BERNARDO SILVA SEIXAS
(Orientador)
RESUMO: Sabe-se que o pagamento de pensão alimentícia é um dever absoluto e incontroverso imposto aos pais enquanto os filhos são menores de idade, no qual se extingue com a maioridade. No entanto, mesmo com a cessação da menor idade, o filho pode permanecer com seu direito aos alimentos, baseando-se então, no vínculo de parentesco, como visto no artigo 1.694 do Código Civil, instituindo assim que a família é a base da sociedade, portanto merecendo proteção do Estado. Observando o artigo 1.635, III, do Código Civil, a obrigação pode persistir se comprovado que os filhos não têm condições de se sustentar. Assim, fundamenta-se no princípio do binômio necessidade-possibilidade, para que seja definido o direito a prestação alimentar na medida da necessidade do alimentado e possibilidade do alimentante. Visto que a legislação atual não estipulou prazo final para a obrigação do pai de prestar alimentos para filhos maiores, surgem divergências tanto jurisprudenciais quanto doutrinarias a respeito. A elaboração do artigo utilizou o método analítico descritivo, através da técnica de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial. Ademais, conclui-se que os maiores tendem a ter seus pedidos deferidos desde que este o prove necessário ou que sirva para sua formação em nível superior.
Palavras-chave: Ação de alimentos; Filhos Maiores; Binômio Necessidade/Possibilidade;
ABSTRACT: In this sense, it’s known that the payment of child supportis a indisputable obligation imposed to the parents while the children are underage and extinguishes with the legal age. However, even with the cessation of the minor age, the son can keep his right to the alimony, based on the kindship bond, as seen on the article 1.694 of the civil code, establishing the Family as the basis of the Society, thefore deserves state protection. In the light of the article 1.635, III, of the civil code, the obligation can persist IF proven that the children can not provide for themselves. Therefore, is based on the principle of the binomial necessity-possibility, to define the right of alimony by the necessity of the child and to the possibility of the provider. Given that in the current legislation there is no final date for the father to fulfill his alimony obligations with his over age child, differences about the subject matter arise both in jurisprudence and in doctrine. The elaboration of the article used the descriptive analytical method, through the technique of bibliographic and jurisprudential research. Conclude that the major can adopt their deferred requests, as long as it is necessary or suitable for their trainig at the higher
Keywords: Alimony; LargerChildren; Necessity / Possibility Binomial;
INTRODUÇÃO
O presente artigo busca analisar, entre as várias situações do Código Civil, no âmbito da família, a propositura de solicitação de alimentos para filhos que atingiram a maioridade civil e possuem capacidade plena. Sabe-se que o pagamento de pensão alimentícia é um dever incontestável imposto aos pais enquanto os filhos são menores de idade. Com o nascimento da prole, surge o poder familiar, o qual se extingue com a maioridade.
No entanto, após a maioridade completa surgem abundantes questionamentos quanto ao dever dos pais de continuar sustentando os seus filhos. Entende-se que essa obrigação deve permanecer até a formação da prole no ensino superior. O indivíduo, assim desenvolvido, deve buscar por si só a conservação de sua vida com os recursos obtidos de seu próprio esforço. Entretanto, algumas circunstâncias, sejam elas momentâneas ou permanentes, como por exemplo, doenças, inabilitação para o trabalho ou incapacidade de qualquer outra espécie, colocam o adulto diante de uma situação em que não consegue suprir a sua vida. É a partir desse princípio que surge precisamente a obrigação alimentar, que traz a necessidade de proteção do adulto, em razão de circunstâncias excepcionais, transformando o dever moral de assistência em obrigação jurídica de alimentos.
Dessa forma, o dever de solidariedade claramente definido que dá nascimento a uma obrigação alimentar tem, no agrupamento família, o local em que ocorre expressivamente esta solidariedade, pois os membros de uma mesma família são unidos por vínculos de afeição e de interesses particularmente fortes. Neste sentido, a obrigação alimentar é uma característica da família moderna, pois decorre de uma manifestação de solidariedade econômica existente entre dois membros de um mesmo grupo.
Ocorre que, a legislação vigente não determina claramente o termo final da obrigação de pagar os alimentos, o que leva a doutrina e jurisprudência a tentar resolverem esse impasse.
No direito, a concepção de alimentos é bem extensa, onde a palavra não significa somente alimentos propriamente ditos, mas também qualquer necessidade básica que o ser humano possui para viver em sociedade.
