SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Separação dos poderes e as cortes constitucionais; 3. Modelos de jurisdição constitucional e a defesa da Constituição; 4. Ativismo judicial e juízes “legisladores”; 5. Decisões marcantes do Supremo Tribunal Federal; 6. Atuação representativa do Judiciário; 7. Considerações finais; 8. Referências bibliográficas.
RESUMO: O presente artigo analisará da crise de representatividade brasileira e a posição do Supremo Tribunal Federal neste ambiente de ebulição. Ao revés da teoria clássica da separação de poderes, o Poder Judiciário vem ganhando terreno no cenário político brasileiro, tapando lacunas que são criadas pelo déficit de representatividade na democracia tupiniquim. A despeito de ser constitucionalmente adjetivada como guardião da Constituição, a Corte Suprema vem assumindo uma posição que vai muito além à do guardião, que assume uma posição passiva. As repercussões e as dúvidas quanto a esta situação são diversas e o atual trabalho realizará importantes estudos neste sentido.
Palavras-chave: Supremo Tribunal Federal. Constituição Federal. Sistema jurídico brasileiro. Crise de representatividade.
1. INTRODUÇÃO
O que é o Supremo Tribunal Federal para a Constituição Federal: seu senhor, ou seu servo? O presente artigo pretende explorar esta interrogação, discutindo desde do problema do controle do poder estatal pelo Direito até a criação das cortes constitucionais, desde o material teórico existente até casos concretos da Suprema Corte brasileira.
Quando o constituinte de 1988 instituiu a divisão dos poderes no artigo 2º, certamente tinha em mente que os Poderes que se incumbiriam precipuamente a representar os anseios populares seriam o Legislativo e o Executivo. Já o Judiciário teria um papel um pouco diverso, e não menos importante: assegurar a integridade e o respeito ao ordenamento jurídico, em especial, da Constituição. A ideia era certamente seguir o molde desenvolvido pelo barão de Montesquieu.[1]
Contudo, a realidade dos fatos demonstrou que as teorias são frágeis e que nem sempre (ou quase nunca) conseguem comportar a complexidade do mundo sensível. A teoria clássica da democracia representativa é uma das vítimas desta destrutiva força dos fatos. Especialmente em países como Brasil, onde há tensões sociais, culturais e históricas acumuladas, a noção de democracia representativa é levada até as últimas consequências, a ponto de ter sua credibilidade colocada sob questionamento.
Esta crise de representatividade que já vinha há tempos fermentando e entrou em erupção com as manifestações populares de junho de 2013, num misto de insatisfação e de desejo de mudança. A crise tem contornos institucionais; as instituições têm sua legitimidade discutida e o sufrágio universal se mostra como um instrumento insuficiente frente a uma sociedade dinâmica demais.
Diante deste vácuo político, o Supremo Tribunal Federal aparece, emerge como um antidoto dinâmico e ativista, rompendo com a estática institucional brasileira. Transpõe seu dever literal de guardião, que repousaria inerte e cego empunhando sua libra e espada para ferir de morte aqueles que ameaçassem seu protegido. Ele agora se move, deixa de apenas interpretar a Constituição e as leis para cria-las como instrumentos de transformação.
Entretanto, esta nova fase da democracia nacional traz novos questionamentos quanto aos seus limites e às suas consequências. O Judiciário dinâmico traz soluções, mas também traz uma série de novas incertezas, que serão apresentadas e dissecadas neste artigo, com base em decisões marcantes da Corte, à luz das doutrinas clássicas e contemporâneas da Ciência Jurídica etc.
2. Separação dos poderes e as cortes constitucionais
Criado como Supremo Tribunal de Justiça em 1828, o Supremo Tribunal Federal é a cúpula do Poder Judiciário e o mais antigo órgão judicial do Brasil; suas competências atuais distinguem-se bastante em relação àquelas primeiras.[2] É um ícone da separação dos poderes por atuar diretamente na preservação da Carta Política, assegurando a manutenção dos checks and balances entre os Poderes constituídos e afastando normas contrárias às máximas constitucionais.
A preocupação com o exercício do poder repousa na base do Estado democrático moderno, e a separação dos poderes veio como uma solução, propondo o exercício plural e universal do poder. Numa democracia, o poder torna-se difuso e instrumentalizado em favor das pessoas. E não as pessoas em favor do poder. O autor que deixou o maior legado sobre a importância do poder estar desconcentrado foi Montesquieu que, em sua obra “Do espírito das leis”, em pleno século XVIII, semeou as bases fundamentais da separação de poderes do Estado moderno.
Confrontando o absolutismo reinante na Europa da época, o pensador francês já ensinava da necessidade de dividir os poderes do Estado, combatendo a concentração do poder nas mãos de poucos:
Tudo então pereceria, se o mesmo homem, ou o mesmo corpo dos principais, o dos nobres, ou o do povo, exercesse êstes três poderes: o de criar as leis, o de executar as resoluções públicas, e o de julgar os crimes e as questões entre os particulares.[3]
Seguindo o pensamento de separação de poderes dos iluministas com alguns incrementos de mais atuais, a Constituição Cidadã de 1988 estabelece que são Poderes, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. Há a previsão das respectivas competências de cada ente, especialmente as típicas: do Legislativo, editor de leis e fiscal da administração pública; do Executivo, efetivador das políticas instituídas pelo ordenamento jurídico; e do Judiciário, apaziguador de conflitos sociais, conforme o Direito.
