RESUMO: Inspirado na jurisprudência da Corte Colombiana, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) ajuizou perante o Supremo Tribunal Federal a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347, em que solicita a declaração do Estado de Coisa Inconstitucional do sistema carcerário brasileiro. Por tratar-se de uma grande novidade jurídica para o Direito brasileiro, muitos questionamentos surgiram com o ajuizamento da ação. O presente trabalho tem como objetivo traçar linhas gerais sobre o que é o “Estado de Coisa Inconstitucional”, abordando os prós e contras de seu reconhecimento, afim de analisar a viabilidade da utilização do instrumento no contexto jurídico brasileiro. O trabalho desenvolvido revela-se eminentemente dogmático-instrumental e filosófico-constitucional, é essencialmente bibliográfico e será realizado utilizando-se o método de procedimento comparativo e interpretativo.
Palavras-chave: Direito Constitucional. Direitos Humanos. Controle de Constitucionalidade.
Sumário: 1 Introdução; 2 A Corte Constitucional Colombiana e suas decisões emblemáticas; 3 O Supremo Tribunal Federal e a ADPF nº 347; 4 Prós e contras: discussão sobre aplicabilidade do ECI no contexto jurídico brasileiro; 5. Conclusões; 6. Referências
1. INTRODUÇÃO
No início de 2015, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) ajuizou perante o Supremo Tribunal Federal a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347, na qual solicita a declaração do Estado de Coisa Inconstitucional (ECI) do Sistema Carcerário brasileiro face às inúmeras violações de direitos fundamentais dos presidiários e a inércia do Poder Público quanto à questão.
Até o presente momento o STF não analisou o mérito da ação. Entretanto, ao julgar os pedidos liminares, a Suprema Corte Constitucional declarou que diversos dispositivos constitucionais e normas internacionais de proteção aos Direitos Humanos estão sendo desrespeitados e reconheceu expressamente a existência de um verdadeiro Estado de Coisa Inconstitucional.
Por tratar-se de uma grande novidade jurídica para o Direito brasileiro, muitos questionamentos surgiram com o ajuizamento da ação. Argumentos de cunho social, político e jurídico fomentam a discussão, o que tem dificultado o alcance de um consenso sobre o tema.
Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo traçar linhas gerais sobre o que é a declaração de Estado de Coisa Inconstitucional, abordando os prós e contras de seu reconhecimento, afim de analisar a viabilidade da utilização do instrumento no contexto jurídico brasileiro.
Tendo em vista a falta de regulamentação sobre o ECI, os métodos de procedimento utilizados na presente pesquisa serão o comparativo e o interpretativo, haja vista que será realizada a comparação entre o ordenamento jurídico pátrio e o direito estrangeiro, sendo necessário fazer a interpretação das diversas legislações abordadas.
No que tange à sua natureza, a pesquisa pode ser classificada como eminentemente dogmático-instrumental e filosófico-constitucional. E a técnica de pesquisa empregada foi a bibliográfica, incluindo textos físicos e aqueles localizados na rede mundial de computadores, disponibilizados no intuito de fomentar a pesquisa científica.
Esse “Estado de Coisas” tem origem na Corte Constitucional da Colômbia (CCC). Foi ela quem o declarou pela primeira vez e que vem desenvolvendo o instrumento ao longo dos anos, conforme restará evidenciado pela jurisprudência da Corte que será apresentada a seguir.
2 A CORTE CONSTITUCIONAL COLOMBIANA E SUAS DECISÕES EMBLEMÁTICAS
O primeiro caso em que se declarou o Estado de Coisa Inconstitucional encontra-se na Corte Constitucional Colombiana, especificamente na Sentencia de Unificaciòn (SU) – 559 de 1997.[1] Na ocasião, diversos professores da rede municipal ajuizaram ações contra os prefeitos de suas cidades alegando que, apesar de existir uma obrigação legal do Município de inscrevê-los em uma Caixa ou Fundo de Previdência Social e de ser deduzida uma percentagem de seus salários mensais para essa finalidade, inexistia a filiação dos educadores em um Programa de Previdência Social, o que implicaria em uma violação aos seus direitos à vida, saúde, segurança social e trabalho.
