RESUMO: O presente trabalho busca de forma sucinta e prática, analisar a possibilidade de resolução de cláusulas dos Contratos de Alienação Fiduciária em Garantia, aplicando, para tanto, exclusivamente o Código de Defesa do Consumidor e a fundamentação por este adotada no caso em comento. Teoria da quebra da base do negócio jurídico, surgida na Alemanha e tem como premissa, para que os contratos atendam os critérios atuais de busca da equidade das partes contratantes, devem ser revestidos ou supervenientemente conter critérios de resolução, tendo como impulsão o fato que o tornou excessivamente oneroso.
Palavras-chave: Direito do Consumidor; Pandemia da COVID-19; onerosidade excessiva; resolução de cláusulas contratuais; Princípio da Equidade; Teoria da quebra da base do negócio jurídico.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. TEORIAS ALICERCES DE DIREITO A REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL; 3. “DIRIGISMO JUDICIAL” E A RESOLUÇÃO DE CLÁUSULA QUE SE TORNOU EXCESSIVAMENTE ONEROSA; 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS E WEBGRÁFICAS.
1. INTRODUÇÃO
O Direito Constitucional com o evoluir social, ganha amplo poder de mandamento de otimização das demais fontes normativas, não tratado neste trabalho, a Constitucionalização do direito é tema de suma importância e fonte da fundamentação em reanálise do direito privado, ou seja, da relativização do direito privado em favor de toda uma coletividade ou de direitos fundamentais do indivíduo enquanto pessoa. Na temática levantada neste trabalho, o consumidor.
Nesse norte, o presente Artigo faz a exposição de Teorias que buscam fundamentar a criação de mecanismos de mitigação do Princípio Pacta Sunt Servanda, consequentemente demonstrando que o mesmo não é absoluto e, nessa linha, o trabalho segue para expor que quando supervenientemente ou não surge uma causa que tornou um contrato ou cláusula deste, excessivamente onerosa ao consumidor, essas Teorias vêm para fundamentar a possibilidade de resolução em benefício de ambas as partes, sempre buscando soluções que façam o contrato cumprir o seu fim sem levar prejuízos, num elo de cooperação e Boa-fé.
Para tanto, é necessário à demonstração por parte do consumidor que em razão da Pandemia da Covid-19 e as medidas Estatais de prevenção e combate, ao exemplo do distanciamento social e do não funcionamento de estabelecimentos comerciais não essenciais, as cláusulas de determinado contrato se tornaram impossíveis de serem cumpridas, no caso em epígrafe, é necessário demonstrar que a impossibilidade do trabalho ou de exercer a função mantenedora da adimplência econômica do contrato, em razão das medidas de saúde adotadas são alicerces para a resolução de cláusula de contrato de alienação fiduciária em garantia, logicamente, para reduzir o valor da parcela mensal.
2. TEORIAS ALICERCES DE DIREITO A REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL
Como visto na introdução, o presente trabalho se atentará a revisão de cláusula contratual que se tornou onerosamente excessiva na linha das relações de consumo, momento este, indispensável o destaque da Súmula 297 do STJ, “o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”. Em regra, o evoluir das normas é no sentido de equilibrar determinada situação fática jurídica que se encontra em desacordo com os princípios máximos do direito, portanto, o CDC vem para ocupar uma função garantidora de direitos ao consumidor que, historicamente ocupou um polo de grande desvantagem na relação contratual.
O direito do Consumidor a revisar um contrato que se tornou onerosamente excessivo, ampara-se em diversas Teorias, ambas contidas como fundamento de ordem civil e de consumo, todavia, de forma concisa, faremos a exposição das três preponderantes na pós-modernidade trazidas do Direito Italiano, Francês e Alemão, e, por último, eleger a que mais se adequa a situação fática das relações jurídicas de consumo. Nesse diapasão, a Teoria da Imprevisão:
A referida cláusula de influência italiana foi designada pela doutrina moderna como Teoria da Imprevisão, visto que se baseia na revisão contratual fundada na imprevisibilidade dos fatores supervenientes que suscitavam excessiva onerosidade para uma das partes do negócio jurídico, de maneira que é pressuposto da Teoria da Imprevisão o fato de que, na ocasião do fechamento do negócio, as partes não tinham condições de prever os acontecimentos ocorridos (NUNES, 2008, p. 141).
Código Civil - Art. 317. Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.
Portanto, quando se tem um Contratante que por causas subjetivas, goza de uma única fonte de renda, ocupa exclusivamente uma função que por motivos naturais alheios a sua vontade ficara impedido de honrar com seus compromissos, estar-se-á diante da imprevisibilidade, contudo, notório é, que a humanidade já passou por grandes estiagens, pandemias, dentre outros fatos naturais, logo, a imprevisibilidade estrita não se mostra adequada a pós-modernidade.
