No que tange as relações de consumo não há dúvidas quanto a posição de fragilidade do consumidor frente aos fornecedores.
O Estado consagrou sua proteção através do Código de Defesa do Consumidor, onde o enquadrou como vulnerável.
A partir do enquadramento, o que de fato é, houve a facilitação da busca pelos direitos.
E não se pretende aqui discutir tal enquadramento, mas sim, chamar a atenção ao fato que ser vulnerável não equivale, obrigatoriamente, estar vulnerável.
A vulnerabilidade é uma situação que podemos nos encontrar, ou não, no exato momento da negociação, ou durante a prestação do serviço.
Até ontem deparávamos com situações de vulnerabilidade apenas do consumidor. Porém, nos dias atuais, impossível não atentarmos a frágil situação no qual encontram-se a maioria dos fornecedores, com ressalva do setor alimentício.
Vislumbra-se que diante das consequências para se conter a disseminação do Covid-19, que inicialmente foi de total isolamento, a maioria dos fornecedores encontram-se em estado de total fragilidade.
Isso porque ninguém é capaz de prever o dia de amanhã, muito menos a situação em que nos encontraremos daqui a alguns meses. Portanto, inevitável concluir que diante da situação imposta, estes fornecedores estão vulneráveis.
Em algumas localidades as Industrias encontram-se fechadas, e assim deverão permanecer, reabrindo com pessoal muito reduzido. O que também se estende ao comércio.
As instituições de ensino, inevitavelmente tendo que adaptar-se as aulas a distância, garantindo a entrega na prestação do serviço, mesmo que diverso do contratado. A opção também beneficia os professores, que mantém garantido o salário.
Paralelamente sabemos que o consumidor não é obrigado a receber serviço diferentemente do contratado, mas o que sobressairá? O bom senso visando o bem estar da coletividade ou o interesse individual?
Quanto as indústrias, um exemplo é que passaram semanas impossibilitadas ao fornecimento de assistência técnica nos produtos que colocou a disposição no mercado. Isso porque não havia procedimento nem pessoal apto para atender os acionamentos.
Hoje, as frases de efeitos e suposta consciência de solidariedade são bem aceitas e inclusive replicadas. Porém, o bom senso pode ser passageiro, e o que hoje se diz compreensivo, amanhã, pode não mais fazer sentido. Principalmente diante da assombrosa mudança de perspectiva sobre a economia.
Com isso aumentará o interesse na distribuição de ações motivadas por consumidores “vulneráveis”.
Porém, inevitavelmente os fornecedores deverão enquadra-se no mesmo estado de vulnerabilidade. Porque assim, diante da pandemia do coronavírus, também se encontram.
Seria imprudente e porque não dizer, injusto, impor ao fornecedor a responsabilidade por danos morais, mesmo que sobrevenha de “aparente” falha na prestação de seu serviço. Devemos lembrar que não decorreu de uma motivação intencional, mas sim porque encontra-se numa situação tão vulnerável quanto o próprio consumidor.
Não ha o que se falar em falha, muito menos em ilícito sobre os litígios decorrentes das relações consumeristas que se enquadrarem no período de vulnerabilidade do fornecedor.
Para tanto, entende que a mesma previsão do artigo 5º da Medida Provisória nº 948 de 8 de abril de 2020, onde a falha ou a falta do serviço se constitui caso fortuito e força maior, deverá ser estendida, por analogia, a todas as relações de consumo.
Este será o momento do nobre colega e advogado, ao ser consultado, pensar também na coletividade, relembrando o consumidor dos efeitos negativos já gerados pela pandemia na economia, o instruindo a litigar estritamente sobre o direito, e não com intuito de punição.
Será preciso atuar dentro de interesses que beneficiem não apenas o individuo, mas toda a coletividade. Ótima oportunidade para acordos extrajudiciais.
Porém, se nada der certo e as demandas ainda forem impetradas, caberá aos magistrados as administrarem de forma a não incentivar ações que visem apenas interesses individuais, pois estes não podem se sobressair aos coletivos. Lembrando que não se discute o “aparente” direito, porém inevitável levar em consideração a situação de vulnerabilidade que encontram-se os fornecedores frente as consequências do isolamento obrigatório provocado pela pandemia do coronavírus.
Por fim, é prudente que todos usem de bom senso, pois é preciso entender a fragilidade dos fornecedores, que neste momento já estão envolvidos por inúmeros fatores negativos, sendo que eventuais condenações sem a devida cautela, principalmente em “supostos” danos morais, servirá apenas como golpe fatal, que gerará rompimento de vínculos trabalhistas e relações contratuais, inclusive com outros fornecedores. Afinal de contas a pessoal jurídica também mantém relação enquanto consumidor final.
Não é muito difícil constatar que tudo faz parte de uma cadeia de consumo e relações. Então, importante agir e manter a consciência de modo a unirmos forças visando o bem estar coletivo, dando oportunidade das empresas saírem da condição de vulnerabilidade que se encontram.
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