HEITOR VINÍCIUS BENTO PESSOA
(Orientador)
RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo fazer uma análise crítica e ponderar o novel Estatuto da Pessoa com Deficiência e seus reflexos na capacidade civil no ordenamento jurídico brasileiro, observando a questão do binômio proteção-liberdade, bem como possíveis prejuízos na mudança da classificação da teoria das incapacidades, mais precisamente para as pessoas que estejam vulneráveis. Para tanto, foi necessário verificar através de entendimentos jurisprudenciais e doutrinários para saber se, no caso concreto, houve ou não algum tipo de agravamento no tratamento jurídico dado às pessoas com deficiência, e como está sendo aplicada a nova regra no caso concreto. O trabalho ocupou-se em ressaltar que a nova regra trazida pelo estatuto mitigou a proteção da teoria das incapacidades em nome da autoafirmação das pessoas com deficiência, dando a elas uma liberdade nunca antes vista em nosso ordenamento jurídico. Diante de estudo e reflexão foi possível concluir que apesar modificações positivas advindas do Estatuto, que merecem aplausos por fazer valer a tão almejada inclusão social, ainda há entendimentos diferentes, doutrinários e jurisprudenciais, na aplicação da norma, bem como há necessidade de se estipular hipóteses de incapacidade absoluta em relação àqueles que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a sua vontade, independentemente de ter deficiência ou não, onde poderá figurar qualquer pessoa, inclusive uma pessoa com deficiência.
Palavras-chave: Pessoa com deficiência – capacidade civil – curatela – inclusão social.
ABSTRACT: The present work has as objective to make a critical analysis and to ponder the novel Statute of the Person with Disability and its reflexes in the civil capacity in the Brazilian legal system, observing the question of the binomial protection-freedom, as well as possible damages in the change of the classification of the theory of the disability, more precisely for people who are vulnerable. In order to do so, it was necessary to verify through jurisprudential and doctrinal understandings as to whether, in the concrete case, there was some kind of aggravation in the legal treatment given to persons with disabilities, and how the new rule is applied in the specific case. The work was focused on emphasizing that the new rule brought by the statute mitigated the protection of the theory of disabilities in the name of the self-assertion of people with disabilities, giving them a freedom never before seen in our legal system. In the face of study and reflection, it was possible to conclude that despite the positive changes arising from the Statute, which merit applause for asserting the longed for social inclusion, there are still different understandings, doctrinal and jurisprudential, in the application of the norm, and there is a need to stipulate hypotheses of absolute incapacity in relation to those who, because of a transient or permanent cause, can not express their will, regardless of whether or not they are disabled, where any person, including a person with a disability, may appear.
Keywords: Disabled person - civil capacity - curatela - social inclusion.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. 1.1 A ORIGEM DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. 1.2 MODIFICAÇÕES NO CÓDIGO CIVIL DE 2002. 1.3 REFLEXOS DA DECLARAÇAO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. 2 CAPACIDADE CIVIL. 2.1 TEORIA DA INCAPACIDADE CIVIL. 2.2 MUDANÇAS NA CAPACIDADE CIVIL. 2.3 INSTITUTO DA CURATELA. 3 ANÁLISE DA PROBLEMÁTICA. 3.1 EFEITOS DA MUDANÇA DA CAPACIDADE CIVIL. 3.2 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL CIVIL DOS EFEITOS. 3.3 POSIÇÃO DA DOUTRINA ACERCA DA TEMÁTICA . CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
Com o advento da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI), denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência (EPD), Lei nº 13.146 de 06 de julho de 2015, houve modificações expressivas na legislação pátria, como as alterações e revogações de alguns artigos do Código Civil Brasileiro (CC), onde foram empregadas mudanças estruturais e funcionais no que diz respeito à teoria da incapacidade civil, afetando diretamente alguns dos institutos do Direito Civil, como a interdição, a curatela, o casamento, os direitos à reprodução e criou uma figura do instituto da tomada de decisão apoiada, totalmente inédita para o direito brasileiro.
Além disso, as modificações causaram uma antinomia gerada pelo Estatuto em descompasso com o Novo Código de Processo Civil (CPC), que entrou em vigor logo após a vigência da LBI. Essa antinomia de normas se configurou no que diz respeito à legitimidade para pedir a curatela, pois ao entrar em vigor, o novo CPC revogou a nova regra que havia sido estabelecida pelo novo Estatuto. Dessa forma, o Estatuto da Pessoa com Deficiência foi assertivo na mudança da capacidade civil? Este é o problema que pretende responder a presente pesquisa.
Como hipótese para a possível conclusão a ser obtida por esta pesquisa elaborada a seguir, adotou-se a ideia de que o Estatuto da pessoa com deficiência ao modificar a capacidade civil foi assertivo e trouxe consigo a liberdade, mas também prejuízos ao suprimir algumas proteções. Sendo assim, perfilhou-se a ideia de que com a nova legislação do Estatuto, vigorando desde 2015, sucederam mudanças substanciais no direito brasileiro as quais suprimiram algumas proteções legais das pessoas com deficiência previstas na teoria da incapacidade civil.
Em verdade, para a maioria das pessoas enquadradas com alguma forma de deficiência, o estatuto foi muito assertivo, pois proporcionou para estas uma liberdade nunca antes vista. Porém, num suposto atropelo legislativo, observou-se a mitigação da proteção de quem não é considerado deficiente, mas que por causa transitória ou permanente não pode exprimir a sua vontade, sendo classificado agora como relativamente incapaz, suprimindo assim algumas proteções dadas a essas pessoas que encontram-se vulneráveis, sem qualquer discernimento e impossibilitadas de exprimir a sua vontade, independentemente de deficiência.
Dessa forma, observa-se que o Estatuto da Pessoa com Deficiência agiu acertadamente em proporcionar mais liberdade para quem consegue usufruir, inclusive criando o instituto da tomada de decisão apoiada que auxilia na autodeterminação da pessoa, todavia pecou em alguns casos onde deixou-se visivelmente desprotegidos aqueles que necessitam dessa proteção maior do Estado.
O objetivo geral deste trabalho é analisar e ponderar as mudanças no sistema da incapacidade civil e seus reflexos no ordenamento jurídico brasileiro, observando possíveis prejuízos para as pessoas com deficiência, bem como para quem por causa transitória ou permanente não puder exprimir a sua vontade. Além disso, é necessário verificar se, no caso concreto, houve ou não algum tipo de agravamento no tratamento jurídico dado às pessoas com deficiência que tiveram mitigada a sua proteção como vulneráveis, dando a elas uma autoafirmação e retirando-as da condição de incapaz oferecida pela antiga legislação revogada.
O objetivo específico deste trabalho é analisar as mudanças estruturais, no que diz respeito à teoria da incapacidade civil, afetando diretamente alguns dos institutos do Direito Civil, como a curatela, que agora é considerada de caráter temporário e tão somente patrimonial, além de observar as mudanças na interdição, que para alguns doutrinadores esta deixou de existir. Verificar a nova regra do casamento, que deu liberdade de casar, além de ter assegurados os direitos à reprodução. Explorar a nova figura do instituto da tomada de decisão apoiada, totalmente inédita para o direito brasileiro. E, por último, como objetivo específico, observar a antinomia gerada pelo Estatuto em descompasso com o Novo Código de Processo Civil no que diz respeito à legitimidade para a curatela.
Esta pesquisa é importante no sentido de compreender, como operadores do direito, qual a magnitude e alcance do novel Estatuto, analisando a importância e complexidade da matéria tendo em vista possíveis avanços e/ou prejuízos, fazendo reflexões acerca dos assuntos que foram aprendidos durante toda a graduação.
Para a ciência, a importância de uma pesquisa científica como esta é imprescindível para o conhecimento e evolução do direito, uma vez que busca-se a melhor aplicação do direito ao caso concreto, possibilitando a elaboração de novos conceitos no intuito de absorver cada vez mais conhecimento jurídico e reflexões sobre assuntos importantes para o estudo do direito.
Já para a sociedade são imperiosos os trabalhos científicos visto que ao se debruçar sobre determinado assunto, o pesquisador procura encontrar respostas para os problemas que, em algum momento da história foram suscitados pela própria sociedade, já que esta encontra-se sempre em processo de mutação, pois é formada de pessoas que também mudam através do tempo e com isso a sociedade deve acompanhar essa metamorfose, assim como o direito também deve participar dessa mudança, oferecendo respostas aos novos anseios da sociedade.
No caso das pessoas com deficiência não foi diferente, uma vez que sentiram a necessidade de ter seus direitos reconhecidos perante a sociedade e o Estado. E para isto basearam-se no novo conceito mundial dos direitos humanos para embasar e ter um alicerce na busca por respostas às suas necessidades, que posteriormente foram acompanhadas pelo direito através da positivação em uma norma dedicada a este grupo, garantindo desta forma que os seus direitos fossem observados e respeitados por todos.
A metodologia utilizada para a elaboração deste trabalho de monografia é a pesquisa bibliográfica que se caracteriza em aprofundar o contexto e a interpretação das reflexões obtidas através de leitura em livros e artigos científicos publicados sobre o tema, além de possíveis decisões jurisprudências. A tradição metodológica será do tipo misto (dedutivo e indutivo) pois serão analisados os dados presentes na sociedade, como também será feita uma observação individual acerca do tema. O viés metodológico será o exploratório, sendo a pesquisa de caráter qualitativa.
1. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
Ao longo dos anos as pessoas com algum tipo de deficiência, seja intelectual, mental ou física, enfrentaram muitos obstáculos na luta pelo reconhecimento e respeito dos seus direitos. A trajetória dessas pessoas com o passar do tempo resultou em muito esforço conjunto para que, paulatinamente, angariassem direitos e com isso conseguissem quebrar barreiras no intuído de se consolidarem na história dos mais diversos povos e culturas como pessoas que realmente são, não sendo mais invisíveis perante os olhos do Estado e da sociedade, passando a ser sujeitos com direitos devidamente respeitados e reconhecidos, deixando de lado todo o passado de desrespeito, descaso, vergonha, preconceito e indiferença, não sendo mais tratadas como um fardo social repartido pela sociedade e pelo Estado.
Uma das formas de assegurar os direitos conquistados por estas pessoas, foi positivá-los em uma norma do ordenamento jurídico, tanto nas constituições que são a base suprema fundamental do ordenamento, bem como através de leis específicas voltadas para estas pessoas em comento. A partir disso, surgiu um Estatuto que reúne todos esses direitos alcançados por este público no decorrer da história dos povos, civilizações e do próprio direito, deixando de ser apenas um caráter naturalista, passando então para a positivação assecuratória.
1.1 A ORIGEM DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA
A preocupação com o bem-estar das pessoas do mundo todo deu início, mais precisamente, após a Segunda Guerra Mundial, onde milhares de pessoas que sobreviveram aos conflitos estavam vivendo de maneira desumana em decorrência dos horrores causados pela guerra. As guerras traziam consigo a devastação de toda uma região, com milhares de mortes em batalhas, bem como com a destruição de cidades inteiras e de suas riquezas, como a agricultura e a pecuária e, consequentemente, deixavam milhares de pessoas morrerem de fome, quando estas não eram prisioneiras e vítimas de toda e qualquer atrocidade pois não se tinha nenhuma norma que possibilitasse um mínimo para uma sobrevivência com dignidade.
A partir disso, houve uma maior atenção da comunidade internacional em proporcionar um mínimo de direitos humanitários para essas pessoas que enfrentaram um período de guerra, perdendo entes da família e até suas casas e seus meios de sobrevivência, ficando à mercê de sua própria sorte e a tratamento desumano.
A consequência disso foi a elaboração da Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1948 feita pela Organização das Nações Unidas – ONU, onde fixou critérios mínimos, e que teve seus reflexos em todo o mundo. Também foi consequência a Convenção Americana de Direitos Humanos onde firmou-se o tratado internacional do Pacto de San José da Costa Rica em 1960 com reflexos nas Américas. Com isso, criou-se a ideia segundo a qual toda pessoa humana tem direito a ter direitos, pelo menos o mínimo necessário a sua sobrevivência com dignidade.
Enfim, entraram em cena os direitos humanos com a finalidade de estabelecer condições mínimas para que as pessoas conseguissem viver com um pouco de dignidade. Nesta esteira, pode-se conceituar os direitos humanos segundo o autor André Ramos como:
Os direitos humanos consistem em um conjunto de direitos considerados indispensáveis para uma vida humana pautada na liberdade, igualdade e dignidade. Os direitos humanos são os direitos essenciais e indispensáveis à vida digna. (RAMOS, 2017, p. 32).
