Resumo: O presente trabalho tem por objetivo proporcionar uma reflexão acerca dos instrumentos legais que visam a eliminar e coibir o trabalho infantil no Brasil, tendo por fundamento a legislação internacional e a legislação nacional, com especial destaque para as normas de direito internacional que tratam sobre o tema, quais sejam: a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança da ONU e a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que dispõe sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação, bem como as seguintes espécies normativas do direito nacional: o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Consolidação das Leis do Trabalho, a Constituição Federal de 1988 e o princípio da Proteção Integral. Finalmente, ressalta-se o relevante papel que possui o Estado, a sociedade e as famílias, a fim de proteger e evitar que crianças e adolescentes sejam inseridos no trabalho infantil, uma vez que devem buscar todos os meios e tomar todas as medidas necessárias para o cumprimento dos instrumentos normativos mencionados acima.
Palavras-Chave: Criança. Adolescente. Trabalho infantil. Proteção Integral.
Abstract: The present work aims to provide a reflection on the legal instruments that aim to eliminate and curb child labor in Brazil, based on international and national legislation, with special emphasis on the rules of international law dealing with the theme , namely: the UN International Convention on the Rights of the Child and Convention 138 of the International Labor Organization (ILO), which provides for the Prohibition of the Worst Forms of Child Labor and Immediate Action for their Elimination, as well as the following species norms of national law: the Statute of Children and Adolescents, the Consolidation of Labor Laws, the Federal Constitution of 1988 and the principle of Integral Protection. Finally, the relevant role of the State, society and families is emphasized, in order to protect and prevent children and adolescents from being inserted in child labor, since they must seek all means and take all necessary measures to compliance with the normative instruments mentioned above.
Keywords: Kid. Teenager. Child labor. Comprehensive Protection.
Sumário: 1. Introdução. 2. Legislação Internacional. 2.1 A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança da ONU. 2.2 A Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que dispõe sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação. 3. Legislação Nacional. 3.1 As disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente. 3.2 As disposições da Consolidação das Leis do Trabalho acerca dos menores de 18 anos. 3.3 As disposições da Constituição Federal de 1988 sobre o trabalho dos menores de 18 anos. 3.4 O princípio da proteção integral. 4. Conclusão. 5. Referências.
1. Introdução
É de conhecimento geral que as crianças precisam de proteção e cuidados especiais, principalmente durante os primeiros anos de vida. Diferentemente de outros animais, que já nascem andando, comendo e com uma certa independência dos genitores, ao nascer, a espécie humana é totalmente dependente e sem o auxílio de adultos estaria certamente fadado à morte.
Na seara laboral não é tão diferente, pois para que sejam executadas determinadas tarefas, atividades e ofícios profissionais, é necessária a aquisição de técnicas e conhecimentos manuais e básicos ou aprimorados, a depender do tipo de trabalho a ser realizado, a fim de que haja desempenho exitoso.
Também é preciso que se tenha determinada idade e necessária compleição e formação física, intelectual e psíquica, e modo que sejam praticadas determinadas atividades laborais, como por exemplo o trabalho noturno, perigoso ou insalubre.
Por conta disso e tendo em vista a situação peculiar de que as crianças e os adolescentes estão em crescente e constante desenvolvimento, há uma farta legislação internacional e nacional, que tem a finalidade eliminar e coibir o trabalho infantil no Brasil e no mundo.
Assim, não é por falta de legislação que se deixará de combater e erradicar o trabalho infantil, pois há instrumentos normativos específicos que tratam, disciplinam e punem seus infratores, visando a proteger crianças e adolescentes contra os malefícios do trabalho infantil e contra a desenfreada exploração econômica.
2. Legislação Internacional
No direito internacional são destacadas, em especial, duas convenções, que trazem disposições a respeito do dever do Estado e de todos de eliminar e combater o trabalho infantil, sobretudo em suas piores formas. Vejamos cada uma das convenções nos aspectos concernentes ao trabalho infantil.
2.1 A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança da ONU
No âmbito da legislação internacional sobre o trabalho infantil, bem como sobre os direitos das crianças e dos adolescentes, destaca-se na seara da Organização das Nações Unidas (ONU), a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, introduzida no direito brasileiro através da aprovação pelo Decreto Legislativo n. 28, de 14 de setembro de 1990, e promulgada pelo Decreto n. 88.710, de 21 de novembro de 1990.
A Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança na ONU assevera o compromisso mundial com a Teoria da Proteção Integral, pois estabelece no artigo 27, item 1, o seguinte: os Estados Partes reconhecem o direito de todas as crianças a um nível de vida adequado ao seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e social[1].
Por sua vez, artigo 32 possui diversas proteções contra a exploração do trabalho infantil, impondo que os Estados Partes devem estabelecer limites de idade mínima para a admissão no mercado de trabalho. Vejamos os dispositivos:
- estabelecer uma idade mínima ou idades mínimas para a admissão no trabalho;
- estabelecer regulamentação apropriada relativa a horários e condições de trabalho;
- estabelecer penalidades ou outras sanções apropriadas para assegurar o cumprimento efetivo deste artigo”[2].
Assim, a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança na ONU reconhece o direito das crianças e dos adolescentes de estarem protegidos contra a exploração econômica e contra o exercício de qualquer atividade laboral que possa ser perigoso ou interferir em sua educação, ou que seja prejudicial e nocivo para sua saúde ou para seu desenvolvimento físico, mental espiritual, moral ou social.
Nesse sentido, pode-se inferir que a convenção supra assevera uma proteção integral às crianças e aos adolescentes, princípio fundamental de direitos humanos que visa proteger e garantir os direitos mais basilares de crianças e adolescentes, tais como educação, prestação de serviços de saúde, lazer , moradia e alimentos.
É de se ressaltar que a diretriz convencional não define propriamente o que seja trabalho infantil, mas tem a finalidade de proteger essa população vulnerável contra a exploração no trabalho, principalmente ao definir limites de idade para admissão ao trabalho, a ser imposta pela legislação de cada país-membro.
2.2 A Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho
Por sua vez, a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), dispõe sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação. Essa convenção foi Convocada em Genebra pelo Conselho de Administração da Secretaria Internacional do Trabalho e reunida em 1ª de junho de 1999, em sua 87ª Reunião, tendo sido aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo n. 178, de 14.12.1999, do Congresso Nacional, ratificada em 02 de fevereiro de 2000 e promulgada pelo Decreto n. 3.597, de 12 de setembro de 2000, com vigência nacional em 02 de fevereiro de 2001[3].
A presente convenção tem a finalidade de proteger as crianças e os adolescentes contra abusos e explorações decorrentes das práticas de trabalho infantil no mundo, principalmente com o objetivo de erradicar as piores formas do trabalho infantil. Assim, a OIT, que é o organismo internacional responsável pelo controle e emissão de normas internacionais referentes ao trabalho, apresentou garantias mínimas de proteção.
A Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que dispõe sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação, já informa em sua exposição de motivos, direitos basilares e fundamentais das crianças e dos adolescentes. Vejamos:
“Considerando a necessidade de adotar novos instrumentos para proibição e eliminação das piores formas de trabalho infantil, como a principal prioridade de ação nacional e internacional, que inclui cooperação e assistência internacionais, para complementar a Convenção e a Recomendação sobre Idade Mínima para Admissão a Emprego, de 1973, que continuam sendo instrumentos fundamentais sobre trabalho infantil[4];
Considerando que a efetiva eliminação das piores formas de trabalho infantil requer ação imediata e global, que leve em conta a importância da educação fundamental e gratuita e a necessidade de retirar a criança de todos esses trabalhos, promover sua reabilitação e integração social e, ao mesmo tempo, atender as necessidades de suas famílias”[5];
Com isso, percebe-se que a referida convenção busca adotar medidas normativas legais que possibilitem proibir e eliminar as piores formas do trabalho infantil e deve ser tratada como prioridade nos planos dos Estados Partes, assim como no âmbito internacional.
Além disso, o combate ao trabalho infantil e as suas piores formas requer ação imediata e orquestrada de forma global, com a retirada das crianças e adolescentes encontrados nessas situações, com a promoção de integração social, onde se revela de suma importância a inserção educacional, a fim de que os retirados não retornem ao trabalho infantil, como comumente se verifica em situações de simples retirada sem quaisquer apoios sociais.
Passemos agora a conhecer alguns dispositivos legais da convenção 138, para melhor compreensão do tema.
“Artigo 1º:
Todo Estado-membro que ratificar a presente Convenção deverá adotar medidas imediatas e eficazes que garantam a proibição e a eliminação das piores formas de trabalho infantil em caráter de urgência”[6].
O artigo 1º da presente convenção já destaca a obrigação que possuem os Estados-membros, como o Brasil, que ratificou o convenção, de tomarem medidas céleres, imediatas e eficazes, para garantir a proibição e eliminação do trabalho infantil, sobretudo, suas piores formas, tendo em vista que priva as crianças e os adolescentes de viverem e aprenderem as coisas típicas dessa fase da vida.
