ANTÔNIO CÉSAR MELLO (orientador): Professor da Faculdade Católica do Tocantins; doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Resumo: Diante da interpretação dos direitos sociais fundamentais, quais sejam, o direito à educação e à igualdade, da análise prática da ineficiência quanto a inclusão de crianças com necessidades especiais e frente a existência de leis que garantem o acesso ao ensino regular e sua eficácia, a dificuldade encontrada pelas crianças com necessidades especiais é a da falta de escolas preparadas para recebe-las, seja por insufiência na estrutura física ou pela ausência de profissionais capacitados e aptos a enfrentar e lidar com as diferenças, o que faz com que estas crianças continuem em situação de desigualdade e desamparo por parte do Estado. Com o objetivo de dispor sobre a educação inclusiva, de modo que quaisquer necessidades especiais sejam vistas com naturalidade, respeitadas e tratadas como meras peculiaridades, como características intrínsecas do indivíduo, garantindo integração, convívio social, e, sobretudo, aprendizagem efetiva, e utilizando-se do método dedutivo, conclui-se que para transformar esta realidade é necessário haver uma reforma cultural, haja vista que a cultura costuma influenciar na subjetividade humana e o que mais afeta o desenvolvimento da educação inclusiva é o preconceito e a discriminação social. No entanto, acredita-se que se houver uma mudança no olhar da sociedade e do Estado, ela não deve ser uma realidade tão distante.
Palavras-chave: Normas Jurídicas. Ineficácia. Educação Inclusiva. Crianças. Necessidades Especiais.
Abstract: Faced with the interpretation of fundamental social rights, namely, the right to education and equality, the practical analysis of inefficiency regarding the inclusion of children with special needs and the existence of laws that guarantee access to regular education and its effectiveness, The difficulty encountered by children with special needs is the lack of schools prepared to receive them, either because of insufficiency in the physical structure or by the absence of trained professionals capable of coping with and dealing with differences, which means that these children remain in situation of inequality and helplessness on the part of the State. With the aim of disposing of inclusive education, so that any special needs are seen naturally, respected and treated as mere peculiarities, as intrinsic characteristics of the individual, guaranteeing integration, social interaction, and, above all, effective learning, it is concluded that to transform this reality it is necessary to have a cultural reform, since culture tends to influence human subjectivity and what most affects the development of inclusive education is prejudice and social discrimination. However, it is believed that if there is a change in the look of society and the state, it should not be such a distant reality.
Keyword: Legal Norms. Ineffectiveness. Inclusive Education. Children. Special Needs.
Sumário: 1 Introdução. 2 A Educação Inclusiva no Ordenamento Jurídico. 3 Vantagens da Educação Inclusiva e Desafio Para a Capacitação de Professores. 4 Comportamento Social e o Papel da Família. 5 Considerações Finais. 6 Referências Bibliográficas.
1. INTRODUÇÃO
O tema se justifica pela grande relevância social à medida que muitos brasileiros conseguem ter seu direito fundamental de acesso à educação garantido, enquanto um grupo de pessoas com necessidades especiais permanecem excluídos e invisíveis, com seus direitos negados e oportunidades limitadas. Assim é preciso ter conhecimento desta realidade para também lutar por ela.
Tamanha essencialidade resta demonstrada pela importância jurídica das disposições legais em que se embasam a educação inclusiva. Ela está pautada no ramo constitucional e também nos direitos sociais. Dois principais direitos a sustentam, são eles o direito à educação e o direito à igualdade.
Caso não compreendida a temática, a sociedade permanecerá imersa em pré-conceitos e falsas verdades sobre o desenvolvimento e realidade de crianças com necessidades especiais, e estas, sem o devido reconhecimento, acesso e incentivo à educação, que se mostra crucial ao avanço e crescimento de qualquer cidadão, não havendo nenhuma melhora ou redução de desigualdades e problemas sociais enfrentados pelo Brasil.
Diante das demais dificuldades e desigualdades sociais enfrentadas no Brasil, sejam elas motivadas pela história, condição econômica, acesso à educação e falta de oportunidades, necessário se faz discutir formas para transformar o presente e avançar. Estas transformações, no entanto, devem ser discutidas dentro da lei, de forma que não firam nenhum preceito legal, afim de proporcionar, de fato, as garantias fundamentais de qualquer cidadão.