Apoiado na concepção de Direitos Humanos, mais precisamente em relação ao princípio da dignidade da pessoa humana, é que se começou a pleitear os direitos das pessoas com deficiência, que em verdade viviam em total desrespeito, descaso, segregação e humilhação, necessitando de uma maior atenção do Estado e da sociedade para poder ter seus direitos devidamente reconhecidos, bem como ser considerados como pessoas, deixando de ser considerados invisíveis. Nesse sentido, Flávia Piovesan classifica os avanços dos direitos em quatro fases, a saber:
A história da construção dos direitos humanos das pessoas com deficiência compreende quatro fases: a) uma fase de intolerância em relação às pessoas com deficiência, em que esta simbolizava impureza, pecado ou mesmo castigo divino; b) uma fase marcada pela invisibilidade das pessoas com deficiência; c) uma terceira fase, orientada por uma ótica assistencialista, pautada na perspectiva médica e biológica de que a deficiência era uma “doença a ser curada”, estando o foco no indivíduo “portador da enfermidade”; e d) finalmente uma quarta fase, orientada pelo paradigma dos direitos humanos, em que emergem os direitos à inclusão social, com ênfase na relação da pessoa com deficiência e do meio em que ela se insere, bem como na necessidade de eliminar obstáculos e barreiras superáveis, sejam elas culturais, físicas ou sociais, que impeçam o pleno exercício de direitos humanos. (PIOVESAN, 2013, p.283).
Na análise assertiva da professora Flávia Piovesan é possível observar o caminho percorrido ao longo do tempo representado pela classificação em quatro fases em que na primeira fase as pessoas com deficiência não eram sequer consideradas como pessoas pois simbolizavam a impureza num caráter extremamente discriminatório. Na segunda classificação pode-se observar que houve uma menor intolerância, porém eram consideradas invisíveis aos olhos da sociedade e do Estado. Já na terceira fase em que houve uma proteção, porém ainda de caráter discriminatório como portador de enfermidade. Por último, na quarta fase, é que acontece de fato a inclusão social com o devido respeito orientado pelo paradigma dos direitos humanos.
Uma consequência da busca pelo reconhecimento das pessoas com deficiência e sua inclusão social foi a Convenção Sobre os Direitos das Pessoa com Deficiência realizada em Nova York em 2007, que depois passou vigorar internacionalmente e, por fim, foi internalizada no Brasil. A convenção surgiu para dar fundamentação às necessidades consideras importantes pela comunidade internacional. Nesse sentido, a professora Flávia Piovesan disserta:
A Convenção surge como resposta da comunidade internacional à longa história de discriminação, exclusão e desumanização das pessoas com deficiência. É inovadora em muitos aspectos, tendo sido o tratado de direitos humanos mais rapidamente negociado e o primeiro do século XXI. Incorpora uma mudança de perspectiva, sendo relevante instrumento para a alteração da percepção da deficiência, reconhecendo que todas as pessoas devem ter a oportunidade de alcançar de forma plena o seu potencial. (PIOVESAN, 2013, p. 284).
Essa convenção surtiu efeito em diversos países que apoiavam a causa e que aceitaram seu protocolo, numa tentativa de maior humanização do mundo. Nessa situação está o Brasil que com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, consagrou como fundamento o princípio da dignidade da pessoa humana. Por este motivo, o Brasil recepcionou e ratificou a Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência e a seu Protocolo Facultativo, resultando no Decreto. 6.949, de 25 de agosto de 2009. Ao aderir à Convenção, o Brasil se prontificou, diante da comunidade internacional e perante seu povo, em aplicar as normas tratadas naquele documento.
Quando da internalização, ela foi aprovada segundo o quórum conforme o procedimento do § 3º do art. 5º da Constituição Federal (CF), onde os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais, portanto, é considerado norma constitucional e deve ser observado por todos, em todo o ordenamento jurídico e servindo de base para a criação das normas.
Em razão disso, teve uma modificação significativa na estrutura das normas no ordenamento jurídico brasileiro, pois foi a primeira vez em que um tratado internacional teve status de emenda constitucional e, consequentemente, norma constitucional. Esta convenção reflete a mais moderna visão inclusiva da pessoa com deficiência que dá total concretude à dignidade da pessoa humana, porém, apesar de já vigorar no país desde 2009, ainda não havia sido devidamente regulamentada em legislação específica.
Porém, convêm salientar que mesmo antes da ratificação da convenção em 2009, o Brasil já havia começado a discutir sobre uma possível lei de inclusão social das pessoas com deficiência por volta do ano 2000, através de um projeto de lei de iniciativa do Senador Paulo Paim, denominado Estatuto do Portador de Necessidades Especiais. Em 2003 este projeto foi modificado e restruturado no Senado Federal, passando a se chamar Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência, sendo posteriormente, após a interferência das mais diversas representações de classes da sociedade brasileira que ajudaram a aprimorar o projeto, transformando-se no Estatuto da Pessoa com Deficiência tal qual se mostra hoje.
No dia 06 de julho de 2015 foi sancionada a Lei Nacional Nº 13.146, que institui a Lei Brasileira de inclusão da Pessoa com deficiência no Brasil, denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência, tendo sido publicada em 07 de julho, com vacatio legis de 180 dias, entrando em vigor no dia 04 de janeiro de 2016. Esta lei foi destinada a assegurar e a promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais por pessoa com deficiência, visando à sua inclusão social e cidadania. Sendo assim, o Brasil passou, definitivamente, a ter uma legislação específica que trata do assunto em voga.
1.2 MODIFICAÇÕES NO CÓDIGO CIVIL DE 2002
Com o advento da Lei 13.146/15, denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência observou-se, indubitavelmente, significativas modificações na definição do conceito de pessoa portadora de deficiência, bem como suas classificações ou distinções. As mudanças foram relação à capacidade civil, o direito de ser testemunha, o casamento, a curatela e a novidade da tomada de decisão apoiada. A primeira mudança no Código Civil Brasileiro foi o art. 3º, conforme a redação:
Art. 3o São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
Art. 4o São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;
IV - os pródigos.
Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial.
(Brasil, Código Civil, 2002, artigos 3º e 4º).
Como pode-se observar, a alteração do art. 3º do CC foi muito expressiva, tendo todos os seus incisos revogados. Este artigo trata das hipóteses de incapacidade absoluta, trazendo em seu caput que são absolutamente incapazes apenas os menores de 16 anos. Já o artigo 4º manteve a maioria dos seus incisos, apenas suprimindo a parte que tratava dos que “por deficiência mental tenham o discernimento reduzido” e “os excepcionais sem desenvolvimento mental completo”, que foram substituídos para a classificação de “por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a sua vontade” que antes estava previsto nas hipóteses de incapacidade absoluta. Nesse sentindo, o autor Cristiano Farias afirma:
A nova redação dedicada aos arts. 3° e 4° do Código Civil de 2002 é de clareza solar ao afastar qualquer tipo de incapacidade jurídica decorrente de deficiência. Assim, a deficiência, de qualquer ordem, não implica em incapacidade para a prática de atos jurídicos. Todavia, a pessoa com deficiência pode reclamar uma proteção diferenciada em determinadas situações, como estado de risco, emergência ou calamidade. (FARIAS; CUNHA; PINTO; 2016, p. 18).
A capacidade civil, que pode ser entendida como a maior ou menor extensão dos direitos e deveres de uma pessoa, pode sofrer restrições legais quanto ao seu exercício, seja pela menoridade ou pela falta de manifestação da vontade. Nesse sentido, no direito brasileiro não existe incapacidade de direito, porque essa capacidade advém da personalidade, que é adquirida ao nascer com vida, e é inerente a toda e qualquer pessoa humana. O que existe é uma incapacidade de fato ou de exercício, que é classificada em incapacidade absoluta e relativa. Este assunto em comento será minuciosamente abordado no próximo capítulo.
Outra modificação no Código Civil foi em relação ao direito das pessoas com deficiência de poder ser testemunhas em igualdade de condições com os demais. O Estatuto partiu da premissa de que a regra geral é a ampla possibilidade de qualquer pessoa servir como testemunha, mesmo que esta não tenha nenhum interesse na solução do conflito. E, dessa forma, acabou por revogar os incisos lI e III do art. 228 do CC/2002, nos mesmos moldes, criou o parágrafo 2º para fixar a nova regra, conforme a redação do artigo supracitado:
Art. 228. Não podem ser admitidos como testemunhas:
I - os menores de dezesseis anos;
II - (Revogado);
III - (Revogado);
IV - o interessado no litígio, o amigo íntimo ou o inimigo capital das partes;
V - os cônjuges, os ascendentes, os descendentes e os colaterais, até o terceiro grau de alguma das partes, por consangüinidade, ou afinidade.
§ 1o Para a prova de fatos que só elas conheçam, pode o juiz admitir o depoimento das pessoas a que se refere este artigo
§ 2o A pessoa com deficiência poderá testemunhar em igualdade de condições com as demais pessoas, sendo-lhe assegurados todos os recursos de tecnologia assistiva.
(Brasil, Código Civil, 2002, artigo 228).
A Lei 13.146/2015 também trouxe consigo um caráter mais humanitário na medida em que possibilitou à pessoa com deficiência o direito ao casamento, bem como o direito de poder gerar um filho ou até mesmo o de poder adotar. E por esse motivo, mudou o art. 1.548 do CC que trata do casamento e de sua anulação, através da revogação do inciso I na inclusão do § 2º do art. 1.550, consoante a nova redação destes artigos:
Art. 1.548. É nulo o casamento contraído:
I - (Revogado);
II - por infringência de impedimento.
Art. 1.550. É anulável o casamento:
I - de quem não completou a idade mínima para casar;
II - do menor em idade núbil, quando não autorizado por seu representante legal;
III - por vício da vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558;
IV - do incapaz de consentir ou manifestar, de modo inequívoco, o consentimento;
V - realizado pelo mandatário, sem que ele ou o outro contraente soubesse da revogação do mandato, e não sobrevindo coabitação entre os cônjuges;
VI - por incompetência da autoridade celebrante.
§ 1o. Equipara-se à revogação a invalidade do mandato judicialmente decretada.
§ 2o A pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbia poderá contrair matrimônio, expressando sua vontade diretamente ou por meio de seu responsável ou curador. (Brasil, Código Civil, 2002, artigos 1.548 e 1.550).
Portanto, o casamento celebrado por pessoa com deficiência não é mais considerado nulo, podendo ser anulável se não cumprir o requisito comum a todas as pessoas, necessitando apenas se encontrar em idade núbia para o casamento, tendo tão somente impedimentos matrimoniais que devem ser observados por todos. Para isto, basta unicamente expressar a sua vontade diretamente ou até mesmo por meio de seu assistente curador, caso esteja em curatela, pois a curatela apenas influência nos direitos negociais e patrimoniais, podendo assim a pessoa com deficiência dispor da liberdade de querer casar ou não. O autor Cristiano Farias disserta sobre o assunto:
A Lei Brasileira de Inclusão altera, significativamente, o sistema de invalidades do matrimônio, previsto nos arts. 1.548 e 1.550 do Código Civil. Não há mais nulidade ou anulabilidade de casamento decorrente de deficiência. Singrando os mesmos mares, o curatelado pode casar, independentemente de anuência do representante ou assistente. Com isso, a hipótese única de nulidade nupcial passa a ser a violação de impedimentos matrimoniais. Lado outro, não mais é possível a anulação do casamento por desconhecimento de doença mental ou deficiência física. (FARIAS; CUNHA; PINTO, 2016, p. 247).
Nesse mesmo sentido, o Estatuto proporcionou plena validade do casamento de uma pessoa com deficiência mental ou intelectual em idade núbil, pois segundo o Estatuto a natureza evidentemente afetiva e existencial do ato nupcial ajusta-se, portanto, com a plena possibilidade de manifestação de vontade por uma pessoa com deficiência, inclusive mental. Também modificou o rol taxativo das hipóteses de erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge com o propósito de anulação do casamento. Conforme a redação dos artigos do CC:
Art. 1.556. O casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro.
Art. 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:
I - o que diz respeito à sua identidade, sua honra e boa fama, sendo esse erro tal que o seu conhecimento ulterior torne insuportável a vida em comum ao cônjuge enganado;
II - a ignorância de crime, anterior ao casamento, que, por sua natureza, torne insuportável a vida conjugal;
III - a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável que não caracterize deficiência ou de moléstia grave e transmissível, por contágio ou por herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência;
IV - (Revogado).
(Brasil, Código Civil, 2002, artigo 1.556 e 1.557).
Contudo, o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge em relação à deficiência não é mais motivo para a anulação de casamento da pessoa com deficiência, pois este artigo continha um dispositivo flagrantemente de cunho discriminatório. Este rol é extremamente importante pois pode, inclusive, gerar até mesmo uma ação penal personalíssima já que é considerado crime de induzimento a erro essencial e ocultação de impedimento segundo o artigo 236 do Código Penal Brasileiro, Lei nº 2848 de 1940, que diz: “Contrair casamento, induzindo em erro essencial o outro contraente, ou ocultando-lhe impedimento que não seja casamento anterior”.