Adentrando nas competências constitucionais do Supremo, é necessário ter em mente o artigo 102 da Constituição, que determina as hipóteses de cabimento de recurso ordinário e extraordinário à Corte, além das situações de competência originária. Já no artigo 103 estão previstas as Ações de Inconstitucionalidade, como a ADI, a ADC e a ADI-O. Sem esquecer das representações para fim de intervenção federal, conforme os artigo 34 e 36. Por fim, o artigo 103-A, inserido pela EC 45/2004, acrescentou ao ordenamento a figura das Súmulas Vinculantes.
A figura do Tribunal Constitucional emana da própria ideia de Constituição rígida como um conjunto de normas fundantes da sociedade com animus de perpetuidade, de perenidade. A Carta Política nasce com o intuito de comportar os pilares jurídicos fundamentais da comunidade social a ela submetida, dando bases fundamentais ao Estado de Direito que deverão ser respeitadas como elementos necessários para a ordem institucional da nação. O sentido de haver uma Constituição rígida, como a brasileira, é mantê-la o mais intacta possível frente aos intemperes do tempo, até por isso contém um núcleo duro que está imune até mesmo aos consensos da democracia, assim chamado de cláusulas pétreas.
O ordenamento jurídico brasileiro comporta quatro cláusulas pétreas expressas, conforme o artigo 60 da Carta Magna: a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e garantias individuais. A terceira é a que nos interessa aqui. A vedação do artigo 60 é direcionada ao constituinte derivado, que não poderá sequer deliberar sobre a abolição da separação de poderes; não obstante, a separação dos poderes deverá ser respeitada em todas as searas do poder estatal.
Contudo, a atuação do STF vem transpondo sua competência de guardião, atingindo questões de caráter político e social que antes lhe erram alheias. O ativismo judicial da Corte é latente, seja por desbravar questões sequer enfrentadas pelo Legislativo, seja por estar cada vez mais receptivo à participação popular, como nem sempre se vê no Congresso Nacional.
Daí vem a dúvida, o constituinte originário primou por colocar a separação dos poderes como um alicerce imutável de nosso ordenamento, imunizando-o até mesmo das deliberações dos representantes mais característicos da população, que compõem o Poder Legislativo. Como poderia, então, o Judiciário agir infringindo tal cláusula pétrea? Que legitimidade tem o Judiciário para “legislar” quando o próprio Legislador não o fez? E quais seriam os limites destes poderes? Estes são alguns dos questionamentos trazidos com a posição ativista assumida pelo Supremo Tribunal Federal.
3. Modelos de jurisdição constitucional e a defesa da Constituição
Antes de adentrar a discussão acerca da legitimidade do ativismo judicial em si, convém um breve estudo sobre os modelos de jurisdição constitucional segundo as principais linhas teóricas que influenciaram o modelo brasileiro. Esta explanação prévia é importante por clarear a compreensão sobre como o Judiciário protege as normas constitucionais no Brasil.
Dois modelos de jurisdição constitucional muito influenciaram o direito brasileiro: o norte-americano, que se caracteriza pelo controle difuso, em sede de exceção, exercido pelo juiz para a resolução do caso concreto; e o europeu, que se caracteriza pelo controle concentrado de constitucionalidade, o qual viria a dar origem às ações diretas de constitucionalidade, que visam a atacar leis inconstitucionais em abstrato.[4] A jurisdição constitucional brasileira tem natureza mista entre esses sistemas, conforme observa José Afonso da Silva:
O Brasil seguiu o sistema norte-americano, evoluindo para um sistema misto e peculiar que combina o critério de controle difuso por via de defesa com o critério de controle concentrado por via de ação direta de inconstitucionalidade, incorporando também agora timidamente a ação de inconstitucionalidade por omissão (art. 102, I, a, e III e 103).[5]
Por influência de Rui Barbosa, adepto do direito norte-americano, o direito nacional inicialmente adotou o modelo difuso de controle de constitucionalidade com a Constituição de 1891, na qual era possível apenas arguir a inconstitucionalidade em sede de matéria de exceção com o fito de afastar a incidência da norma inconstitucional no caso concreto. Esta primeira vertente preza pelo respeito à separação dos poderes, sendo defeso ao Judiciário excluir normas do ordenamento; a lei estaria revestida de proteção por ter sido fruto do Legislativo, legítimo representante do povo.
Somente com a Constituição de 1934 o controle concentrado passou a figurar no ordenamento pátrio, embora de forma incipiente. Com o transcorrer do tempo, o controle abstrato foi adquirindo abrangência e dimensão novas, chegando à atual Constituição de 1988.
A paternidade da teoria do controle abstrato é atribuída ao jurista austríaco Hans Kelsen que, num esforço de superar a construção teórica do alemão Carl Schmitt, desenvolveu o sustentáculo inicial para a difusão do controle direto de constitucionalidade pelo mundo.
