ser utilizada desde 1º de janeiro de 1996, incidindo desde o pagamento indevido do tributo, até o mês anterior ao da restituição, aplicando-se 1% de juros no mês em que estiver sendo efetuada a repetição.
De grande monta foram as discussões judiciais quanto à aplicação da SELIC, em conformidade com o art. 39, § 4º, da Lei 9.250/95, em contrapartida do que enuncia o art. 167 do Código Tributário Nacional. Ainda assim, decidiu o Superior Tribunal de Justiça pela aplicação da SELIC a partir de 1º de janeiro de 1996, no REsp nº. 1.111.175 – SP, julgado pela sistemática do art. 543-C do CPC:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL SUBMETIDO À SISTEMÁTICA PREVISTA NO ART. 543-C DO CPC. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. NÃO-OCORRÊNCIA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. JUROS DE MORA PELA TAXA SELIC. ART. 39, § 4º, DA LEI 9.250⁄95. PRECEDENTES DESTA CORTE. 1. Não viola o art. 535 do CPC, tampouco nega a prestação jurisdicional, o acórdão que adota fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia. 2. Aplica-se a taxa SELIC, a partir de 1º.1.1996, na atualização monetária do indébito tributário, não podendo ser cumulada, porém, com qualquer outro índice, seja de juros ou atualização monetária. 3. Se os pagamentos foram efetuados após 1º.1.1996, o termo inicial para a incidência do acréscimo será o do pagamento indevido; no entanto, havendo pagamentos indevidos anteriores à data de vigência da Lei 9.250⁄95, a incidência da taxa SELIC terá como termo a quo a data de vigência do diploma legal em tela, ou seja, janeiro de 1996. Esse entendimento prevaleceu na Primeira Seção desta Corte por ocasião do julgamento dos EREsps 291.257⁄SC, 399.497⁄SC e 425.709⁄SC. 4. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão sujeito à sistemática prevista no art. 543-C do CPC, c⁄c a Resolução 8⁄2008 – Presidência⁄STJ. (RECURSO ESPECIAL Nº 1.111.175 – SP (2009⁄0018825-6), RELATORA: MINISTRA DENISE ARRUDA, RECORRENTE: SOFT SPUMA INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA, ADVOGADO: WALDEMAR CURY MALULY JUNIOR E OUTRO(S), RECORRIDO: FAZENDA NACIONAL, ADVOGADO: PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL, Brasília (DF), 10 de junho de 2009 (Data do Julgamento), DJe: 01/07/2009). (Grifou-se).
No mesmo sentido e explicitando melhor o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, argumenta o seguinte julgado:
TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PRESCRIÇÃO. NOVA ORIENTAÇÃO FIRMADA PELA 1ª SEÇÃO DO STJ NA APRECIAÇÃO DO ERESP 435.835/SC. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS. COMPENSAÇÃO. TRIBUTOS DE DIFERENTES ESPÉCIES. SUCESSIVOS REGIMES DE COMPENSAÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA OU EXAME DA CAUSA À LUZ DO DIREITO SUPERVENIENTE. INVIABILIDADE.1. A 1ª Seção do STJ, no julgamento do ERESP 435.835/SC, Rel. p/ o acórdão Min. José Delgado, sessão de 24.03.2004, consagrou o entendimento segundo o qual o prazo prescricional para pleitear a restituição de tributos sujeitos a lançamento por homologação é de cinco anos, contados da data da homologação do lançamento, que, se for tácita, ocorre após cinco anos da realização do fato gerador -sendo irrelevante, para fins de cômputo do prazo prescricional, a causa do indébito. Adota-se o entendimento firmado pela Seção, com ressalva do ponto de vista pessoal, no sentido da subordinação do termo a quo do prazo ao universal princípio da actio nata (voto-vista proferido nos autos do ERESP 423.994/SC, 1ª Seção, Min. Peçanha Martins, sessão de 08.10.2003). 2. Está assentada nesta Corte a orientação segundo a qual são os seguintes os índices a serem utilizados na repetição ou compensação de indébito tributário: (a) IPC, de março/1990 a janeiro/1991; (b) INPC, de fevereiro a dezembro/1991; (c) UFIR, a partir de janeiro/1992; (d) taxa SELIC, exclusivamente, a partir de janeiro/1996. 