Uma outra grande modificação no Código Civil foi, sem dúvida, em relação à curatela. Essa alteração no instituto vem causando várias interpretações pois em sua nova redação, o EPD suprimiu as hipóteses anteriormente previstas de aplicação da curatela às pessoas que não tem o necessário de discernimento para atos da vida civil, às pessoas com deficiência mental e às pessoas sem completo desenvolvimento mental. Vale ressaltar que essa modificação também afetou o Código de Processo Civil, pois criou uma antinomia conforme explica Cristiano Farias:
Nessa linha de perspectiva, o Estatuto legitimou a própria pessoa para a ação de curatela (a chamada autocuratela) e, a outro giro, reconheceu a legitimidade do Ministério Público para qualquer tipo de curatela, mesmo não se tratando de doença mental grave. Nota-se, ademais, que o Código Adjetivo de 2015 teve de cumprir uma vacatio legis de um ano, enquanto à Lei Brasileira de Inclusão, por seu turno, foi estabelecido um período de vacância de 180 dias. Ou seja, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, embora seja lei posterior (já que a norma legal existe a partir de sua promulgação, conforme entendimento prevalecente em doutrina), entrou em vigor em janeiro de 2016, enquanto o Código de Processo Civil de 2016 (que é lei anterior) somente ganhou vigência em março de 2016. Malgrado seja possível uma interpretação no sentido de que urna norma teria revogado a outra (utilizando o critério da anterioridade ou da especialidade), a melhor compreensão é no sentida da harmonização entre os dois Diplomas Legais, procurando estabelecer uma interpretação sistêmica. Assim sendo, deve se retirar de cada lei aquilo que melhor se mostrar para a pessoa com deficiência. ((FARIAS; CUNHA; PINTO; 2016, p.329).
Dito isto, é notória a contradição entre a regra estabelecida pelo EPD e o novo Código de Processo Civil, uma vez que, em princípio, havia a possibilidade de legitimidade da própria pessoa de poder entrar com ação para submeter-se à curatela, e desta forma, poderia ela mesma propor o pedido em juízo, mas com a entrada em vigor do novo CPC, essa legitimidade foi revogada. Consoante a regra presente nos arts. 1.767 e 1.768 do CC, que foram revogados pela entrada em vigor do CPC. A redação revogada da curatela está prevista no seguintes artigos do Código Civil:
Art. 1.767. Estão sujeitos a curatela:
I - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;
II - (Revogado);
III - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
IV - (Revogado);
V - os pródigos.
Art. 1.768. O processo que define os termos da curatela deve ser promovido: (Revogado pela Lei n º 13.105, de 2015) (Vigência)
I - pelos pais ou tutores; (Revogado pela Lei n º 13.105, de 2015) (Vigência)
II - pelo cônjuge, ou por qualquer parente; (Revogado pela Lei n º 13.105, de 2015) (Vigência)
III - pelo Ministério Público. (Revogado pela Lei n º 13.105, de 2015) (Vigência)
IV - pela própria pessoa. (Revogado)
(Brasil, Código Civil, 2002, artigos 1.767 e 1.768).
Portanto, ao entrar em vigor o novo Código de Processo Civil revogou os artigos do Código Civil que tratavam da legitimidade para a curatela trazidos pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, em que possibilitava legitimidade para a própria pessoa. O novo CPC tratou de forma diferente este assunto, trazendo em seu art. 747 a nova regra que entra em contradição com o que foi estabelecido no Estatuto da Pessoa com Deficiência, conforme o previsto no artigo a seguir:
Art. 747. A interdição pode ser promovida:
I - pelo cônjuge ou companheiro;
II - pelos parentes ou tutores;
III - pelo representante da entidade em que se encontra abrigado o interditando;
IV - pelo Ministério Público.
Parágrafo único. A legitimidade deverá ser comprovada por documentação que acompanhe a petição inicial.
(BRASIL, Código de Processo Civil, 2015, art. 747).
Nessa esteira, há um choque de normas onde uma lei revogou as regras trazidas por outra lei, que, em verdade, deveria o Código de Processo Civil estar em consonância e harmonia com o Estatuto da Pessoa com Deficiência, porém há essa antinomia de normas, que segundo a doutrina, deverá levar em consideração a interpretação sistêmica e o que se apresentar melhor para a pessoa com deficiência, que deverá ser adotado no caso concreto, mas dependerá de cada magistrado a interpretação se cabe ou não legitimidade para a própria pessoa a ser interditada.
Outra grande novidade advinda do Estatuto foi, indubitavelmente, a maior inovação no Direito Civil, no que concerne à criação do instituto da tomada de decisão apoiada. Nesse ponto o Estatuto modernizou o direito brasileiro ao criar este instituto que deu a possibilidade de a pessoa com deficiência, se assim ela preferir, poder contar com a ajuda de outras duas pessoas de sua confiança para prestar apoio sobre os atos da vida civil e tomar opiniões das mesmas, podendo inclusive ser essa ajuda suprida pelo juiz, conforme a regras dos artigos a seguir:
Art. 1.783-A. A tomada de decisão apoiada é o processo pelo qual a pessoa com deficiência elege pelo menos 2 (duas) pessoas ido?neas, com as quais mantenha vínculos e que gozem de sua confiança, para prestar-lhe apoio na tomada de decisão sobre atos da vida civil, fornecendo-lhes os elementos e informaço?es necessários para que possa exercer sua capacidade.
§ 1o Para formular pedido de tomada de decisão apoiada, a pessoa com deficiência e os apoiadores devem apresentar termo em que constem os limites do apoio a ser oferecido e os compromissos dos apoiadores, inclusive o prazo de vigência do acordo e o respeito a? vontade, aos direitos e aos interesses da pessoa que devem apoiar.
§ 2o O pedido de tomada de decisão apoiada será requerido pela pessoa a ser apoiada, com indicação expressa das pessoas aptas a prestarem o apoio previsto no caput deste artigo.
§ 3o Antes de se pronunciar sobre o pedido de tomada de decisão apoiada, o juiz, assistido por equipe multidisciplinar, após oitiva do Ministério Público, ouvirá pessoalmente o requerente e as pessoas que lhe prestarão apoio.
§ 4o A decisão tomada por pessoa apoiada terá validade e efeitos sobre terceiros, sem restriço?es, desde que esteja inserida nos limites do apoio acordado.
§ 5o Terceiro com quem a pessoa apoiada mantenha relação negocial pode solicitar que os apoiadores contra-assinem o contrato ou acordo, especificando, por escrito, sua função em relação ao apoiado.
§ 6o Em caso de negócio jurídico que possa trazer risco ou prejuízo relevante, havendo divergência de opinio?es entre a pessoa apoiada e um dos apoiadores, deverá o juiz, ouvido o Ministério Público, decidir sobre a questão.
§ 7o Se o apoiador agir com negligência, exercer pressão indevida ou não adimplir as obrigaço?es assumidas, poderá a pessoa apoiada ou qualquer pessoa apresentar denúncia ao Ministério Público ou ao juiz.
§ 8o Se procedente a denúncia, o juiz destituirá o apoiador e nomeará, ouvida a pessoa apoiada e se for de seu interesse, outra pessoa para prestação de apoio.
§ 9o A pessoa apoiada pode, a qualquer tempo, solicitar o término de acordo firmado em processo de tomada de decisão apoiada.
§ 10. O apoiador pode solicitar ao juiz a exclusão de sua participação do processo de tomada de decisão apoiada, sendo seu desligamento condicionado a? manifestação do juiz sobre a matéria.
§ 11. Aplicam-se a? tomada de decisão apoiada, no que couber, as disposiço?es referentes a? prestação de contas na curatela.
(Brasil, Código Civil, 2002, artigo 1.783-A).
Esse novo instituto criado pela Lei Brasileira de Inclusão corrobora com a nova realidade da capacidade civil, uma vez que possibilita a pessoa com deficiência de poder expressar a sua vontade, bem como reforça a sua autodeterminação, podendo ser utilizado ou não, pois é uma opção que é dada à pessoa com deficiência que, para se ter uma maior segurança no momento em que julgar necessário, poder contar com a ajuda de outras duas pessoas idôneas com as quais tenha convívio e confiança para contribuir e apoiar nas decisões a serem tomadas.
1.3 REFLEXOS DA DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DO HOMEM NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO
A Declaração Universal dos Direitos do Homem, (DUDH ou UDHR pela sigla em inglês), assinado em Paris, em 1948, constitui a mais importante conquista dos direitos humanos fundamentais em nível internacional, conforme visto anteriormente quando da origem do Estatuto da Pessoa com Deficiência. Além disso, os direitos humanos possuem gerações distintas, que são classificadas em primeira, segunda e terceira gerações, de acordo com as mutações das ideologias sociais. Conforme assegurou Bobbio:
Os direitos não nascem todos de uma vez. Nascem quando devem ou podem nascer. Nascem quando o aumento do poder do homem sobre o homem (...) ou cria novas ameaças à liberdade do indivíduo, ou permite novos remédios para as suas indigências. (BÓBBIO, 1992, p. 9).
Os direitos humanos foram, de fato, consolidados no mundo depois da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que é fruto do mundo pós 2ª guerra mundial, promulgada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) em 10 de dezembro de 1948. Esta Declaração foi assinada por 48 Estados no mundo todo, e um destes é o Brasil, que assinou o documento no mesmo dia da sua promulgação mundial. Sendo assim, os direitos humanos passaram a ser ramo autônomo do direito internacional.
A DUDH destaca em seu preâmbulo que o respeito à dignidade de todos os membros da família humana e a igualdade de seus direitos inalienáveis são o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo. Ou seja, todo e qualquer ser humano, é protegido por esses direitos.
Os reflexos da Declaração no ordenamento jurídico brasileiro teve início na Constituição Federal, onde os direitos humanos foram plenamente positivados, tantos os individuais, como os difusos e coletivos na parte relativa aos direitos e garantias fundamentais, trazendo, também, diversos remédios constitucionais para garantir a eficácia desses direitos. Entre esses direitos, previstos em sua maioria no art. 5º da CF/88 estão: vida, liberdade, propriedade, educação, presunção de inocência, igualdade, liberdade de pensamento, proibição a escravidão, vedação a tortura, segurança, nacionalidade, entre outros.
Conforme a classificação de Kelsen em sua obra “Teoria pura do direito”, a Constituição é a base do ordenamento jurídico, representado no formato de uma pirâmide, onde a norma hipotética fundamental é a mais superior dentre o ordenamento jurídico. Nesse sentido ele afirma que:
Quer dizer: a norma fundamental que representa o fundamento de validade de uma ordem jurídica refere-se apenas a uma Constituição que é a base de uma ordem de coerção eficaz. Somente quando a conduta real (efetiva) dos indivíduos corresponda, globalmente considerada, ao sentido subjetivo dos atos dirigidos a essa conduta é que este sentido subjetivo é reconhecido como sendo também o seu sentido objetivo, e esses atos são considerados ou interpretados como atos jurídicos. (KELSEN, 1998, p. 33).
Nessa perspectiva, a Constituição deve sempre ser levada em conta como base suprema do ordenamento jurídico, devendo ser respeitada em todos os panoramas. Assim, também foram observados os direitos trabalhistas contidos da parte de direitos sociais da Declaração, uma vez que também é previsto na Constituição Federal, e assim sendo, foi implementado no ordenamento jurídico. São direitos trabalhistas previsto naquele documento: direito ao trabalho, livre escolha de emprego, condições justas de trabalho, proteção contra o desemprego, igual remuneração por igual trabalho, remuneração justa, sindicatos, repouso, lazer, férias e jornada de trabalho limitada, entre outros.
Em relação à atuação estatal, exige-se principalmente a elaboração de normas no sentido de intervir nas relações de trabalho com a finalidade de igualar as disparidades que existem na relação de emprego, em face da opressão naturalmente causada pelo empregador, que detém, em regra, maiores condições financeiras. Assim sendo, busca-se pelo melhor tratamento a ser ofertado à pessoa com deficiência em decorrência de eventuais limitações, devendo ser oferecido os meios mais adequados para sua habilitação, bem como para sua reabilitação.
Portanto, os reflexos da Declaração Universal dos Direitos do Homem no ordenamento jurídico brasileiro está espalhado em todas as legislações, visto que estas, necessariamente, precisam estar de acordo com a Constituição Federal. Sendo assim, os reflexos percorrem o direito constitucional, direito penal, direito civil, direito do trabalho e tantos outros direitos previstos no ordenamento jurídico pátrio.
2. CAPACIDADE CIVIL
Consoante o exposto no artigo 1º do Código Civil Brasileiro de 2002 “toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. Isto quer dizer, em linhas gerais, que toda e qualquer pessoa nascida com vida, e através disto adquirir a personalidade jurídica já que é um atributo inerente a sua condição de ser humano, é capaz de direitos e obrigações, ou seja, todas as pessoas podem ser titulares de um direito, bem como podem contrair obrigações na ordem civil, bastando para tanto o requisito da capacidade, o que nada mais é do que uma aptidão que o ordenamento jurídico atribui às pessoas.
Essa capacidade é dividida em duas espécies: Capacidade de direito ou de gozo (genérica) e capacidade de fato ou exercício (medida do exercício da personalidade). A capacidade de direito ou de gozo é inerente à personalidade da pessoa humana nascida com vida e que só se perde com a morte, por isso, todas as pessoas gozam dessa espécie de capacidade. Já a capacidade de fato ou de exercício pode sofrer limitações no exercício desses direitos, uma vez que pode faltar discernimento para praticar tal ato por não possuir o elemento volitivo, gerando dessa forma uma incapacidade para praticar os atos.