É neste contexto que surge a educação inclusiva, uma medida que objetiva reduzir desigualdades de forma imediata. O problema é que ainda não é uma realidade presente e possível na grande maioria das cidades brasileiras, em virtude da ausência de atuação do Estado nesta área.
Os direitos sociais asseguram a todos a possibilidade de obter do Estado idênticas oportunidades para que possam desenvolver-se fisicamente, eticamente e profissionalmente de acordo com suas aptidões e projetos de vida.
Fundamentada nestes princípios de direitos humanos e cidadania, a educação inclusiva é um movimento que tem por objetivo eliminar a discriminação e a exclusão, para garantir direito à igualdade de oportunidades e à diferença, transformando os sistemas de ensino, de modo a propiciar a participação de todos os alunos, com foco específico naqueles vulneráveis à marginalização e a exclusão.
Significa, assim, a inclusão de todas as pessoas, independentemente de seu talento, deficiência, nível socioeconômico ou cultural, em salas de aula com todas as suas necessidades sendo atendidas.
Quando ocorre essa falha na aplicação prática do direito à educação passa-se a interferir em outro direito constitucional fundamental, o direito à igualdade. Ocorre que a igualdade aqui discutida deve ser vista aos olhos da justiça social, ou seja, deve-se buscar uma equiparação entre os estudantes de forma que todos tenham idênticas oportunidades de acesso à educação.
Quer dizer, não é justo que aqueles que não tiveram acesso à educação inclusiva efetiva e de qualidade, sejam prejudicados em sua vivência cotidiana, que não estejam qualificados e aptos para desenvolver funções no mercado de trabalho, que não se desenvolvam como um cidadão comum, com todas as suas capacidades exploradas e ampliadas, apesar de suas diferenças, pois dessa forma fica claro que o grupo privilegiado sempre estará em constante vantagem e destaque na sociedade, o que determina um quadro de desigualdade.
Com isso, pensar em uma escola inclusiva significa, em um primeiro momento, pensar em uma escola para cada um, isto é, em uma escola em que cada aluno seja atendido de acordo com suas necessidades e dificuldades, com recursos e metodologias que propiciem o seu aprendizado e desenvolvimento. (WARICODA et al, 2005 apud MIRANDA, 2001).
Ao contrário, a realidade da educação inclusiva, além de pouco aceita e de credibilidade limitada frente a sociedade, também não possui escolas preparadas para receber estes alunos com necessidades especiais, tanto no âmbito físico quanto no de recursos humanos. Aponta Waricoda et al (2005, apud GLAT, 1998) que o professor, neste contexto, deve estar preparado para lidar com as diferenças, com a singularidade e a diversidade de todos os alunos.
No entanto, o que se vê no mundo prático é o total oposto, as escolas não estão aptas a identificar e responder às necessidades de seus alunos, nem a acomodar tantos estilos e ritmos diferentes de aprendizagem, garantindo uma educação de qualidade a todos. (WARICODA et al, 2005 apud MENDES, 2002).
Por todo o exposto, para alcançar os objetivos propostos primeiramente falar-se-á da educação inclusiva no ordenamento jurídico. Em um segundo momento serão expostas as vantagens desse modelo de educação e desafios para a capacitação dos professores e finalmente será explanado sobre o comportamento social e o papel da família nesse papel inclusivo.
2. A EDUCAÇÃO INCLUSIVA NO ORDENAMENTO JURÍDICO
Com o avanço dos anos e da sociedade, a problemática que envolve as pessoas com necessidades especiais e a educação inclusiva recebem maior importância, em função das modificações nas concepções envolvendo esta temática, foi surgindo uma nova forma de entender a problemática dos deficientes na perspectiva pseudoeducativa. Assim, por volta das décadas de 80 e 90 do século passado, a educação inclusiva, em busca de um único sistema educacional para todas as pessoas, ganha repercussão. (WARICODA et al. 2005, p. 2).
