RESUMO: Este trabalho versa sobre um tema de grande relevância para o direito brasileiro (em particular, o direito administrativo) e para o cotidiano do Poder Público – o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), trazido ao ordenamento jurídico pátrio pela Lei 12. 462/11. Focando em seu impacto na realidade fática e no cenário jurídico de nosso país, pretende o presente estudo realizar uma análise sobre os principais pontos do tema. Após abordar importantes traços da Lei do RDC (assim como a apresentação de linhas gerais sobre a Lei 8.666/93 – Lei Geral de Licitações e Contratos), as atenções serão voltadas às polêmicas sobre o regime de contratações em análise. Do levantamento bibliográfico feito sobre o assunto é possível concluir que as críticas ao Regime Diferenciado de Contratações concentram-se, principalmente, em quatro assuntos: a alegada inconstitucionalidade formal da Lei 12.462/11; a possibilidade de contratação integrada; os mecanismos de incentivo econômico do RDC (remuneração variável e contratos de eficiências) e, finalmente, o sigilo orçamentário. Não obstante as críticas e controvérsias a seu respeito, o RDC continua sendo constantemente utilizado pela Administração Pública, consolidando-se como um dos principais regimes dos quais o Poder Público lança mão para a efetivação de seus contratos.
Palavras-chave: licitações, contratos, Regime Diferenciado de Contratações, lei 12.462/11, lei 8.666/93.
Sumário: Introdução; 1. Conceituação de licitação e breve análise do procedimento licitatório pela Lei 8.666 de 1993; 2. Linhas gerais sobre o Regime Diferenciado de Contratação; 3. Peculiaridades do Regime Diferenciado de Contratações Públicas; 4. Polêmicas a respeito da Lei 12.462 de 2011; Conclusão; Referências.
INTRODUÇÃO
A Administração Pública não pode (salvo exceções legais) realizar seus contratos de forma direta; ela deve, antes de contratar, realizar prévio procedimento licitatório. Este procedimento é previsto pelo artigo 37, XXI da Constituição Federal, encontra-se majoritariamente disciplinado pela Lei 8.666 de 1993 (Lei Geral de Licitações e Contratos) e é pautado por uma série de princípios (constitucionais e infraconstitucionais).
O Regime Diferenciado de Contratações é um regime de licitações e contratos e, uma vez prevista no edital a opção por ele, restam afastadas – por disposição expressa da lei que o regula (Lei 12. 462/11) e ressalvados alguns casos previstos nesta mesma lei – as normas contidas na Lei 8.666/93.
Como será visto ao longo deste trabalho, a Lei do Regime Diferenciado de Contratações é um diploma bastante utilizado no dia a dia da Administração Pública. Trata-se de lei recente e, de certa forma, polêmica, posto que boa parte da doutrina não concorda com muitos de seus dispositivos, acusando-os, não raro, de serem inconstitucionais.
1. CONCEITUAÇÃO DE LICITAÇÃO E BREVE ANÁLISE DO PROCEDIMENTO LICITATÓRIO PELA LEI 8.666 DE 1993
A Administração Pública tem como um de seus deveres manter o equilíbrio social e conduzir a máquina pública; não seria prudente, portanto, que a lei permitisse ao administrador que livremente selecionasse as pessoas a serem contratadas, posto que isto colocaria em grande risco o interesse coletivo (CARVALHO, 2014).
É a licitação um procedimento administrativo através do qual a Administração Pública, exercendo a função administrativa, abre a todos os interessados que se submetam às exigências estabelecidas no instrumento convocatório a oportunidade de que apresentem propostas – estas serão analisadas e será escolhida e aceita a mais adequada à celebração de um contrato (DI PIETRO, 2015).
Em outras palavras, a licitação nada mais é do que um procedimento administrativo prévio aos contratos da Administração Pública. Deste modo, em regra (exceções são encontradas nas hipóteses de dispensa e inexigibilidade de licitação), quando ela vai contratar, deve realizar procedimento licitatório.
A licitação é determinada por lei e por um ato administrativo prévio (JUSTEN FILHO, 2011). Compete privativamente à União legislar sobre normais gerais de licitação e contratos administrativos, conforme disposto no artigo 22, XXVII da Constituição Federal de 1988:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1°, III.