De acordo com Cahali, (1993, p.13):
Adotada no direito para designar o conteúdo de uma pretensão ou de uma obrigação, a palavra “alimentos” vem a significar tudo que é necessário para satisfazer aos reclames da vida, são as prestações com as quais podem ser satisfeitas as necessidades vitais de quem não pode provê-las por si; mais amplamente, é a contribuição periódica assegurada a alguém, por um título de direito, para exigir para de outrem, como necessário à sua manutenção.
Os alimentos, na linguagem jurídica, possuem significado bem mais amplo do que o sentido comum, compreendendo, além da alimentação, também o que for necessário para moradia, vestuário, assistência médica e instrução. Os alimentos, assim, traduzem-se em prestações recorrentes fornecidas a alguém para suprir essas necessidades e assegurar sua subsistência.
A Constituição Federal/88, em seu artigo 227, destaca que “é dever da família assegurar à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação entre outros”.
Yussef Said Cahali (2002, p.16) diz que alimentos são as "prestações devidas, feitas para quem as recebe possa subsistir, isto é, manter sua existência, realizar o direito à vida, tanto física (sustento do corpo) como intelectual e moral (cultivo e educação do espírito, do ser racional)".
Assim sendo, o bem jurídico tutelado ao se falar em alimentos se dispõe a própria vida do alimentado, vida a qual deve ser conferida a dignidade prevista constitucionalmente.
De acordo com Rodrigo da Cunha Pereira (1997, p.3):
“Em consonância com as diretrizes constitucionais que determinam a prevalência de uma vida digna à pessoa humana, os alimentos se consubstanciam em um instituto de direito de família que visa dar suporte material a quem não tem meios de arcar com a própria subsistência. Relaciona-se não apenas ao direito à vida e à integridade física da pessoa, mas, principalmente, à realização da Dignidade Humana, proporcionando ao necessitado condições materiais de manter sua existência. Seu conteúdo está expressamente atrelado à tutela da pessoa e à satisfação de suas necessidades fundamentais.”
É também fundamento do dever de alimentos o princípio constitucional da solidariedade, este fixado no artigo 3º, I e III.
A fundamentação do dever de alimentos se encontra principalmente no princípio da solidariedade, ou seja, a fonte da obrigação alimentar são os laços de parentais que ligam as pessoas que constituem uma família, independentemente de
No que tange à natureza jurídica do direito à prestação de alimentos, podem ser definidos como sendo naturais, cíveis e compensatórios.
1.1 NATUREZA DOS ALIMENTOS
No tocante da natureza jurídica dos alimentos naturais, de acordo com o artigo 1.694 do Código Civil (BRASIL) “podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”.
Portanto, subentendem-se alimentos naturais consistem em prestações que suprem as necessidades primárias do indivíduo, como educação, vestimenta, saúde, moradia e tudo aquilo que é necessário para a manutenção da vida, preservando a mesma condição social do alimentante. Podem ser chamados também de alimentos necessários.
Já os alimentos cíveis tratam da manutenção da condição social e status da família, ou seja, a condição anterior da pessoa. Estes podem ser chamados de alimentos côngruos, isto é, convenientes a que incluem os meios suficientes para a satisfação de todas as outras necessidades básica do alimentando, segundo a possibilidade do alimentante. Abrangem também outras necessidades intelectuais e morais, como o laser e a educação. Neste sentido à natureza jurídica, convém ressaltar o § 2 do artigo 1.694 que dispõe que “os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia”. Sendo assim, se por inércia do credor dos alimentos, estes devem ser fixados buscando eliminar a finalidade estímulo a ociosidade.
Os alimentos compensatórios são a prestação pecuniária devida por um dos cônjuges a outro, na ocorrência de ruptura do vínculo de casamento ou da união estável, visando restabelecer o equilíbrio financeiro que vigorava antes da referida ruptura, quando há regime de separação total de bens estipulado no artigo 1.687 do Código Civil Brasileiro de 2002, este diz que “Estipulada à separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real”.
Deve-se frisar que o pagamento dos alimentos, não deriva da intenção em estimular a inércia do alimentando, visto que a obrigação alimentar é uma tentativa de proteger aquele que por motivos diversos, sendo estes físicos ou psíquicos, não possui a capacidade se manter pelo seu próprio sustento. Assim, o direito dos alimentos tem como atributo garantir o mínimo existencial.
