RESUMO: A aquisição da nacionalidade brasileira apresenta diferentes nuances, requisitos e hipóteses. Com a classificação dos brasileiros natos ou naturalizados abre-se em leque com algumas possibilidades. Este artigo, com embasamento em doutrinas jurídicas, apresenta essas possibilidades, trazendo e explicando conceitos como por exemplo o dos requisitos de ius solis e ius sanguinis para a classificação dos brasileiros natos, e também diferenciações entre as maneiras de o estrangeiro se tornar brasileiro naturalizado.
Palavras-Chaves: nacionalidade; brasileiros natos; brasileiros nacionalizados.
ABSTRACT: The Brazilian nationality’s acquisition presents different aspects, requirements and hypotheses. With native or naturalized Brazilians’ classification, it opens up with a range of possibilities. This article, based on legal doctrines, presents these possibilities, bringing and explaining concepts such as the requirements of ius solis and ius sanguinis to native Brazilians’ classification, and also differentiations between the ways in which foreigners become naturalized Brazilians.
Keywords: nationality; native brazilian; naturalized brazilian
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. ASPECTOS GERAIS DAS ESPÉCIES DE NACIONALIDADE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. 2.1 BRASILEIROS NATOS. 2.1.1. Aquisição da nacionalidade pela territorialidade. 2.1.2. Aquisição da nacionalidade pela consanguinidade. 2.2. BRASILEIROS NATURALIZADOS. 2.2.1. Naturalização tácita. 2.2.2. Naturalização expressa. 2.2.3. Radicação precoce e curso superior. 2.3. A NÃO DISTINÇÃO DE BRASILEIROS NATOS E NATURALIZADOS PELA LEI. 2.4. PERDA DA NACIONALIDADE. 3.CONCLUSÃO. 4. REFERÊNCIAS.
O presente artigo apresenta as espécies de nacionalidade apresentadas na Constituição Federal brasileira e nuances referentes às suas aquisições, perda e reaquisições. Pensando em espécies nacionalidades brasileiras, devemos considerar que podemos encontrar brasileiros natos e naturalizados.
Quanto a diferenciação dos brasileiros natos e dos brasileiros naturalizados é importante ter consciência que em regra geral a Constituição de 1988 traz em seu texto que a lei é proibida de estabelecer qualquer discriminação entre os tipos de brasileiros quanto a seus direitos e deveres enquanto indivíduo integrante do povo brasileiro. Todavia, a própria norma máxima estabelece algumas exceções, e assim, acaba conferindo alguns privilégios aos brasileiros natos quanto a participação e integração da estrutura do Estado brasileiro.
Com isso, este texto nos mostra aspectos intrínsecos à aquisição da nacionalidade brasileira, apresentando os diferentes procedimentos, a concessão ou não de privilégios, entre outros.
2.ASPECTOS GERAIS DAS ESPÉCIES DE NACIONALIDADE NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
Previstas na Constituição Federal de 1988 em seu artigo 12, as espécies de nacionalidade trazem à luz as hipóteses jurídicas em que se considera um indivíduo um brasileiro. De acordo com Alexandre de Moraes (2017, p. 173), aborda-se como nacionalidade todo vínculo jurídico político que coliga indivíduos a um específico Estado, e assim, incorpora-o a um de seus elementos constitutivos, o povo. Complementando, Uadi Lammêgo Bulos (2017, p. 853) informa-nos que a Magna Carta apresenta a nacionalidade como um direito público, material e formalmente constitucional, mesmo que resguardado por norma ou documentação infraconstitucional ou até de natureza privada, isso pois a intenção da Carta de 1988 é justamente enaltecer e garantir os direitos dos seres humanos, como também conferir responsabilidades ao quais integram um mesmo ambiente cultural e costumeiro.