Depois de analisar a matéria de política econômica da educação no país em relação à distribuição da dotação orçamentária e a nomeação de professores sem recursos orçamentais para este fim, a Corte Colombiana concluiu tratar-se de um problema geral que afeta um número significativo de professores no país e cujas causas estão relacionadas com a aplicação desordenada e irracional da política de educação.[2]
No caso em tela, é possível constatar a existência de uma falha estrutural, visto que a responsabilidade pela má gerência da política educacional recai não somente em um órgão, mas sobre um conjunto de entes estatais. Diante disto, a Corte decidiu pela declaração de um Estado de Coisas contrárias à Constituição, com base nos seguintes argumentos:
La Corte Constitucional tiene el deber de colaborar de manera armónica con los restantes órganos del Estado para la realización de sus fines. Del mismo modo que debe comunicarse a la autoridad competente la noticia relativa a la comisión de un delito, no se ve por qué deba omitirse la notificación de que un determinado estado de cosas resulta violatorio de la Constitución Política. El deber de colaboración se torna imperativo si el remedio administrativo oportuno puede evitar la excesiva utilización de la acción de tutela. Los recursos con que cuenta la administración de justicia son escasos. Si instar al cumplimiento diligente de las obligaciones constitucionales que pesan sobre una determinada autoridad contribuye a reducir el número de causas constitucionales, que de otro modo inexorablemente se presentarían, dicha acción se erige también en medio legítimo a través del cual la Corte realiza su función de guardiana de la integridad de la Constitución y de la efectividad de sus mandatos. Si el estado de cosas que como tal no se compadece con la Constitución Política, tiene relación directa con la violación de derechos fundamentales, verificada en un proceso de tutela por parte de la Corte Constitucional, a la notificación de la regularidad existente podrá acompañarse un requerimiento específico o genérico dirigido a las autoridades en el sentido de realizar una acción o de abstenerse de hacerlo.[3] (grifo nosso)
Conforme se observa, a Corte Colombiana apoiou sua decisão no dever de colaboração harmônica entre os poderes do Estado, incumbindo ao Judiciário, no exercício de sua função de guardião da Constituição, notificar as autoridades competentes quanto à existência de uma violação e requerer destas o cumprimento diligente das obrigações constitucionais.
Todavia, a decisão não traduz a real dimensão do instituto, consoante leciona George Marmelstein Lima.[4] Segundo o jurista, nesse primeiro momento o ECI foi utilizado principalmente para evitar a repetição de demandas individuais sobre o mesmo tema, de modo que fosse construída uma solução uniforme para todos os casos.
Com as decisões seguintes, o instituto do Estado de Coisa Inconstitucional foi evoluindo, sendo gradativamente aperfeiçoado pela jurisprudência da Corte Colombiana. Em que pese o ECI ter sido aplicado em diferentes casos, a doutrina[5] confere uma importância especial a duas decisões: a Sentencia de Tutela (T) – 153 de 1998,[6] referente ao Sistema Penitenciario Colombiano, e a Sentencia de Tutela (T) – 025 de 2004,[7] que trata dos deslocamentos forçados.
A decisão sobre o Sistema Carcerário Colombiano é fruto dos processos de tutela T - 137001 e T - 143950, promovidos por Manuel José Duque Arcila e Jhon Jairo Hernandez e outros, respectivamente, frente ao Ministério da Justiça e do Direito, e do Instituto Nacional Penitenciário e Carcerário - INPEC. Da análise da sentença (T) – 153/98, é possível constatar que em ambas as ações supracitadas alegava-se a superlotação das prisões e as inúmeras violações aos direitos fundamentais que os detentos sofriam.
A fim de obter informações precisas sobre a real situação carcerária do país, a CCC ordenou a realização de uma série de inspeções judiciais, além de requerer informações de diversas entidades, como Ministério da Justiça e do Direito, o INPEC, a Defensoria Pública, a Procuradoria Geral da República, Ministério da Saúde, Ministério da Fazenda e Crédito Público e da Polícia Nacional.[8]
As inspeções levaram a Comissão Judicial a concluir que as condições das prisões visitadas eram absolutamente desumanas, nos termos da Corte:
Las condiciones de vida en los penales colombianos vulneran evidentemente la dignidad de los penados y amenazan otros de sus derechos, tales como la vida y la integridad personal, su derecho a la familia, etc. Nadie se atrevería a decir que los establecimientos de reclusión cumplen con la labor de resocialización que se les ha encomendado. Por lo contrario, la situación descrita anteriormente tiende más bien a confirmar el lugar común acerca de que las cárceles son escuelas del crimen, generadoras de ocio, violencia y corrupción.[9] (grifo nosso)
Outrossim, das informações solicitadas concluiu-se que a situação de superlotação carcerária não se resumia apenas às instituições prisionais objeto das ações que originaram a demanda em questão, mas afetava quase todas as 167 penitenciárias do país,[10] o que representa uma violação massiva e generalizada a direitos fundamentais.
O Tribunal Colombiano analisou as disposições da legislação interna do país sobre o direito dos detentos, bem como os tratados e acordos internacionais de direitos humanos, concluindo que ambos constituem “letra morta”,[11] ante sua ineficácia. A corte acrescentou ainda que, apesar de se saber há muito tempo que a infraestrutura das prisões é inadequada e que os direitos dos detentos são constantemente violados, a questão não possui lugar de destaque agenda política do Estado.
Neste sentido, diante da ineficácia da legislação doméstica e internacional no que tange à proteção de direitos humanos e da omissão do poder público em face ao direito das minorias, a Corte Colombiana fez importantes ponderações acerca do papel contramajoritário que as Cortes Constitucionais exercem:
La actitud de los gestores de las políticas públicas frente al problema de las cárceles obedece a la lógica del principio de las mayorías, que gobierna los regímenes democráticos. Los reclusos son personas marginadas por la sociedad. El mismo hecho de que sean confinados en establecimientos especiales, difícilmente accesibles, hace gráfica la condición de extrañamiento de los presos. En estas condiciones, los penados no constituyen un grupo de presión que pueda hacer oír su voz. Por eso, sus demandas y dolencias se pierden entre el conjunto de necesidades que agobian las sociedades subdesarrolladas, como la colombiana.