2. PODER DE FAMÍLIA E A OBRIGAÇÃO ALIMENTAR
Os alimentos servem para atender as necessidades de sobrevivência e engloba tudo o que é necessário para que a pessoa viva com dignidade. No Direito de Família, a obrigação alimentar deriva do poder familiar, do vínculo de parentesco e da dissolução do casamento ou da união estável.
Segundo a Constituição Federal (artigo 229), “os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”. (BRASIL, 1988)
Estes têm obrigação de garantir aos filhos condições para um desenvolvimento apropriado em todos os níveis, criando os filhos menores, educando-os e auxiliando-os no que for preciso. A obrigação dos pais decorre do poder familiar, compete-lhes o dever de sustento dos filhos menores. Cessado o poder familiar, pela maioridade ou emancipação, termina o ciclo do dever de sustento e começa o vínculo da obrigação alimentar, cuja necessidade deve ser comprovada.
Para conceder os alimentos é preciso verificar se os requisitos legais estão presentes e cada caso é analisado de maneira pormenorizada para se detalhar a forma do pagamento, os valores, as atualizações e principalmente o tempo de duração da obrigação alimentar. O pressuposto básico das pensões alimentícias é o binômio necessidade/possibilidade, ou seja, comprova-se a necessidade de quem as recebe e a possibilidade de quem as paga.
O artigo 1695 do Código Civil de 2002 destaca o princípio básico da obrigação alimentar pelo qual os alimentos devem ser fixados de acordo com as necessidades do reclamante e as possibilidades do reclamado, complementado pelo artigo 1694. Além disso, é preciso provar a existência de parentesco, vínculo conjugal ou companheirismo entre as partes.
A obrigação alimentar possui tamanha relevância que a Constituição Federal admite a prisão do devedor de alimentos (artigo 5º, inciso LXVII), porém essa medida coercitiva para obrigar o pagamento não exime o devedor do pagamento da prestação.
2.1 O DEVER DO SUSTENTO
O dever de sustento deriva do poder familiar, situação em que os pais ou responsáveis têm direitos sobre os filhos ou tutelados, contudo o Estatuto da Criança e do Adolescente, dispõe:
Art. 20. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Sobre tal exceção, o Código Civil de 2002 dispõe no artigo 1694:
Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
A Constituição Federal de 1988 também impõe um dispositivo relativo à questão:
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
É claro a preocupação do Estado com os deveres entre pais e filhos, ao impor tais obrigações de alimentar, sendo eles fixados na proporção das necessidades do alimentando e dos recursos do alimentante, de forma que é um dever.
Assim expõe o Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, José Antônio de Paula Santos Neto (1994, p. 110):
A precariedade da condição econômica do genitor não tem o condão de exonerá-lo dessa obrigação, que subsiste sempre enquanto perdurar o pátrio poder, mesmo que já estando o filho, pela sua idade, apto para o trabalho em face da legislação específica.
É cogente salientar que os pais, mesmo em situação de precariedade financeira, não estão excluídos da obrigação de prestação alimentar, visto que é dever dos pais o sustento para os filhos menores. No caso de filhos maiores de 18 anos, se utiliza como parâmetro a relação de parentesco que decorre da obrigação alimentar, uma vez que o filho maior de idade não é abrangido pelo fator do poder familiar.
3. PAGAMENTO DE PENSÃO ALIMENTÍCIA PARA FILHOS MAIORES
Os devedores de pensão alimentícia muitas vezes trazem consigo a errônea ideia de que a maioridade dos credores é o marco para extinguir automaticamente a obrigação alimentar, no entanto estão extremamente equivocados, visto que há outras possibilidades da continuação do pagamento da pensão alimentícia.
Não obstante esteja previsto que com a maioridade cesse o dever de sustento dos pais para com os filhos, à luz do artigo 1.635, III, do Código Civil, a obrigação pode persistir se comprovado que os filhos não têm condições de se sustentar. A partir do momento em que cessa o poder familiar, o fundamento da prestação alimentar passa a se dar pelo vínculo de parentesco, entre os outros requisitos que serão demonstrados.
Desse modo, constata-se que, enquanto na menoridade não é necessário comprovar a necessidade dos alimentos, na maioridade esta prova é obrigatória para que o filho continue tendo direito ao sustento dos pais, enquanto estudar e até adentrar ao mercado de trabalho.