São consideradas espécies de nacionalidade, a “primária ou originária” (ART. 12, I, CF/88) e a “adquirida ou secundária” (art. 12, II, CF/88). A nacionalidade primária ou originária é conferida aos considerados brasileiros natos, enquanto que a nacionalidade adquirida ou secundária é conferida aos brasileiros naturalizados.
Em regra, conceitua-se brasileiro nato aquele que nasce dentro do território brasileiro o que está prevista na alínea “a”, do inciso I, do supra mencionado dispositivo legal. É percebida essa forma aquisitiva de nacionalidade pelo termo ius solis ou ius loci. Imposta mencionar que devido às raízes históricas migratórias do Estado brasileiro, a Constituição de 1988 trouxe a mescla do critério sanguíneo com o critério territorial para a classificação dos chamados brasileiros natos, uma vez que, por inúmeras vezes os descendentes dos imigrantes nascidos em solo brasileiro constroem suas vidas no país sem a menor intenção de retornar ao Estado origem de seus antepassados (BULOS, 2017, p. 855).
Entretanto, a nacionalidade primária não se configura somente pelo critério territorial como já dito, leva-se em contam também o critério ius sanguinis ou de consanguinidade. Por esse critério pode-se considerar brasileiro nato todo descendente de brasileiro não nascido no território da República Federativa do Brasil, entretanto, como afirma Alexandre de Moraes (2017, p. 174), não se pode analisar esse critério individualmente pois a leis suprema exige o preenchimento de alguns requisitos necessários para a aquisição da nacionalidade por esse critério, contudo sempre estará resguardada a consanguinidade ascendente.
José Afonso da Silva (2006, p. 326) em interpretação da Constituição Federal, traz a classificação dos brasileiros natos da seguinte maneira:
“A Constituição reputa brasileiro nato aquele que adquire a nacionalidade brasileira pelo fator nascimento. É dizer: brasileiro nato é quem nasce na República Federativa do Brasil. Corresponde ao titular da nacionalidade brasileira primária, para cujo reconhecimento nossas constituições sempre adotaram o critério ius solis, com ligeiras atenuações. Mas não se disse acima que o brasileiro nato é só o que nasce no território brasileiro. O art. 12, I, da Constituição, e só ele, é que dá os critérios e pressupostos para que alguém seja considerado necessariamente, e de direito, brasileiro nato. Por ele vê que não só o ius solis é fonte da nacionalidade primária entre nós; há concessões ao princípio do ius sanguinis combinado com outros elementos”.
Façamos agora análise mais detalhada a respeito dos dois critérios de aquisição da nacionalidade brasileira.
2.1.1 Aquisição da nacionalidade pela territorialidade
O critério territorial de aquisição da nacionalidade está previsto na Constituição Federal, pela letra da lei: “art. 12. São brasileiros: I - natos: a) os nascidos na República Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes não estejam a serviço de seu país; (...)”.
É de extrema relevância abordar os limites territoriais do Estado brasileiro, deve-se levar em conta claramente as fronteiras geográficas com outros Estados, mas também extensões e fronteiras fluviais, lacustres, ilhas, golfos, espaço aéreo e o mar territorial. Além desses limites, consideram-se ainda território da República Federativa do Brasil os navios e as aeronaves de guerra brasileiros qualquer lugar que se encontrem, navios mercantes e aeronaves civis brasileiras em territórios exteriores (BULOS, 2017, p. 856).
É considerado brasileiro nato porquanto se nasce em território brasileiro independentemente se os pais são também brasileiros ou estrangeiros. Contudo, há uma exceção, os filhos de pais estrangeiros que nascem em território brasileiro enquanto seus pais (ou um deles) estão a serviço de seu país de origem. Nesse caso o critério ius sanguinis prevalece ao critério ius solis, uma vez que existe a ligação ao serviço interligado ao país nacional que os pais prestam. Caso os pais estejam em território brasileiro a serviço de país diferente do seu de origem, o nascido será considerado brasileiro (SILVA, 2006, p. 326).