3. Está pacificado nesta Corte o entendimento de que é inaplicável o IGP-M nos meses de julho e agosto de 1994, devendo ser utilizada, no período, a UFIR. 4. Nos casos de repetição de indébito tributário, a orientação prevalente no âmbito da 1ª Seção quanto aos juros pode ser sintetizada da seguinte forma: (a) antes do advento da Lei 9.250/95, incidia a correção monetária desde o pagamento indevido até a restituição ou compensação (Súmula 162/STJ), acrescida de juros de mora a partir do trânsito em julgado (Súmula 188/STJ), nos termos do art. 167, parágrafo único, do CTN; (b) após a edição da Lei 9.250/95, aplica-se a taxa SELIC desde o recolhimento indevido, ou, se for o caso, a partir de 1º.01.1996, não podendo ser cumulada, porém, com qualquer outro índice, seja de atualização monetária, seja de juros, porque a SELIC inclui, a um só tempo, o índice de inflação do período e a taxa de juros real. 5. É legítima a utilização da taxa SELIC como índice de correção monetária e de juros de mora, na atualização dos créditos tributários. 6. A compensação, modalidade excepcional de extinção do crédito tributário, foi introduzida no ordenamento pelo art. 66 da Lei 8.383/91, limitada a tributos e contribuições da mesma espécie. 7. A Lei 9.430/96 trouxe a possibilidade de compensação entre tributos de espécies distintas, a ser autorizada e realizada pela Secretaria da Receita Federal, após a análise de cada caso, a requerimento do contribuinte ou de ofício (Decreto 2.138/97), com relação aos tributos sob administração daquele órgão. 8. Essa situação somente foi modificada com a edição da Lei 10.637/02, que deu nova redação ao art. 74 da Lei 9.430/96, autorizando, para os tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, a compensação de iniciativa do contribuinte, mediante entrega de declaração contendo as informações sobre os créditos e débitos utilizados, cujo efeito é o de extinguir o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação. 9. Além disso, desde 10.01.2001, com o advento da Lei Complementar 104, que introduziu no Código Tributário o art. 170-A, segundo o qual "é vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial", agregou-se novo requisito para a realização da compensação tributária: a inexistência de discussão judicial sobre os créditos a serem utilizados pelo contribuinte na compensação. 10. Atualmente, portanto, a compensação será viável apenas após o trânsito em julgado da decisão, devendo ocorrer, de acordo com o regime previsto na Lei 10.637/02, isto é, (a) por iniciativa do contribuinte, (b) entre quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, (c) mediante entrega de declaração contendo as informações sobre os créditos e débitos utilizados, cujo efeito é o de extinguir o crédito tributário, sob condição resolutória de sua ulterior homologação. 11. É inviável, no âmbito do recurso especial, não apenas a aplicação retroativa do direito superveniente, mas também a apreciação da causa à luz de seus preceitos, os quais, ao mesmo tempo em que ampliaram o rol das espécies tributárias compensáveis, condicionaram a realização da compensação a outros requisitos, cuja existência não constou da causa de pedir e nem foi objeto de exame nas instâncias ordinárias. 12. No caso concreto, tendo em vista o regime normativo vigente à época da postulação (2000), não poderia o pedido ser atendido. Todavia, por força do princípio da vedação da reformatio in pejus, deve prevalecer o entendimento esposado no acórdão recorrido, no sentido de possibilitar a compensação dos valores indevidamente recolhidos a título de PIS apenas com parcelas do próprio PIS, o que, evidentemente, não compromete o eventual direito da impetrante de proceder à compensação dos créditos na conformidade com as normas supervenientes, se atender aos requisitos próprios. 13. Recurso especial a que se dá parcial provimento. (715665 SP 2005/0009031-0, Relator: Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, Data de Julgamento: 15/03/2005, T1 – PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 04/04/2005 p. 231). (Grifou-se).