O poder legal de controle dos filhos cessa quando acaba a menoridade deles, e isso ocorre aos dezoito anos (Art. 5º, caput, e 1635, III, do Código Civil de 2002). Portanto, de acordo com tais dispositivos, os pais não estão mais obrigados a prestar alimentos aos filhos que são maiores e capazes.
Todavia, a ação de alimentos visa garantir a subsistência da pessoa solicitada como também compreende verbas para a instrução e educação. A questão educacional não deve ser restrita à faixa etária, pois filhos maiores necessitam também de instrução e educação, que deverão ser fornecidas pelos pais ou outros responsáveis.
A situação do pagamento de pensão para os filhos que atingiram a maioridade é divergente e debatida na doutrina e na jurisprudência porque inexiste regramento legal expresso que menciona o marco final do pagamento da verba alimentar. A situação fática é analisada caso a caso e a construção jurisprudencial é a fonte primordial para o deslinde da controvérsia.
De acordo com os artigos 1695 e 1696 do Código Civil, a maioridade não é exigência para a extinção de alimentos.
Art. 1.695. São devidos os alimentos quando quem os pretende não tem bens suficientes, nem pode prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, pode fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.
Art. 1696 O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. (BRASIL, 2002)
De acordo com disposto nos artigos citados acima, quem não possui renda suficiente e está impossibilitado de se sustentar com seus próprios proventos, possui o direito de requerer mutuamente os alimentos entre pais e filhos.
O Código Civil exige um exame aprofundado da situação pelo magistrado, observando quais são as reais necessidades dos filhos e a real possibilidade dos pais, uma vez que acontecem em diversos casos de filhos que invocam a justiça peticionando alimentos sem haver a necessidade comprovada, arriscando o patrimônio dos pais, mesmo possuindo autossuficiência financeira.
Apesar disso há filhos que necessitam da prestação de alimentos para sobreviverem e continuarem seus estudos, que são cláusulas básicas de sobrevivência. Por esse motivo que a lei necessita atender seu objetivo social, concedendo direito a quem realmente os possui, após detalhada apreciação do caso concreto.
Entende-se que a pensão poderá se estender por mais algum tempo, até que o filho complete os estudos superiores ou profissionalizantes, com idade razoável, e possa prover sua própria subsistência. Nesse sentido, o artigo 1694 do presente Código sublinha que os alimentos devem atender, inclusive, às necessidades de educação. Têm se entendido que o pensionamento deve ir até os 24 anos de idade. Outras situações excepcionais, como condição de saúde, poderão fazer com que os alimentos possam ir além da maioridade, o que deverá ser examinado no caso concreto.
Portanto, a prestação de alimentos é independe da idade, contudo depende do binômio necessidade e possibilidade, observando tanto o alimentado quanto o alimentando. Em relação ao exposto, se é certo que, com a maioridade ou emancipação, cessa o pátrio poder, também é certo que, tão somente com o implemento de tal fato, não será extinto o dever alimentar, merecendo que se analise, caso a caso, o binômio: necessidade-possibilidade.
Por outro lado, é compreendido também por Yussef Said Cahali (2012, página 72):
Ainda que o filho seja portador de habilitação profissional, mas com dificuldades de se fixar na profissão não apenas pelos embaraços naturais, para iniciação da carreira profissional, como também porque se apresenta com distúrbios de comportamento, em razão de manifestações neuróticas, justifica-se que embora sua habilidade e a conquistada habilitação teórica para uma profissão liberal, deva, então, merecer alimentos a serem suportados pelo pai, na medida suficiente para ministração do acompanhamento psicoterápico, com vistas a, mais tarde, capacitar o alimentando a enfrentar as dificuldades que o impedem, de presente, o início da atividade profissional”.
O ônus da prova cabe ao peticionário, que fundamenta seu pedido no vínculo familiar e seu estado de necessidade, basta provar o vínculo e necessidade, enquanto isso o réu necessita demonstrar a existência de itens que impedem a sentença que defere o pedido, como sua impossibilidade financeira, ou a ausência de vínculo de parentesco em linha reta ou colateral até o segundo grau civil.
No caso de peticionário em situação de menoridade, basta comprovar tal situação, que é o requisito primordial para que receba a prestação alimentícia, que é ser menor de 18 anos de idade.