51. La racionalidad constitucional es diferente de la de las mayorías. Los derechos fundamentales son precisamente una limitación al principio de las mayorías, con el ánimo de garantizar los derechos de las minorías y de los individuos. El juez constitucional está obligado a asumir la vocería de las minorías olvidadas, es decir de aquellos grupos que difícilmente tienen acceso a los organismos políticos. Por esta razón, la Corte Constitucional está llamada a actuar en ocasiones como la presente, llamando la atención sobre el estado de cosas inconstitucional que se presenta en el sistema penitenciario colombiano y que exige la toma de medidas por parte de las distintas ramas y órganos del poder, con miras a poner solución al estado de cosas que se advierte reina en las cárceles colombianas.[12]
Apoiada em seu dever de desempenhar a função de contramajoritário, a Corte declarou o Estado de Coisa Inconstitucional do sistema carcerário e determinou a adoção de uma série de medidas por parte de diversos entes do Estado. Todavia, a execução dessas ordens não obteve grande resultados, conforme ensina Carlos Alexandre de Azevedo Campos.[13] Para o autor, os principais motivos para o insucesso da decisão podem ser atribuídos a pouca flexibilidade das ordens e a falta de monitoramento, pela própria Corte, da execução da sentença.
Contudo, é importante frisar que, ainda que a decisão não tenha surtido os efeitos esperados, é incontestável o fato de que a declaração de Estado de Coisa Inconstitucional chama a atenção das autoridades para questões antes menosprezadas pelo poder público.
Os maiores avanços na tese do ECI podem ser identificados na sentença de tutela (T) – 025 de 2004, que trata dos deslocamentos internos forçados ocasionados pela violência gerada por conflitos armados. Nessa oportunidade a Corte, baseada em sua própria jurisprudência,[14] estabeleceu os fatores que são necessários para se definir a existência de um Estado de Coisa Inconstitucional, quais sejam:
(i) la vulneración masiva y generalizada de varios derechos constitucionales que afecta a un número significativo de personas; (ii) la prolongada omisión de las autoridades en el cumplimiento de sus obligaciones para garantizar los derechos; (ii) la adopción de prácticas inconstitucionales, como la incorporación de la acción de tutela como parte del procedimiento para garantizar el derecho conculcado; (iii) la no expedición de medidas legislativas, administrativas o presupuestales necesarias para evitar la vulneración de los derechos. (iv) la existencia de un problema social cuya solución compromete la intervención de varias entidades, requiere la adopción de un conjunto complejo y coordinado de acciones y exige un nivel de recursos que demanda un esfuerzo presupuestal adicional importante; (v) si todas las personas afectadas por el mismo problema acudieran a la acción de tutela para obtener la protección de sus derechos, se produciría una mayor congestión judicial.[15]
Reconhecido o preenchimento de todos os requisitos acima estampados, a Corte declarou o Estado de Coisa Inconstitucional, notificou as autoridades competentes e ordenou o cumprimento de diversas medidas a fim de sanar a violação. Contudo, nessa ocasião, a Corte posicionou-se de maneira distinta em relação à decisão sobre o sistema penitenciário: foram adotadas ordens de caráter flexível e realizou-se o monitoramento jurisdicional das medidas indicadas, o que permitiu que a decisão surtisse bons resultados.[16]
A partir do estudo dos dois casos acima apresentados, verifica-se uma mudança na postura da Corte Colombiana no que tange ao propósito da declaração de Estado de Coisa Inconstitucional: aquilo que antes era utilizado para evitar o congestionamento judicial com demandas individuais sobre o mesmo tema, passa a ser tratado como um importante mecanismo para a superação de situações de graves e sistemáticas violações de direitos fundamentais.[17]
Nesse sentido, merece destaque a lição do jurista Carlos de Azevedo Campos, que explica com clareza e simplicidade a essência do ECI:
Quando declara o Estado de Coisas Inconstitucional, a corte afirma existir quadro insuportável de violação massiva de direitos fundamentais, decorrente de atos comissivos e omissivos praticados por diferentes autoridades públicas, agravado pela inércia continuada dessas mesmas autoridades, de modo que apenas transformações estruturais da atuação do Poder Público podem modificar a situação inconstitucional. Ante a gravidade excepcional do quadro, a corte se afirma legitimada a interferir na formulação e implementação de políticas públicas e em alocações de recursos orçamentários e a coordenar as medidas concretas necessárias para superação do estado de inconstitucionalidades.[18] (grifo nosso)
3 O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E A ADPF 347
Inspirado na jurisprudência da Corte Colombiana, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) ajuizou em maio de 2015 perante o Supremo Tribunal Federal a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347, em que solicita a declaração do Estado de Coisa Inconstitucional do sistema carcerário brasileiro.
Diante das inúmeras violações a direitos fundamentais dos presidiários e da inércia do poder público quanto à situação, o partido requereu que a Corte Constitucional determine que a União e os Estados adotem um conjunto de medidas com intuito de fazer cessar tais violações, que permeiam todo o sistema penitenciário do Brasil.
A ação, que muito se assemelha ao caso enfrentado pela Colômbia na Sentencia T - 153 de 1998, ainda está com o mérito pendente de julgamento. Todavia, o Supremo já enfrentou questões importantes ao analisar os pedidos cautelares.