De acordo com a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho, em seu artigo 2º, o termo criança designa toda pessoa menor de 18 anos, ou seja, compreende tanto as crianças que possuem até 12 anos de idade (conforme legislação nacional), como os adolescentes, que possuem entre 12 até 18 anos.
Por sua vez, o artigo 3º da Convenção 138 apresenta a compreensão do que se entende por piores formas de trabalho infantil, em um rol exemplificativo. Vejamos:
“Para os fins desta Convenção, a expressão as piores formas de trabalho infantil compreende:
a) todas as formas de escravidão ou práticas análogas à escravidão, como venda e tráfico de crianças, sujeição por dívida, servidão, trabalho forçado ou compulsório, inclusive recrutamento forçado ou obrigatório de crianças para serem utilizadas em conflitos armados;
b) utilização, demanda e oferta de criança para fins de prostituição, produção de pornografia ou atuações pornográficas;
c) utilização, recrutamento e oferta de criança para atividades ilícitas, particularmente para a produção e tráfico de entorpecentes conforme definidos nos tratados internacionais pertinentes;
d) trabalhos que, por sua natureza ou pelas circunstâncias em que são executados, são suscetíveis de prejudicar a saúde, a segurança e a moral da criança"[7].
Pelo excerto acima, compreende-se como piores formas de trabalho infantil, a escravidão ou prática semelhantes à escravidão, como por exemplo, venda e tráfico de crianças; utilização de crianças para prostituição e produção de pornografia; recrutamento e oferta de crianças para práticas ilícitas, como quaisquer práticas criminosas, bem como trabalhos que causem malefícios à saúde e à segurança das crianças.
A Convenção em epígrafe ressalta a importância da educação para se eliminar as piores formas de trabalho infantil, com destaque para as seguintes medidas estatais:
“Artigo 7º, item 2:
Todo Estado-membro, tendo em vista a importância da educação para a eliminação do trabalho infantil, adotará medidas efetivas para, num determinado prazo:
a) impedir a ocupação de crianças nas piores formas de trabalho infantil;
b) dispensar a necessária e apropriada assistência direta para retirar crianças das piores formas de trabalho infantil e assegurar sua reabilitação e integração social;
c) garantir o acesso de toda criança retirada das piores formas de trabalho infantil à educação fundamental gratuita e, quando possível e adequado, à formação profissional;
d) identificar crianças particularmente expostas a riscos e entrar em contato direto com elas; e,
e) levar em consideração a situação especial das meninas”[8].
Por fim, cumpre destacar que esses instrumentos internacionais comentados acima estão inseridos no ordenamento jurídico brasileiro e são de observância e cumprimento obrigatório pelo Brasil, uma vez que nosso país é signatário da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança da ONU e da Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que dispõe sobre a Proibição das Piores Formas de Trabalho Infantil e Ação Imediata para sua Eliminação.
3. Legislação Nacional
O Brasil também possui uma vasta legislação que protege crianças e adolescentes contra a exploração e abusos advindos da prática de trabalho infantil, desde normas infraconstitucionais até normas de estatura constitucional, como veremos a seguir.
Essas normas são de ordem pública e de observância cogente por todos os membros e atores da sociedade brasileira. Além disso, existe dois importantes princípios, o da proteção integral e o da prioridade absoluta, que ditam proteções e atenções especiais às crianças e aos adolescentes de nosso país.
Assim, vamos conhecer as disposições das espécies normativas do ordenamento jurídico brasileiro pertinentes aos direitos das crianças e dos adolescentes e sua proteção contra o trabalho infantil.
3.1 As disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente
O estatuto da criança e do adolescente foi consagrado pela Lei n º 8.069, de 13 de julho de 1990, constituindo-se num verdadeiro sistema de garantias e direitos de crianças e de adolescentes, concedendo especial proteção aos menores 18 anos, e, em caráter excepcional, aos que possuem até 21 anos, conforme determina seu art. 2º.
Trata-se de um sistema que visa resguardar os direitos fundamentais de crianças e de adolescentes conferidos pelo artigo 227 da Constituição Federal de 1988, em que sua efetivação tem seu campo de aplicação amparado com status de prioridade absoluta e de proteção integral, tendo por finalidade assegurar proteção total e em todos os aspectos da vida infanto-juvenil.