O embate teórico entre eles foi intenso e teve amplas repercussões no cenário político europeu de então. Kelsen defendia que o guardião da Constituição deveria ser externo aos embates políticos instituídos, como um órgão incumbido a agir de maneira eminentemente técnica-jurídica. Carl Schmitt[6] diverge essencialmente. Para o jurista alemão, a Constituição não é um contrato social que comporta a essencial da sociedade civil e os limites do poder, mas sim uma decisão política, ou seja, o que os poderosos definirem. Com base nesse pensamento, Schmitt buscava atribuir ao Poder Executivo a responsabilidade de guardar a Constituição, por este ser o suprassumo do poder estatal; como tal, seria o sujeito mais compatível à realização da Constituição. Enfim, todo o poder seria dado ao chefe do Executivo, ao líder do Reich.[7]
O jurista austríaco, por outro lado, defende um controle de constitucionalidade plural a partir de um Tribunal Constitucional, que deve buscar se separar ao máximo dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Tal Corte deveria ser composta por indivíduos comprometidos com a segurança e com a máxima concretização do texto constitucional. Kelsen também adverte sobre os riscos de um controle constitucional individual, que se sujeitaria a arbitrariedades e a interesses pessoais, além de violar a essência democrática, pois se tenderia a implantar um estado de autoritarismo. A cerca da defesa da Constituição, criticando Schmitt, disserta Kelsen[8] que defender a ideia de que o chefe do Executivo deveria ser o guardião da Constituição é uma ideologia voltada a favorecer a reconcentração do poder nas mãos daqueles que o teriam perdido devido à instalação do Estado constitucional, além de que seria um contrassenso atribuir poderes quase absolutos para um só indivíduo num contexto constitucional, pois a função política da Constituição é estabelecer limites jurídicos ao poder.
Enfim, embora com certo atraso, a doutrina desenvolvida por Kelsen prevaleceu à teoria de Schmitt, tendo sido fundamental para construção da teoria constitucional democrática. No Brasil, sua influência é latente, contudo, vem sofrendo diversas mitigações, visto que a separação dos poderes, tão apreciada por Kelsen, vem sofrendo diversos reveses.
4. Ativismo judicial e juízes “legisladores”
Introduzindo esta nova etapa de estudo, é preciso recordar Konrad Hesse, que viu na Constituição mais do que uma mera folha de papel, mas um eu-transformador, sedento por ter eficácia e alterar o mundo dos fatos, conforme as suas normas programáticas. É justamente na Wille zur Verfassung (vontade da Constituição, em alemão) que repousa a normative Kraft der Verfassung (força normativa da Constituição), baseada na pretensão de eficácia que tem.[9] É necessário dar vida ao texto constitucional, fazer com que seu conteúdo transponha o papel e transforme o mundo lá fora, executando os anseios contidos na norma constitucional.
Totalmente inserido neste contexto, o ativismo judicial pode ser comparável ao processo de combustão, cujos três elementos essenciais são: combustível, comburente e calor inicial. Permissa venia, embora o fator humano trace uma linha distintiva entre as ciências humanas e as naturais, a analogia parece didaticamente bem-vinda. Ora, o combustível é definido como elemento reativo que, quando em contado um comburente junto ao montante de energia suficiente, entra em combustão e sofre alteração em sua composição essencial. Já o comburente é a outra substância indispensável para no processo de combustão sem a qual a transformação química não ocorreria. Na química, o oxigênio é o comburente mais comum. Por fim, mas não menos necessário está o calor inicial, que é o montante de energia necessário para dar ignição na reação química.
Para fins deste artigo, o calor inicial são os instrumentos jurídico-processuais de acesso ao Judiciário, conforme previsto na Constituição. O comburente são as normas constitucionais, que estão à disposição daqueles que buscarem a tutela jurisdicional para fazê-los valer. Outra analogia cabível é que quanto maior a quantidade e a amplitude das normas constitucionais, tanto maior será o campo de incidência das normas; assim como quanto mais oxigênio, maior a chance de combustão. Por fim, o combustível: a realidade que se mostra incompatível com as determinações constitucionais e que terá (ou deverá ter) sua composição essencial alterada com a incidência da norma. Tendo como fundamento a Constituição, o Judiciário ao ser acionado transforma a realidade não quimicamente, mas jurídica-socialmente.