Temos, em esfera federal, duas leis gerais de licitação: a Lei 8.666 de 1993 e a Lei 10.520 de 2002; há, também, duas leis sobre contratos administrativos: quais sejam, a Lei 8.987 de 1995 e a Lei 11.079 de 2004 (CARVALHO, 2013). Também é tomada por norma geral de licitações e contratos a Lei 12.462 de 2011, que versa sobre o Regime Diferenciado de Contratações – o RDC (CARVALHO, 2014).
Importante salientar que, muito embora a Constituição Federal diga que a competência para legislar sobre licitações seja privativa da União, a doutrina entende que tal competência é concorrente (MAZZA, 2013). Deste modo, estados e municípios têm competência legislativa suplementar em matéria de licitação (DI PIETRO, 2015).
Portanto, o fato de a União ter competência privativa para legislar sobre normas gerais de licitação não impede que os estados e municípios estabeleçam normas específicas, desde que obedeçam às regras das normas gerais de licitação expedidas pela União.
O procedimento licitatório visa, de acordo com o caput do artigo 3º da Lei 8.666 de 1993, atender três finalidades: garantir a observância do princípio constitucional da isonomia nas contratações públicas (desde que sejam atendidos os requisitos exigidos, qualquer um pode contratar com o Poder Público); selecionar a proposta mais vantajosa para a administração (em respeito à indisponibilidade do interesse público, a Administração não pode deixar de contratar a melhor proposta e contratar uma pior) e promover o desenvolvimento nacional sustentável.
Importante ressalvar que não há predileção ou hierarquia entre as três finalidades vistas acima, devendo ser concomitantemente observadas sempre que o ente público realizar procedimento licitatório (CARVALHO, 2014).
Por fim, também o caput do artigo 3º da Lei 8.666 de 1993 nos traz que são princípios básicos da licitação os princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade (não se confunde com publicação, pois esta é somente uma das formas de se fazer publicidade), da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório (que vincula não apenas o licitante, mas a própria Administração Pública), do julgamento objetivo (o critério a ser utilizado para julgar e escolher o vencedor deve estar objetivamente posto no instrumento convocatório, não sendo admitidas surpresas) e dos que lhes são correlatos.
2. LINHAS GERAIS SOBRE O REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÃO
Instituído pela Lei 12.462 de 2011, o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), é uma modalidade de licitação que, em seus primórdios, se voltava a prover rapidez às contratações necessárias para o cumprimento de obrigações contraídas pelo Estado brasileiro, na qualidade de sede de importantes eventos esportivos mundiais (SANTANA, 2014).
Assim, o RDC é uma nova modalidade de licitação, não se confundindo com as outras já existentes.
O Regime Diferenciado de Contratações teve inspiração nas normas de contratação da União Europeia, dos Estados Unidos da América e nos procedimentos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), assim como na legislação brasileira regulamentadora das contratações através de pregão e Parceria Público Privada – PPP (RABELO, ROCHA & SILVA, 2014).
A supracitada lei foi editada objetivando definir procedimento licitatório e de instrumentalização singular para contratos fundamentais à efetuação dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos de 2016, da Copa das Confederações da Federação Internacional de Futebol (FIFA) 2013 e da Copa do Mundo FIFA 2014; restringiu-se, no tocante às obras públicas, às constantes da matriz de responsabilidades celebrada entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios, assim como para as contratações de obras de infraestrutura e de contratação de serviços para os aeroportos das capitais dos Estados da Federação distantes até trezentos e cinquenta quilômetros das cidades sedes dos referidos campeonatos mundiais (CARVALHO, 2014).
Relevante observar não ser obrigatória a utilização do RDC para a construção dos estádios, obras de infraestrutura e aeroportos. O Poder Público deve escolher o regime de contratação que lhe aparentar cabível, podendo, inclusive, optar pelos da Lei 8.987 de 1995, da Lei 11.079 de 2004 ou da Lei 8.666 de 1993 – regime de concessão e permissão de serviço público; regime de parcerias-público-privadas e regime de empreitada, respectivamente (DI PIETRO, 2015).
Deve-se salientar que a escolha da aplicação do RDC constará expressamente no instrumento convocatório e acarretará na dispensa das normas da Lei 8.666/93, que não terá aplicação subsidiária a não ser nas situações especificadas pela Lei 12.462/11 (CARVALHO, 2014).