Preliminarmente, discutiu-se o cabimento da ação, quando, por unanimidade, os Ministros do STF reconheceram o preenchimento dos requisitos que autorizam a propositura da ADPF, quais sejam, a violação de preceito fundamental da Constituição decorrente de atos do poder público e a inexistência de outro meio capaz de solucionar a lesividade.
Conforme se extrai do acórdão do Supremo, não há como negar a qualidade de preceitos fundamentais da constituição inerente aos direitos e garantias individuais, que é o assunto discutido na ação em apreço: o flagrante desrespeito à dignidade humana e à integridade física e moral dos presos. Ademais, essas violações aos preceitos fundamentais da ordem constitucional são decorrentes de várias ações e omissões do poder público, de modo que não podem ser impugnados por nenhuma outra medida do controle abstrato, restando, por exclusão, apenas a ADPF.
Constatada a adequação da via eleita para ingressar em juízo, o Supremo Tribunal Federal passou a analisar a necessidade da concessão dos pedidos liminares. Assim, baseada em relatórios do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e da CPI do Sistema Carcerário,[19] como também em dados fornecidos pela Clínica de Direitos Fundamentais da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e no parecer do Professor Titular de Direito Penal da mesma instituição, Juarez Tavares, a Corte apontou o cenário carcerário como desumano e completamente contrário aos ditames constitucionais, conforme se extrai do trecho colacionado a seguir:
Diante de tais relatos, a conclusão deve ser única: no sistema prisional brasileiro, ocorre violação generalizada de direitos fundamentais dos presos no tocante à dignidade, higidez física e integridade psíquica. A superlotação carcerária e a precariedade das instalações das delegacias e presídios, mais do que inobservância, pelo Estado, da ordem jurídica correspondente, configuram tratamento degradante, ultrajante e indigno a pessoas que se encontram sob custódia. As penas privativas de liberdade aplicadas em nossos presídios convertem-se em penas cruéis e desumanas. Os presos tornam-se “lixo digno do pior tratamento possível”, sendo-lhes negado todo e qualquer direito à existência minimamente segura e salubre. Daí o acerto do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, na comparação com as “masmorras medievais”.[20] (grifo nosso)
Os ministros constataram a ocorrência de violações a vários dispositivos constitucionais, dentre os quais se destacam: o artigo 1º, inciso III; artigo 5º, incisos III, XLVII, alínea “e”, XLVIII, XLIX, e LXXIV; e artigo 6º. Além disso, evidenciou-se também o desrespeito a diversos Tratados Internacionais de direitos humanos, tais como o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, a Convenção contra a Tortura e outros Tratamentos e Penas Cruéis, Desumanos e Degradantes e a Convenção Americana de Direitos Humanos.
Nesse contexto, o Ministro Marco Aurélio, relator da ação, proferiu voto em que discute a responsabilidade do poder público e o papel do Supremo Tribunal Federal. Assim, após destrinchar o encargo que cada um dos poderes possui em relação à situação, o Ministro concluiu:
Em síntese, assiste-se ao mau funcionamento estrutural e histórico do Estado – União, estados e Distrito Federal, considerados os três Poderes – como fator da violação de direitos fundamentais dos presos e da própria insegurança da sociedade. Ante tal quadro, a solução, ou conjunto de soluções, para ganhar efetividade, deve possuir alcance orgânico de mesma extensão, ou seja, deve envolver a atuação coordenada e mutuamente complementar do Legislativo, do Executivo e do Judiciário, dos diferentes níveis federativos, e não apenas de um único órgão ou entidade.[21]
Diante desse quadro, consoante entendimento do relator, cabe ao STF superar os bloqueios políticos e institucionais existentes através da coordenação de uma série de medidas impostas a todos os Poderes. Tendo em vista que a sociedade rejeita e demonstra total desprezo aos encarcerados, os poderes majoritários - Executivo e Legislativo - ignoram sua situação degradante, de modo que a atuação jurisdicional torna-se imprescindível ante o papel contramajoritário inerente à Corte Constitucional.
Todavia, a interferência do Judiciário não deve ser irrestrita. O próprio Ministro relator da ação apontou alguns limites que devem ser respeitados quando da atuação jurisdicional:
Ao Supremo cumpre interferir nas escolhas orçamentárias e nos ciclos de formulação, implementação e avaliação de políticas públicas, mas sem detalhá-las. Deve formular ordens flexíveis, com margem de criação legislativa e de execução a serem esquematizadas e avançadas pelos outros Poderes, cabendo-lhe reter jurisdição para monitorar a observância da decisão e o sucesso dos meios escolhidos. Ao atuar assim, reservará aos Poderes Executivo e Legislativo o campo democrático e técnico de escolhas sobre a forma mais adequada para a superação do estado de inconstitucionalidades, vindo apenas a colocar a máquina estatal em movimento e cuidar da harmonia dessas ações.[22]
Conforme se observa, seria encargo do STF: catalisar os debates sobre determinadas situações contrárias à Constituição, coordenar medidas para sanar as violações existentes e monitorar a execução e os resultados dessas ações, respeitando, contudo, as atividades próprias de cada um dos Poderes. Trata-se, pois, de um verdadeiro diálogo institucional. Sobre o tema, o Ministro Luís Roberto Barroso fez importantes observações quanto à necessidade não só de um diálogo institucional, mas também de um diálogo com a sociedade.