Portanto, para se ter o direito e poder exercê-lo é necessário ter, respectivamente, capacidade de direito ou gozo e capacidade de fato ou exercício, para dessa forma possuir a capacidade civil plena, onde uma pessoa é detentora do direito e poderá exercê-lo sem limitações. Porém, quando se tem a capacidade de direito e não se tem a de fato ou de exercício, estaremos diante de uma incapacidade civil. A professora Maria Helena Diniz conceitua incapacidade como:
A incapacidade é a restrição legal ao exercício dos atos da vida civil, devendo ser sempre encarada estritamente, considerando-se o princípio que “a capacidade é a regra e a incapacidade a exceção”. Como toda incapacidade advém de lei, consequentemente não constituem incapacidade quaisquer limitações ao exercício dos direitos provenientes de ato jurídico inter vivos ou causa mortis. (DINIZ, 2017, p 169).
A incapacidade civil é classificada em absoluta e relativa. Na incapacidade absoluta, a pessoa está impossibilitada de exprimir a sua vontade, portanto, não tem discernimento para praticar o ato, devendo dessa forma ser representada em juízo. Já na incapacidade relativa é possível observar um certo discernimento, mesmo que reduzido, mas com autodeterminação, o que o impossibilita de exercer o direito por si só, fazendo jus à assistência de uma pessoa, o que significa ser necessário a presença do assistido e seu assistente nos atos da vida civil.
2.1 TEORIA DA INCAPACIDADE CIVIL
A teoria da incapacidade civil no ordenamento jurídico brasileiro advém da premissa de que é necessário a criação de mecanismos para a proteção de pessoas que não possuam o necessário discernimento para a prática dos atos da vida civil, notadamente ao que diz respeito ao viés patrimonialista, por faltar-lhes o necessário discernimento.
E, para isto, criou-se a figura da incapacidade absoluta onde necessita-se de representação legal e a incapacidade relativa que caracteriza-se pela necessidade de assistência, com a finalidade de realizar a proteção jurídica dos incapazes nas relações patrimoniais para que estes possam exercê-las com mais segurança os atos da vida civil. Nesse sentido, Maria Helena Diniz explana:
A incapacidade será absoluta quando houver proibição total do exercício do direito pelo incapaz, acarretando, em caso de violação do preceito, a nulidade do ato (CC, art. 166, I). Logo, os absolutamente incapazes têm direitos, porém não poderão exercê-los direta ou pessoalmente, devendo ser representados. São absolutamente incapazes (CC, art. 3º) somente os menores de 16 anos, porque devido à idade não atingiram o necessário discernimento para distinguir o que podem ou não fazer, o que lhes é conveniente ou prejudicial. Dado seu desenvolvimento mental incompleto, carecem de auto-orientação, sendo facilmente influenciáveis por outrem. (DINIZ, 2017, p 172).
Ao nascer com vida, toda e qualquer pessoa adquire a personalidade jurídica, pois o Direito Civil brasileiro adotada a teoria natalista e, em consequência disto, torna-se sujeito capaz de adquirir direitos e contrair deveres na ordem civil. Isto quer dizer que a pessoa passa a ter capacidade de direito ou de gozo já que possui personalidade jurídica, sendo esta, condição inerente à pessoa natural, não podendo ser recusada ao indivíduo, sob pena de se negar sua qualidade de pessoa, conforme o art. 1º do CC de 2002 que expressamente diz “Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil”. Nesse sentido, Maria Helena Diniz conceitua:
Aos que assim são tratados por lei, o direito denomina “incapazes”. Logo, a capacidade de fato ou de exercício é a aptidão de exercer por si só os atos da vida civil dependendo, portanto, do discernimento que é critério, prudência, juízo, tino, inteligência, e, sob o prisma jurídico, a aptidão que tem a pessoa de distinguir o lícito do ilícito, o conveniente do prejudicial. (DINIZ, 2017, p 169).
Porém, esta capacidade pode sofrer restrições ou limitações legais no intuito de proteger a pessoa no que diz respeito ao modo de como exercer a sua capacidade, isto é, há uma delimitação na sua capacidade de fato ou de exercício, ou capacidade stricto senso, seja por limitações orgânicas como a idade (menoridade ou maioridade) ou por limitações acerca da manifestação da vontade, por falta de ação volitiva. Nesse sentido, o doutrinador Flávio Tartuce leciona:
Toda pessoa tem capacidade de direito, mas não necessariamente a capacidade de fato, pois pode lhe faltar a consciência sã para o exercício dos atos de natureza privada. Desse modo, a capacidade de direito não pode, de maneira alguma, ser negada a qualquer pessoa, podendo somente sofrer restrições quanto ao seu exercício. (TARTUCE, 2017, p 131).
Assim, quem possui os dois tipos de capacidade, de gozo e de exercício, tem a chamada capacidade civil plena, pois além de ser detentor do direito e dever na ordem civil, também poderá exercê-la sem limitações e sem o auxílio de ninguém, sendo para tanto considerada pessoa absolutamente capaz.
No direito brasileiro não existe pessoa que não possua a capacidade de gozo, pois esta é inerente à pessoa humana nascida com vida, pois ao nascer com vida adquire-se automaticamente a personalidade jurídica, assim como também é automática a obtenção da capacidade de gozo. Portanto, a incapacidade da pessoa está estritamente ligada à incapacidade de exercício, pois para esta o elemento volitivo não é considerado. Desse modo, o Código Civil classifica, em conformidade com a Lei 13.146/15, como absolutamente incapaz apenas os menores de 16 anos, utilizando para essa classificação apenas o requisito biológico da menoridade. Nesse sentido, leciona Flávio Tartuce:
Em suma, não existe mais no sistema privado brasileiro pessoa absolutamente incapaz que seja maior de idade. Ademais, como consequência, não há que se falar mais em ação de interdição absoluta no nosso sistema civil. Todas as pessoas com deficiência que eram tratadas no comando anterior passam a ser, em regra, plenamente capazes para o Direito Civil, o que visa a sua total inclusão social, em prol de sua dignidade. Valorizando-se a dignidade-liberdade, deixa-se de lado a dignidade-vulnerabilidade. (TARTUCE, 2017, p 134).
Já em relação à incapacidade relativa é possível observar um certo nível de discernimento que possibilita praticar os atos da vida civil, desde que, para tal, esteja devidamente assistido por um terceiro que acompanhará o relativamente incapaz, quer seja por parentesco ou por designação judicial. Acerca deste assunto Flávio Tartuce pondera:
Confrontada com a incapacidade absoluta, a incapacidade relativa diz respeito àqueles que podem praticar os atos da vida civil, desde que haja assistência. O efeito da violação desta norma é gerar a anulabilidade ou nulidade relativa do negócio jurídico celebrado, isso dependente de eventual iniciativa do lesado (art. 171, inc. I, do CC). Em havendo incapacidade relativa, o negócio somente será anulado se proposta ação pelo interessado no prazo de 4 (quatro) anos, contados de quando cessar a incapacidade (art. 178 do CC). (TARTUCE, 2017, p 139).
Nesse sistema de capacidade relativa há quatro situações em que será necessário o instituto da assistência da teoria das incapacidades, quais sejam: Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos; Os ébrios habituais e os viciados em tóxico; Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade; E, por fim, os pródigos.
2.2 MUDANÇAS NA CAPACIDADE CIVIL
Com o advento do Estatuto da pessoa com deficiência houve uma modificação expressiva em relação à capacidade civil, mais precisamente a capacidade de fato ou exercício que compõe a capacidade civil plena prevista no Código Civil de 2002. Tal modificação poderá ser observada nos a seguir com a antiga redação dos artigos 3º e 4º do CC:
Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil:
I - os menores de dezesseis anos;
II - os que, por enfermidade ou deficiência mental, não tiverem o necessário discernimento para a prática desses atos;
III - os que, mesmo por causa transitória, não puderem exprimir sua vontade.
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais, os viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental, tenham o discernimento reduzido;
III - os excepcionais, sem desenvolvimento mental completo;
Parágrafo único. A capacidade dos índios será regulada por legislação especial. (BRASIL. Código Civil, 2002, art. 3º e 4º, anterior a Lei 13.146/2015).
Essa antiga classificação estava conforme a teoria das incapacidades, onde pode-se observar duas distintas espécies de incapacidades, qual seja, absolutamente e relativamente. Este antigo modelo abordava as pessoas com deficiência tanto como absolutamente incapaz, bem como relativamente incapazes, consoante o grau de seu discernimento. Destarte a nova redação do Código Civil após a entrada em vigor do Estatuto se apresenta da seguinte forma para o art. 3º e 4º:
Art. 3º São absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos.
Art. 4º São incapazes, relativamente a certos atos ou à maneira de os exercer:
I - os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;
II - os ébrios habituais e os viciados em tóxico;
III - aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;
Parágrafo único. A capacidade dos indígenas será regulada por legislação especial. (BRASIL. Código Civil, 2002, art. 3º e 4º).
Contudo, é possível observar a mudança da capacidade civil em relação à incapacidade absoluta contida no art. 3º do diploma onde todos os incisos foram revogados, onde agora apenas classifica como absolutamente incapaz o menor de dezesseis anos, ou seja, foi mantida a classificação orgânica pela idade, porém foi retirada do diploma civil a possibilidade de incapacidade absoluta para aqueles que sejam maior de 16 anos e tenham limitações que retiram o poder da manifestação da vontade, isto é, não tenham o necessário discernimento para os atos da vida civil, por força do diploma normativo do Estatuto da pessoa com deficiência. Pondera o professor Pablo Stolze acerca do assunto:
Em verdade, o que o Estatuto pretendeu foi, homenageando o princípio da dignidade da pessoa humana, fazer com que a pessoa com deficiência deixasse de ser “rotulada” como incapaz, para ser considerada – em uma perspectiva constitucional isonômica – dotada de plena capacidade legal, ainda que haja a necessidade de adoc?a?o de institutos assistenciais especi?ficos, como a tomada de decisa?o apoiada e, extraordinariamente, a curatela, para a pra?tica de atos na vida civil. GAGLIANO, PAMPLONA, 2017, p 150).
Em relação à classificação dos relativamente incapazes, contido no art. 4º do CC/2002, também observa-se mudanças, porém manteve-se a espécie da classificação orgânica quanto à idade, igualmente observado na parte dos absolutamente incapazes. Mas já em relação ao critério do discernimento necessário foi completamente modificado, sendo retirado de seu texto a parte que aludia às pessoas com deficiência mental e mantida as demais classificações como a do ébrio habitual, bem como do viciado em tóxico.
Porém houve a realocação de “aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir a sua vontade” que deixaram de ser absolutamente incapazes, passando agora a classificação dos relativamente incapazes. O Estatuto da pessoa com deficiência traz expressamente em seus artigos 6º e 84, que a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, conforme a redação a seguir:
Art. 6º A deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa, inclusive para:
I - casar-se e constituir união estável;
II - exercer direitos sexuais e reprodutivos;
III - exercer o direito de decidir sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre reprodução e planejamento familiar;
IV - conservar sua fertilidade, sendo vedada a esterilização compulsória;
V - exercer o direito à família e à convivência familiar e comunitária; e
VI - exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção, como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
Art. 84. A pessoa com deficiência tem assegurado o direito ao exercício de sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas. (BRASIL, Lei 13.146, 2015, artigo 6º e 84).
Por conseguinte, através dessa modificação da capacidade civil no ordenamento jurídico brasileiro é possível concluir que as pessoas com alguma deficiência mental são consideradas agora como absolutamente capazes de exercer os atos da vida civil, não necessitando de representação e nem de assistência. Nesse mesmo sentido, o doutrinador Silvio Venosa pontua:
Pretendeu o legislador, com essas inovações, impedir que a pessoa com deficiência seja considerada e tratada como incapaz, tendo em vista os princípios constitucionais da igualdade e da dignidade humana. Todavia, têm elas sido objeto de pesadas críticas formuladas pela doutrina, pelo fato, principalmente, de desproteger aqueles que merecem proteção legal. (VENOSA, 2016, p 112).
Portanto, as mudanças trazidas pela Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência causaram uma verdadeira reconstrução jurídica no âmbito da incapacidade civil, pois segundo a nova lei, a pessoa com deficiência, isto é, aquela que tem impedimento de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, consoante o art. 2º da Lei. 13.146, e mais precisamente a que tenha deficiência mental, não deve ser mais tecnicamente considerada civilmente incapaz, tendo agora status de pessoal absolutamente capaz.
2.3 INSTITUTO DA CURATELA
Como visto anteriormente a respeito da capacidade civil, há hipóteses em que uma pessoa não poderá exercer de fato os seus direitos por ter limitações na sua capacidade de exercício, que desta feita, necessitará de representação ou assistência conforme o nível de sua incapacidade. Em alguns casos é necessário a figura de um tutor ou um curador que será responsável por aquela pessoa no que diz respeito a reger a pessoa e administrar os seus bens. Nesse sentido Paulo Lobo disserta:
O fundamento comum da tutela e da curatela e? o dever de solidariedade que se atribui ao Estado, a? sociedade e aos parentes. Ao Estado, para que regule as respectivas garantias e assegure a prestac?a?o jurisdicional. A? sociedade, pois qualquer pessoa que preencha os requisitos legais podera? ser investida pelo Judicia?rio desse mu?nus. Aos parentes, porque sa?o os primeiros a serem convocados, salvo se legalmente dispensados. (LOBO, 2009, p. 388).