2.1.2 Aquisição da nacionalidade pela consanguinidade
Quanto a essa forma de aquisição da nacionalidade, a Magna Carta traz no mesmo dispositivo legal acima abordado duas outras hipóteses relativas ao ius sanguinis, são elas,
art. 12. São brasileiros: I - natos: (...)
b) os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que qualquer deles esteja a serviço da República Federativa do Brasil;
c) os nascidos no estrangeiro de pai brasileiro ou de mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição brasileira competente ou venham a residir na República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988)
Ao abordar a alínea “b”, considera-se brasileiros natos aqueles nascidos em território estrangeiro quando os pais (ou um deles) estiverem em serviço do Estado brasileiro. Aqui fica mais que claro o critério do ius sanguinis, pois independente dos pais serem brasileiros natos ou naturalizados, estão oficialmente a serviço do Brasil em outro Estado. Ao pensarmos nos serviços oficiais prestados pelos pais, devemos considerar qualquer serviço que esteja correlacionado à administração pública brasileira seja ela direita ou indireta, e, também de todos os entes federativos (BULOS, 2017, pp. 856 e 857). São exemplos pessoas que exercem funções como diplomatas, militares, cargos públicos da administração direta ou indireta, etc.
A alínea “c” aborda a conhecida nacionalidade potestativa, em regra, nessa nacionalidade específica não se considera somente o ius saguinis, mas também mais dois requisitos o “critério residencial” e a “opção confirmativa”. Quando abordado o critério de consanguinidade em conjunto com o critério residencial e opção confirmativa, deve-se analisar que justamente o fato de ser uma nacionalidade potestativa é o que dá ao indivíduo a possibilidade de escolher ter um vínculo que o torna parte do povo de um Estado determinado, sendo essa escolha ato personalíssimo (BULOS, 2017, p. 857).
Ressalta-se que a expressão de vontade de ser naturalizado brasileiro do indivíduo filho de pais brasileiros que não estavam a serviço do país somente poderá ser reconhecida a partir de sua maior idade pela Justiça Federal. Entretanto o fato gerador da nacionalidade potestativa ocorre com a fixação de residência no país, e caso ocorra antes de sua maior idade será concedida ao indivíduo a nacionalidade provisória até que possa expressar sua vontade (MORAES, 2017, p. 176). Com a Emenda Constitucional nº 54/2007, além da imposição do requisito da expressão da vontade após a maior idade, foi também imposto o requisito do registro em repartição pública brasileira competente do nascimento de filho de brasileiro(s) para que assim ele possa adquirir a nacionalidade originária, lembrando que com o registro não há a obrigatoriedade de fixar endereço no território brasileiro para ser considerado brasileiro nato (BULOS, 2017, p. 859).
A chamada nacionalidade secundária ou adquirida pode ser requerida pelo estrangeiro ou apátrida e é concedida por meio da naturalização ao invés do nascimento, daí o termo “brasileiros naturalizados”. O artigo 12, inciso II, da Constituição Federal prevê em seu texto,
art. 12. São brasileiros: (...) II - naturalizados:
a) os que, na forma da lei, adquiram a nacionalidade brasileira, exigidas aos originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininterrupto e idoneidade moral;
b) os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988)
Importante dizer que para que haja a aquisição na nacionalidade secundária o estrangeiro ou apátrida deverá conseguir a outorga do chefe do Poder Executivo, por ser esse um ato discricionário competente exclusivamente a ele (BULOS, 2017, p. 861). Portanto a aquisição da nacionalidade secundária ocorre por meio da naturalização expressa, e assim, podendo ser classificada em duas espécies de naturalização, a tácita e a expressa.