A lei que instituiu o RDC já passou por algumas alterações. A primeira foi pela Lei 12.688/12, que acrescentou ao regime as contratações indispensáveis ao cumprimento das ações incluídas no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC); a segunda, pela Lei 12.722/12, que fez o RDC ser passível de aplicação também às licitações e contratos necessários à efetivação de obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de ensino.
Merece atenção a Lei 12. 745/12, que determinou que o RDC pudesse ser utilizado em contratações relativas a execução de obras e serviços de engenharia no campo do Sistema Único de Saúde (DI PIETRO, 2015).
A Lei 13.190/2015, por sua vez, acrescentou à Lei de RDC a possibilidade de este regime diferenciado ser usado nos casos de contrato de locação sob medida – a chamada built to suit (CAVALCANTE, 2015). A mesma lei estendeu o RDC à licitação e contratação nos seguintes casos: obras e serviços de engenharia para construção, ampliação e reforma e administração de estabelecimentos penais e de unidades de atendimento socioeducativo; ações no âmbito da segurança pública; obras e serviços de engenharia, relacionadas a melhorias na mobilidade urbana ou ampliação de infraestrutura logística; e obras e serviços de engenharia no âmbito dos sistemas públicos de pesquisa, ciência e tecnologia.
Por fim, recentemente, com a edição da Lei nº 13.243/2016, o RDC também passou a ser aplicável às licitações e contratos necessários à realização das ações em órgãos e entidades dedicados à ciência, à tecnologia e à inovação.
Possui quatro objetivos o RDC, quais sejam: aumento da eficácia nas contratações públicas e ampliação da competitividade entre os licitantes; promoção de troca de experiências e tecnologias visando a melhor relação entre custos e benefícios para o setor público; estímulo da inovação tecnológica e garantia de tratamento isonômico entre os licitantes, além da escolha da proposta mais vantajosa para a administração pública (MAZZA, 2013).
Por fim, cumpre ressaltar que, assim como na Lei Geral de Licitações e Contratos (Lei 8.666/93), na Lei 12.462/11 o procedimento licitatório também uma comissão de licitação (podendo ser permanente ou especial) fica a cargo do procedimento licitatório (DI PIETRO, 2015).
Segundo o artigo 34 da Lei 12.462/11, esta comissão é majoritariamente formada por servidores ou empregados públicos que estejam nos quadros permanentes dos órgãos ou entidades da administração pública encarregados do procedimento. Diz o §1º do supramencionado artigo que normas relacionadas às atividades das comissões de licitação e da comissão de cadastramento sobre a qual versa a Lei 12.462/11 serão estabelecidas em regulamento. Esta regulamentação encontra-se no Decreto nº 7.581/11 (DIAS, 2014).
Os membros dessa comissão, segundo a letra da lei, devem responder solidariamente por atos praticados pela comissão, sendo essa responsabilidade solidária afastadas nos casos em que a posição individual discordante de membro estiver registrada na ata da reunião na qual tenha sido tomada a decisão.
3. PECULIARIDADES DO REGIME DIFERENCIADO DE CONTRATAÇÕES PÚBLICAS
Criado com a função primordial de possibilitar efetividade a procedimentos de licitação, o Regime Diferenciado de Contratações trouxe consigo, para a concretização deste objetivo, muitos novos métodos; dentre eles, podemos destacar a possibilidade de escolha da marca ou modelo (CARDOSO & CORRALO, 2015).
De acordo com o art. 7º, I da Lei 12.462/11, permite-se a indicação de marcas nos casos de licitação para aquisição de bens, sob a condição de que isso deve ser justificado formalmente e que derive de três situações.
A primeira situação decorre da necessidade de o objeto seja padronizado. A segunda, ocorre quando mais de um fornecedor comercialize certa marca (ou modelo) que seja a única com capacidade de atender as demandas da entidade contratante.
A terceira hipótese é aquela na qual a descrição do objeto a ser licitado pode ser compreendida de forma melhor pela identificação de certa marca ou modelo adequado a servir como referência, situação em que se fará obrigatório o acréscimo da expressão “ou similar ou de melhor qualidade”. Neste caso, o poder público não vai indicar a marca que tem a intenção de adquirir – ele apenas irá a utilizar como referência, de modo que os licitantes compreendam as especificações do bem que a entidade deseja obter (CARVALHO, 2014).