Vejamos alguns direitos previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente sobre esses direitos e garantias.
“Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem”[9].
O estatuto também trata do direito à Profissionalização e à Proteção no Trabalho no capítulo V, por meio de diversos artigos. Passemos aos dispositivos legais.
“Art. 60. É proibido qualquer trabalho a menores de quatorze anos de idade, salvo na condição de aprendiz.
Art. 61. A proteção ao trabalho dos adolescentes é regulada por legislação especial, sem prejuízo do disposto nesta Lei
Art. 66. Ao adolescente portador de deficiência é assegurado trabalho protegido.
Art. 67. Ao adolescente empregado, aprendiz, em regime familiar de trabalho, aluno de escola técnica, assistido em entidade governamental ou não-governamental, é vedado trabalho:
I - noturno, realizado entre as vinte e duas horas de um dia e as cinco horas do dia seguinte;
II - perigoso, insalubre ou penoso;
III - realizado em locais prejudiciais à sua formação e ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social;
IV - realizado em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.
Art. 68. O programa social que tenha por base o trabalho educativo, sob responsabilidade de entidade governamental ou não-governamental sem fins lucrativos, deverá assegurar ao adolescente que dele participe condições de capacitação para o exercício de atividade regular remunerada.
§ 1º Entende-se por trabalho educativo a atividade laboral em que as exigências pedagógicas relativas ao desenvolvimento pessoal e social do educando prevalecem sobre o aspecto produtivo.
§ 2º A remuneração que o adolescente recebe pelo trabalho efetuado ou a participação na venda dos produtos de seu trabalho não desfigura o caráter educativo.
Art. 69. O adolescente tem direito à profissionalização e à proteção no trabalho, observados os seguintes aspectos, entre outros:
I – respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento;
II - capacitação profissional adequada ao mercado de trabalho”[10].
Pela quantidade e qualidade dos artigos supracitados, o diploma legal apresenta uma série de proteções às crianças e aos adolescentes concernentes ao mundo do trabalho, visando assegurar proteção integral nas situações que possam causar prejuízos ao desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, bem como o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Nesse sentido, o trabalho no Brasil só é possível a partir dos 14 (catorze) anos e, mesmo assim, regulado por legislação especial que estabeleça um contrato de trabalho especial para as situações trabalhos possíveis de serem exercidas por adolescentes contratados no mercado de trabalho. Destaque-se essa possibilidade apenas na condição de aprendizes.
Ademais, importa acrescer que, nos termos do artigo 429 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), os estabelecimentos de qualquer natureza são obrigados a empregar e matricular nos cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem número de aprendizes equivalente a cinco por cento, no mínimo, e quinze por cento, no máximo, dos trabalhadores existentes em cada estabelecimento, cujas funções demandem formação profissional[11].
As normas legais supracitadas, em reprodução às normas constitucionais, ainda proíbem o trabalho de qualquer adolescente, inclusive os maiores de 14 anos, em situações de trabalho noturno, perigoso ou insalubre. Essas trabalhos somente podem ser realizados no Brasil a partir dos 18 anos.
3.2 As Disposições da Consolidação das Leis do Trabalho acerca do trabalho dos menores de 18 anos
A Consolidação das Leis do Trabalho reservou um capítulo inteiro, qual seja, o capítulo IV, no título III, para dispor acerca do trabalho dos menores de 18 anos. Assim, de acordo com a CLT, o menor, para os efeitos da legislação trabalhista, é aquele que possui entre quatorze até dezoito anos, consoante dicção do artigo 402.
Além disso, no artigo 403, a CLT vedou expressamente a realização de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos de idade, salvo na condição de aprendiz e a partir dos quatorze anos. Mas, quando permitido, esse trabalho não poderá ser realizado em locais prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em horários e locais que não permitam a freqüência à escola.
Também a CLT proíbe o trabalho noturno aos menores de 18 anos no artigo 404, que compreende a atividade laboral exercida no período de 22 (vinte duas) horas de um dia até às 05 (cinco) horas do dia seguinte, assim como nos locais e serviços perigosos ou insalubres, nos termos do artigo 405, I e o trabalho em locais ou serviços prejudiciais à sua moralidade, conforme artigo 405, II.
3.3 Disposições da Constituição Federal sobre o trabalho de menores de 18 anos
É conhecido no direito pátrio que as normas previstas na Constituição Federal de 1988 possuem eficácia normativa e irradiam sua força por todo o ordenamento jurídico, tendo em vista o princípio da supremacia da Constituição Federal e a rigidez constitucional, que são parâmetros norteadores, orientadores e conformadores das demais espécies normativas.