De acordo com a Constituição de 24 de fevereiro de 1891, no artigo 69, §4º, era previsto que os estrangeiros que encontravam-se no Brasil no dia 15 de novembro de 1889 eram considerados brasileiros naturalizados, salvo se declarassem a vontade de conservar a nacionalidade de origem dentro de seis meses da entrada em vigor da Constituição da época. Contudo, as Constituições seguintes terminaram com esse preceito e desde então não há mais que se falar em naturalização tácita (BULOS, 2017, p. 863).
A naturalização expressa é aquela propriamente mencionada anteriormente, portanto, segue o requisito do requerimento realizado pelo interessado para que realmente seja concedida. É certo afirmar que a naturalização expressa pode ocorrer de dias maneiras, a primeira chamada “ordinária ou comum” e a segunda chamada “extraordinária ou quinzenária”.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 12, inciso II, alínea “a” afirma que serão considerados brasileiros naturalizados aqueles originários de países que possuem a língua portuguesa como oficial quando residirem por um ano ininterrupto em território brasileiro e possuir idoneidade moral. É nítida que a aquisição da naturalização nessa hipótese está submetida a alguns requisitos, tendo por eles um requisito implícito ao texto constitucional que é a aceitação pelo Chefe do Poder Executivo do requerimento de naturalização do estrangeiro, com isso, mesmo que cumpram os requisitos expressos na letra da norma será necessária a anuência do Presidente da República (BULOS, 2017, p. 864).
Os outros requisitos necessários são os considerados expressos, e aqui podemos dividir em partes para a melhor compreensão:
a) Para os estrangeiros simplesmente, não originários de países de língua portuguesa, necessitam cumprir algumas condições do Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80) em seu artigo 112, incisos I a VIII, sendo essas condições:
I. Capacidade civil, segundo a lei brasileira;
II. Ser registrado como permanente no Brasil;
III. Residência contínua no território nacional, pelo prazo mínimo de quatro anos, imediatamente anteriores ao pedido de naturalização;
IV. Ler e escrever a língua portuguesa, consideradas as condições do naturalizando;
V. Exercício de profissão ou posses de bens suficientes à manutenção própria e da família;
VI. Bom procedimento;
VII. Inexistência de denúncia, pronúncia ou condenação no Brasil ou no exterior por crime doloso a que seja cominada pena mínima de prisão, abstratamente considerada, superior a um ano; e
VIII. Boa saúde. (Lei nº 6.815/80, art. 112, I a VIII)
b) Para os estrangeiros advindos de países de língua portuguesa, observando-se que os Portugueses possuem normatização diferenciada para a aquisição da naturalização brasileira, serão necessárias aos outros estrangeiros: residência ininterrupta por um ano no território brasileiro e idoneidade moral. Todos esses requisitos, claramente, sem desconsiderar o ato discricionário do Chefe do Poder Executivo e a expressão da vontade do estrangeiro;
c) Quando abordamos os portugueses, devemos considerar que a Constituição Federal prevê no parágrafo primeiro de seu artigo 12, a possibilidade de residência permanente no Brasil a eles caso haja reciprocidade em favor dos brasileiros em Portugal, isso claro, cumprindo-se os requisitos de residência ininterrupta por um ano mais idoneidade moral. Em outras palavras, Alexandre de Moraes interpreta as possibilidades de aquisição da nacionalidade brasileira por portugueses da seguinte maneira:
“1ª – aquisição da nacionalidade brasileira derivada: neste caso seguirá todos os requisitos da naturalização para os originários de países de língua portuguesa (ver item anterior);
2ª – aquisição da equiparação com brasileiro naturalizado, sem contudo perder a nacionalidade portuguesa (quase nacionalidade): o art. 12, § 1º, da Constituição Federal, com nova redação dada pela Emenda Constitucional de Revisão nº 3, de 7-6-1994, prevê aos portugueses que preencham os requisitos constitucionais, a possibilidade, desde que haja reciprocidade em favor dos brasileiros (cláusula do ut des, ou seja, cláusula de admissão de reciprocidade), de atribuição dos direitos inerentes ao brasileiro naturalizado, salvo os previstos na Constituição. O Ministério da Justiça é o órgão com atribuição para o reconhecimento da igualdade de direitos e deveres entre os portugueses equiparados e os brasileiros naturalizados. Ressalte-se que, para o exercício dos direitos políticos, há necessidade de requerimento à Justiça Eleitoral e permanência, no mínimo, de três anos de residência no país“. (MORAES, 2017, p. 180)
É importante dizer que não há de se considerar dupla nacionalidade entre os brasileiros residentes em Portugal e os portugueses residentes no Brasil, cada qual continua nacional de seu país de origem, entretanto serão considerados reciprocamente benefícios aos que estiverem em território do outro Estado amigo.