Assim como ocorre com a Lei 8.666/93, a lei do RDC define que o edital de licitação estabelecerá qual o critério de julgamento a ser utilizado para a escolha do vencedor do certame. O RDC possui critérios de julgamento diferentes dos previstos na Lei Geral de Licitações e Contratos; enquanto a Lei 8.666/93 prevê os tipos menor preço, melhor técnica, técnica e preço e maior lance ou oferta, a Lei 12.462/11 prevê como critérios de julgamento menor preço ou maior desconto, técnica e preço, melhor técnica ou conteúdo artístico, maior oferta de preço e maior retorno econômico (MELO, 2016).
Caso haja empate entre duas ou mais propostas, o artigo 25 da Lei 12.462/11 traz os critérios de desempate. Importante salientar que esses critérios apenas são utilizados após garantir-se a preferências das microempresas e das empresas de pequeno porte, conforme o parágrafo único do supracitado artigo (DI PIETRO, 2015).
São critérios de desempate no RDC, nesta ordem: disputa final (em que os licitantes empatados poderão apresentar nova proposta fechada em ato contínuo à classificação); a avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes (desde que exista sistema objetivo de avaliação instituído); os critérios estabelecidos no art. 3o da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991, e no § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993; e, por fim, sorteio.
Regulamentado pela Lei 12.462/11, o procedimento de licitação passa pelas seguintes fases: preparatória (que ocorre da mesma maneira que a fase interna da Lei 8.666/93); publicação do instrumento convocatório (não há exigência de que o instrumento seja publicado em jornal de grande circulação, mas essa possibilidade também não é vedada. Ademais, para contratação de bens e serviços, inclusive de engenharia, de até oitenta mil reais ou para execução de obras de até cento e cinquenta mil reais, dispensa-se publicação em Diário Oficial – somente é necessária publicação no sítio eletrônico); apresentação de propostas ou lances (serão desclassificadas as propostas que se enquadrem em alguma das situações trazidas pelo artigo 24 da Lei 12.462/11); julgamento (por um dos critérios previamente adotados no instrumento convocatório); habilitação (saliente-se que, se o edital previr a inversão de fases, a habilitação dos licitantes será realizada antes da apresentação de propostas); recurso (deve ser interposto em até cinco dias úteis, a contar da data de intimação ou de lavratura da ata, garantindo-se aos licitantes vista dos dados essenciais à proteção e defesa de seus interesses) e, finalmente, o encerramento (CARVALHO, 2014).
A Lei 12.462/11 admite que haja parcelamento do objeto a ser contratado – em seu artigo 4º, inciso VI, a citada prevê a possibilidade de parcelamento do objeto, intentando à ampla participação de licitantes, sem perda de economia de escala.
Também é possível, no regime diferenciado em estudo, que haja a contratação integrada. A contratação de forma integra surge para fazer com que o procedimento seja mais eficiente, tanto sob a ótica técnica quanto financeira, conferindo maior liberdade ao particular contratado (SANTANA, 2015).
Na contratação integrada não existe anexo ao instrumento convocatório do projeto básico que foi aprovado pela autoridade competente, uma vez que a contratação já abarca a feitura e o desenrolamento dos projetos básico e executivo, a execução de obras e serviços de engenharia, montagem, realização de testes, pré-operação e os demais procedimentos essenciais e hábeis voltados à entrega final do objeto do contrato – assim, no lugar de projeto básico, o que se terá no instrumento convocatório será anteprojeto de engenharia, não havendo aqui, deste modo, a proibição prevista no art. 9º, I da Lei 8.666/93 (MELO, 2016). Na contratação integrada, portanto, a Lei 12.462/11 prevê a possibilidade de se contratar uma única empresa para ser responsável pela realização do projeto básico, do projeto executivo e pela obra.
A lei do RDC também prevê que, na hipótese em que o objeto da contratação puder ser executado de forma concorrente e simultânea por mais de um contratado, ou caso a múltipla contratação seja conveniente para atender à Administração Pública, a contratação simultânea poderá ser realizada, devendo o Poder Público ter controle individualizado da execução do objeto contratual relativamente a cada um dos contratados (CARVALHO, 2014).
A pré-qualificação é um dos procedimentos auxiliares das licitações regidas pelo disposto na 12.462/11. No Regime Diferenciado de Contrações, há a faculdade de que seja instituída pré-qualificação permanente, sendo proveitoso à Administração no tocante à celeridade do processo e à diminuição dos riscos da contratação (RABELO, ROCHA & SILVA, 2014). O artigo 30 da Lei do RDC trata da pré-qualificação permanente, que será feita antes da licitação, poderá ser parcial ou total e terá validade máxima de um ano, podendo, a qualquer tempo, ser atualizada.