A partir de 1990, principalmente com a realização da Conferência Mundial sobre Educação para Todos, ocorrida em Jomtien – Tailândia –, as políticas de educação em vários países têm estado voltadas para a melhoria dos aspectos relativos à qualidade da educação para todos os indivíduos, abrangendo desde as minorias éticas, crianças em situação de vulnerabilidade e pessoas com deficiências, dentre outros. Frente a esse cenário é que nas últimas décadas foram realizados vários eventos que culminaram na criação de documentos com repercussão internacional sobre os destinos da Educação. Dentre os documentos produzidos, merecem destaque a Declaração Mundial da Educação para Todos, de 1990, resultado da referida Conferência, que apresentou o compromisso de várias nações de atenderem às necessidades de aprendizagem a todas as crianças, e a Declaração de Salamanca (Espanha), de 1994, que proporcionou a oportunidade da inserção da educação especial dentro da estrutura ampla de educação, além de apresentar encaminhamentos de diretrizes básicas para a formulação e a reforma de políticas e sistemas educacionais. (SANT’ANA, 2011, p. 2).
A partir da Declaração de Salamanca, em 1994, a inclusão escolar de crianças com necessidades especiais no ensino regular tem sido tema de pesquisas e de eventos científicos, abordando-se desde os pressupostos teóricos políticofilosóficos até formas de implementação das diretrizes estabelecidas na referida declaração. (SANT’ANA, 2005, p. 1).
Ao que tange as novas propostas de inclusão, a Declaração de Salamanca (Brasil, 1994) destaca que o provimento de serviços de apoio é extremamente necessário para o sucesso de políticas educacionais inclusivas. Nesse contexto, o psicólogo escolar e outros profissionais de várias agências e instituições participariam de um grupo multidisciplinar e externo a fim de propiciar apoio, que estaria à disposição das crianças com necessidades educacionais especiais, conforme disposição contida no tópico 49 do dispositivo. (SANT’ANA, 2011).
Delibera o tópico 49 da Declaração de Salamanca, que o apoio externo do pessoal de recurso de várias agências, departamentos e instituições, tais como professor-consultor, psicólogos escolares, fonoaudiólogos e terapeutas ocupacionais, etc., deveria ser coordenado em nível local. O agrupamento de escolas tem comprovadamente se constituído numa estratégia útil na mobilização de recursos educacionais bem como no envolvimento da comunidade.
Grupos de escolas poderiam ser coletivamente responsáveis pela provisão de serviços a alunos com necessidades educacionais especiais em suas áreas e (a tais grupos de escolas) poderia ser dado o espaço necessário para alocarem os recursos conforme o requerido. Tais arranjos também deveriam envolver serviços não educacionais. De fato, a experiência sugere que serviços educacionais se beneficiariam significativamente caso maiores esforços fossem feitos para assegurar o ótimo uso de todo o conhecimento e recursos disponíveis.
Em alinhamento com disposto no tópico apontado, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), estabelece à luz do Artigo 58, inciso I, que “haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela da educação especial”.
Apesar da necessidade de preparação adequada dos agentes educacionais estar preconizada na Declaração de Salamanca (Brasil, 1994) e na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Brasil, 1996) como fator fundamental para a mudança em direção às escolas integradoras, o que tem acontecido nos cursos de formação docente, em termos gerais, é a ênfase dada aos aspectos teóricos, com currículos distanciados da prática pedagógica, não proporcionando, por conseguinte, a capacitação necessária aos profissionais para o trabalho com a diversidade dos educandos (Glat, Magalhães & Carneiro, 1998). A formação deficitária traz sérias consequências à efetivação do princípio inclusivo, pois este pressupõe custos e rearranjos posteriores que poderiam ser evitados. (SANT’ANA, 2005, p. 2).
Ainda neste sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) estabelece como deve ser proposta e desenvolvida a educação inclusiva:
Art. 59. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação:
I - currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e organização específicos, para atender às suas necessidades;
II - terminalidade específica para aqueles que não puderem atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental, em virtude de suas deficiências, e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados;
III - professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores do ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns;
IV - educação especial para o trabalho, visando a sua efetiva integração na vida em sociedade, inclusive condições adequadas para os que não revelarem capacidade de inserção no trabalho competitivo, mediante articulação com os órgãos oficiais afins, bem como para aqueles que apresentam uma habilidade superior nas áreas artística, intelectual ou psicomotora;
V - acesso igualitário aos benefícios dos programas sociais suplementares disponíveis para o respectivo nível do ensino regular.