Este encargo muda conforme a condição da pessoa protegida, pois no caso de ser criança ou adolescente que não esteja mais sob o poder familiar dos pais, será necessário neste caso o instituto da tutela, onde o tutor representará ou assistirá o menor conforme o caso nos atos da vida civil, necessitando também de regularização de sua guarda.
A curatela se assemelha bastante à tutela, sendo cabível a curatela nos casos em que a pessoa protegida se tratar de um maior de 18 anos que, em regra, teria capacidade civil plena, mas que por alguma limitação não consegue exercer os atos da vida civil. Flávio Tartuce pondera a respeito do tema:
Curatela é instituto de direito assistencial, para a defesa dos interesses de maiores incapazes. Assim como ocorre com a tutela, há um múnus público, atribuído pela lei. São partes da curatela o curador e o curatelado. Estão sujeitos à curatela os maiores incapazes. Como visto, não existem mais absolutamente incapazes maiores, por força das alterações que foram feitas no art. 3.º do Código Civil pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015). Sendo assim, a curatela somente incide para os maiores relativamente incapazes que, na nova redação do art. 4.º da codificação material, são os ébrios habituais (no sentido de alcoólatras), os viciados em tóxicos, as pessoas que por causa transitória ou definitiva não puderem exprimir vontade e os pródigos. Como visto, não há mais a menção às pessoas com discernimento mental reduzido e aos excepcionais, tidos agora como plenamente capazes pelo sistema. (TARTUCE, 2017. p. 1.508).
Portanto, a curatela é um encargo atribuído à pessoa natural para reger a vida e administrar os bens de uma alguém maior de 18 anos sem capacidade civil, sendo assim, a curatela é considerada um mecanismo de proteção patrimonial e negocial das pessoas incapazes, pois estas, segundo o novo Estatuto da pessoa com deficiência tem capacidade plena para casar, exercer direitos sexuais e reprodutivos, bem como os direitos de família como um todo.
As pessoas que poderão figurar como sujeitos passivos na curatela estão previstos no rol taxativo de relativamente incapazes contidos no art. 4º do Código Civil de 2002, onde figuram os ébrios habituais e viciados em tóxicos, nesse caso, por se tratar de vícios em drogas, é encarado como uma doença pela comunidade médica, sendo neste caso considerado o discernimento reduzido da pessoa relativamente incapaz por se tratar de uma doença onde a pessoa certamente tem os seus momentos de lucidez.
Também está nessa classificação de relativamente incapaz, aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade. Esta classificação recebeu e ainda recebe várias críticas de autores civilistas pois é extremamente genérica e deixa brecha para várias interpretações. Outra crítica é em relação às pessoas que se encontram em estado de coma e se enquadram nessa categoria de relativamente incapazes, devendo ser assistidos nos atos da vida civil, o que não faz muito sentido pois o seu estado de coma os deixam completamente impedidos de exprimir qualquer vontade. Nesse caso a curatela será utilizada e o magistrado deverá analisar, no caso concreto, as particularidades do curatelado conforme determinação médica.
Por fim, os pródigos que são pessoas caracterizadas por dilapidar ou dissipar seu patrimônio, gastando mais do que o necessário sem justificação, de modo a prejudicar seu próprio sustento. É considerado relativamente incapaz por se tratar de um desvio no comportamento, necessitando dessa forma de um laudo psicológico que ateste esta condição para que o juiz entenda pela aplicação ou não da medida protetiva da curatela, pois o simples fato de gastar o dinheiro não implica em uma doença, é imprescindível um laudo médico.
Nesse caso, segundo a Lei 13.146/15, a curador só atuará nas questões patrimoniais e negociais e só o privará de, sem curador, emprestar, transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, e praticar, em geral, os atos que não sejam de mera administração.
A nova redação trazida pela LBI pondera que a curatela é uma medida protetiva extraordinária quando se tornar necessária, sendo proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso e será, em regra, temporária, devendo durar o menor tempo possível. Para isto, haverá um processo de interdição onde o juiz, observando no caso concreto a incapacidade, se absoluta ou relativa, decidirá na sentença pela curatela e nomeará um curado conforme o art. 1.775 e 1.775-A do CC de 2002, com a seguinte redação:
Art. 1.775. O co?njuge ou companheiro, na?o separado judicialmente ou de fato, e?, de direito, curador do outro, quando interdito.
§ 1.o Na falta do co?njuge ou companheiro, e? curador legi?timo o pai ou a ma?e; na falta destes, o descendente que se demonstrar mais apto.
§ 2.o Entre os descendentes, os mais pro?ximos precedem aos mais remotos.
§ 3.o Na falta das pessoas mencionadas neste artigo, compete ao juiz a escolha do curador”.
Art. 1.775-A. Na nomeac?a?o de curador para a pessoa com deficie?ncia, o juiz podera? estabelecer curatela compartilhada a mais de uma pessoa. (BRASIL. Código Civil, 2002, art. 1.775 e 1.775-A).
Ainda conforme o rol de ordem preferencial de curador, o Estatuto acrescentou o art. 1.775-A ao CC/2002, onde passa a ser possível a designação de mais de um curador no processo de curatela, conforme a regra do artigo supracitado.
Outra novidade trazida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência é a legitimidade do próprio curatelado para promover a sua interdição. Porém esta nova regra encontra uma antinomia de normas, pois quando da alteração do Código Civil através da Lei 13.146/15 dando legitimidade para o próprio interdito conforme o art. 1.768, posteriormente com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil revogou esta legitimidade, já que em sua redação não é possível a própria pessoa promover a sua interdição, conforme a redação do art. 747 do CPC:
Art. 747. A interdição pode ser promovida:
I - pelo cônjuge ou companheiro;
II - pelos parentes ou tutores;
III - pelo representante da entidade em que se encontra abrigado o interditando;
Parágrafo único. A legitimidade deverá ser comprovada por documentação que acompanhe a petição inicial.
(BRASIL, Código de Processo Civil, 2015, art. 747).
Nesse ponto, com a entrada em vigor no novo Código de Processo Civil, o legislador não observou a regra trazida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, o que gerou uma contraposição de normas, uma vez que foi contrária a regra anterior e segundo a qual dava direito de o próprio curatelado poder promover a curatela, pois teria legitimidade para tal. Nesse sentindo o jurista Pablo Stolze pondera:
Ha? necessidade de se interpretar adequadamente ambos os diplomas, para se tentar amenizar os efeitos de um verdadeiro choque normativo. E a tarefa tambe?m na?o sera? fa?cil, na medida em que o CPC/2015 surge com muitos dispositivos atingidos pelo Estatuto. Damos como exemplo o dispositivo do Co?digo Civil que trata da legitimidade para promover a ac?a?o de interdic?a?o (art. 1.768), revogado pelo art. 747 do CPC/2015. O Estatuto da Pessoa com Deficie?ncia, por seu turno, ignorando a revo gac?a?o do dispositivo pelo CPC/2015 — observou FREDIE DIDIER JR. — acrescentou-lhe um novo inciso (art. 1.768, IV, CC), para permitir que a pro?pria pessoa instaure o procedimento de curatela. Certamente, a conclusa?o a se chegar e? no sentido de que o art. 747 do CPC vigorara? com este novo inciso. Sera? um intenso exerci?cio de hermene?utica que devera? ser guiado sempre pelo bom senso. (GAGLIANO, PAMPLONA, 2017, p 743).
Ainda em relação a curatela, por ter esta, em regra, um caráter temporário, poderá ser levantada a qualquer momento, isto quer dizer que o curatelado poderá deixar de ser interditado e, consequentemente, não necessite mais do instituto de proteção da curatela. Nesse caso, o próprio curatela poderá promover o pedido de levantamento de sua curatela, segundo a redação do art. 756 do CPC/15:
Art. 756. Levantar-se-á a curatela quando cessar a causa que a determinou.
§ 1o O pedido de levantamento da curatela poderá ser feito pelo interdito, pelo curador ou pelo Ministério Público e será apensado aos autos da interdição.
§ 2o O juiz nomeará perito ou equipe multidisciplinar para proceder ao exame do interdito e designará audiência de instrução e julgamento após a apresentação do laudo.
§ 3o Acolhido o pedido, o juiz decretará o levantamento da interdição e determinará a publicação da sentença, após o trânsito em julgado, na forma do art. 755, § 3o, ou, não sendo possível, na imprensa local e no órgão oficial, por 3 (três) vezes, com intervalo de 10 (dez) dias, seguindo-se a averbação no registro de pessoas naturais.
§ 4o A interdição poderá ser levantada parcialmente quando demonstrada a capacidade do interdito para praticar alguns atos da vida civil. (BRASIL, Código de Processo Civil, 2015, art. 756).
Essa redação está de acordo com o previsto na Lei 13.146/15, porém há uma polêmica em relação às pessoas que estavam interditadas através de um processo de curatela e, que, com a nova regra trazida pela Estatuto passaram a ter capacidade absoluta segundo o novo diploma legal. A problemática se dá no fato de ser ou não atribuído automaticamente a plena capacidade civil a quem esteja interditado. Nesse sendo explica Pablo Stolze:
Com efeito, a partir da entrada em vigor do Estatuto, surgiu a questa?o atinente ao levantamento das interdic?o?es ja? decretadas. Vale dizer, na medida em que o novo diploma considera a pessoa deficiente legalmente capaz, a curatela, que haja sido institui?da em seu favor, cairia automaticamente? Por o?bvio, mesmo que um procedimento de interdic?a?o — hoje melhor denominado como “procedimento de curatela” — haja sido conclui?do, o curatelado passou a ser reputado legalmente capaz, a partir da vige?ncia do novo Estatuto. O que na?o tem sentido, inclusive pela inseguranc?a juri?dica que geraria, e? a conclusa?o de que as curatelas designadas cairiam automaticamente. Algumas razo?es, ale?m da ja? mencionada necessidade de seguranc?a nas relac?o?es sociais, militam em favor desta linha de intelecc?a?o. A curatela, ainda que considerada extraordina?ria, na?o deixou de existir. Assim, sem prejui?zo de o interessado requerer o levantamento, nos termos das normas processuais, os termos de curatela ja? existentes devem ser interpretados na perspectiva do Estatuto, considerando-se o a?mbito limitado de atuac?a?o do curador, quanto a? pra?tica de atos de natureza patrimonial. Em suma, na?o se deve considerar que as curatelas ja? designadas quedar-se-iam, a partir do Estatuto, como em um “passe de ma?gica”. (GAGLIANO, Pablo Stolze/ PAMPLONA, Rodolfo filho. Novo curso de direito civil, volume 6: direto de família, 7ª.ed. Sa?o Paulo: Saraiva, 2017, p 745).
Portanto, ainda há muitos pontos que carecem de uma melhor reflexão por parte dos aplicadores do direito, mais precisamente aos magistrados que necessitaram utilizar-se das regras da hermenêutica, dos princípios gerais do direito, bem como da equidade para resolver esses problemas no caso concreto, uma vez que há pontos ainda confusos que precisam ser melhores considerados na legislação.
3. ANÁLISE DA PROBLEMÁTICA
Como já visto anteriormente, a teoria da capacidade civil sofreu uma grande transformação no ordenamento jurídico brasileiro e, mais especificamente, no Código Civil Brasileiro, onde a nova regra classifica apenas o menor de dezesseis anos como absolutamente incapaz para os atos da vida civil, observando-se portanto apenas o caráter natural biológico etário.
Nesta perspectiva, a pessoa com deficiência deixou de ser considerada absolutamente incapaz e passou a ser plenamente capaz, podendo ser, em alguns casos, relativamente incapaz nos casos em que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a sua vontade, assim como qualquer outra pessoa poderá ficar nessa situação independentemente de deficiência ou não, consoante a regra do art. 4º, inciso III do Código Civil de 2002.
Com essa mudança, ocorreram reflexos no diploma civilista, onde começou-se a atribuir vários direitos às pessoas com deficiência que, até então, não os possuía, mas agora com estes novos direitos, surgiram também as obrigações que antes não seriam exigíveis, porém daí em diante merecem uma maior atenção, em virtude de ser pessoa absolutamente capaz de direitos e obrigações na ordem civil, é imprescindível observar as normas por não deter mais determinadas proteções legais, devendo, portanto, observar os princípios gerais do direito, tal como o da legalidade e segurança jurídica.