Ao abordarmos a naturalização extraordinária, devemos analisar a alínea “b” do inciso II, do artigo 12 da Carta de 1988, “os estrangeiros de qualquer nacionalidade, residentes na República Federativa do Brasil há mais de quinze anos ininterruptos e sem condenação penal, desde que requeiram a nacionalidade brasileira”. Portanto, considera-se direito público subjetivo aos estrangeiros de qualquer origem a aquisição da naturalização brasileira caso ele resida em território brasileiro a mais de quinze anos ininterruptos sem que exista condenação penal.
Bulos (2017, p. 867) nos traz a importante informação de que foi com a Emenda Constitucional de Revisão nº 3 de 1994 que houve a alteração do artigo 12, II, “b”, anteriormente o prazo de residência contínua do estrangeiro no país era de trinta anos, entretanto, após a revisão constitucional passou a ser de quinze anos. A consideração aqui foi a congruência de que um estrangeiro com idoneidade moral que já reside no Brasil há quinze anos e não possui qualquer condenação penal, não apresentaria necessidade alguma de esperar mais o tempo necessários para completassem os trinta anos e fosse adquirida sua naturalização.
Lembra-se ainda que o requerimento do interessado é imprescindível, contudo, o Poder Executivo não poderá negar ao estrangeiro que cumpre todos os requisitos mencionados sua naturalização extraordinária por não estar este ato específico atrelado ao poder discricionário do Estado.
2.2.3 Radicação precoce e curso superior
A Constituição de 1967 com sua Emenda Constitucional n. 1/69 previa além dessas hipóteses de aquisição da naturalidade brasileira outras duas, a “radicação precoce” e a “conclusão de curso superior” (BULOS, 2017, p. 868 e 869). Classificam-se como radicação precoce os estrangeiros admitidos no Brasil até seus primeiros cinco anos de vida, residindo definitivamente no território do país, contudo há a necessidade de manifestação da intenção de permanecer com a nacionalidade brasileira após sua maior idade, com prazo de até dois anos após seu aniversário. Por outro lado, os estrangeiros que residindo no país antes de completar a maioridade fizerem cursos superiores em instituições de ensino brasileiras podem requerer a naturalização até um ano após o final do curso.
A Constituição Federal de 1988 não abordou em seu texto essas hipóteses, entretanto deixou com que o legislador ordinário regulamentasse essas questões, o que é perceptível no artigo 12, II, “a”, com a frase “são brasileiros naturalizados os que na forma da lei (...)” e também em seu artigo 22, XIII, quando confere competência privativa à União legislar a respeito de nacionalidade, cidadania e naturalização. Dessa forma, após a recepção do Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/80) pela Carta de 1988, foram expressamente permitidas as concessões de naturalizações aos estrangeiros pelas hipóteses de radicação precoce e conclusão de curso superior, como demonstram os artigos 115, §2º, I e II, e artigo 116 do mencionado estatuto.