Com efeito, como a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia – SELIC alberga, num mesmo índice, correção monetária e juros de mora, não pode ser cumulada com quaisquer outros índices de correção e juros no período em que for aplicada. Veja-se:
PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. DISSÍDIO NOTÓRIO. ALÍNEA C. POSSIBILIDADE DE ANÁLISE. TAXA SELIC. LEGALIDADE. CUMULAÇÃO COM OUTROS ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO. VEDAÇÃO. ENTENDIMENTO FIRMADO EM RECURSO REPETITIVO. RESP PARADIGMA: 1.111.175/SP. APLICAÇÃO EM ÂMBITO ESTADUAL. POSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA A PARTIR DA VIGÊNCIA DA LEI LOCAL. VEDAÇÃO. ENTENDIMENTO FIRMADO EM RECURSO REPETITIVO. RESP PARADIGMA: 1.111.189/SP. UFESP. LEGALIDADE. PRECEDENTES. 1. A jurisprudência do STJ reconhece, com ressalvas, a possibilidade de mitigar as exigências de natureza formal para o conhecimento de recurso especial pela alínea c quando tratar-se de dissídio jurisprudencial notório. Precedentes. 2. O entendimento do STJ é pacífico no sentido de que a taxa SELIC não pode ser cumulada com quaisquer outros índices de correção monetária e juros de mora. REsp 1.111.175/SP, relatoria da Min.Denise Arruda, julgado em 10.6.2009, DJe 1.7.2009 (art. 543-C doCPC). 3. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.111.189/SP, confirmou entendimento no sentido de que "a jurisprudência do STJ considera incidente a taxa SELIC na repetição de indébito de tributos estaduais a partir da data de vigência da lei estadual que prevê a incidência de tal encargo sobre o pagamento atrasado de seus tributos". REsp 1111189/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki,Primeira Seção, julgado em 13.5.2009, DJe 25.5.2009 (art. 543-C do CPC). REsp 1.111.189/SP4. "A Primeira Seção pacificou o entendimento de que é possível a aplicação da UFESP como índice de correção monetária dos débitos ecréditos fiscais do Estado de São Paulo, assim como a respeito dasua atualização pelo IPC/FIPE" (REsp 829.598/SP, Rel. Min. ElianaCalmon, Segunda Turma, DJe 24.3.2009). 5. Para evitar a cumulação da Taxa SELIC com outros índices de atualização, é devida a incidência da UFESP até a entrada em vigor da Lei Estadual n. 10.175/98, momento a partir do qual incidirá tão somente a Taxa SELIC, garantido-se, assim, a aplicação isolada das referidas taxas. Agravo regimental parcialmente provido.10.175 (1261667 SP 2011/0079915-2, Relator: Ministro HUMBERTO MARTINS, Data de Julgamento: 06/03/2012, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 13/03/2012, undefined).
Por outro giro, gize-se que a Lei 9.250/95 tem cunho federal, ou seja, é aplicável apenas no âmbito da União, uma vez que não diz respeito a tributos estaduais e/ou municipais.
Nesse norte, apenas se autoriza a incidência da SELIC nas restituições de tributos de competência dos Municípios e dos Estados, caso lei específica desses entes autorizem. Esse é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça:
TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA. PRESCRIÇÃO. APLICAÇÃO RETROATIVA DO ART. 3º DA LC 118/2005. INCONSTITUCIONALIDADE. MATÉRIA APRECIADA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC. SELIC. UTILIZAÇÃO COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO PELO MUNICÍPIO. EXISTÊNCIA DE PREVISÃO NA LEGISLAÇÃO LOCAL. Admite-se o conhecimento de matéria de ordem pública, mesmo não havendo prequestionamento, desde que a instância especial tenha sido aberta por outra questão, o que veio a ocorrer in casu. Precedentes do STJ. 2. Conforme decidido pela Corte Especial, é inconstitucional a segunda parte do art. 4º da LC 118/2005, que determina a aplicação retroativa do disposto em seu art. 3º. 3. Orientação reafirmada pela Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.002.932/SP, submetido ao rito do art. 543-C do CPC. 4. A utilização da taxa Selic, no que diz respeito à cobrança ou à restituição de tributo, no âmbito dos Estados ou Municípios, é condicionada à existência de lei própria (estadual ou municipal) que determine a sua aplicação nessas hipóteses, ou ao menos em alguma delas (aplicação do princípio da isonomia). 5. No caso concreto, existe norma específica que disciplina a utilização da taxa Selic na esfera dos tributos relacionados à competência do Município de Belo Horizonte (Lei Municipal 7.738/1997). 6. Agravo Regimental não provido. REsp 1.002.932/SP (1228193 MG 2010/0214120-1, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 22/03/2011, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/04/2011, undefine. (Grifou-se).
Sendo assim, continua-se aplicando o art. 167, par. único, do CTN e as Súmulas 188 e 162 do STJ aos Estados e Municípios da Federação, enquanto tais entes não instituírem lei autorizando a aplicação da SELIC. De outro modo, no âmbito da União, é plenamente aplicável a SELIC, desde 1º de janeiro de 1996, a partir do pagamento indevido, de acordo com a Lei n.º 9.250/95.
4 DO RESSARCIMENTO DO CRÉDITO ESCRITURAL E SUA DIFERENCIAÇÃO EM FACE DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO TRIBUTÁRIO
Os créditos escriturais não se confundem com créditos tributários, uma vez que são valores consignados na escrita fiscal de uma empresa e que, devido a um benefício fiscal previsto em lei, pode ser objeto de ressarcimento em dinheiro ou por meio de compensação pela administração tributária.