A partir daí se desenvolve o ativismo judicial, que, ansiando efetivar a Constituição e reconhecendo a inércia dos corpos representativos típicos, ocupa as lacunas jurídicas deixadas, seja pela insuficiência linguística das leis, seja pela necessidade de atingir as finalidades do ordenamento mais agilmente devido à lentidão da política do Congresso Nacional, seja pela defesa de minorias. Embora a legislação brasileira seja quantitativamente farta – senão hipertrofiada –, ainda é socialmente insuficiente frente às demandas cada vez maiores da sociedade.[10] Cumpre também trazer o ensinamento de Mauro Cappelletti:
Constitui um dado da realidade que a legislação social ou de welfare conduz inevitavelmente o Estado a superar os limites das funções tradicionais de ‘proteção’ e ‘repressão’. O papel do governo não pode mais se limitar a ser de um gadarme ou night watchman; ao contrário, o Estado social (...) deve fazer sua a técnica de controle social que os cientistas políticos chamam de promocional. Tal técnica consiste em prescrever programas de desenvolvimentos futuros, promovendo-lhes a execução gradual, ao invés de escolher, como é típico da legislação clássica, entre ‘certo’ e ‘errado’, ou seja, entre o caso ‘justo’ ou ‘injusto’, right and wrong. E mesmo quando a legislação social cria por si mesma direitos subjetivos, cuida-se mais de direitos sociais do que meramente direitos individuais.[11]
Portanto, rompendo com os cânones clássicos da atuação do Estado, rompem-se também alguns dos cânones da teoria clássica da separação de poderes, quando os poderes incumbidos para tal são inertes. O Estado-Juiz agora assume (indevidamente?) o papel também do Estado-Legislador, suprindo do déficit deixado. Ainda sobre a divisão dos poderes, diz Cappelletti:
Nosso século, todavia haveria de ensinar uma outra lição: a de que a ideia rousseuniana da infalibilidade da lei parlamentar não passava de outra ilusão, pois até o Legislativo, e não apenas o Executivo, pode abusar do poder. A experiência mostrou, além disso, que a possibilidade do abuso legislativo cresceu enormemente com o crescimento legiferante do Estado moderno, e também que as tiranias legislativas e majoritárias podem ser tão opressivas quanto a tirania do Executivo.[12]
O exposto decorre do chamado neoconstitucionalismo[13], que passou a impor uma Lei Suprema, à qual todos os Poderes seriam submissos; cuja natureza seria jurídica, com força e eficácia diretas. Dentro deste processo, passou-se a haver o inevitável reconhecimento do valor normativo dos princípios, principalmente aqueles presentes no texto constitucional. Quanto ao assunto, desenvolve Glauco Barreira que o Estado Democrático de Direito se distingue pelo culto à Constituição, com ênfase no princípio da constitucionalidade e no reconhecimento da normatividade dos princípios que consagram direitos fundamentais, sendo estes preceitos supremos vistos não como meros conselhos ao legislador ou simples declarações políticas de direito, mas, sim, como normas vinculantes.[14] A Constituição passou, enfim, a ter um papel central na estrutura normativa, sendo o fundamento de validade das demais normas do ordenamento e o escopo da atuação estatal.
Neste diapasão, o Judiciário abandonou a mera subsunção do fato à norma, passando a exercer práticas ativas e criativas, utilizando-se de interpretações consonantes como os métodos da nova hermenêutica constitucional, fazendo do Direito um instrumento de transformação da realidade social.
A impossibilidade de se resolver casos concretos pelos métodos da hermenêutica clássica fica muito evidente, por exemplo, quando se trata da colisão de direitos fundamentais, visto que aqui se faz necessária a utilização de sopesamentos entre valores jurídicos, primando pela coexistência deles no ordenamento jurídico, visando a efetivá-los ao máximo simultaneamente. A respeito disso, leciona Friedrich Müller:
A aplicação tópica do direito, que abre mão da dedução aparentemente lógica e visa o teor material e de problemas dos aspectos, portanto um sistema “aberto”, indaga necessariamente para além da norma e pretende desvelar assim a estrutura de cada interpretação, que se vê forçada a declarar como partes do direito positivo as descobertas não extraíveis das fontes formais mesmo quanto alegadamente não abandona o quadro do teor “dado” da lei.[15]
O jurista alemão, em sua Teoria Estruturante, traça uma clara distinção entre texto normativo e norma jurídica. Aquele é o enunciado linguístico da lei. Enquanto que este é o resultado do trabalho de concretização, que é o processo tópico-dialético entre o texto legal a priori e o meio fático do caso, o extra-norma. Deste processo surge a norma como fruto da interpretação-aplicação do enunciado textual a fim de resolver problema do caso concreto. Nota-se, então, que o intérprete do Direito, o responsável pelo processo de concretização, assume uma posição de preponderância com a função de ser o criador do Direito in concretu. Este método interpretavivo também se mostra primordial para aplicação dos princípios aqui tidos como disposições normativas com elevado grau de abstração e não colidentes em abstrato.[16]
A funcionalidade desta teoria fica muito evidente quando o interprete se depara com normas passíveis a mais de uma interpretação plausível, entretanto, uma delas acena à inconstitucionalidade, enquanto outra se ajusta aos preceitos constitucionais. Típico da teoria hermenêutica constitucional, a interpretação conforme a Constituição é uma técnica interpretativa muito comum no Pretório Constitucional, em que intérprete deve sempre ter em mente encontrar uma interpretação que salve a lei. Neste sentido, cumpre destacar um decisum marcante da Corte Constitucional, cuja autoria é do então Min. Moreira Alves:
Ora, esta Corte, ao julgar, afinal, a ação direta de inconstitucionalidade, pode – utilizando-se da técnica da “interpretação conforme à Constituição” – declarar que a norma impugnada só é constitucional se se lhe der a interpretação que este Tribunal entende compatível com a Constituição Federal, o que implica dizer que as demais interpretações que se lhe queiram dar serão inconstitucionais. É por isso que, na técnica da Corte Constitucional alemã, quando ela se utiliza da “interpretação conforme à Constituição” julga a arguição de inconstitucionalidade parcialmente procedente, pois há procedência quanto à inconstitucionalidade das interpretações que não a admitida pelo Tribunal (há, aí, uma declaração de inconstitucionalidade “sem redução de texto” atacado, pois o que se reduz é o seu alcance, que fica restrito ao decorrente da interpretação admitida como constitucional). [...][17]
Porém, no decorrer dos anos, com o desenvolvimento do direito constitucional brasileiro à luz do texto de 1988 e o amadurecimento da democracia, a interpretação conforme a Constituição adquiriu nova fisionomia. Anteriormente, como no julgado de Moreira Alves, o STF assumia uma posição mais conservadora, deixando o papel proativo para o legislador. Este cenário vem, porém, mudando. A hermenêutica assumiu sua quota de participação na atuação ativista do STF.