No art. 40 da Lei 12.462/11 encontramos a possibilidade de contratação de proposta que não a vencedora do procedimento licitatório, algo inimaginável em uma licitação ordinária (estabelecida pela Lei 8.666/93), posto que, neste último caso, a Administração Pública poderia convocar os demais licitantes para contratar, porém nos termos da proposta vencedora (MAZZA, 2013).
No Regime Diferenciado de Contratações é possível que (desde que prevista no instrumento convocatório e no contrato, motivada pelo ente contratante e respeitado o limite de orçamento) haja definição de remuneração variável ao particular contratado relacionada ao desempenho deste (CARVALHO, 2014). Cumpre lembrar que, na Lei 8.666/93, a remuneração devida a particular contratado deve ser fixa, estabelecida conforme a proposta vencedora da licitação.
No tocante às sanções administrativas, de acordo com a Lei 8.666/93, em seu artigo 87, III, a Administração Pública pode punir o contratado (após, evidentemente, defesa prévia) com suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a dois anos. A Lei 12.462/11 inovou no que diz respeito ao prazo, e o estendeu para cinco anos somente no tocante ao impedimento de licitar e contratar com União, Estados, Distrito Federal e Municípios, sendo necessário chamar atenção para o fato de que as hipóteses de aplicação desta sanção estão listadas de forma taxativa em lei (DI PIETRO, 2015).
4. POLÊMICAS A RESPEITO DA LEI 12.462 DE 2011
Apesar de todas as novidades elogiadas (em sua maior parte visando a desburocratização e a celeridade de procedimentos licitatórios e contratuais), a Lei 12.462/11 também sofre duras críticas, havendo muitos que põe em dúvida a viabilidade desta em assegurar a eficiência e até mesmo garantir a base principiológica determinada pela Constituição Federal (DIAS, 2014).
Podemos citar como primeira crítica as alegações de inconstitucionalidade da supracitada lei.
A respeito da Lei 12.462/11, há duas Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) em trâmite no Supremo Tribunal Federal contra ela – ADI 4.465 e ADI 4.655 –, ambas ajuizadas em 2011; uma de autoria de um grupo de partidos políticos e a outra de autoria do Procurador-Geral da República (PEREIRA, 2015).
Em resumo, as mencionadas ADIs questionam se a Medida Provisória nº 527/11 (de cuja conversão resultou a Lei 12.462/11) observou os pressupostos de urgência e relevância cruciais à sua edição e se incidiu em abuso do poder emendar a Medida Provisória e, assim, incorreu em violação do devido processo legislativo (GARCIA, 2015).
A Advocacia-Geral da União (AGU) dirigiu ao Congresso Nacional, no próprio ano de 2011, nota técnica defendendo a constitucionalidade formal do referido diploma (LAVOR, PERSSON & PORTO, 2016).
As ADIs em análise ainda não foram decididas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e, quando o forem, formarão importante julgado; não só pelo tema em tela (referente ao RDC), mas também em relação à possibilidade de serem emendadas medidas provisórias com teores diferentes quando da sua conversão em lei (GARCIA, 2015).
A segunda controvérsia no tocante à Lei 12.462/11 seria o regime de contratação integrada previsto por ela.
Como visto anteriormente no presente estudo, o regime de contratação integrada, previsto pela Lei 12.462/11, possibilita à empresa contratada elaborar o projeto básico da obra e a execução dela, objetiva transferir ao contratado o desenvolvimento do projeto básico e executivo, além de concretizar a obra oriunda deste projeto; nisso, a citada lei do RDC diverge da Lei 8.666/93, que prevê a divisão em no mínimo duas licitações distintas, sendo uma para a contratação do projeto básico e outra para a execução das obras (BRAZ, OLIVEIRA & NETO, 2015).
A crítica a este instituto gira em torno de que a contratação integrada seria uma desvantagem do Regime Diferenciado de Contratações, uma vez que a ausência de projetos adequados acarretaria em prejuízo ao Erário e a permissão de que uma única empresa realizasse os dois projetos (quais sejam, o projeto básico e o projeto executivo) poderia facilitar a utilização do projeto básica como forma de aquisição de benefícios no projeto executivo, e isso violaria o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular (MELO, 2016).