Com efeito, conforme exposto acima, a repetição de indébito ocorre quando há o pagamento indevido de tributo por parte do sujeito passivo, ou seja, a lei impõe um adimplemento em dinheiro ao contribuinte ou responsável tributário, sendo este realizado de forma equivocada.
O aproveitamento de créditos escriturais não passa de benefício fiscal e, por isso, apenas ocorre quando há previsão legal para isso, na forma do art. 150, § 6º, da Constituição Federal.
Ou seja, o Poder Legislativo permite que o Fisco, por benevolência, ressarça o contribuinte mediante algumas situações específicas que, na maioria das vezes, economicamente, trazem prejuízo aos negócios das empresas.
De fato, por ser benefício fiscal, em regra, não se fala em correção monetária, haja vista que a Fazenda Pública não tem em seu poder valor de propriedade do sujeito passivo da obrigação tributária.
Por isso, a falta de obstáculo ao aproveitamento dos créditos pelo contribuinte não pode gerar ônus para o Fisco, até mesmo porque não obteve disponibilidade financeira, pois, como dito, trata-se de crédito de natureza escritural.
Ora, nesses casos, não há desembolso de valores pelo sujeito passivo, motivo por que não há ingresso de numerário nos cofres públicos, sendo os referidos créditos apenas escriturados nos livros das empresas, sob suas titularidades, sendo possível sua utilização quando houver lei nesse sentido.
Com efeito, na maioria dos casos previstos em lei, quando ocorre a impossibilidade de utilização desses créditos escriturais para abatimento do tributo, o contribuinte requer à administração tributária o seu ressarcimento.
Contudo, o pedido do sujeito passivo pode demorar a ser atendido, acarretando defasagem do valor que não existiria se fosse reconhecido tempestivamente ou se pudesse ser utilizado na escrita fiscal.
Daí porque, o aproveitamento de créditos escriturais, em regra, não enseja correção monetária, a não ser que o creditamento seja impedido por óbice ilegítimo do Fisco, conforme entendimento consolidado na Súmula nº 411/STJ, in verbis:
É devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do Fisco.
O Superior Tribunal de Justiça, em recurso representativo da controvérsia, firmou o entendimento de que nos casos de pedidos de ressarcimento de créditos deve incidir a correção monetária se houver demora no atendimento pela Secretaria da Receita Federal do Brasil. Confira-se:
PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. IPI. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. EXERCÍCIO DO DIREITO DE CRÉDITO POSTERGADO PELO FISCO. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE CRÉDITO ESCRITURAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. INCIDÊNCIA.
1. A correção monetária não incide sobre os créditos de IPI decorrentes do princípio constitucional da não-cumulatividade (créditos escriturais), por ausência de previsão legal.
2. A oposição constante de ato estatal, administrativo ou normativo, impedindo a utilização do direito de crédito oriundo da aplicação do princípio da não-cumulatividade, descaracteriza referido crédito como escritural, assim considerado aquele oportunamente lançado pelo contribuinte em sua escrita contábil.
3. Destarte, a vedação legal ao aproveitamento do crédito impele o contribuinte a socorrer-se do Judiciário, circunstância que acarreta demora no reconhecimento do direito pleiteado, dada a tramitação normal dos feitos judiciais.
4. Consectariamente, ocorrendo a vedação ao aproveitamento desses créditos, com o consequente ingresso no Judiciário, posterga-se o reconhecimento do direito pleiteado, exsurgindo legítima a necessidade de atualizá-los monetariamente, sob pena de enriquecimento sem causa do Fisco (Precedentes da Primeira Seção: EREsp 490.547/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.09.2005, DJ 10.10.2005; EREsp 613.977/RS, Rel. Ministro José Delgado, julgado em 09.11.2005, DJ 05.12.2005; EREsp 495.953/PR, Rel. Ministra Denise Arruda, julgado em 27.09.2006, DJ 23.10.2006; EREsp 522.796/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 08.11.2006, DJ 24.09.2007; EREsp 430.498/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, julgado em 26.03.2008, DJe 07.04.2008; e EREsp 605.921/RS, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 12.11.2008, DJe 24.11.2008).
5. Recurso especial da Fazenda Nacional desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.
(REsp 1035847/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/06/2009, DJe 03/08/2009)
Há que se salientar que o art. 24 da Lei 11.457/2007 estabeleceu que a decisão administrativa referente a pedidos administrativos efetuados à Receita Federal deve ser emitida no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta dias). Confira-se:
Art. 24. É obrigatório que seja proferida decisão administrativa no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias a contar do protocolo de petições, defesas ou recursos administrativos do contribuinte.