No intuito de vencer essa falha ou inadequação por evolução das relações contratuais com o advento das diversas tecnologias e a expansão desenfreada do mercado de prestação de serviços e produtos. Surgiu a Teoria da Onerosidade Excessiva, para mitigar e afirmar que não é um fato imprevisível que alicerça a revisão contratual, mas as consequências que tornaram as cláusulas excessivamente onerosas que fundamentam uma readequação de cláusulas.
De modo geral, as leis transmutam-se com o evoluir social, a Teoria dos Contratos não é diferente, nesse norte, como dito acima, principalmente com o advento da tecnologia, os conceitos primórdios criados para tornar contratante e contratado subjetivamente equitativos com referência as obrigações, hoje, estão revestidos por diversos princípios de otimização, pois perderam o aspecto de proteção em razão da evolução das relações. Constitucionalmente conhecido como Princípio Mãe, a Dignidade da Pessoa Humana constitucionaliza o ramo civil trazendo a Boa-fé, probidade e a equidade, assim como a confiança entre as partes, tendo o Judiciário trabalhado neste sentido de tornar útil o contrato e fazer prevalecer à justiça social.
E assim, por último, surge na Alemanha a Teoria da quebra da base do negócio jurídico, que Karl Larenz (1997) “preconiza a base objetiva do negócio como sendo as circunstâncias objetivamente necessárias à permanência existencial do contrato, sustentando a relativização da vontade para o qual fora concebido em sua forma original”. Portando, a citada Teoria vem afirmar que é necessária a existência de mecanismos adaptadores do mesmo contrato as novas circunstâncias, que em suma, são indesejáveis a todas as partes.
Na análise proposta pelo trabalho, ou seja, a possibilidade da resolução de cláusula contratual que em razão da Pandemia da Covid-19 se tornou excessivamente onerosa ao consumidor, não é diferente, está-se diante da quebra da base do negócio jurídico, uma vez que, com a referida Pandemia que se alastra no Mundo, da COVID-19, ainda que a Teoria eleita não exija a previsibilidade de prejuízo futuro, tratando-se de Consumidor revestido de subjetividades que demonstre a onerosidade excessiva, apto estará a buscar seu direito.
Nesse norte, havendo demonstração de causa superveniente que tornou a execução primária do contrato excessivamente onerosa ao Consumidor, importante ratificar com a melhor Doutrina.
No direito brasileiro, este parece ser o fundamento da revisão contratual por onerosidade excessiva no âmbito do CDC, posto que à distinção da solução apontada pelo direito civil, o direito do consumidor, sob a ótica de revisão enquanto direito subjetivo do vulnerável, confere previsão de revisão por fato superveniente que torna as prestações excessivamente onerosas, no entanto, de forma objetiva e diferenciada das exigências da lei civil (MIRAGEM, 2008, p. 128-129).
Leciona também o eminente Advogado Luís Fernando do Vale (2020), É mister ter-se em vista que a regra está circunscrita às relações de consumo. Mas é tão amplo o conceito dessas relações que a repercussão da regra na vida cotidiana pode ser sensível. Assim, vê-se como tem evoluído o contrato, talvez no sentido de sacrificar a amplitude de seus princípios básicos em favor das restrições que almejam torna-lo mais justo e mais humano.
3. “DIRIGISMO JUDICIAL” E A RESOLUÇÃO DE CLÁUSULA QUE SE TORNOU EXCESSIVAMENTE ONEROSA
Após a explanação Teórica que alicerça o direito à resolução de cláusula contratual que se tornou onerosamente excessiva, no caso em apresso com um agravante, a superveniência de uma Pandemia, percebe-se que ambas as teorias se adequam ao caso concreto, todavia, como se trata de uma relação de consumo, é lógica a eleição da Teoria mais vantajosa ao consumidor que é a regra estabelecida no art. 6.º, inciso V, parte final, do CDC.
Art. 6.º São direitos básicos do consumidor:
V - a modificação das cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais ou sua revisão em razão de fatos supervenientes que as tornem excessivamente onerosas.
O Mundo, segundo informações prestadas pela Organização Mundial da Saúde – OMS, enfrenta e enfrentará por no mínimo 1 (um) ano um vírus mortal, que origina a doença conhecida como COVID-19, hoje, o maior remédio para prevenir a infecção altamente contagiosa é o distanciamento social, existindo no âmbito de todo território social medidas legais que vedam a aglomeração de pessoas, dentre outras ordens cerceadoras do direito de ir e vir, porém, ponderadamente sustentada no direito a vida.