3.1 EFEITOS DA MUDANÇA DA CAPACIDADE CIVIL
De acordo com o Estatuto, Lei 13.146/15, a deficiência não afeta a plena capacidade civil da pessoa com deficiência, sendo considerada, portanto, em regra, como pessoa plenamente capaz de direitos e obrigações na ordem civil, não sofrendo mais nenhum tipo de restrição no atos praticados, mas em alguns casos pode ser considerada pessoa relativamente incapaz, dependendo para isto de uma determinação judicial onde será nomeado um assistente. Segundo explica o doutrinador Cristiano Farias:
A leitura atenta dos arts. 3° e 4° da Codificação de 2002, com a nova redação estabelecida pela Norma Estatutária, permite extrair a existência de dois diferentes critérios determinantes da incapacidade, um deles objetivo (o critério etário) e o outro subjetivo (o critério psicológico). Quando se trata de incapacidade decorrente de critério cronológico (etário), a situação é facilmente demonstrável, porque submetida a um requisito objetivo, qual seja, a comprovação da idade da pessoa. Comprovada a idade, naturalmente, decorrem os efeitos jurídicos da incapacidade, vinculando todos os atos praticados pelo titular. No entanto, em se tratando de incapacidade (relativa) fundada em critério subjetivo (psicológico), considerando que a incapacidade é excepcional, é exigível o reconhecimento judicial da causa geradora da incapacidade, através de uma decisão judicial a ser proferida em ação específica, por meio de um procedimento especial de jurisdição voluntária. E a chamada ação de curatela - e não mais ação de interdição, para garantir o império da filosofia implantada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência. É o caso da incapacidade relativa das pessoas que, mesmo por causa transitória não puderem exprimir sua. vontade" (CC, art. 4o), cuja incapacidade precisa ser reconhecida pelo juiz. (FARIAS; CUNHA; PINTO, 2016, p. 241).
Por este motivo, a mudança na capacidade civil proporcionou um outro panorama para as pessoas com deficiência, diga-se de passagem, as deficiências de caráter mental ou psicológico, uma vez que, ao se reconhecer a plena capacidade civil, houve a revogação de tutelas e curatelas para alguns que estavam interditados, por se entender que não seria mais necessário já que, pela lei, agora são pessoas plenamente capazes. Conforme explica o professor Cristiano Farias:
A partir da nova sistemática estatutária, a pessoa com deficiência não mais se enquadra, em boa hora, nas latitudes e longitudes da teoria das incapacidades, pelo simples fato de ter uma deficiência (física, mental ou intelectual). A incapacidade, todavia, pode se caracterizar quando uma pessoa, com ou sem deficiência, não puder exprimir a sua vontade (CC, art. 4°, III). Singrando esses mares, reconhecida a incapacidade, na ação de curatela, está legitimado o Parquet ao pedido de suprimento judicial de consentimento. Atuando como órgão agente (parte autora) do pleito, não há necessidade de atuação de outro Promotor de Justiça como fiscal da ordem jurídica (custos juris). (FARIAS; CUNHA; PINTO, 2016, p. 65).
No entanto, ainda há a possibilidade de curatela, que agora tem um caráter, em regra, temporário e com limites de atuação apenas em questões patrimoniais e negociais. Também é novidade o instituto da tomada de decisão apoiada, o que é inédito em nosso ordenamento pois é a possibilidade que a pessoa com deficiência tem de eleger duas pessoas idôneas e de sua confiança para prestarem apoio nas suas decisões sobre os atos da vida civil no intuito de exercer com mais segurança a sua capacidade.
Nessa nova perspectiva houve uma mudança de paradigma baseada no princípio da dignidade da pessoa humana com a finalidade de proporcionar à pessoa com deficiência a sua inclusão social, bem como evitar os termos estigmatizados e de cunho pejorativo como “incapaz”, “deficiente” e “retardado”, sendo este último termo ainda presente no Código Penal Brasileiro.
Com essas mudanças, a pessoa com deficiência adquiriu direitos que antes não poderiam, em regra, exercer. Como, por exemplo, o direito ao casamento, o direito de poder gerar um filho ou de até mesmo adotar, bem como o direito de ser tutor ou curador de outra pessoa. Além do direito ao trabalho, voto, profissionalização, habilitação e reabilitação.
Não obstante, a pessoa com deficiência ao ser considerada plenamente capaz adquiriu também obrigações na ordem civil, e não gozam mais da proteção legal dada aos incapazes, como por exemplo a nulidade absoluta dos negócios jurídicos, podendo ser anuláveis quando a pessoa com deficiência for considerada relativamente incapaz, conforme o art. 104 do Código Civil Brasileiro por faltar capacidade ao agente, consoante a redação do artigo supracitado:
Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
II - objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III - forma prescrita ou não defesa em lei.
(BRASIL. Código Civil, 2002, art 104).
Portanto, não há mais que se falar em invalidade absoluta do negócio jurídico praticado por uma pessoa com deficiência, pois não se enquadram mais como incapazes e sim plenamente capaz ou relativamente incapaz, podendo ser ou não anuláveis, de acordo com o previsto no art. 166, inciso I, do Código Civil, conforme a sua redação:
Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;
VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção. (BRASIL. Código Civil, 2002, art. 166).
Pode parecer injusto, mas é o que está expresso na legislação e, na medida em que não são mais absolutamente incapazes, perderam a proteção dada pela lei, pois em nosso ordenamento esse rol é taxativo, uma vez que é observado o princípio da segurança jurídica na aplicação da lei ao caso concreto. Não obstante, em casos onde a pessoa com deficiência estiver interditada através de curatela e, em razão disso, se tornar relativamente incapaz, poderá ter seus atos anulados se não tiver assistência para tal. Nesse sentido, corrobora Cristiano Farias:
Os atos praticados pelo curatelado, sem a representação ou assistência do curador, serão nulos de pleno direito ou anuláveis, a depender do grau de incapacidade. Sendo absoluta: nulos; relativa, anuláveis. Considerando que a pessoa com deficiência pode ser enquadrada como relativamente incapaz quando não puder exprimir vontade, o ato por ela praticado, sem a assistência respectiva, pode ser reputado anulável, jamais nulo, independentemente do grau de sua deficiência. (FARIAS; CUNHA; PINTO, 2016, p. 315).
Uma outra mudança no panorama de direitos da pessoa com deficiência, por ter se tornado plenamente capaz ou podendo ser, no máximo, relativamente incapaz, é a observância do prazo da prescrição e da decadência, pois estes prazos não correm contra os absolutamente incapazes, mas corre contra os relativamente incapazes e plenamente capazes, sendo portanto, agora, de observância obrigatória, sob pena de perder a pretensão ou o direito, consoante a norma dos artigos 198 e 208, ambos do Código Civil que contem a seguinte redação:
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I - contra os incapazes de que trata o art. 3o;
II - contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;
III - contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.
Art. 208. Aplica-se à decadência o disposto nos arts. 195 e 198, inciso I.
(BRASIL. Código Civil, 2002, artigos 198 e 208).
Dessa forma, a pessoa com deficiência não goza mais da proteção legal aos prazos prescricionais ou decadenciais pois só poderão ser classificados como relativamente incapazes nos casos em que, por transitória ou permanente não puderem exprimir a sua vontade, sendo que não há previsão de proteção dos prazos da prescrição e decadência para os relativamente incapazes, sendo apenas protegidos os absolutamente incapazes, uma vez que não correm os prazos supracitados contra estes. Nesse sentido Cristiano Farias ensina:
A partir da fórmula do inciso I do art. 198 da Codificação de 2002, com a redação emprestada pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, somente não correm os prazos prescricionais contra os absolutamente incapazes. Contra os relativamente incapazes, os lapsos prescricionais (extintivos e aquisitivos) correm regularmente, segundo a dicção legal. Assim, contra toda e qualquer pessoa com deficiência que não puder exprimir vontade, mesmo que por uma causa definitiva (como no exemplo de uma pessoa tetraplégica), a prescrição fluirá regularmente. Essa conclusão pode se mostrar extremamente injusta e perniciosa. Sem dúvida! [...] As raízes etimológicas da expressão permitem uma tradução explicativa: contra aqueles que não podem agir, não fluem os prazos de prescrição. Buscando as raízes da teoria, nota-se que o seu fundamento é de conteúdo ético: um prazo prescricional não pode correr contra aquele que está incapacitado de agir, mesmo não havendo previsão legal para a suspensão ou interrupção do prazo. A proposição, destarte, diz respeito a uma compreensão equitativa, e não legalista, das hipóteses de suspensão e de interrupção dos prazos extintivos. (FARIAS; CUNHA; PINTO, 2016, p. 316).
Nota-se, contudo, que houve um prejuízo para as pessoas com deficiência em relação às proteção legal que não mais se aplica para estas, uma vez que a legislação tratou de forma expressa do assunto em relação a validade e nulidade dos negócios jurídicos, bem como dos prazos prescricionais e decadenciais, porém alguns doutrinadores defendem a flexibilização e a adoção da equidade para ser utilizada a proteção da suspensão ou da interrupção dos prazos para as pessoas com deficiência.
3.2 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL CIVIL DOS EFEITOS
A partir da mudança na legislação vigente no ordenamento jurídico brasileiro, o Poder Judiciário através de seus julgadores, teve a obrigação de aplicar a nova regra ao caso concreto, combinado a observância e o auxílio do Ministério Público, para fazer valer os novos direitos das pessoas com deficiência. Nesse ínterim da entrada em vigor do Estatuto da Pessoa com Deficiência, já foram emitidos diversos julgados nesse sentido de variadas cortes estaduais em todo o país.
Por se tratar de um direito novo, há ainda algumas divergências de entendimentos entre julgadores, uma vez que o próprio Estatuto deixou uma brecha para que o juiz aplicasse ao caso concreto o que fosse mais adequado, utilizando-se da equidade e da hermenêutica baseado na interpretação extensiva dada ao § 3o do artigo 84 da Lei 13.146 onde afirma “A definição de curatela de pessoa com deficiência constitui medida protetiva extraordinária, proporcional às necessidades e às circunstâncias de cada caso, e durará o menor tempo possível”.
Porém há juízes que estão aplicando a legislação tal qual se apresenta, não entrando na questão da equidade, apenas aplicando o que está expresso na lei. Isto tem se refletido nos mais diversos julgados, conforme pode se observar a seguir:
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CIVIL. INTERDIÇÃO. CURATELA INTEGRAL. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. MEDIDA EXCEPCIONAL. ATOS RELACIONADOS AOS DIREITOS DE NATUREZA PATRIMONIAL E NEGOCIAL. INCAPACIDADE RELATIVA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA.
1. As regras de incapacidade destinam a proteger a pessoa do incapaz, isto é, são para pessoas que merecem cuidados do direito para que não acabem sofrendo prejuízos em suas relações econômicas e jurídicas.
2. A incapacidade com interdição tem causas diversas da insuficiência de idade legal. E para que haja a interdição é preciso ter pelo menos uma situação descrita: a) prodigalidade; b) embriaguez habitual ou vício em tóxico; c) impedimento permanente ou temporário para a expressão da vontade.
3.Como adventoda lei 13.146/2015(Estatuto da pessoa com Deficiência), houve alterações no Código Civil trazendo grandes mudanças estruturais e funcionais na antiga teoria das incapacidades, o que repercute diretamente para institutos do Direito de Família, como o casamento, a interdição e a curatela.
4. Não mais existe pessoa absolutamente incapaz que seja maior de idade. Desse modo, não há que se falar em ação de interdição absoluta no nosso sistema civil, pois os menores não são interditados. Todas as pessoas com deficiência passam a ser, em regra, plenamente capazes para o Direito Civil, o que visa a sua plena inclusão social, em prol de sua dignidade.
5. O decreto da interdição deve ocorrer quando o interditado for considerado relativamente capaz, porquanto a assistência tem cabimento em favor dos relativamente incapazes e, diferentemente da representação, o assistente pratica o ato ou negócio jurídico em conjunto com o assistido.
6. Recurso CONHECIDO e PROVIDO. Sentença reformada.
(BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Acórdão n.1031801, 20160310153756APC, Relator: ROBSON BARBOSA DE AZEVEDO 5ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 12/07/2017, Publicado no DJE: 27/07/2017. Pág.: 313/319).
Neste Julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, é possível observar a utilização à risca da Lei 13.146/15, ou seja, a 5ª Turma Cível entendeu seguir a lei seca em sua literalidade, não analisando profundamente o perfil do interditando, apenas cumprindo o expresso da inteligência da norma. Porém, no mesmo tribunal, mas em outra turma, mais especificamente a 6ª Turma Cível, houve um entendimento totalmente diferente, conforme a Ementa:
APELAÇÃO CÍVEL. INTERDIÇÃO. CURADORIA. LIMITES DA CURATELA. INTERDIÇÃO PLENA. DEPENDÊNCIA TOTAL DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. OBSERVÂNCIA DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ABRANDAMENTO DO RIGOR DA LEGISLAÇÃO DE INCLUSÃO. SENTENÇA MANTIDA.
1. A interdição - exceção ao estado normal - refere-se à limitação individual extrema, na qual ocorre a privação do indivíduo, a priori com capacidade plena, contudo que requer restrição ao exercício de seus direitos e liberdades conferidos pela legislação.
2. Faz-se necessário o amparo e proteção ao interditando, sendo necessária a constituição da curatela para resguardar a segurança da pessoa interditada e de seus bens. Observa-se que o referido procedimento não visa apenas à proteção dos bens do curatelado, mas se mostra necessário à própria dignidade da pessoa humana que requer cuidados.