5. Decisões marcantes do Supremo Tribunal Federal
Intrometendo-se em questões jurídicas (e consequentemente sociais) que antes eram reservadas aos legítimos representantes do povo, muito se questiona se a atuação do STF não estaria demasiadamente politizada (não no sentido partidário do termo). Quanto a isso, convém destacar a seguinte posição de Paulo Bonavides:
O problema constitucional básico suscitado por todo sistema de controle de constitucionalidade entende com a natureza política da competência revogatória ou paralisante que se costuma conceder a um dos poderes, normalmente o Judiciário, cuja ascendência sobre os demais ramos da soberania não raro resulta em sacrifício imposto ao princípio de separação de poderes.[18]
Ao incumbir à Corte a defesa da Carta Política, que é tão normativamente ampla e socialmente ambiciosa, parece até inevitável a ocorrência de atritos institucionais decorrentes de decisões políticas da Corte.[19] Seguindo a lógica acima descrita, não há espaços vazios na política; caso algum Poder deixe um vácuo de representatividade, outro acabará por ocupá-lo. Frise-se, aqui não se trata do exercício do poder em si, mas na assunção do papel de representante de interesse populares, mesmo que não no seu sentido formal. Fato é que há o vácuo, e o Supremo ocupou-o; isto parece evidente. Convém trazer um pouco das divergências doutrinárias a respeito das decisões políticas no Judiciário.
Serão estudadas duas linhas doutrinárias divergentes. Para a primeira linha de pensamento, a jurisdição constitucional tem natureza jurídica em todos os sentidos. Embora reconheça que a integração entre política e jurídica seja inevitável, uma decisão feita no âmbito político não altera o fato de tal decisão ter caráter jurídico. O controle de constitucionalidade seria político por consequência, mas técnico-jurídico por essência. Nesse sentido, tece André Ramos Tavares:
Contudo, poder-se-ia afirmar, sob a influência de determinada teoria, que qualquer órgão da República é político, no sentido de que goza de autonomia em relação aos demais e, outrossim, por exercer alguma das funções consideradas essenciais (teoria da separação orgânica dos poderes) dentro de um Estado. A partir dessa ideia, ter-se-ia que todo o controle da constitucionalidade reverteria em controle político, porque exercido por um órgão politicamente relevante. Esse reducionismo, contudo, não se presta a qualquer esclarecimento sobre a correta natureza das diversas formas com que os órgãos do poder exercem a verificação da constitucionalidade dos atos e atividades, privadas e públicas, incluindo os seus próprios.
Mas a presente classificação enfrenta um óbice teórico ainda maior. É que poderia ela levar ao entendimento equivocado de que o controle político, aqui descrito, significa um controle realizado conforme critérios políticos (conveniência e oportunidade). O que se passa, em realidade, é o presente critério classificatório, presente em praticamente todas as obras que se dedicam ao assunto, significa um critério quanto ao tipo de órgão, exclusivamente quanto ao tipo de órgão, e não quanto ao tipo de fundamento utilizado para o controle. Em outras palavras, o controle continua sendo técnico, e só por isso pode ser controle de constitucionalidade. O órgão que o realiza, porém, é considerado político. Daí a sua classificação em controle político. Assim, se os motivos do controle fossem político, ele não poderia ser um controle de constitucionalidade. Este é sempre técnico-jurídico.[20]
Do lado oposto da discussão, estão aqueles que defendem que é muito difícil ou impossível o juiz decidir sem tomar critérios políticos (não no seu sentido partidário, mas no sentido de bem comum). Contudo, tais decisões políticos seriam disfarçadas por argumentos jurídicos a fim de dissimular sua essência política. O debate fica ainda mais intenso em se tratando de controla de constitucionalidade. Esta doutrina tenderia a atribuir natureza político ao controle de constitucionalidade, o juiz se incumbiria apenas de encontrar uma saída jurídica para fundamentar sua decisão. Neste sentido, posiciona-se Ronald Dworkin:
Os juízes nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha tomam decisões políticas? Naturalmente, as decisões que os juízes tomam devem ser políticas em algum sentido. Em muitos casos, a decisão de um juiz será aprovada por um grupo político e reprovada por outros porque esses casos têm consequências para controvérsias políticas. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Supremo Tribunal tem de decidir questões constitucionais importantes que também são questões políticas, como a de determinar se criminosos acusados têm direitos processuais que dificultam mais a aplicação da lei. Na Grã-Bretanha, os tribunais têm de decidir casos que exigem a interpretação do direito do trabalho, como aqueles que dizem respeito à legalidade dos piquetes, quando os sindicatos favorecem uma interpretação e as indústrias britânicas, outra. (...) Um juiz que decide baseando-se em fundamentos políticos não está decidindo com base em fundamentos de política partidária. (...) Mas nos princípios políticos em que acredita, como, por exemplo, a crença de que a igualdade é um objetivo político importante, podem [eles] ser mais característicos de um partido político que de outros.[21]
Enfim, a dúvida paira sem uma resposta certa. Parece, porém, evidente que qualquer juiz está sujeito à pré-compreenções de mundo e à pré-juízos de valor. O ser humano está sempre afetado pela sua mundividência (Weltanschauung), haverá sempre alguma inclinação cognitiva do observador ao analisar o objeto de estudo (ou de julgamento), ainda mais quando se trata de um aplicador do Direito, que terá de considerar um sem-número de variáveis no momento de exercer seu ofício. O direcionamento político parece até mesmo inevitável, principalmente diante dos chamados hard cases. Frise-se, contudo, que, tendo em vista a natureza técnica do exercício da jurisdição, a fundamentação jurídica é imprescindível, visto que o juiz – que não é uma figura legitimada pelo voto popular – carece a priori de legitimidade no exercício de promoção do bem comum. Por esta razão, deverá buscar a legitimação por meio de argumentos racionais que embasem a sua decisão, legitimando juridicamente até mesmo decisões com raízes eminentemente políticas.