Nesta linha decidiu a Ministra Nancy Andrighi:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. EXONERAÇAO. MAIORIDADE. NECESSIDADE. ÔNUS DA PROVA. Em relação aos alimentos devidos pelos pais a seus filhos em virtude do Poder Familiar, não pairam dúvidas quanto ao ônus da prova –que pertence ao alimentante–, em relação ao binômio possibilidade/necessidade da prestação alimentícia. Isso decorre da presunção de necessidade dos filhos menores, ou incapazes, de receberem alimentos que lhes possa proporcionar, para além do sustento material, a saúde, o lazer e a educação. Nessa hipótese, o alimentante apenas pode opor a sua capacidade financeira como fator limitante do valor dos alimentos prestados, circunstância que, por óbvio, deverá provar. A cessação da menoridade, contudo, traz consigo o fim do Poder Familiar e, por conseguinte, a vinculada obrigação alimentar dos pais em relação à sua prole, remanescendo, no entanto, pela redação do art. 1.694 do CC/02, a possibilidade dos alimentos continuarem a ser prestados, agora em face do vínculo de parentesco. Nessa linha de entendimento, chega-se à solução da questão central aqui debatida, pois a continuidade dos alimentos após a maioridade, ausente a continuidade dos estudos, somente subsistirá caso haja 63 NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, 2016. p. 135. 29 prova, por parte do filho, da necessidade de continuar a receber alimentos, o que caracterizará fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor-alimentante, a depender da situação. RECURSO ESPECIAL Nº 1.198.105 - RJ (2010/0111457-4).
A exoneração de pensão alimentícia, pedida sempre pelo alimentante vem amparada nos pressupostos de: Primeiro aquisição de maioridade civil, segundo finalização de estudos de nível superior ou profissionalizante. O solicitante ao requerer a exoneração julga ser um momento de seu filho ou filha assumir a condição de se auto sustentar. Os casos analisados encaminham sempre nesse sentido, pois se a solicitação de alimentos se baseia na necessidade de complementação de estudos, e isto ocorrido, pode o alimentante se liberar deste pagamento. O que nos leva ao entendimento de que a função de parentesco cumpriu o objetivo de colocar seu filho ou filha aptos a conquistar um posto no mercado de trabalho.
Volta e meia, quando ocorre a maioridade civil da prole, ocorrem litígios relacionados à prestação de alimentos, visto que para que haja prorrogação em concessão de custeio ao filho, até o presente momento recém-adulto, deverá comprovar os estudos ou a incapacidade física ou psíquica. Em tal âmbito duvidoso existem precedentes positivos para que existam os alimentos para os filhos já inseridos na maioridade e que estejam no ensino superior.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul obrigou um pai a continuar prestando alimentos a uma filha de 21 anos, que já havia concluído a graduação em ensino superior, para que terminasse pós-graduação lato sensu (vide Ap. 70006854384, DOERS 07.11.2003, Desembargador Sérgio Fernando de Vasconcello Chaves, in Revista Brasileira de Direito de Família-Síntese, nº23, p. 108, verbete nº 2302).
O mesmo tribunal impôs em uma decisão a obrigação de um pai a pagar pensão ao filho recém-bacharel em Direito (apesar de viver maritalmente com uma mulher) para que ele custeasse um curso preparatório para o Exame da OAB, além de frequentar um curso de aperfeiçoamento da Associação de Juízes do Rio Grande do Sul (vide AI 700011221118, Desembargador Antônio Carlos Stangler Pereira, DORS 30.08.2002, in Revista Brasileira de Direito de Família-Síntese, vol. 13, p. 126, verbete nº 1362).
Outras jurisprudências a respeito:
TJRJ – APELAÇÃO - 0017295-81.2015.8.19.0014 - 1ª Ementa Des(a). BENEDICTO ULTRA ABICAIR - Julgamento: 09/05/2018 - SEXTA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE EXONERAÇÃO C/C REVISÃO ALIMENTOS. FILHO MAIOR, MATRICULADO EM INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR. DEVER ALIMENTAR QUE SUBSISTE DECORRENTE DA RELAÇÃO DE PARENTESCO. REDUÇÃO DO PENSIONAMENTO DEVIDO, DIANTE DA MODIFICAÇÃO DO BINÔMIO POSSIBILIDADE E NECESSIDADE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
Neste caso, o apelante alcançou a maioridade civil, mas estava matriculado em curso superior, o que justificava a continuidade do pagamento da pensão alimentícia, a fim de não frustrar a possibilidade de ascensão profissional do alimentando. Entretanto, certo é que o alimentando possui formação para pilotar avião, estando ainda em fase de obtenção do número de horas exigidas para exercer a atividade profissional, demonstrando capacidade de trabalho por estar em plena idade produtiva. Assim, a manutenção da pensão alimentícia se impõe, mas revela-se plenamente cabível a revisão dos percentuais devidos pelo alimentante, na medida em que o pensionamento tem como fundamento o binômio possibilidade e necessidade, nos termos do art. 1699 do Código Civil. Então, foi reputado a diminuição do pensionamento devido para 11% dos rendimentos líquidos do alimentante.