Nesse norte, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que há resistência injustificada quando ultrapassados os 360 (trezentos e sessenta dias) sem que a administração tributária se manifeste acerca do pedido ressarcimento do contribuinte, autorizando-se a correção monetária. Veja-se:
TRIBUTÁRIO. CRÉDITOS DE PIS/COFINS. REGIME NÃO CUMULATIVO. RESSARCIMENTO. APRECIAÇÃO DO PEDIDO ADMINISTRATIVO PELO FISCO. ESCOAMENTO DO PRAZO DE 360 DIAS PREVISTO NO ART. 24 DA LEI 11.457/07. RESISTÊNCIA ILEGÍTIMA CONFIGURADA. SÚMULA 411/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA DEVIDA. TERMO INICIAL. TAXA SELIC 1. A Primeira Seção desta Corte Superior, no julgamento do REsp 1.035.847/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC, firmou entendimento no sentido de que o aproveitamento de créditos escriturais, em regra, não dá ensejo à correção monetária, exceto quanto obstaculizado injustamente o creditamento pelo fisco.
2. "É devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do Fisco" (Súmula 411/STJ).
3. Em tais casos, a correção monetária, pela taxa SELIC, deve ser contada a partir do fim do prazo de que dispõe a administração para apreciar o pedido do contribuinte, que é de 360 dias (art. 24 da Lei 11.457/07). Nesse sentido: REsp 1.138.206/RS, submetido ao rito do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/STJ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1467934/RS, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 24/02/2015, DJe 06/03/2015)
Ainda assim, a atualização monetária, nas referidas hipóteses de exceção, deve ser realizada pela SELIC, a qual será computada quando escoado o prazo para a análise do requerimento administrativo. Mais uma vez, acompanhe-se o entendimento do STJ:
TRIBUTÁRIO. CRÉDITO ESCRITURAL E CRÉDITO PRESUMIDO. PEDIDOS ADMINISTRATIVOS DE RESSARCIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMO A QUO. APÓS PRAZO LEGAL DE 360 DIAS. ART. 24 DA LEI 11.457/07.
1. Consoante a jurisprudência assentada pelo STJ, o direito à correção monetária de crédito escritural é condicionado à existência de ato estatal impeditivo de seu aproveitamento no momento oportuno.
Em outros termos, é preciso que fique caracterizada a “resistência ilegítima do Fisco”, na linha do que preceitua a Súmula 411/STJ: "É devida a correção monetária ao creditamento do IPI quando há oposição ao seu aproveitamento decorrente de resistência ilegítima do Fisco".
2. Em tais casos, a correção monetária, pela taxa Selic, deve ser contada a partir do fim do prazo de que dispõe a administração para apreciar o pedido do contribuinte, que é de 360 dias (art. 24 da Lei 11.457/07). Nesse sentido: AgRg nos EREsp 1.490.081/SC, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, DJe de 1°.7.2015.
3. Agravo Interno não provido.
(AgInt no REsp 1585275/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 14/10/2016) (Grifou-se)
Portanto, por ser benefício fiscal e distinto da repetição do indébito tributário, o ressarcimento de crédito escritural somente poderá ter incidência de atualização monetária quando houver resistência injustificada do Fisco, uma vez que perderá sua natureza contábil.
5 CONCLUSÃO
Por meio desse artigo se abordou o ressarcimento de crédito escritural, a qual está fundado em lei e tem natureza de favor fiscal.
Nessa senda, diferentemente das hipóteses de repetição de indébito tributário, a correção dos créditos escriturais somente ocorre quando há resistência injustificada da administração tributária, na forma da Súmula 411/STJ.
Por sua vez, a correção monetária deve incidir quando esgotado o prazo de 360 (trezentos e sessenta) dias previsto no art. 24 da Lei 11.057/2007 ou no momento do ato concreto da resistência injustificada.
Sendo assim, em regra, a correção monetária não incide no ressarcimento de créditos escriturais.
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Procurador da Fazenda Nacional. Ex-Analista do Ministério Público da União/Apoio Jurídico/Direito. Ex-Assistente Nível III em Gabinete de Subprocuradora-Geral da República. Especialista em Direito Tributário.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAGAS, Erick Joseph Rabelo. A correção monetária no ressarcimento do crédito escritural Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 jun 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50327/a-correcao-monetaria-no-ressarcimento-do-credito-escritural. Acesso em: 22 nov 2024.
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