Concluídas as considerações preliminares, é momento de analisar algumas decisões de alto grau de complexidade: ADI 3.570 – pesquisa com células-tronco; ADPF 54 – interrupção de gravidez de feto anencéfalo; e ADI 4.277 e ADPF 132 – união homoafetiva. As decisões serão analisadas apenas brevemente, já que não são propriamente o objeto de estudo, mas apenas evidências dele.
Por iniciativa do Procurador-Geral da República, a Corte Suprema julgou, por seis votos a cinco, constitucional o artigo 5º da Lei 11.105/05 (Lei de biossegurança), que admite a utilização de células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro para fins de pesquisa e terapia. A fundamentação utilizada pautou-se fundamentalmente pelo momento do início da vida, fugindo do puro legalismo e atingindo questões éticas. A fundamentação foi variada: alguns ministros argumentaram que haveria necessidade de haver uma personalidade para haver a tutela do direito à vida, o que não ocorria com um embrião; outros, que só haveria a tutela do nascituro se o embrião se encontra no útero, pois só assim haveria a potencialidade de surgir uma pessoa. Houve também o argumento utilitarista de que o uso destas células seria importante para salvar muitas pessoas. Todos os fundamentos são juridicamente admitidos a partir do princípio da dignidade da pessoa humana, mas as raízes do convencimento dos Ministros certamente não vieram da mera exegese do artigo 1º da Constituição.
Em outra decisão marcante em abril de 2012, a Corte julgou, por oito votos a dois, constitucional e penalmente atípica a interrupção da gravidez de fetos anencéfalos. Este julgado envolveu uma conjuntura ampla de argumentos, servindo de marco por chamar a sociedade para interpretar a Constituição Federal. A Corte se rendeu à necessidade de ouvir a sociedade civil para construir seu convencimento, foram ouvidos especialistas de diversas áreas, e o teor dos votos demonstrou que a contribuição foi sentida. Novamente foi o direito à vida foi o cerne da discussão. A necessidade de cérebro para haver vida humana foi o que pautou os votos; a possibilidade de vida extrauterina do anencéfalo foi também muito discutida, assim como a integridade física e a liberdade de escolha da mulher. Dentre os vencidos, destaque-se o voto do Min. Ricardo Lewandowski que sustentou que estaria havendo invasão na competência do legislativo pelo STF, visto que, se assim o quisesse, o próprio Legislativo criaria a nova excludente no Código Penal para a hipótese de anencefalia. Também vencido, o Min. Cesar Peluso frisou que a vedação ao aborto de anencéfalos não se trata de questão puramente moral ou religiosa, mas, sim, de defesa à vida, mesmo que não seja dotada de todas as qualidades de um humano completo. O teor político do julgamento parece evidente; juízos de bem comum e de ética imperaram na Suprema Corte, enquanto que os argumentos eminentemente técnicos foram raros.
Por fim, em sede de julgamento simultâneo da ADI 4.277 e da ADPF 132, o Supremo Tribunal Federal sedimentou a interpretação conforme a Constituição do artigo 1.723 do Código Civil. Até o decisum, havia intensa divergência se a união homossexual deveria ser tratada como sociedade de fato ou como união estável – esta última equiparada à união heterossexual. Findando a divergência sobre o sentido constitucional de família, a Corte assentou por unanimidade que a afetividade e a igualdade são os valores primordiais da família à luz da Constituição de 1988, e não a diversidade de gêneros. O julgamento também foi envolto por muita participação da sociedade civil, contando com oito amici curiae; seis a favor da procedência das ações e dois, contra. O Tribunal assumiu uma posição marcadamente contramajoritária, tutelando interesses que não estão sendo adequadamente assistidos pela representação majoritária do Congresso. As fundamentações foram diversas, desde o reconhecimento da homossexualidade como traço da personalidade digno de tutela, até a necessidade do combate ao preconceito; desde a autonomia da vontade, até o direito à busca pela felicidade. Por força desta decisão, foi editada a Resolução n. 175, de 14 de maio de 2013, aprovada durante a 169ª Sessão Plenária do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual obriga o registro de casamentos homoafetivos por cartórios de todo o país.
À parte às críticas ao mérito das decisões, o arcabouço político das fundamentações é evidente, sem deixar de lado a argumentação jurídica. A Corte assumiu uma posição ativista e contramajoritário, assumindo o dever remendar as lacunas do ordenamento. Os ouvidos atentos às demandas sociais vêm se intensificando, amplificando o viés representativo e democrático da Corte; algo que não raro falta ao Legislativo e ao Executivo. O foco político está deslocado, o STF é cada vez mais o lugar onde as decisões decisivas são tomadas.