Por todo o analisado, restou evidente a configuração de um Estado de Coisa Inconstitucional, consoante esclarece o Ministro Celso de Mello:
Há, efetivamente, no Brasil, um claro e indisfarçável “estado de coisas inconstitucional” resultante – tal como denunciado pelo PSOL – da omissão do Poder Público em implementar medidas eficazes de ordem estrutural que neutralizem a situação de absurda patologia constitucional gerada, incompreensivelmente, pela inércia do Estado que descumpre a Constituição Federal, que ofende a Lei de Execução Penal e que fere o sentimento de decência dos cidadãos desta República.[23] (grifos do autor)
Neste contexto, o Supremo Tribunal Federal, julgou parcialmente procedente a medida cautelar e deferiu os pedidos das alíneas “b” e “h”, com isso, determinou: a realização de audiências de custódia e a liberação de saldo acumulado pelo Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN).
Apesar de não haver previsão para o julgamento de mérito da ADPF, as considerações feitas em sede de cautelar revestem-se de suma importância, na medida em que corroboram para o aperfeiçoamento do instrumento intitulado “Estado de Coisa Inconstitucional”. Ademais, outras ponderações de grande relevância para jurisdição constitucional foram traçadas nessa decisão. Os ministros enfrentaram questões como: interpretação constitucional, o papel do STF enquanto guardião da Constituição, controle jurisdicional de políticas públicas e a reserva do possível.
4 PRÓS E CONTRAS: DISCUSSÃO SOBRE APLICABILIDADE DO ECI NO CONTEXTO JURÍDICO BRASILEIRO
O Estado de Coisa Inconstitucional tem gerado grande polêmica no universo jurídico brasileiro. Argumentos de cunho social, político e jurídico fomentam o debate, o que tem dificultado o alcance do consenso sobre o tema.
As discussões começam já na conceituação do ECI. O jurista Lenio Streck[24] alerta sobre o risco causado pela abrangência do nome do instrumento. Segundo esse autor, um conceito vago abre espaço para o fortalecimento exacerbado do Judiciário. Em sentido semelhante, Lima[25] aponta a necessidade de cautela na definição do papel do Judiciário nesse processo.
De fato, a tese do ECI ainda carece de uma consolidação teórica. Contudo, a jurisprudência da Corte Colombiana já definiu os pressupostos para o reconhecimento do Estado de Coisa Inconstitucional, o que representa uma limitação à sua aplicação arbitrária. Trata-se de uma medida de caráter excepcional que deve ser aplicada apenas em situações igualmente excepcionais.[26]
Diante do alcance que um conceito amplo pode atingir, Lenio Streck[27] indica o ECI como uma forma de ativismo judicial camuflado. Carlos Alexandre de Azevedo Campos[28] defende a ideia do ativismo, entretanto com uma nova roupagem. Para ele o ECI seria um ativismo judicial estrutural dialógico. Esse entendimento é defendido também por Luís Fux[29], Ministro do STF, em seu voto sobre os pedidos cautelares da já mencionada ADPF nº 347.
A discussão sobre ativismo judicial, entretanto, não é nenhuma novidade. Os doutrinadores contrários à prática defendem que esse tipo de atuação do Judiciário representa uma grave afronta ao princípio de separação dos poderes e enorme perigo à democracia.
Todavia, o ativismo dialógico proposto pelo reconhecimento do ECI representa um avanço na comunicação entre os poderes, que devem sempre agir em harmonia, uns com os outros. A compreensão do papel do Judiciário nesse processo refuta completamente a suposta ofensa à separação dos poderes.
Assim, cumpre transcrever mais uma lição de Carlos Alexandre de Azevedo Campos sobre o tema:
Além de superar bloqueios políticos e institucionais, a intervenção judicial estrutural pode ter o efeito de aumentar a deliberação e o diálogo sobre causas e soluções do ECI. Pode provocar reações e mobilizações sociais em torno da implementação das medidas necessárias, mudar a opinião pública sobre a gravidade das violações de direitos e, com isso, influenciar positivamente o comportamento dos atores políticos. Em vez de substituir o debate popular, o ativismo judicial estrutural servirá a ampliar os canais de mobilização social. No mais, adotadas ordens flexíveis e sob monitoramento, mantêm-se a participação e as margens decisórias dos diferentes atores políticos e sociais sobre como superar os problemas estruturais.[30] (grifo nosso)
O entendimento acima estampado encontra respaldo não só nas decisões da Corte Constitucional Colombiana, como também na recente decisão do Supremo Tribunal Federal, na qual se destaca, em diversos momentos, a importância do diálogo institucional e do diálogo com a sociedade:
Nada do que foi afirmado autoriza, todavia, o Supremo a substituir-se ao Legislativo e ao Executivo na consecução de tarefas próprias. O Tribunal deve superar bloqueios políticos e institucionais sem afastar esses Poderes dos processos de formulação e implementação das soluções necessárias. Deve agir em diálogo com os outros Poderes e com a sociedade.[31]
Para Lima,[32] o que se tem de mais valioso no modelo colombiano é esse diálogo. Segundo ele, o ECI é “antes de mais nada, uma forma de chamar atenção para o problema de fundo, de reforçar o papel de cada um dos poderes e de exigir a realização de ações concretas para a solução do problema”. A existência dessa cooperação entre os poderes e da participação da sociedade nesse processo desconstrói a alegação de enfraquecimento da democracia.