Demonstra ainda o dever do Estado de garantir educação inclusiva pública em seu artigo 4º, inciso III, preceituando que o “atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, transversal a todos os níveis, etapas e modalidades, preferencialmente na rede regular de ensino”.
A Constituição Brasileira de 1988 garante o acesso ao Ensino Fundamental regular a todas as crianças e adolescentes, sem exceção. E deixa claro que a criança com necessidade educacional especial deve receber atendimento especializado complementar, de preferência dentro da escola. A inclusão ganhou reforços com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de 1996, e com a Convenção da Guatemala, de 2001. Esta última proíbe qualquer tipo de diferenciação, exclusão ou restrição baseadas na deficiência das pessoas. Sendo assim, mantê-las fora do ensino regular é considerado exclusão - e crime. (CAVALCANTE, 2012).
Neste mesmo sentido está estabelecido na Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo 208, inciso III, que “o dever do Estado com a Educação será efetivado com base nos seguintes princípios: atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino”. (BRASIL, 1988, s.p.).
A luz do direito penal, segundo Fávero (2007), o acesso de crianças com deficiência também é previsto na legislação penal, já que condutas que frustram, sem justa causa, a matrícula de alunos com deficiência, configuram-se como crime, de acordo com o artigo 8º da Lei nº 7.853/89. Sendo assim, a exclusão por si só é crime. (BIAGGIO, 2007).
O artigo 8º da Lei nº 7.853/89 preceitua ser crime punível com reclusão de 02 a 05 anos e multa a recusa, cobrança de valores adicionais, suspensão, procrastinação, cancelamento ou cessação da inscrição de alunos em estabelecimento de ensino de qualquer curso ou grau, público ou privado, em razão de deficiência. (BRASIL, 1989).
Resta, sem dúvidas, provado o direito a educação inclusiva garantido em muitas vias, sendo necessário enfoque, aprofundamento e compreensão desta área.
3. VANTAGENS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA E DESAFIO PARA A CAPACITAÇÃO DE PROFESSORES
Para Rosa Blanco (2007, p. 20), o conceito de inclusão é “holístico, um modelo educacional guiado pela certeza de que discriminar seres humanos é filosoficamente ilegal, e incluir é acreditar que todos têm o direito de participar ativamente da educação e da sociedade em geral”
Essa nova proposta educacional tem como alicerce: acessibilidade, projeto político-pedagógico, criação de redes e de parcerias, formação de professores e atendimento educacional especializado. (BIAGGIO, 2007).
A inclusão “consiste em adequar os sistemas sociais gerais da sociedade de tal modo que sejam eliminados os fatores que excluíam certas pessoas do seu meio e mantinham afastadas aquelas que foram excluídas”. (SASSAKI, 2005, p. 21). Possibilita a sociedade se estruturar, organizar, adaptar para receber as pessoas com deficiência, devendo ser eliminadas todas as barreiras que discriminam os sujeitos da sociedade, sejam elas arquitetônicas, metodológicas, instrumentais, atitudinais. (LIMA et al, 2013)
Independentemente do gênero, classe social ou outras características individuais e/ou sociais, a inclusão é um direito fundamental de todas as crianças. Enquanto direito fundamental, o direito à inclusão não pode ser negado a nenhum grupo social nem a nenhuma faixa etária. A inclusão garante que todos os alunos, independentemente das suas características e diferenças, acedam a uma educação de qualidade e vivam experiências significativas. (BRANDÃO, 2013, apud BAPTISTA, 1999; BÉNARD DA COSTA, 1999; CÉSAR, 2003).
A inclusão obriga a repensar a diferença, pois cada criança tem características, interesses, capacidades e necessidades de aprendizagem que lhe são próprias. (BRANDÃO, 2013).
Na perspectiva inclusiva, aceitar a diferença implica respeitar as características, os interesses, as motivações e os projetos de vida de cada criança, o que só é possível criando estratégias e recursos educativos capazes de promover o seu desenvolvimento global. A ideia central do princípio da inclusão é que todos os alunos são únicos, com as suas experiências, interesses e atitudes e é a escola que se tem de adaptar aos seus alunos, para tirar partido da diversidade existente. A diferença surge como uma mais-valia, como uma oportunidade de desenvolvimento. (BRANDÃO, 2013, apud AINSCOW, 1999; MORATO, 2003).