Nesse sentido, a própria Constituição da República de 1988, alterada pela Emenda Constitucional nº 20, em 15 de dezembro de 1998, dispôs sobre os limites de idade mínima para o trabalho no Brasil, conforme seu artigo 7º, XXXIII, que passou a vigorar da seguinte forma:
“proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de 18 (dezoito) anos e de qualquer trabalho a menores de 16 (dezesseis) anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de 14 (quatorze) anos”[12].
Noutra passagem, a Constituição Federal de 1988, tratando de assuntos pertinentes à área social e afetos diretamente à proibição do trabalho infantil, estabelece o seguinte no artigo 227:
"É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".
Assim, o princípio da absoluta prioridade é erigido com estatura constitucional e deve ser assegurado às crianças e aos adolescentes de nosso país, sendo, pois dever de todos assegurá-lo, a fim de colocar as crianças e os adolescentes a salvo de qualquer forma de exploração (aqui se inclui a exploração do trabalho), violência, crueldade e opressão.
Desse modo, caso haja colisão de direitos constitucionais de crianças e de adolescentes em relação a outros direitos de indivíduos maiores de 18 anos, com base no princípio constitucional da absoluta prioridade, há que haver preponderância e concretização, inicialmente, dos direitos daqueles, pois ensejam proteção especial, haja vista sua situação peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Com relação ao combate ao trabalho infantil e ao regramento normativo, o Brasil encontra-se particularmente adiantado em relação aos demais países no que se refere à existência de legislação proibitiva ao trabalho infantil e de proteção aos direitos da criança e do adolescente, bem como existe um intenso combate nacional a essa prática ilegal, que é executada pelo Estado brasileiro através do Ministério da Economia (antigo Ministério do Trabalho), com atuação específica e privativa dos Auditores-Fiscais do Trabalho.
Esses servidores públicos federais exercem o papel fundamental de combater o trabalho infantil no Brasil. Assim, no âmbito da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério da Economia há um projeto nacional específico de combate ao trabalho infantil e que deve ser executado por todas as unidades administrativas descentralizadas nos Estados-membros, normalmente as Superintendências Regionais do Trabalho.
3.4 O Princípio da Proteção Integral
Tanto no Brasil como no mundo inteiro, nos primórdios das sociedades, as crianças e os adolescentes não eram tratados como sujeitos de direitos, mas, como objetos que eram utilizados para as atividades laborais, tendo em vista que podiam ser manipulados facilmente e ganhavam menos que os demais trabalhadores.
Entretanto, com o passar do tempo e durante as revoltas e mobilizações de trabalhadores promovidas durante o período da Revolução Industrial, as crianças e os adolescentes foram reconhecidos como pessoas e sujeitos de direitos, ocorrendo, assim, uma evolução de seus direitos e garantias.
No Brasil, no ano de 1927, foi publicado o Decreto 17.943-A, que veio a ser a primeira legislação sobre os menores, chamado de Código Mello Matos. Essa legislação trouxe importantes inovações, como a figura do juiz de menores, centralizando todas as decisões referentes ao destino dos menores infratores.
Porém, o papel da família como parte integrante e necessária do desenvolvimento do menor era suprimido, dando-se mais importância ao recolhimento dos infratores como forma de proteger a sociedade do que se dedicando a resolver a questão. Esse pensamento ficou conhecido como doutrina da situação irregular.
Assim, não existia política de proteção aos menores, mas sim de proteção à sociedade. Por isso, os menores eram retirados do seio familiar e abrigados em casas de menores.
Nesse contexto, o princípio da proteção integral floresceu com a evolução dos direitos sociais, a fim de impor limites ao poder do Estado e assegurar garantias e direitos de liberdade aos mais necessitados, sobretudo às crianças.
Nesse sentido, a Constituição Federal de 1988 veio para nortear a construção e orientação do ordenamento jurídico nacional, com especial atenção à proteção dos direitos da criança e do adolescente.
Com isso, conforme dicção prevista na Lei Fundamental do país, parte-se do pressuposto de que os menores de 18 anos não são detentores de capacidade de exercício de seus direitos e obrigações ou pelo menos da maior parte dos atos da vida civil.
Por isso, necessitam de especial proteção de terceiros (família, sociedade e Estado), a fim de que possam resguardar e garantir os direitos basilares que são próprios dessa fase de desenvolvimento humano.