TJRJ - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0058393-20.2017.8.19.0000 - 1ª Ementa Des(a). MARCO AURÉLIO BEZERRA DE MELO - Julgamento: 24/04/2018 - DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. DECISÃO AGRAVADA QUE INDEFERIU PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA A FIM DE QUE A VERBA ALIMENTAR ACORDADA PARA A FILHA SEJA REDUZIDA PARA 50% DO SALÁRIO MÍNIMO. INCONFORMISMO DO ALIMENTANTE. ALEGAÇÃO DE IMPOSSIBILIDADE DE PAGAMENTO POR ESTAR EM SITUAÇÃO FINANCEIRA DIFÍCIL E QUE A FILHA NÃO NECESSITA DE TODA A VERBA FIXADA.
No presente caso, o alimentante é empresário, cuja renda é de difícil confirmação pelo Juízo, além de ter contra si várias execuções de alimentos ofertadas pela filha. Esta estava matriculada numa instituição de ensino particular, onde cursava Direito e no decorrer do processo comprovou a necessidade da pensão, portanto julgado procedente.
3.1 PRINCIPIOS CONTITUCIONAIS
Os princípios que orientam o Direito de Família, destaca-se o princípio da dignidade da pessoa humana:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: (...)
III - a dignidade da pessoa humana.
Também há princípio da solidariedade familiar e o princípio da função social da família:
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I - construir uma sociedade livre, justa e solidária; (...)
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
A dignidade humana e a solidariedade são dois princípios constitucionais intrinsecamente ligados ao direito de família e aos seus institutos. Podem ser, inclusive, citados como sendo princípios garantidores de vários direitos, dentre eles, o direito a alimentos.
Primeiramente, cabe analisar o princípio da dignidade humana. Dito princípio foi trazido expressamente ao ordenamento jurídico brasileiro pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 1º, inciso III, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Com o chegada da Constituição, o respeito à dignidade da pessoa humana tornou-se um comando jurídico e, a partir daí, que a ordem jurídica brasileira se apoia e se constitui, de maneira que este princípio assegura a ordem constitucional e a democracia (BONAVIDES, 2006, p. 634 e MORAES, 2006, p. 13-14).
Também é a dignidade humana, capaz de dar origem a uma ordem política baseada nos direitos humanos, consistente no respeito a todas as pessoas de forma igualitária (HABERMAS, 2010, p.10).
Para Reis (2010, p. 81), o princípio da dignidade da pessoa humana está associado à ideia de “mínimo existencial”, que consiste no conjunto de bens e utilidades necessárias para a subsistência física do indivíduo, ao mesmo tempo em que pretende assegurar a todos a integridade e a autodeterminação, sem que nenhuma pessoa seja alijada da sociedade.
Neste sentido, pode se dizer que para a preservação da dignidade da pessoa humana, é indispensável garantir condições justas e adequadas de vida para o indivíduo e sua família.
Para Dias (2011, p. 62-63), o princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado como valor nuclear da ordem constitucional, é o mais universal de todos os princípios. Além de estar “umbilicalmente” ligado aos direitos humanos, é na família que esse princípio encontra o solo apropriado para florescer. Como já dito, a dignidade humana é princípio fundamental do Estado Democrático e também da ordem jurídica. Sendo assim, a família deve observar e respeitar o desenvolvimento da dignidade das pessoas que a integram (LÔBO, 2011, p. 62).
Assim, o princípio da dignidade humana deve ser observado em todos os ramos de atuação do direito, com vistas a assegurar uma vida digna a todos os seres humanos.
Ao lado do princípio da dignidade humana, há outro princípio garantidor do direito a alimentos: O princípio da solidariedade. Apenas com a promulgação da Constituição Federal de 1988, a solidariedade assumiu o status de princípio jurídico no ordenamento jurídico brasileiro, sendo dotado de força normativa e capacidade de tutelar o respeito devido a cada um.