Inúmeras são as vantagens para esse modelo de educação dita Escola para Todos, sendo que o impacto parece ser bastante positivo para os diversos intervenientes neste processo, nomeadamente as crianças com necessidades especiais e respectivas famílias e as crianças com desenvolvimento "dito normal" e suas famílias. (BRANDÃO, 2013, apud PECK; ODOM; BRICKER, 1993). Quanto aos benefícios para as crianças e jovens ditos "normais", a redução das atitudes de receio relativamente às diferenças humanas, o desenvolvimento de princípios pessoais e de relações de amizade calorosas, a melhoria no autoconceito, e ainda a melhoria na cognição social. (STAUB E PECK, 1995 apud TANNER; LINSCOTT; GALLIS, 1996).
O motivo principal de crianças frequentarem a escola é poderem encontrar um espaço genuinamente democrático, onde partilham o conhecimento e convivem com a diversidade, propiciando esses mesmos benefícios aos professores e aos alunos não dotados de necessidades especiais. Por isso, quem vive a inclusão sabe que está participando de algo revolucionário. A criança pertence a um grupo, é considerada, tem seus direitos fundamentais respeitados e - mesmo sem saber - colabora para formar adultos tolerantes, solidários e responsáveis para com os outros. A inclusão é, para muitos pais e educadores, mais que uma lei a ser seguida: chega a ser questão de honra e cidadania. (CAVALCANTE, 2012).
No entanto, muitas vezes, por falta de informação ou omissão dos pais, dos educadores ou do poder público, milhares de crianças ainda vivem escondidas em casa ou isoladas em instituições especializadas.
Em razão disto é notória a importância da preparação de profissionais e educadores, em especial do professor de classe comum, para o atendimento das necessidades educativas de todas as crianças, com ou sem deficiências (SANT’ANA, 2005). Ou seja, compreendendo o desenvolvimento como um processo qualitativamente diferente para cada indivíduo.
Na medida em que a orientação inclusiva implica um ensino adaptado às diferenças e às necessidades individuais, os educadores precisam estar habilitados para atuar de forma competente junto aos alunos inseridos, nos vários níveis de ensino. No entanto, autores como Goffredo (1992) e Manzini (1999) têm alertado para o fato de que a implantação da educação inclusiva tem encontrado limites e dificuldades, em virtude da falta de formação dos professores das classes regulares para atender às necessidades educativas especiais, além de infraestrutura adequada e condições materiais para o trabalho pedagógico junto a crianças com deficiência. O que se tem colocado em discussão, principalmente, é a ausência de formação especializada dos educadores para trabalhar com essa clientela, e isso certamente se constitui em um sério problema na implantação de políticas desse tipo”. (SANT’ANA, 2005).
Diante desse quadro, torna-se importante que os professores sejam instrumentalizados a fim de atender às peculiaridades apresentadas pelos alunos. Aqui, tendo-se em vista a capacitação docente, a participação das universidades e dos centros formadores parece ser relevante. (SANT’ANA, 2005).
A universidade, além de proporcionar cursos de aperfeiçoamento e de pós-graduação, deve envolver-se em pesquisas sobre o ensino de pessoas com necessidades especiais, desenvolvendo instrumentos e recursos que facilitem a vida dessas pessoas. (SANT’ANA, 2005 apud GOTTI, 1988). Apesar de a necessidade de preparação adequada dos agentes educacionais estar preconizada na Declaração de Salamanca (Brasil, 1994) e na atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Brasil, 1996) como fator fundamental para a mudança em direção às escolas integradoras, o que tem acontecido nos cursos de formação docente, em termos gerais, é a ênfase dada aos aspectos teóricos, com currículos distanciados da prática pedagógica, não proporcionando, por conseguinte, a capacitação necessária aos profissionais para o trabalho com a diversidade dos educandos (SANT’ANA, 2005 apud GLAT, MAGALHÃES & CARNEIRO, 1998).