3. O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/15), no entanto, trouxe alterações importantes com relação à curatela. De acordo com o art. 84, § 1º, do referido Estatuto, é possível a interdição de pessoa capaz, dispondo que, "quando necessário, a pessoa com deficiência será submetida à curatela".
4. Nos termos do art. 85 da Lei 13.146/15, a curatela engloba apenas os aspectos patrimoniais, ou seja, os aspectos existenciais referentes à vida, sexualidade, matrimônio, educação, saúde, voto, trabalho, dentre outros, não serão afetados. Nessa nova perspectiva de tutela legal, os deficientes não mais são considerados absolutamente incapazes, e sim relativamente incapazes. Caso haja impossibilidade real e duradoura da pessoa manifestar sua vontade, será necessária a curatela.
5. Na hipótese de dependência total da pessoa com deficiência com terceiro, antes da observância da referida legislação de inclusão, torna-se indubitável a observância do fundamento-base da República Federativa do Brasil, qual seja, "a dignidade da pessoa humana".
6. Ressalte-se que não se ignora o disposto no art. 85 da Lei 13.146/15 e nem a vontade da sociedade brasileira de se realizar a inclusão das pessoas com deficiência. No entanto, especificamente para as situações em que o deficiente depende totalmente de outra pessoa, é imprescindível o abrandamento do rigor tecnicista da legislação para fazer prevalecer o fundamento primordial de todo ser que é a dignidade da pessoa humana.
7. Assim, diante do conjunto probatório, verifica-se acertada a interdição, de modo pleno, abrangendo atos de natureza pessoal em razão da falta de discernimento para a tomada de qualquer decisão, ou para os simples atos de cuidado e até de higiene pessoal, circunstância que deve ser sopesada na eventualidade de decidir-se a respeito de eventual tratamento médico ou mesmo a ingestão de medicamentos. Logo, nesse diapasão, bem se vê que a interdição não pode ficar restrita a aspectos meramente patrimoniais
8. Verifica-se acertada a interdição, de modo pleno, abrangendo atos de natureza pessoal em razão da falta de discernimento para a tomada de qualquer decisão.
8. Recurso conhecido e desprovido.
(BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios. Acórdão n.1043359, 20160310152995APC, Relator: CARLOS RODRIGUES 6ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 16/08/2017, Publicado no DJE: 05/09/2017. Pág.: 310/353).
Conforme este julgado, a 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios entendeu diferente do expresso na norma do Estatuto ao realizar uma interpretação extensiva baseada na hermenêutica e julgar utilizando-se de equidade para decidir pelo que entendeu ser o mais justo a ser aplicado no caso concreto. Os julgadores desta turma entenderam por flexibilizar a nova norma trazida pela Lei 13.146/15 para aplicar a interdição plena abrangendo não apenas as questões patrimoniais e negociais, como também os atos de natureza pessoal em razão da falta de discernimento.
Nesse caso foi observado o perfil do interditando, o qual não tinha o menor discernimento para qualquer ato, sendo imprescindível ser representado, uma vez que não consiga exercer sua autodeterminação através de assistência, e necessita de acompanhamento para todos os atos de natureza pessoal, realizando dessa forma o abrandamento da nova regra em proveito do interditando com base no princípio da dignidade da pessoa humana, pois não lhe seria exigível ser assistido em atos apenas patrimoniais e negociais.
Outro julgado que decidiu no mesmo sentido de ser necessário a representação do interditando que não possuía discernimento para participar do ato juntamente com seu assistente, pois não poderia acompanhá-lo e nem tomar decisões em conjunto, foi o entendimento dos julgadores da Terceira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, consoante a ementa a seguir:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INTERDIÇÃO. ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA (LEI Nº 13.146/2015). NOVOS CONCEITOS SOBRE CAPACIDADE CIVIL. FIM DA INCAPACIDADE ABSOLUTA DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA. A pessoa com deficiência física, mental, intelectual ou sensorial tem reconhecida sua plena capacidade de autodeterminação. A deficiência, por si só, não pode ser entendida como causa que interfira no discernimento da pessoa. Quando não puder exprimir a sua vontade, por causa transitória ou permanente, a pessoa é considerada relativamente incapaz (art.4º, III, Código Civil) e está sujeita à curatela (art.1.767, I, Código Civil). A depender do desenvolvimento mental do interdito e suas características pessoais, a pessoa em situação de curatela será representada ou assistida em determinados atos da vida civil, podendo, inclusive, praticar alguns autonomamente. A nomeação de curador é medida protetiva excepcional, restrita aos atos de natureza patrimonial e negocial (arts.84 e 85, da Lei nº 13.146/2015). A interditanda está com 95 anos de idade e sofre com o mal de Alzheimer. Tem seu discernimento completamente comprometido, em razão da insanidade permanente e irreversível. Tendo em vista que seu estado psíquico não lhe permite praticar atos de disposição em conjunto com a curadora (sua filha), é recomendável que esta a represente nos atos de natureza patrimonial e negocial. PROVIMENTO DO RECURSO. (BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro. APELAÇÃO CÍVEL 0004362-34.2014.8.19.0007; Relator: Peterson Barroso Simão: Terceira Câmara Cível; Julgamento: 20/09/2017).
Por outro lado, a 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo teve um entendimento bem diferente no julgado a seguir onde o próprio Ministério Público pretendia a declaração de incapacidade para a prática de todos os atos da vida civil, não apenas os atos patrimoniais e negociais. Diante disto, a 9ª Câmara Cível entendeu que deveria ser aplicada a lei tal como se apresentar por não ter sido declarada inconstitucional, conforme a Ementa a seguir:
AÇÃO DE INTERDIÇÃO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECONHECIDA A INCAPACIDADE DO INTERDITADO DE PRATICAR ATOS DE NATUREZA PATRIMONIAL E NEGOCIAL SEM O CURADOR. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO, QUE PRETENDE A DECLARAÇÃO DE INCAPACIDADE PARA A PRÁTICA DE TODOS OS ATOS DA VIDA CIVIL. PARCIAL PROVIMENTO. AUSÊNCIA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ESTATUTO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA. PORÉM, DIANTE DA SITUAÇÃO ESPECÍFICA DO INTERDITADO, DEVE SER DETERMINADO O ACOMPANHAMENTO, PELO CURADOR, NOS ATOS NECESSÁRIOS À MANUTENÇÃO DO INTERDITADO, COMO CONTRATAÇÕES MÉDICAS, AUTORIZAÇÃO DE PROCEDIMENTOS, ETC. INCAPACIDADE PARA EXPRIMIR VONTADE. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
(BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Apelação 1003461-42.2016.8.26.0344; Relator (a): Alexandre Lazzarini; Órgão Julgador: 9ª Câmara de Direito Privado; Foro de Marília - 2ª Vara de Família e Sucessões; Data do Julgamento: 25/07/2017; Data de Registro: 25/07/2017).
Destarte, é possível observar a discrepância de julgados sobre a mesma matéria, onde em alguns Tribunais os seus julgadores realizam um julgamento mais justo baseado na equidade, na interpretação sistêmica, na hermenêutica e no princípio da dignidade da pessoa humana no que se assemelha à dignidade-vulnerabilidade. Ao passo em que em outros julgados, seja do mesmo tribunal ou de outros tribunais estaduais, fica evidenciado o cumprimento da lei na estrita legalidade apresentada pela norma, sem analisar o perfil da pessoa e suas características, sendo aplicado ao caso concreto a lei como se apresenta.
3.3 POSIÇÃO DA DOUTRINA ACERCA DA TEMÁTICA
Após a entrada em vigor da Estatuto da Pessoa com Deficiência, Lei 13.146 de 2015, e, consequentemente, após as modificações no Código Civil Brasileiro, diversos doutrinadores civilista se posicionaram a respeito da nova regra trazida pela Lei Brasileira de Inclusão. Nesse sentido, Flávio Tartuce classificou os posicionamentos doutrinários em duas correntes, onde uma condena as modificações com base no princípio da dignidade-vulnerabilidade, e a outra defende e aplaude as inovações do Estatuto conforme o princípio da dignidade-liberdade. É o que Flávio Tartuce afirma:
Em suma, houve uma verdadeira revolução na teoria das incapacidades, o que repercute diretamente para os institutos de direito assistencial, em especial para a curatela. Percebemos, pela leitura de textos publicados na internet em 2015, que duas correntes se formaram a respeito da norma. A primeira – à qual estão filiados José Fernando Simão e Vitor Kümpel – condena as modificações, pois a dignidade de tais pessoas deveria ser resguardada por meio de sua proteção como vulneráveis (dignidade-vulnerabilidade). A segunda vertente – liderada por Joyceane Bezerra, Paulo Lôbo, Nelson Rosenvald, Jones Figueirêdo Alves, Rodrigo da Cunha Pereira e Pablo Stolze – aplaude a inovação, pela tutela da dignidade-liberdade das pessoas com deficiência, evidenciada pelos objetivos de sua inclusão. (TARTUCE, 2017, p. 1493).
Assim, ao fazer essa classificação e após muito estudo e reflexão, o professor Flávio Tartuce afirma ser a favor das inovações, seguindo a corrente que defende o Estatuto com base na dignidade-liberdade, porém ressalta “que somente o tempo e a prática poderão demostrar se o melhor caminho é mesmo a dignidade-liberdade, em vez da anterior dignidade-vulnerabilidade” (TARTUCE, 2017, p 1493).
Tartuce defende ainda que precisa ser feito alguns ajustes na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, onde, inclusive, manifestou um parecer favorável ao Projeto de Lei 757/2015 do Senado Federal de autoria dos senadores Antônio Carlos Valadares e Paulo Paim, que pretende dispor sobre a igualdade civil e o apoio às pessoas sem pleno discernimento ou que não puderem exprimir sua vontade.
Este projeto de lei também pretende dispor sobre os limites da curatela, os efeitos e o procedimento da tomada de decisão apoiada para não vincular automaticamente a condição de pessoa com deficiência a qualquer presunção de incapacidade, mas garantindo que qualquer pessoa com ou sem deficiência tenha o apoio de que necessite para os atos da vida civil. Conforme Flávio Tartuce explana:
Reafirme-se, para fins didáticos, quanto aos absolutamente incapazes, passaram a ser apenas os menores de 16 anos, não havendo mais menção aos enfermos e deficientes mentais sem discernimento para a prática dos atos da vida civil (antigo inciso II do art. 3.º do Código Civil). Além disso, as pessoas que por causa transitória ou definitiva não puderem exprimir vontade deixaram de compor o inciso III do art. 3.º, e agora constam do art. 4.º, III, como relativamente incapazes. Em suma, não existem mais pessoas maiores que são incapazes. Pontue-se que o Projeto de Lei 757/2015 pretende retomar a regra a respeito de pessoas absolutamente incapazes que não têm qualquer condição de exprimir vontade, sem que isso tenha relação com a deficiência, o que tem o apoio deste autor. Cite-se, a título de exemplo, a pessoa que se encontra em coma profundo. (TARTUCE, 2017, p. 1492).
Outro doutrinador que também está alinhado ao mesmo pensamento do princípio da dignidade-liberdade é o professor e jurista Pablo Stolze Gagliano, porém também teceu algumas críticas e considerações que achou necessário ao analisar a fundo a temática, apontado uma brecha autofágica e que o legislador não soube onde situar a norma ao se tratar como relativamente incapaz aquele que não puder exprimir a sua vontade e fez as seguintes pontuações em um de seus artigos públicos na rede mundial de computadores:
Por óbvio, tais pessoas estão absolutamente impedidas de manifestar vontade, não havendo sentido algum em considerá-las “relativamente incapazes”, como pretende o inc. III do art. 4º do CC, alterado pelo Estatuto. Menos sentido ainda há - sob pena de inversão da lógica de todo o sistema inaugurado - em se imaginar haver, nesta hipótese de incapacidade relativa, uma “brecha” para que as pessoas com deficiência ainda fossem consideradas incapazes. E pior: uma brecha inconstitucional e autofágica, pois, além de ferir mortalmente a Convenção de Nova York, teria o condão de desmantelar a pedra fundamental do próprio Estatuto, que, com isso, destruiria a si mesmo. O cenário desenhado seria absurdo: desrespeitando-se flagrantemente o comando constitucional do art. 12 da Convenção e, ainda, em rota de colisão com os arts. 6º e 84 do Estatuto, as pessoas com deficiência, a despeito de contempladas com um novo conceito de capacidade legal, caso não pudessem exprimir vontade, seriam reputadas “relativamente incapazes”. Surreal. Houve, sem dúvida, um “erro topográfico”, na localização do texto do inc. III do art. 4º do Código Civil. E é papel do intérprete corrigi-lo, e não amplificá-lo. Fica o convite à reflexão. (GAGLIANO, 2016, p 6).
Em outra oportunidade, Pablo Stolze reconhece a grandiosidade da nova lei que tratou a pessoa com deficiência de forma mais humana e igualitária em busca de mais inclusão social e cidadania, e teceu muitos comentários em uma de suas obras em conjunto com o doutrinador Rodolfo Pamplona Filho onde entende que é:
Verdadeira reconstrução valorativa na tradicional tessitura do sistema juri?dico brasileiro da incapacidade civil. Mas o grande desafio e? a mudanc?a de mentalidade, na perspectiva de respeito a? dimensa?o existencial do outro. Mais do que leis, “precisamos mudar mentes e corac?o?es. (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2017, p. 152).