Para Melo (2009, p. 107), a solidariedade consiste em uma “doação personalíssima, própria do sentimento humanista, visando a momentos graves na vida de uma pessoa, quando sua dignidade não está sendo devidamente considerada”. Ainda de acordo com o autor, o princípio da solidariedade pode ser o “[...] princípio ético supremo capaz de evitar a perpetuação das atitudes egoístas que degradam o ser humano [...]” (2009, p. 106).
Entende-se que a solidariedade é o que cada um deve ao outro. Esse princípio, que tem origem nos vínculos afetivos, dispõe de acentuado conteúdo ético, pois contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a fraternidade e a reciprocidade. Dessa maneira, o princípio da solidariedade, além de ser um princípio moral que rege as relações interpessoais, consiste em um dos meios de garantia do direito a alimentos.
Também princípios constitucionais com elos no Direito Civil, como o princípio da igualdade entre filhos:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
(...)
§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Art. 1.596. Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Os princípios constitucionais possuem grande importância, estes concedem uma proteção legal ao direito de ter uma vida digna a todos, à valorização da família e de sua função social, para que todos os membros do grupo familiar estejam em situação de igualdade. Quando um integrante da família estiver com condições financeiras confortáveis enquanto outro em linha reta ou colateral até quarto grau estiver em situação financeira crítica, terá que ocorrer solidariedade do primeiro para com o segundo, podendo ser demandado através de ação de alimentos, pois estaria irregular com a Constituição Federal de 1988 manter o familiar em condições deploráveis, em situação de emergência. A Constituição da República vigente não permite no parágrafo 6º do art. nº 227 a distinção entre filhos havidos dentro e fora da abrangência do casamento, onde ambos desfrutem do mesmo direito, sem qualquer distinção.
CONCLUSÃO
Os alimentos consistem nas prestações devidas e necessárias à vida humana para que o indivíduo possa subsistir, mantendo sua existência, não abrangendo apenas a alimentação, mas também a educação, habitação, saúde e vestuário, não importando a idade do requerente. O alimento é aquilo que o indivíduo necessita para a sobrevivência digna.
Exige-se a comprovação do binômio necessidade do alimentado e possibilidade do alimentando, derivando a prestação alimentícia para os maiores de 18 anos de idade da relação de parentesco em linha reta e colateral até segundo grau. Havendo a comprovação do binômio, o descendente passa a ter direito ao recebimento da prestação alimentar, não tendo o dever de sustento, visto que é decorrente do poder familiar, que encerra com o ingresso na maioridade. Os descendentes capazes de exercer as atividades da vida civil até 24anos de idade que estiverem cursando o ensino superior possui o direito de receber a prestação alimentícia, entretanto não é uma medida taxativa, uma vez que pode ocorrer de o jovem ultrapassar a idade citada e ainda não ter concluído o ensino superior, tendo ainda a necessidade de receber os alimentos, visto que ainda não possui renda suficiente para sobreviver sem auxílio, em razão de ainda estar estudando, por outro lado, pode ocorrer também do jovem ter menos de 24 anos e já possuir possibilidade de se sustentar sozinho, não tendo necessidade de receber os alimentos.
Conclui-se, assim, que a crença de que o pagamento da pensão alimentícia cessa automaticamente quando o credor atingir a maioridade civil deve ser afastada porque inexiste no ordenamento jurídico leis que determinem o marco final das referidas pensões quanto ao critério etário.
Não havendo o marco final, ao devedor, resta ingressar judicialmente com uma ação de exoneração de alimentos caso entenda que a maioridade faz cessar a obrigação alimentar, e, ao credor, defender-se na demanda se ainda necessitar da verba para manter as suas condições mínimas de sobrevivência. Se o devedor simplesmente quedar-se inerte quanto ao pagamento da pensão alimentícia, ao argumento de que o credor atingiu a maioridade civil, poderá ter contra si uma possível execução das prestações não pagas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Família. 2ª Ed.. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2016.
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Bacharelanda no curso de Direito pelo Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas - CIESA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBA, Mariana Freitas de Souza. Alimentos e o pagamento de prestação alimentícia na maioridade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 out 2019, 19:29. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53602/alimentos-e-o-pagamento-de-prestao-alimentcia-na-maioridade. Acesso em: 22 nov 2024.
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