Entre as principais dificuldades encontradas estão as mesmas existentes em qualquer escola pública brasileira, além da formação insuficiente dos professores, a saber: baixos salários, falta de apoio pedagógico, infraestrutura e condições de trabalho precárias. Além disso, constatou que as dificuldades apontadas pelos professores referem-se à atuação com a totalidade dos alunos, e não apenas com os que apresentam algum tipo de deficiência. Por último, a autora ressaltou a necessidade de os professores serem orientados a partir de fundamentos teórico-práticos, para que possam modificar práticas e métodos de ensino, com o objetivo de propiciar um ensino de qualidade para todos. (SANT’ANA, 2005, apud CASTRO 1997).
A formação implica um processo contínuo, o qual, segundo Sadalla (1997), precisa ir além da presença de professores em cursos que visem mudar sua ação no processo ensino-aprendizagem. Para a autora, o professor precisa ser ajudado a refletir sobre a sua prática, para que compreenda suas crenças em relação ao processo e se torne um pesquisador de sua ação, buscando aprimorar o ensino oferecido em sala de aula. (SANT’ANA, 2005).
Alinhando-se aos argumentos ante expostos, pode-se perceber que são necessárias mudanças profundas no sistema educacional vigente a fim de garantir o cumprimento dos objetivos da inclusão. Cumpre, então, considerar as inúmeras dificuldades vivenciadas por todos os participantes do cotidiano das escolas que tentam, de diferentes maneiras, viabilizar a educação inclusiva de acordo com suas possibilidades. Aparentemente, a formação continuada pode favorecer a implementação da proposta inclusiva; todavia necessita estar aliada a melhorias nas condições de ensino, ao suporte de profissionais no auxílio ao trabalho do professor, bem como ao compromisso de cada profissional em trabalhar para a concretização dessas mudanças. (SANT’ANA, 2005).
É imprescindível ressaltar necessidade das escolas tornarem-se comunidades acolhedoras, sendo que o primeiro passo desse processo seria o desenvolvimento de uma cultura escolar baseada no reconhecimento, na valorização e no respeito a todos os alunos. (SANT’ANA, 2005 apud KARAGIANNIS, STAINBACK e STAINBACK, 1999).
Torna-se importante, então, não se ter uma visão simplista da educação inclusiva. Compreendendo-a como um processo muito amplo de reforma do sistema escolar. A escola deve abrir espaço para a diversidade humana; os professores devem estar continuamente em busca do aprendizado sobre como se deve ensinar, para que possam proporcionar um ensino de qualidade a todos. Infelizmente como alerta Santos (2001), ainda hoje muitos entendem, erroneamente, a inclusão como simplesmente a prática de colocar pessoas com deficiência estudando com outras não portadoras de necessidades especiais. (TESSARO, 2005, apud SARTORETTO, 2001).
4. COMPORTAMENTO SOCIAL E PAPEL DA FAMÍLIA
Vale ressaltar que o princípio básico da educação inclusiva implica na possibilidade de que todas as crianças aprendam juntas, independentemente de suas dificuldades ou diferenças. SegundoTessaro (2005), as escolas devem reconhecer e responder às diversas necessidades dos alunos, acomodando tanto estilos como ritmos de aprendizagem, assim assegurando um ensino de qualidade a todos.
A integração/inclusão envolve professores mais capacitados em relação às necessidades especiais, bem como uma pedagogia que se ajuste às necessidades de cada criança e a definição de uma política que venha subsidiar princípios e práticas para as necessidades educativas especiais”. (WARICODA, 2005 apud Tesini e Manzini, 1999)
Há muitos educadores, pais e profissionais interessados que confundem a educação inclusiva com uma forma de assistência prestada por abnegados a crianças, jovens e adultos com deficiências. Mesmo quando concebida adequadamente, a educação especial no Brasil é entendida também como um conjunto de métodos, técnicas e recursos especiais de ensino e de formas de atendimento escolar de apoio que se destinam a alunos que não conseguem atender às expectativas e exigências da educação regular. (MANTOAN, 2009)
A formação tradicional em educação especial não se destina a profissionais que terão o compromisso de incluir os excluídos da escola, pois não lhes incute a ideia do especial da educação, que redireciona objetivos e práticas de ensino, pelo reconhecimento e valorização das diferenças. Porque continua a dividir, a separar, a fragmentar o que a escola deve unir, fundir, para se fortalecer e tornar-se justa e democrática, cônscia de seus deveres e dos preceitos constitucionais que garantem a todos os cidadãos brasileiros uma escola sem preconceitos, que não discrimina. (MANTOAN, 2009).