Outra crítica relevante feita por Streck[33] diz respeito ao objeto do controle de constitucionalidade. O jurista entende não ser possível a declaração de inconstitucionalidade da realidade empírica, mas sim, apenas as normas jurídicas estariam sujeitas a esse controle.
Contudo, conforme já exposto em tópico anterior, essa questão já foi analisada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da medida cautelar da ADPF nº 347. Na ocasião, o Ministro Gilmar Mendes citou algumas situações em que o Tribunal realizou o controle de um estado de fato, absolutamente incompatível com o texto constitucional, demonstrando ser plenamente viável esse controle quando a situação contrária à Constituição for consequência de ações ou omissões do Poder Público.
Nessa perspectiva, não é razoável que o Judiciário se abstenha de interferir em casos que afrontem gravemente direitos humanos fundamentais, sob alegação de inexistência de disposição expressa na Constituição Federal ou na legislação pátria que autorize, propriamente, o controle de constitucionalidade de situações fáticas. A atuação do STF nesses casos legitima-se diante de sua função de guardião do Constituição e de poder contramajoritário, encontrando respaldo no princípio constitucional supremo, denominada de dignidade da pessoa humana, o qual permeia todo o texto da Carta Magna.
Ademais, muitos questionamentos são levantados quanto à eficácia da declaração do ECI, contexto em que Lima aponta o insucesso do instituto no caso do sistema carcerário colombiano: “a Corte Constitucional, em 2013, proferiu uma nova decisão (T 388-2013) reconhecendo que, apesar da decisão de 1998, o Estado de Coisas Inconstitucional nos cárceres colombianos persistia (ainda que por razões distintas)”.[34]
Entretanto, é preciso levar em consideração que na época da primeira decisão o instituto do ECI ainda era muito recente, os seus pressupostos, bem como os tipos de providências que a Corte deveria tomar ao constatar um Estado de Coisas contrário à Constituição, não estavam bem definidos. Nesse contexto, merecem destaque os ensinamentos de Campos:
É verdade que o uso do Estado de Coisas Inconstitucional pela Corte Constitucional colombiana não surtiu o efeito desejado no caso do sistema carcerário. Todavia, em caso posterior, a corte identificou o insucesso, diagnosticou os erros e avançou nova posição, menos arrogante, mais dialógica e factível ao sucesso. Afirmar a inviabilidade do Estado de Coisas Inconstitucionais em razão de um caso particular, sem examinar suas aplicações vitoriosas posteriores, é contar uma história pela metade. Até porque, categorias dessa natureza, nada ortodoxas, não nascem prontas, são aprimoradas com o tempo e uso.[35]
É imprescindível salientar que a declaração de Estado Coisa Inconstitucional na forma em que é proposta na ADPF nº 347, adapta-se ao modo de atuação adotado pela Corte Constitucional Colombiana em casos um pouco mais recentes, como o caso dos deslocamentos forçados, os quais obtiveram resultados consideráveis.
Por todo exposto, observa-se que o instituto do ECI tem muito a contribuir na promoção de diálogos democráticos entre os poderes e sociedade, na harmonização das funções públicas e na construção de meios de cooperação para superar as situações inconstitucionais.
5 CONCLUSÕES
Ao longo do artigo ora se encerra, foi abordada a possibilidade de se declarar o Estado de Coisa Inconstitucional como forma de obrigar o Estado a adotar medidas cabíveis para sanar uma situação de grave violação de direitos humanos.
Assim, o exame do tema revelou-se extremamente pertinente tanto sob o ponto de vista jurídico quanto social, uma vez que fornece à população mais uma ferramenta de proteção aos direitos humanos através do diálogo institucional proporcionado pela adoção do ECI.
Inicialmente foi analisada a jurisprudência da Corte Constitucional Colombiana sobre o Estado de Coisa Inconstitucional e em seguida as particularidades da ADPF nº 347, restando evidenciadas as principais características do ECI. A partir do estudo realizado, foi possível apontar as principais falhas e acertos da experiência colombiana, fato que contribui para evolução e consolidação do instrumento.
Constatou-se que o grande erro da Corte Colombiana nas primeiras ações em que declarou o ECI foi ter emitido normas específicas e pouco flexíveis, sem conferir certo poder discricionário aos demais órgãos públicos, bem como não monitorar o cumprimento de sua decisão.
Posteriormente, a Corte evoluiu e passou a emitir normas mais flexíveis e gerais, conferindo espaço para que os outros poderes escolham a melhor forma de cumprir com as suas determinações, e começou a supervisionar a fase de implementação dessas medidas. Restou claro que uma das maiores vantagens que se pode extrair da tese colombiana é o diálogo institucional que ela promove.