6. Atuação representativa do Judiciário
Filho do iluminismo e da ascensão da burguesia, a democracia moderna assumiu o perfil representativo, em oposição ao modelo direto da Grécia antiga. A expressão democracia representativa passou a ser utilizada ao final do século XVIII, em razão do constitucionalismo e dos teóricos da ciência política quando se referiam ao novo tipo de governo emergente, cujas raízes estavam no consenso popular.[22] Este era um jeito novo de pensar a democracia, que significa um tipo de governo, no qual as pessoas são livres para escolher outrem que há de agir em defesa de seus interesses, isto é, representando-os e decidindo em seu nome.[23]
Novamente, a teoria democrática que em tese resolveria o problema do exercício do poder a partir da escolha de representantes populares fracassa. No Brasil, a crise de representatividade é latente e as manifestações de 2013 foram um indicador claro disto. Antes de arrematar sobre a participação do Judiciário neste processo, traz-se o ensinamento de Kelsen quanto à democracia representativa:
Nas chamadas democracias representativas, porém, a teoria política tradicional vê os órgãos representantes do Estado pelo fato de representarem o povo do Estado. O princípio de que o órgão legislativo, o parlamento e o supremo órgão executivo, o presidente de um Estado democrático, representam o povo – como apontado aqui – significa unicamente que os indivíduos submetidos à ordem jurídica que constitui o Estado exercem uma influência decisiva sobre a criação dos órgãos legislativos e executivos em questão, na medida em que a constituição autoriza a eleger esses órgãos. É verdade que a representação do Estado e a representação do povo do Estado são dois conceitos diversos, nem sempre distinguidos com suficiente clareza na teoria política tradicional.[24]
O autor austríaco traçou brevemente uma distinção conceitual entre a representação do Estado e a representação do povo do Estado. Comumente seriam tratados como sinônimos, embora não o sejam para Kelsen. Aquele representaria apenas formalmente o povo, por ter sido eleito pelo sufrágio universal, mas não encamparia necessariamente as posições de seus representados; este, por seu turno, detém a representação material de representação e assume posições consoantes às de seus representados.
A representatividade daqueles que foram popularmente eleitos vem sendo politicamente simbólica e representativamente formal, ao menos aos olhos da maioria dos cidadãos. A consequência foi o Judiciário assumir a posição de representante no sentido material da palavra, seja fazendo justiça quando os demais Poderes não o faz, seja legislando quando o legislador se faz inerte.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Constituição Federal, pautada pela separação dos Poderes soberanos, estatuiu para o STF, em sua literalidade, a função de guardião da Constituição, cujo ofício se baseia no rigoroso e estático exercício de declarar normas como constitucionais ou não. Este ofício, de acordo com as teorias clássicas, consistiria em julgar a compatibilidade da norma inferior à superior por um exercício dogmático de interpretação, sem maiores aberturas para questionamentos sobre critérios de justiça. Entretanto, esta realidade vem se alterando. A Corte Suprema, há tempos, assume uma posição proativa, ativista, inovando no ordenamento, trançando normas sobre temas que sequer o Legislativo sedimentou.
Como guardião da Constituição, o STF se aproxima da visão kelseniana de jurisdição constitucional, a visão do órgão fiscalizador externo aos Poderes instituídos que atua de forma pragmática, técnica. Estando à parte dos embates políticos, a função da Corte deveria controlar o exercício do poder, com base em critérios eminentemente jurídicos, e nada políticos; a imparcialidade seria indispensável. Diferentemente do arranjo teórico de Kelsen, o que se vê no constitucionalismo nacional não é a restrição do exercício do poder a partir da Corte, mas o exercício do poder pela Corte. Em vez de se colocar como elemento neutro à política, o Tribunal Constitucional brasileiro parece ter imergido nela como nunca antes.
Contudo, o constituinte de 1988 não moldou o Estado com o intuito de dar ao STF o exercício da política, visto que ele não tem a legitimidade necessária para tal; quem a tem são o Legislativo e o Executivo, estes, sim, legitimados para definir os rumos da polis. Melhor, legitimados em tese, pois os fatos destoam da teoria, já que os eleitos pelo povo são pouco reconhecidos pelo próprio povo como tal. A representatividade da democracia está em frangalhos; a representação do povo é meramente formal, do voto, e não material, dos ideais. Quem sofre com isto é a Constituição que vê políticos vagarosos e ineficientes de mais para velocidade das demandas sociais. A válvula de escape para a Constituição, como não poderia deixar de ser, é o Supremo.
Por conseguinte, o Pretório Excelso assumiu um papel politizado na institucionalidade brasileira, diante da necessidade inexorável de dar vida à Constituição. As decisões políticas se proliferaram, e não faltam bases jurídicas para dar-lhes sustentação, afinal, frente à expressiva densidade axiológica e à elevada carga normativa dos princípios da Carta Magna de 1988, muito dificilmente faltarão fundamentos jurídicos a uma decisão política. Os frutos disto foram diversas decisões da Corte que desafiaram a dogmática hermenêutica clássica por terem tido sua fundamentação extraída da axiologia constitucional, e não de regras jurídicas fechadas; um exemplo evidente é a decisão sobre união homoafetiva, como já explanado.