Sendo assim, deve-se entender que educador é aquele que educa, ensina sem olhar a quem, ele ensina sentindo, vendo o outro, compreendendo esse outro, mas não deve se importar com as diferenças, não deve querer padronizar todos, os educandos são diferentes e vão permanecer diferentes, iguais apenas no consentimento do direito e deveres. Resta o professor valorizar essa mistura, hibridismo entre os sujeitos favorecendo a aprendizagem e respeito a todos. (LIMA et al, 2013)
Atualmente existem várias pesquisas que abordam a temática da inclusão escolar do deficiente. Tessaro (2005, apud FALEIROS 2001), em seu estudo sobre educação inclusiva, verificou que os alunos incluídos apresentaram ganhos quanto à socialização e a aprendizagem, contudo, a escola não fornece o apoio necessário para a inclusão desses alunos.
É indispensável o desenvolvimento de planos e projetos que enfatizem a integração social e escolar dessas crianças, a preparação da comunidade escolar para compreender e atuar frente às diferenças individuais, e a sensibilização da comunidade em geral quanto à integração escolar e social desses indivíduos. Existe uma inadequação do paradigma da inclusão e a ausência de um trabalho participativo, entre os educadores e a família, que oriente e esclareça o processo de inclusão de deficientes. Acredita-se que este processo se apresenta inadequado a quem necessita dele, e compromete a proposta do sistema escolar brasileiro, que visa assegurar a todos uma educação que considera a cultura da adversidade. (ROSA, 2005)
Significa incluir todas as pessoas, independentemente de seu talento, deficiência, nível socioeconômico ou cultural, em salas de aula com todas as suas necessidades sendo atendidas. (ROSA, 2005 apud KARAGIANNIS, STAINBACK e STAINBACK, 1999).
Melhor do que organizar escolas culturalmente diferentes, é receber a diversidade numa escola para todos. Uma escola que faça funcionar, ao mesmo tempo, os dois princípios da diferença cultural e da identidade enquanto ser humano; os princípios do direito à diferença e do direito à semelhança. (CHARLOT, 2000)
Na perspectiva e aplicação prática da educação aberta às diferenças e do ensino inclusivo a formação dos professores não acontece pelos mesmos caminhos acima referidos; ela é construída no interior das escolas, continuamente, à medida que os problemas de aprendizagem dos alunos com e sem deficiência aparecem e considerando-se concomitantemente o ensino ministrado, suas deficiências, inadequações, conservadorismo. (MANTOAN, 2009)
Mas tudo isso sendo entendido como um processo de trabalho que é necessário para que a escola acolha a todos os alunos, sem preconceitos e cônscia de seus compromissos de formadora e não apenas de instrutora das novas gerações e transmissora de um saber, que é ultrapassado continuamente e que, assim sendo, não pode ser sistematizado aprendido/ensinado, como antes. (MANTOAN, 2009).
Ao se analisar o comportamento social, percebe-se que grande parte da população entende que o preconceito e a discriminação social são os principais empecilhos para a efetivação da inclusão escolar. De acordo com Tessaro (2005), o fato da maioria popular considerar a discriminação social como o principal óbice ao processo de inclusão escolar torna-se muito interessante, principalmente quando se considera que nesse estudo eles se mostraram confiantes e favoráveis à inclusão escolar. Talvez esse resultado possa ser justificado pelo fato de identificarem quão preconceituosas ainda são as pessoas que não possuem necessidades educativas especiais e quanta dificuldade elas têm para aceitar e conviver com a diversidade.
Acredita-se, ainda, na perspectiva de Waricoda et al (2005), que a discriminação social foi o principal embaraço da inclusão escolar pelo fato de o deficiente ainda ser visto como incapaz e limitado.
As atitudes dos pais (todos os pais) são determinantes no sucesso da inclusão. A família tem um papel chave neste processo, ensinando aos seus filhos a respeitar as diferenças individuais e a aprender que as diferenças não têm que ser apreciadas de modo negativo. (BRANDÃO, 2013 apud DUHANEY E SALEND, 2000; SALEND 2004).