Os autores Cury, Garrido e Marçura ensinam que:
“A proteção integral tem como fundamento a concepção de que crianças e adolescentes são sujeitos de direitos, frente à família, à sociedade e ao Estado. Rompe com a idéia de que sejam simples objetos de intervenção no mundo adulto, colocando-os como titulares de direitos comuns a toda e qualquer pessoa, bem como de direitos especiais decorrentes da condição peculiar de pessoas em processo de desenvolvimento” (2002, p. 21).
Pelo exposto acima, percebe-se que o princípio da proteção integral pressupõe direitos às crianças e aos adolescentes que podem ser contrários até mesmo às famílias, mas, sempre visando especial proteção e em benefício dos protegidos, sobretudo porque estabelece que as crianças e os adolescentes são titulares de direitos da mesma forma que os adultos, tendo em vista sua situação peculiar de pessoa em desenvolvimento.
É de se inferir ainda que o princípio da proteção integral disciplina a relação das crianças e dos adolescentes com suas famílias, com a sociedade e o com o próprio Estado, uma vez que estes devem assegurar e garantir a concretização dos direitos daqueles, principalmente os direitos mais basilares de alimentação, saúde, educação, segurança e moradia.
Assim, é preciso que o Estado e a sociedade busquem cada vez mais a concretude do princípio da proteção integral, a fim de verem as crianças e os adolescentes assistidos por todos os seus direitos para, dessa forma, construirmos uma sociedade justa, igualitária e fraterna, conforme estabelece a Constituição Federal.
O presente trabalho se presta a conscientizar e fazer uma reflexão sobre os fartos instrumentos normativos existentes no direito internacional e nacional, acerca das proteções especiais dirigidas às crianças e aos adolescentes, que devem ser conhecidas como pessoas em constante desenvolvimento.
Nesse sentido, os direitos e as garantias previstas nas espécies normativas tratadas devem ser perseguidos pelo Estado, pela sociedade e por todos os familiares, a fim de poder alcançar todos os lugares e regiões de nosso país.
Com isso, busca-se adicionar considerações ao vasto material acadêmico já publicado a respeito do tema, mas, com enfoque legal e constitucional e também à luz do princípio da proteção integral. Por isso, os direitos sociais constitucionalmente estabelecidos no artigo 6º da Carta Magna, como à alimentação, à saúde, à educação, ao lazer, à moradia, devem ser disponibilizados a todos, principalmente aos que se encontrados em situação peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Por fim, cumpre destacar que é dever de todos, em todas as regiões de nosso país, de Norte a Sul e de Leste a Oeste, dos Poderes Públicos, da família e da sociedade atuar para a concretização fática dos direitos e garantias das crianças e dos adolescentes, a fim de protegerem contra a exploração econômica e social, que é o cerne do trabalho infantil.
Presidência da República. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
_________Presidência da República. Decreto-Lei 5.452, de 01 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Direito Constitucional. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
Convenção sobre os Direitos da Criança. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.unicef.org/brazil/convencao-sobre-os-direitos-da-crianca > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
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CURY, Munir; PAULA, Paulo Afonso Garrido de; MARÇURA, Jurandir Norberto. Estatuto da criança e do adolescente anotado. 3ª ed., rev. E atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
[1] Convenção sobre os Direitos da Criança. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.unicef.org/brazil/convencao-sobre-os-direitos-da-crianca > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[2] Convenção sobre os Direitos da Criança. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.unicef.org/brazil/convencao-sobre-os-direitos-da-crianca > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[3] Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236696/lang--pt/index.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[4] Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236696/lang--pt/index.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[5] Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236696/lang--pt/index.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[6] Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236696/lang--pt/index.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[7] Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236696/lang--pt/index.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[8] Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho. Direito Internacional. Disponível em: < https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_236696/lang--pt/index.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[9] Presidência da República. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[10] Presidência da República. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
[11] Presidência da República. Decreto-Lei 5.452, de 01 de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm > Acesso em 24 de fevereiro de 2020
[12] Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Direito Constitucional. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. > Acesso em 24 de fevereiro de 2020.
Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Acre, servidor público federal, exercendo o cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho desde 2011. Também é advogado, mas, por conta do cargo público, não pode exercer a advocacia.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BANDEIRA, Valdemar Neto Oliveira. Os instrumentos legais que visam eliminar e coibir o Trabalho Infantil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 fev 2020, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54265/os-instrumentos-legais-que-visam-eliminar-e-coibir-o-trabalho-infantil. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
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