Por fim, foram apresentados argumentos de grandes juristas brasileiros sobre os pontos positivos e negativos da aplicabilidade do Estado de Coisa Inconstitucional no contexto jurídico brasileiro. Concluindo-se que, embora existam muitas críticas ao instrumento, seu uso pode ser extremamente benéfico para o Brasil, caso seja aplicado com a devida cautela.
Para o sucesso do instrumento e manutenção do equilíbrio institucional, é necessário que se definam bem as situações autorizadoras da declaração do Estado de Coisa Inconstitucional, assim como os parâmetros e limites da atuação judicial.
6 REFERÊNCIAS
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COLÔMBIA. Corte Constitucional. Sala Terceira de Revisão. Processo T-653010 e acumulados. Sentencia de Tutela (T) – 025 de 2004. Disponível em: <http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2004/t-025-04.htm> Acesso em: 21.mar.2018.
LIMA, George Marmelstein. O Estado de Coisas Inconstitucional – ECI: apenas uma nova onda do verão constitucional?. Direitosfundamentais, 02.out.2015. Disponível em: <http://direitosfundamentais.net/2015/10/02/o-estado-de-coisas-inconstitucional-eci-apenas-uma-nova-onda-do-verao-constitucional> Acesso em: 10.fev.2018.
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RODRIGUES, José Rodrigo. Estado de Coisas Surreal. JOTA, 25.set.2015. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/estado-de-coisas-surreal>. Acesso em: 10.fev.2018.
STRECK, Lenio. Estado de Coisa Inconstitucional é uma nova forma de ativismo. Conjur, 24.out.2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-out-24/observatorio-constitucional-estado-coisas-inconstitucional-forma-ativismo> Acesso em: 11.fev.2018.
[1] COLÔMBIA. Corte Constitucional. Pleno. Sentencia de Unificaciòn (SU) – 559 de 1997. Disponível em: <http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/1997/SU559-97.htm> Acesso em: 21.mar.2018.
[2] RIOS, Luis Carlos Alzate. El estado de cosas inconstitucional. Disponível em: <http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/el-estado-de-cosas-inconstitucional> Acesso em: 10.mar.2018.
[3] COLÔMBIA. Corte Constitucional. Sentencia de Unificaciòn (SU) – 559 de 1997, vide nota nº 2. Tradução nossa: A Corte Constitucional tem o dever de colaborar harmoniosamente com os demais órgãos do Estado para realizar seus propósitos. Assim como se deve comunicar a autoridade competente quanto à prática de um delito, não se vê o porquê deva se omitir a notificação de que um certo estado de coisas é uma violação à Constituição Política. O dever de cooperação torna-se imperativo se o remédio administrativo adequado pode evitar o uso excessivo das ações constitucionais. Os recursos da administração da justiça são escassos. Impor o cumprimento diligente das obrigações constitucionais que recaem sobre uma determinada autoridade ajuda a reduzir o número de casos constitucionais, que, de outra forma, inevitavelmente, seriam apresentados, tal ação também constitui meio legítimo através do qual a Corte exerce a sua função guardião da integridade da Constituição e da eficácia dos seus mandatos. Se o estado de coisas, como tal, não é consistente com a Constituição Política e possui relação direta com a violação dos direitos fundamentais, caso seja verificado em um processo de tutela pelo Tribunal Constitucional, a notificação de regularidade existente poderá ser acompanhada por um requerimento específico ou genérico dirigido às autoridades no sentido de realizar uma ação ou abster-se em fazê-lo.
[4] LIMA, George Marmelstein. O Estado de Coisas Inconstitucional – ECI: apenas uma nova onda do verão constitucional?. Direitosfundamentais, 02.out.2015. Disponível em: <http://direitosfundamentais.net/2015/10/02/o-estado-de-coisas-inconstitucional-eci-apenas-uma-nova-onda-do-verao-constitucional> Acesso em: 10.fev.2018.
[5] Esse dois casos são apontados como os mais relevantes por Carlos Alexandre de Azevedo Campos e George Marmelstein Lima.
[6] COLÔMBIA. Corte Constitucional. Sala Terceira de Revisão. Processos T - 137001 e T – 143950. Sentencia de Tutela (T) – 153 de 1998. Disponível em: <http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/1998/t-153-98.htm> Acesso em: 21.mar.2018.
[7] COLÔMBIA. Corte Constitucional. Sala Terceira de Revisão. Processo T-653010 e acumulados. Sentencia de Tutela (T) – 025 de 2004. Disponível em: <http://www.corteconstitucional.gov.co/relatoria/2004/t-025-04.htm> Acesso em: 21.mar.2018.
[8] COLÔMBIA. Corte Constitucional. Sentencia de Tutela (T) – 153 de 1998, vide nota nº 7. Fundamento jurídico nº 3.
[9] Ibidem, fundamento jurídico nº 48. Tradução nossa: As condições de vida nas prisões colombianas violam claramente a dignidade dos prisioneiros e ameaçam outros de seus direitos, tais como a vida e a integridade pessoal, o direito à família, etc. Ninguém ousaria dizer que os estabelecimentos prisionais cumprem a função de ressocialização que lhes foi confiada. Pelo contrário, a situação descrita acima tende antes a confirmar o senso comum segundo a qual os cárceres são escolas do crime, geradoras de ócio, violência e corrupção.