Para tanto, legalmente, é necessário que o Poder Judiciário faça uma análise criteriosa da cláusula contratual que se tornou excessivamente onerosa, levando em consideração as causas ensejadoras desta análise, outrora dirigindo impessoalmente a situação fática aplicando a justiça social e humanamente, reconheça haver evento superveniente que ocasionou o desequilíbrio contratual e impossibilidade de cumprimento do mesmo que, não levará apenas prejuízo ao Consumidor que em regra “perderá” o seu bem, mas para o Credor/fornecedor de serviço que haverá de promover todas as medidas legais para o determinado fim.
Tratando-se dessa modalidade de contrato e Teoria aplicada ao caso concreto, no nordeste, são dois fatores ensejadores da resolução, tanto a longa estiagem quanto a COVID-19, são causas que tornam excessivamente onerosa para determinada classe trabalhadora a manutenção de valores de prestações. Portanto, faz jus a resolução do contrato e reconhecimento do direito do consumidor a novamente ter todas as cláusulas do contrato equitativas e não onerosas.
Não sendo possível a resolução da cláusula de modo extrajudicial, diretamente com o credor/fornecedor do serviço, é necessária a intervenção judicial para tornar novamente o contrato equilibrado, sob pena, de sua rescisão por inadimplemento total por parte do consumidor. Portando, sob a égide de amplos direitos que vem para afastar a desproporcionalidade de avenças consumeristas, certo é, que só o consumidor é revestido pelo direito de mitigação do princípio do pacta sunt servanda através da responsabilidade objetiva.
Apenas por critério de fundamentação, em detrimento a Teoria do Risco imposta ao fornecedor de produto ou serviço, ampara-se a demanda na Responsabilidade Objetiva vide Súmula 297 do STJ.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estado atual de saúde ao qual se encontra o Mundo, logicamente o Brasil, faz surgir diversas situações ensejadoras de provocação da ponderação de direitos fundamentais. Existe uma gama de direitos que “nascemos sabendo ter”, dentre estes, sem dúvida, o direito a simplesmente viver, portanto, é nessa linha, que neste momento de exceção, a ponderação é de prevalecer o simples fato de viver.
Neste norte, sob a possibilidade de resolução de cláusula contratual que se tornou onerosamente excessiva, logicamente quebrando a base do negócio jurídico em razão da Pandemia da Covid-19, isto, restringindo o presente trabalho aos contratos de cláusulas contínuas, especificamente os de Alienação Fiduciária em garantia, é possível aplicar a Teoria da quebra da base do negócio jurídico, demonstrando que as medidas de prevenção e combate a Covid-19 simplesmente tornaram a/as cláusulas contratuais onerosamente excessivas pelo simples fato do isolamento social ou qualquer outra justificativa plausível e no caso, por ser relação de consumo, tendo o beneficio da aplicação da responsabilização civil objetiva.
Por fim, é necessário após a análise criteriosa de determinado concreto que a flexibilização do direito exige e se fundamenta na busca do equilíbrio do consequente desequilíbrio, no caso em apresso, trazendo mecanismos garantidores da equidade e, portanto, relativização do princípio da Pacta Sunt Servanda. No caso em apresso, não se aplica a Teoria da Imprevisão, haja vista, a previsibilidade em cláusula contratual de uma Pandemia ser possível.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFICAS
GUILHERME, LUIZ FERNANDO DO VALE DE ALMEIDA. Manual de direito civil. 3 ed. São Paulo: Manole, 2020, p.
LARENZ, Karl. Base del negocio jurídico y cumplimiento de los contratos. Trad. Carlos Fernandez Rodriguez, Madrid: Editorial Revista de Derecho Privado, 1997, p. 94.
MIRAGEM, Bruno et al. Direito do Consumidor: fundamentos do direito do consumidor; direito material e processual do consumidor; proteção administrativa do consumidor; direito penal do consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008. 125-129 p.
NUNES, Luiz Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor: com exercícios. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p.141.
Advogado, UNIAGES; Procurador do Município de Fátima; pós-graduando em Direito Processual Civil e Direito Público pela Faculdade Futura.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Isaias Cantidiano de Oliveira. Análise dos Contratos de Alienação Fiduciária em Garantia sob a ótica da Teoria da quebra da base do Negócio Jurídico e a superveniência da Pandemia da Covid-19 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 maio 2020, 04:41. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54588/anlise-dos-contratos-de-alienao-fiduciria-em-garantia-sob-a-tica-da-teoria-da-quebra-da-base-do-negcio-jurdico-e-a-supervenincia-da-pandemia-da-covid-19. Acesso em: 22 nov 2024.
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