Concluindo, o STF já não pode mais ser visto que um órgão eminentemente técnico-jurídico, haja vistas à sua atuação junto à Carta de 1988, a qual carece que um Judiciário sóbrio e ativo, atencioso e parcimonioso, em defesa das minorias, que não raro são ignoradas na democracia majoritária, e dos fins da Constituição. Para tal, a Corte deve pôr em prática o ideal da sociedade aberta dos interpretes da Constituição, visto que a nova conjuntura institucional e democrática exige que a Constituição seja protegida e construída com uma ampla participação da comunidade política que a ela se submete.
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[1] Vide MONTESQUIEU, Charles. Do espírito das leis. Tradução de Gabriela de Andrade Dias Barbosa. São Paulo: Edições e Publicações Brasil Editora S. A., 1960, p. 180.
[2] MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 944.
[3] MONTESQUIEU, Charles, Op. Cit., 1960, p. 180.
[4] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 34. ed. São Paulo: Malheiros Editora, 2010, p. 557.
[5] SILVA, José Afonso da, Op. Cit., 2010, p. 558.
[6] Vide SCHMITT, Carl. O guardião da Constituição. Tradução de Geraldo de Carvalho. Belo Horizonte: Del Rey, 2007.
[7] SCHMITT, Carl. O conceito do político. Tradução de Geraldo de Carvalho. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p.20.
[8] A função política da Constituição é estabelecer limites jurídicos do poder. Garantia da Constituição significa segurança de que tais limites não serão ultrapassados. Se algo é indubitável é que nenhuma instância é tão pouco idônea para tal função quanto justamente aquela a quem a Constituição confia – na totalidade ou em parte – o exercício do poder e que portanto possui, primordialmente, a oportunidade jurídica e o estímulo político de vulnerá-la. Lembre-se que nenhum outro princípio técnico-jurídico é tão unânime quanto este: ninguém pode ser juiz em causa própria. Quando portanto os representantes da teoria constitucional do século XIX, orientados pelo assim-chamado princípio monárquico, defendiam a tese de que o natural guardião da Constituição seria o monarca, este não passava – quem poderia hoje duvidar disso! – de uma ideologia muito evidente, uma das tantas que formam a assim chamada doutrina do constitucionalismo, e através da qual essa interpretação da Constituição procurava mascarar sua tendência básica: a de compensar a perda de poder que o chefe de Estado havia experimentado na passagem da monarquia absoluta para a constitucional. O que em realidade se queria era (...) impedir uma eficaz garantia da Constituição, pelo menos contra violações por parte de quem mais ameaçava, (...) o governo, ou seja, o monarca em conjunto com ministros que assinavam seus atos, pois aquele não podia agir por si só. (...) Como não se poderia declarar abertamente o verdadeiro objetivo político de impedir uma eficaz garantia da Constituição, ele era mascarado com a doutrina segundo a qual tal garantia seria tarefa do chefe de Estado. KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. Tradução de Alexandre Krug. São Paulo: Martins Fontes, 2003, pp. 240-241.
[9] HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, pp. 14-20.
[10] LEITE, Glauco Salomão. Súmula vinculante e jurisdição constitucional brasileira. Disponível em: < https://tede.pucsp.br/bitstream/handle/7615/1/Glauco%20Salomao%20Leite.pdf >. Acesso em: 22 de dezembro de 2017, p. 40-42.
[11] CAPPELLETTI, Mauro. Juízes legisladores? Tradução de Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1999, p. 41.
[12] CAPPELLETTI, Mauro. Repudiando Montesquieu? A expansão e a legitimidade da “Justiça Constitucional”, Revista Forense, Rio de Janeiro, v. 99, n. 366, mar./abr. 2003, p. 138.
[13] Vide BARROSO, Luis Roberto. Fundamentos teóricos e filosóficos do novo direito constitucional brasileiro. Disponível em: < bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/download/47562/44776 >. Acesso em 23 de dezembro de 2017.
[14] MAGALHÃES FILHO, Glauco Barreira. Hermenêutica e unidade axiológica da Constituição. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2011, p. 30.
[15] MÜLLER, Friedrich. Teoria Estruturante do Direito. 2. ed. São Paulo: Revista do Tribunais, 2009, p. 67.
[16] ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios. 11. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, pp 30-31.
[17] ADI-MC 491, Rel. Min Moreira Alves, RTJ, 137 (1)/90.
[18] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 25. ed. São Paulo: Malheiros Editora, 2009, p. 317.
[19] A esse respeito, vide LIMA, Francisco Gérson Marques de. O STF na crise institucional brasileira. São Paulo: Malheiros Editora, 2009, pp. 64-68.
[20] TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 247-248.
[21] DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. Tradução de Luís Carlos Borges. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 3.
[22] KEANE, John. The life and death of democracy. New York: W. W Norton & Company, 2009, p. 161
[23] KEANE, John, Op. Cit., 2009, pp. 163-164.
[24] KELSEN, Hans. A democracia. Tradução de Ivone Castilho Benedetti, Jefferson Luiz Camargo, Marcelo Brandão Cipolla e Vera Barkow. São Paulo: Martins Fontes, 2000, p. 150.
Mestrando em Direito na Universidade Federal do Ceará. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Thúlio Mesquita Teles de. Crise na democracia representativa brasileira e o exercício do poder pelo Supremo Tribunal Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jan 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51199/crise-na-democracia-representativa-brasileira-e-o-exercicio-do-poder-pelo-supremo-tribunal-federal. Acesso em: 22 nov 2024.
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