Silvio de Salvo Venosa, um dos grandes doutrinadores clássicos civilistas, tratou do assunto em sua obra mais atual de Direito Civil, porém preferiu não analisar mais profundamente questão, fazendo algumas constatações sobre a nova modificação na capacidade civil trazidas peça mais recente diploma legal, pontuou que “Há possibilidade de questões complexas que podem advir dessa avaliação de incapacidade, mormente no tocante à validade dos negócios jurídicos.” (VENOSA, 2017, p. 137).
O doutrinador e professor José Fernando Simão faz parte da corrente da dignidade-vulnerabilidade onde condena-se as modificações advinda do novo Estatuto, apesar de aplaudir a iniciativa, porém entende que a pessoa com deficiência deve ser protegida por ser vulnerável, e afirma causar perplexidade e preocupação na comunidade dos estudiosos civilistas. Nesse sentido, Fernando Simão faz as seguintes afirmações em seu artigo publicado na internet:
Assim indago: qual o efeito prático da mudança proposta pelo Estatuto? Esse descompasso entre a realidade e a lei será catastrófico. Com a vigência do Estatuto, tais pessoas ficam abandonadas à própria sorte, pois não podem exprimir sua vontade e não poderão ser representadas, pois são capazes por ficção legal. Como praticarão os atos da vida civil se não conseguem fazê-lo pessoalmente? A situação imposta pelo Estatuto às pessoas que necessitam de proteção é dramática. Trouxe, nesse aspecto, o Estatuto alguma vantagem aos deficientes? A mim, parece que nenhuma. Contudo, nas notas conclusiva, propomos uma solução para a questão. (SIMÃO, 2015).
Já na opinião dos doutrinadores Cristiano Farias de Farias, Rogério Sanchez Cunha e Ronaldo Batista Pinto, em sua obra Estatuto da Pessoa com Deficiência Comentado, os autores fizeram uma reflexão mais aprofundada sobre o assunto em tela ao escreverem um livro comentando sobre a Lei Brasileira de Inclusão e fizerem a seguinte constatação:
Com tais percepções, cuidadosas e inexoráveis, concluímos que o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência somente contribui para um sistema jurídico mais justo e mais solidário. Refletindo, dá para relembrar a ideia de interregnum, ou seja, de um l tempo que serve para concatenar a mudança de diferentes valores sociais (...)Vivenciamos o momento de interregno, na mais pura acepção romanista da palavra: é um período de transição entre uma concepção patrimonialista, pela qual a pessoa com deficiência era vista como incapaz, um fardo social, repartido entre família e Estado; e um novo tempo, no qual há uma verdadeira emancipação de direitos existenciais das pessoas com deficiência. Direitos, não favores. Afirmamos, assim, sem hesitações, que o Estatuto da Pessoa com Deficiência é norma em construção, não apenas imposta, ou sugerida. Altera a lógica de um sistema, inaugura urna nova forma de tratar o procedimento em juízo-para reconhecimento de eventual incapacidade de alguém. Corajoso, harmônico e responsável, o Estatuto da Pessoa com Deficiência inaugura um novo tempo em que, apesar dos perigos, estamos atentos, estamos mais vivos, pra sobreviver, pra sobreviver. (FARIAS, CUNHA, PINTO, 2017, p. 241).
O fato de os autores supracitados terem escrito uma obra comentando a lei, certamente tenha os deixados mais inteirados em relação ao assunto pois foi necessário uma maior pesquisa para embasar a sua obra. E conforme os outros doutrinadores que seguem a linha da corrente dignidade-liberdade, os autores reconhecem a importância do Estatuto, mas também constatam que há alguns problemas já relatados aqui quando da opinião de Flavio Tartuce e Pablo Stolze. Mas no quesito reconhecimento, os autores foram mais enfáticos e constatam a mudança de paradigma onde não se trata apenas de uma questão patrimonialista, mas sim de um reconhecimento dos direitos das Pessoas com Deficiência que agora possuem mais liberdade.
Em linhas gerais, apesar de separado em duas correntes segundo a classificação do professor Flávio Tartuce, é possível observar que ambas as correntes reconhecem ter sido um grande avanço a nova Lei Brasileira de Inclusão, bem como apontam problemas na nova norma. O que é mais distinto nas opiniões é o fato do tamanho da extensão dos problemas, onde uns acreditam poder utilizar-se de hermenêutica e equidade para supri-los, e outros que analisam mais friamente a matéria, defendo de modo mais legalista e fazendo pesadas críticas dessa nova realidade e mudança de paradigma.
CONCLUSÃO
Com a promulgação em 06 de julho de 2015 da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, denominada Estatuto da Pessoa com Deficiência, e sua entrada em vigor em 04 de janeiro de 2016, no intuito de cumprir as normas da Declaração Universal dos Direitos Humanos ratificados pelo Brasil no ano de 2009, processou-se alterações de cunho relevantes no ordenamento jurídico brasileiro, com alterações e revogações de alguns artigos do Código Civil Brasileiro.
Essas modificações na legislação civilista, mais precisamente, as mudanças estruturais e funcionais em relação à teoria da incapacidade civil prevista na norma, afetou diretamente alguns dos institutos do Direito Civil, como exemplos: a interdição, a curatela, o casamento, os direitos à reprodução e o novo instituto da tomada de decisão apoiada. Dessa forma, o Estatuto da Pessoa com Deficiência foi assertivo na mudança da capacidade civil?
Além das modificações, houve também problemas que causaram uma antinomia gerada pelo Estatuto em descompasso com o Novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor logo após a vigência do Estatuto, e que revogou alguns incisos do Código Civil em relação à legitimidade para pedir a curatela, que, pela regra do Estatuto a própria pessoa teria legitimidade para propor a sua curatela. No entanto, ao entrar em vigor o novo CPC, este revogou a nova regra da legitimidade que havia sido estabelecida pelo Estatuto da Pessoa com Deficiência, criando assim uma antinomia, ou seja, uma contradição das normas.
Nessa esteira, através dos novos panoramas apresentados pelo novo Estatuto, a pessoa com deficiência intelectual ou mental deixou de ser considerada incapaz e passou a ter capacidade plena, sendo dotada de capacidade de fato e capacidade de direito. Esta nova realidade trouxe consigo algumas divergências doutrinárias e jurisprudenciais, criando opiniões contrárias que se dividiram em duas correntes, uma à favor da liberdade e independência com fulcro no binômio dignidade-liberdade, e outra contra a liberdade por entender que foi suprimida a proteção das pessoas tidas como vulneráveis, em consonância com o binômio dignidade-vulnerabilidade.
Ao analisar todas essas mudanças estruturais e funcionais, o presente trabalho procurou responder se, de fato, o novel Estatuto da Pessoa com Deficiência foi assertivo na alteração da capacidade civil? Como hipótese para a pesquisa realizada, adotou-se a ideia de que o Estatuto da pessoa com deficiência ao modificar a capacidade civil trouxe consigo a liberdade, mas também prejuízos ao suprimir algumas proteções.
Dessa forma, ao fazer essa análise do Estatuto da Pessoa com Deficiência e seus reflexos na capacidade civil, procurou-se, antes de tudo, analisar no primeiro capítulo a origem do Estatuto, que teve como ponto de partida a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, ratificada pelo Brasil em 2009 com status de emenda constitucional. Após isso, examinou-se as modificações no Código Civil Brasileiro de 2002 com a entrada em vigor do novel Estatuto. Posteriormente observou os reflexos da Declaração Universal dos Direitos do Homem no ordenamento jurídico brasileiro, estando refletido desde o direito constitucional até o direito penal, civil, trabalhista e em tantos outros.
Em seguida, no segundo capítulo, foi analisado pormenorizadamente o instituto da capacidade civil, bem como explorando a teoria da incapacidade civil e suas proteções legais aos incapazes. Além disso, verificou-se as mudanças ocorridas na capacidade civil que gerou uma verdadeira reconstrução jurídica no âmbito da incapacidade civil, onde a pessoa com deficiência não é mais tecnicamente considerada incapaz. Em decorrência disso, foi imprescindível uma análise do instituto da curatela e como este agora passa a operar no direito em face da nova realidade, necessitando de muita interpretação e utilização da hermenêutica para resolver os problemas no caso concreto.
Posteriormente, no terceiro capítulo deste trabalho, operou-se uma análise da problemática da nova perspectiva e dos efeitos da mudança na capacidade civil, onde foi possível observar a mitigação da proteção legal. Após isso, passou-se a análise jurisprudencial civil dos efeitos, que refletiu uma discrepância de entendimentos e julgados sobre a mesma matéria. Por fim, averiguou-se qual a posição da doutrina acerca da temática, momento em que foi possível constatar duas correntes, uma a favor e outra contra as mudanças da capacidade civil, tendo em vista o binômio da dignidade-liberdade e dignidade-vulnerabilidade, respectivamente.
A metodologia utilizada neste trabalho foi a pesquisa bibliográfica de livros e artigos científicos publicados na internet sobre o tema, bem como as decisões jurisprudências. O viés metodológico foi o exploratório e a pesquisa foi de caráter qualitativa. Esta metodologia empregada foi eficaz na produção deste trabalho, apesar de ainda possuir poucas obras sobre o tema, foi possível concluir as indagações desta monografia.
A pesquisa foi conclusiva no sentido de que o Estatuto da Pessoa com Deficiência foi, indubitavelmente, um grande avanço na inclusão social das pessoas com deficiência, onde se operou uma mudança de paradigma, em que não se trata mais apenas de uma questão tão somente patrimonialista, mas sim de um reconhecimento de direitos pessoais e de mais liberdade, com a finalidade de proporcionar uma autodeterminação.
Porém, a pesquisa constatou prejuízos no sentido de que, ao suprimir as hipóteses de incapacidade absoluta, o Estatuto retirou a proteção dada a toda e qualquer pessoa que se encontrasse impossibilitada de exprimir a sua vontade, seja por causa transitória ou permanente, independente de deficiência.
Por esse motivo, ainda há pontos a serem ajustados pelo legislador, no sentido de prever uma hipótese de incapacidade absoluta para as pessoas que não tenham qualquer condição de exprimir a sua vontade, independente de deficiência ou não, nos casos em que não se pode manifestar a vontade, como o de pessoas que estejam em estado de coma profundo, pois não seria exigível que estas fossem apenas assistidas, necessitando dessa forma que o Código Civil preveja mais uma possibilidade de incapacidade civil absoluta além daquela do menor de 16 anos, onde leva-se em consideração apenas o caráter etário.
Também é necessário ajuste nos casos em que a impossibilidade de manifestação da vontade se operar por intermédio de deficiência grave em que a pessoa for acometida e que seja imprescindível uma interdição plena incluindo os atos de natureza pessoal, além das questões patrimoniais e negociais, conforme o perfil do curatelado, por não poder exercer sua autodeterminação frente a falta de qualquer discernimento, e não ser exigível que este seja apenas assistido, uma vez que não possua consciência para participar do ato juntamente de seu assistente, ficando a cargo do legislador incluir no rol das pessoas que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a sua vontade, independente de deficiência, sem caráter discriminatório.
Portanto, o Estatuto operou uma grande mudança paradigmática em nosso ordenamento jurídico brasileiro ao promover a autodeterminação das pessoas com deficiência e concretizar a inclusão social baseado no princípio da dignidade da pessoa humana.
Contudo, pesar disso, houve prejuízos na classificação de relativamente incapaz das pessoas que por causa transitória ou permanente não puderem exprimir a sua vontade, independente de deficiência. E da falta de possibilidade de, em casos extremamente graves de deficiência, não poder realizar a curatela plena que inclua além dos atos patrimoniais e negociais, também os atos de natureza pessoal.
Como solução para esta pesquisa, já existe uma projeto de lei para tratar de alguns ajustes no Estatuto da Pessoa com Deficiência, que é o projeto nº 757/2015 de autoria dos Senadores Paulo Paim e Antônio Carlos Valadares, que está em tramitação perante o Senado Federal e que, inclusive, conta com a concordância favoravelmente de estudiosos civilistas, como é o caso do doutrinador Flávio Tartuce. Este projeto de lei vai ajustar especificamente os pontos supracitados, para que não se opere mais nenhum prejuízo e que as novas regas se consolide definitivamente no ordenamento jurídico brasileiro, bem como na mentalidade da sociedade para que respeite efetivamente os direitos das pessoas com deficiência e que se tenha uma palpável inclusão social e cidadania acertada.
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Advogada formada em Direito pelo Centro Universitário UNIEURO, Especialista em Direito Civil e Direito Administrativo pela Faculdade Cidade Verde. Geógrafa formada pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte.<br><br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARNEIRO, Luciana Vieira. O Estatuto da pessoa com deficiência e seus reflexos na capacidade civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 ago 2018, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52101/o-estatuto-da-pessoa-com-deficiencia-e-seus-reflexos-na-capacidade-civil. Acesso em: 21 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
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