Terceiro ponto de críticas à Lei do Regime Diferenciado de Contratações são os mecanismos de incentivo econômico – os contratos de eficiência E a remuneração variável (SANTANA, 2014).
A Lei 12.462/11 estabeleceu critério de julgamento chamado melhor retorno econômico e sua utilização provoca um contrato de eficiência (PEREIRA, 2015).
Os contratos de eficiência trazem uma grande vantagem: o Poder Pública remunera o contratado parcialmente, baseando-se na economia gerada à Administração (KRAWCZYK, 2012). Deste modo, havendo resultado positivo, causando ganho econômico para a Administração, essa vantagem será transformada em adicional pecuniário para o contratado (SANTANA, 2014). Por outro lado, se o contratado não alcançar a economia contratada, ele terá que suportar a diferença, por meio de desconto de sua remuneração ou através do pagamento de multa (PEREIRA, 2015).
A remuneração variável, por sua vez, trata-se de um equilíbrio no pagamento feito pelo Poder Público com fundamento no desempenho do contratado para a execução do contrato (caso seja positivo, há bônus; negativo, descontos) e são passíveis as variáveis de qualidade, prazos de entrega e sustentabilidade, tudo devendo ter respaldo em metas e ser restrito ao orçamento da contratação (GARCIA, 2015).
Criticam-se o contrato de eficiência e a remuneração variável posto que há a possibilidade de que nestes dois institutos sejam usados critérios subjetivos para que o contratado seja beneficiado e isto poderia dar margem a caracterização de vantagens ilícitas; por outro lado, quando se pode determinar critério objetivos de aferição desses benefícios, torna-se possível a inovação benéfica para a Administração Pública (SANTANA, 2014).
Por fim, como quarto ponto de polêmica envolvendo o RDC, temos o sigilo orçamentário.
Até que haja a conclusão da licitação, a Lei 12.462/11 estabeleceu que o sigilo orçamentário deve ser mantido, sendo isto uma vantagem trazida pelo RDC sobre a Lei Geral de Licitações e Contratos, já que o sigilo do orçamento estimado tem por finalidade permitir ao Poder Público a análise de que propostas serão realmente executadas, posto que os licitantes não irão moldar suas propostas conforme o orçamento estimado, mas sim de acordo com a capacidade de execução que têm (MELO, 2016).
Há, todavia, parcela da doutrina que acusa o sigilo do orçamento de violar o princípio da publicidade, expresso na Constituição Federal de 1988, alegando que a fase recursal será essencialmente prejudicada, principalmente, no tocante aos derrotados no certame, posto que parcela das alegações de defesa poderiam ter por base o cálculo usado para confecção do orçamento da administração, não sendo, portanto, possível argumentar sobre aquilo que não se conhece (SANTANA, 2014).
Além do exposto acima, os críticos do sigilo orçamentário chamam atenção para o fato de que, sendo o orçamento mantido em segredo e, naturalmente, havendo parcela de servidores públicos detentores desses dados privilegiados, poderia haver repasse de informações sigilosas a particulares por meio dos agentes públicos (GARCIA, 2015).
CONCLUSÃO
Como visto, Regime Diferenciado de Contratações surgiu no cenário jurídico brasileiro com o advento da Lei 12.462/11. Originou-se da necessidade de desburocratização e consequente celeridade para que fossem feitas licitações prévias a contratos relacionados a grandes eventos esportivos mundiais dos quais o Brasil seria sede. Contudo, o legislador, após a edição da referida lei, criou novas hipóteses às já previstas.
A Lei 12.462/11 prevê um regime de licitação e contratos quase que completamente diferente do previsto na Lei 8.666/93 (poucos são os pontos semelhantes) e tem regras inovadoras, na medida em que elimina óbices à rapidez procedimental licitatória e contratual ao mesmo tempo em que deve obediência aos mesmos princípios norteadores da Lei Geral de Licitações e Contratos.
Apesar de todas as críticas analisadas neste trabalho, constata-se que o RDC continua em voga, sendo muito utilizado no cotidiano do Poder Público. É pouco provável que o referido regime de contratações sofra grandes cerceamentos, posto que é um dos mais importantes no atual cenário fático-jurídico nacional.
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Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco. Pós-Graduada em Direito Público pela Universidade Anhanguera - UNIDERP.
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