Outro aspecto que parece ser determinante para uma inclusão de sucesso, tem a ver com a proximidade entre os técnicos e a família, sendo fundamental manter um sistema de comunicação continuada entre ambos (BRANDÃO, 2013 apud CROSS et al., 2004; KACZMAREK, 2006).
Ou seja, os profissionais deverão valorizar a participação da família e criar relações de parceria com os pais das crianças, partilhando com eles, de uma forma acessível e culturalmente adequada, informações e estratégias adequadas aos seus interesses e necessidades, visando garantir a sua participação ativa em todos os processos que envolvam a habilitação e integração social dos seus filhos (BRANDÃO, 2013).
De modo conclusivo, ao que concerne a atuação da família e demais profissionais na educação inclusiva, tem-se que a inclusão mobiliza a família, os professores, a escola e os profissionais de apoio especializado. Nos primeiros meses, pode gerar medo, angústia, tensão, dúvidas, tanto para a família como para escola. Tanto a escola quanto a instituição de educação infantil torna-se inclusiva quando há um projeto pedagógico elaborado coletivamente, entre as instituições educativas, a família e os profissionais especializados. E que a maior demanda encontra-se na esfera das atitudes, posturas, formas de lidar com a diversidade e a diferença significativa de cada aluno. Essa não deve ser responsabilidade só do professor, mas do coletivo escolar. (BIAGGIO, 2007)
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mesmo com grandes garantias no ordenamento jurídico e apesar de algumas evoluções sociais, a educação inclusiva ainda não teve devido destaque, tão pouco atingiu o resultado esperado. Muitas crianças ainda são privadas de seu direito à educação, tornando-se seres isolados e à margem da sociedade, impedidos de se desenvolverem de forma plena e efetiva, e de viverem como cidadãos comuns na medida de suas limitações.
Nota-se que os maiores impedimentos para a aplicação e eficácia das normas que garantem a educação inclusiva é o preconceito e a discriminação, sentimentos estes que estão atrelados à sociedade desde a antiguidade. Desde sempre as pessoas com deficiência ou com necessidades especiais foram subestimadas e vistas como inferiores, o que faz com que este julgamento perdure até hoje.
Outro ponto importante é a ausência de empatia, fato comum no dia-a-dia da sociedade, grande parte das pessoas tem dificuldades de se colocar no lugar do próximo, de se compadecer de seus problemas e contribuir para que que uma adversidade vire mero detalhe. Por muitas vezes isto só vira realidade quando uma pessoa, por algum motivo, passa a viver com algum tipo de necessidade especial ou alguém próximo a ele.
Sendo assim, é fácil perceber que a mudança desta realidade de ineficiência da educação inclusiva deve partir, primeiramente, de uma reforma cultural e social, pois, o desenvolvimento humano é algo complexo, e é neste processo que a cultura tende a influenciar na subjetividade humana, a partir das inclinações que compõem nossa identidade, ou seja, o debate sobre diversidade também representa o debate identitário cultural na escola, que corresponderá aos aspectos diversos da constituição dos sujeitos atentando a complexidade da vida individual, familiar e social. (LIMA et al, 2013).
Por fim, a efetivação da educação inclusiva não deve ser uma realidade tão distante, dependendo, em sua essência, de mudança no olhar da sociedade e do Estado, para que este movimento mundial fundamentado nos princípios dos direitos humanos e da cidadania, com objetivo de eliminar a discriminação e a exclusão, para garantir o direito à igualdade de oportunidades e à diferença, transformando os sistemas de ensino, de modo a propiciar a participação de todos os alunos, com foco específico naqueles que são vulneráveis à marginalização e exclusão, aconteça. (BIAGGIO, 2007).
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Acadêmica do curso de Direito na Faculdade Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARQUES, Quintiliana Janis Cardoso. Ineficácia das normas que objetivam promover a inclusão de crianças com necessidades especiais nas escolas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 nov 2017, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50970/ineficacia-das-normas-que-objetivam-promover-a-inclusao-de-criancas-com-necessidades-especiais-nas-escolas. Acesso em: 22 nov 2024.
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