[10] Ibidem, fundamento jurídico nº 11.
[11] Ibidem, fundamento jurídico nº 48.
[12] Ibidem, fundamento jurídico nº 50 e 51. Tradução nossa: A atitude dos gestores de políticas públicas frente ao problema das prisões obedece à lógica do princípio da maioria, que rege os regimes democráticos. Os presos são marginalizados pela sociedade. O próprio fato de que eles estão confinados em estabelecimentos especiais, de difícil acesso, demonstra a condição de alienação dos presos. Sob estas condições, os prisioneiros não constituem um grupo de pressão que possa fazer suas vozes serem ouvidas. Portanto, suas demandas e reclamações são perdidas entre o conjunto de necessidades que afligem as sociedades subdesenvolvidas, como a Colômbia.
A racionalidade constitucional é diferente daquela das maiorias. Os direitos fundamentais são precisamente uma limitação ao princípio da maioria, com o objetivo de garantir os direitos das minorias e dos indivíduos. O juíz Constitucional é obrigado a tomar-se o porta-voz das minorias esquecidas, ou seja, aqueles grupos que raramente têm acesso aos órgãos políticos. Por esta razão, o Tribunal Constitucional é chamado a agir em momentos como o presente, chamando a atenção para o estado de coisa inconstitucional apresentada pelo sistema prisional colombiano e que requer a tomada de medidas por parte das vários entes e órgãos poder, a fim de solucionar a situação que prevalece em prisões colombianas.
[13] CAMPOS. Carlos Alexandre de Azevedo. O Estado de Coisa Inconstitucional e o litígio estrutural. Conjur, 01.set.2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-set-01/carlos-campos-estado-coisas-inconstitucional-litigio-estrutural> Acesso em: 09.fev.2018.
[14] COLOMBIA. Corte Constitucional. Sentencia de Tutela (T) – 025 de 2004, vide nota 8. Considerações e fundamentos nº 7: A Corte, que declarou o Estado de Coisa Inconstitucional em sete ocasiões anteriores ao caso dos deslocamentos forçados, utilizou suas sentenças para ilustrar o conceito e alcance do instrumento.
[15] Ibidem. Tradução nossa: (i) a violação maciça e generalizada de vários direitos constitucionais que afeta um número significativo de pessoas; (ii) omissão prolongada das autoridades no cumprimento das suas obrigações de garantir os direitos; (iii) a adoção de práticas inconstitucionais, como a adoção de práticas inconstitucionais, como a incorporação da tutela judicial como parte do procedimento para garantir direito violado; (iv) a não adoção de medidas legislativas, administrativas ou orçamentárias necessárias para evitar violação de direitos. (v) a existência de um problema social cuja solução depende da intervenção de várias entidades, exige a adoção de conjunto complexo e coordenado de ações e exige um nível de recursos que demanda um esforço orçamental adicional substancial; (vi) se todas as pessoas afetadas pelo mesmo problema virem à tutela para a proteção de seus direitos, iria ocorrer maior congestão judicial.
[16] CAMPOS, op. cit., nota 14.
[17] LIMA, op cit.
[18] CAMPOS, op. cit., nota 14.
[19] Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados (2007-2009).
[20] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. ADPF 347 MC/DF, Rel. Min Marco Aurélio, julgado em 09.set.2015 Inteiro Teor do Acórdão, p. 24.. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/peticaoInicial/verPeticaoInicial.asp?base=ADPF&s1=347&processo=347> Acesso em: 01.fev.2018.
[21] Ibidem, p. 28.
[22] Ibidem, p. 36
[23] Ibidem, p. 159.
[24] STRECK, Lenio. Estado de Coisa Inconstitucional é uma nova forma de ativismo. Conjur, 24.out.2015. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-out-24/observatorio-constitucional-estado-coisas-inconstitucional-forma-ativismo> Acesso em: 11.fev.2018.
[25] LIMA, op. cit.
[26] RODRIGUES, José Rodrigo. Estado de Coisas Surreal. JOTA, 25.set.2015. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/estado-de-coisas-surreal>. Acesso em: 10.fev.2018.
[27] STRECK, op. cit.
[28] CAMPOS, Carlos Alexandre de Azevedo. Estado de Coisas Inconstitucional. JOTA, 04.mai.2015. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/jotamundo-estado-de-coisas-inconstitucional> Acesso em: 09.fev.2018.
[29] ADPF nº 347. op. cit. Inteiro Teor do Acórdão, p 113.
[30] CAMPOS, op. cit., nota 29.
[31] ADPF 347, inteiro teor do acórdão, p. 36.
[32] LIMA, op. cit.
[33] STRECK, op. cit.
[34] LIMA, op. cit.
[35] CAMPOS, op. cit., nota 14.
Graduada em Direito pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB. Pós-graduada em Direito Público pela Faculdade Damásio de Jesus. Pós-graduada em Direito Constitucional pela Universidade Candido Mendes - UCAM Advogada.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARCOLINO, Fabíola Vilela Chaves. O estado de coisa inconstitucional e sua aplicabilidade no sistema jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 fev 2020, 04:31. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54217/o-estado-de-coisa-inconstitucional-e-sua-aplicabilidade-no-sistema-jurdico-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
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