2.3 A não Distinção de Brasileiros Natos e Naturalizados pela Lei
A regra expressa no parágrafo 2º do artigo 12 da Constituição Federal é clara, “a lei não poderá estabelecer distinção entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituição”. Ou seja, percebe-se que quando pensamos em direitos e deveres presentes no ordenamento jurídico brasileiro, não poderá haver diferenciação entre brasileiros natos e naturalizados uma vez que todos integram um dos elementos constitutivos do Estado, o povo.
Não obstante, a própria norma constitucional expressa exceções, sendo elas: a extradição (art. 5º, LI, CF), cargos (art. 12, §3º, CF), funções (art. 89, VII, CF) e propriedade de empresa jornalística, de radiodifusão sonora de sons e imagens (art. 222, CF). O legislador infraconstitucional ficou impossibilitado de acrescentar outras exceções (BULOS, 2017, pp. 869 até 872). Brevemente abordaremos as hipóteses de diferenciação de brasileiros natos e naturalizados acima apresentadas:
a) Extradição (art. 5º, LI, CF): ao pensar em brasileiros natos deve considerar que não existe possibilidade de extradição a pedido de Estado estrangeiro, independentemente do delito que tenha cometido. Porém, o brasileiro naturalizado poderá ser extraditado quando cometido crime comum antes da naturalização, ou comprovado envolvimento com tráfico;
b) Cargos (art. 12, §3º, CF): os seguintes cargos podem ser ocupados somente por brasileiros natos: Presidente e Vice-Presidente da República; Presidente das Câmaras dos Deputados; Presidente do Senado Federal; Ministro do Supremo Tribunal Federal; membro da carreira diplomática ( com exceção do Ministro das Relações Exteriores); oficiais das Forças Armadas; e Ministro do Estado de Defesa após a Emenda Constitucional 23/99.
c) Funções (art. 89, VII, CF): fica reservado ao Conselho da República seis cadeiras obrigatória a brasileiros natos. Observa-se aqui a possibilidade de participação de brasileiros naturalizados, entretanto a CF/88 prevê a obrigatoriedade de quantidade específica de brasileiros natos em sua composição;
d) Propriedade de empresa jornalística, de radiodifusão sonora de sons e imagens (art. 222, CF): para que o brasileiro naturalizado seja proprietário de quaisquer dessas empresas, o tempo de sua naturalização deve exceder dez anos conforme a CF/88.
Somente há a possibilidade de perder a nacionalidade caso ocorram uma das opções previstas na Constituição Federal, no parágrafo 4º do artigo 12, ou seja:
4º - Será declarada a perda da nacionalidade do brasileiro que:
I - tiver cancelada sua naturalização, por sentença judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional;
II - adquirir outra nacionalidade, salvo nos casos:
a) de reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangeira;
b) de imposição de naturalização, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em estado estrangeiro, como condição para permanência em seu território ou para o exercício de direitos civis;
Quanto a primeira possibilidade de perda trazida na Constituição Federal, deve-se analisar a chamada “ação de cancelamento de naturalização” gerando uma punição por algum ato do naturalizado que lesione o chamado “interesse nacional”. Bulos (2017, p. 872), diz que são dois os objetivos da aplicação dessa perda-punição somente para brasileiros naturalizados:
· “Retirar os direitos do naturalizado que exerce ou exerceu atividade prejudicial e grave ao interesse da nação brasileira;” e
· “Propiciar, a depender do caso, a aplicação de sanções políticas e criminais aos infratores.” (BULOS, 2017, p. 872)
Relevante é dizer, ainda, que os dois objetivos da aplicação da pena podem ocorrer ao mesmo tempo, não ocorrendo bis in idem.
Quando abordamos a respeito do segundo inciso, no parágrafo quarto, do artigo 12 da constituição federal, devemos considerar a chamada “naturalização voluntária” ou “perda-mudança”, podendo ser aplicada tanto a brasileiros natos quanto aos naturalizados. Consideram-se três os requisitos para essa parda de nacionalidade: a) a manifestação da vontade do brasileiro nato ou naturalizado de abrir mão da nacionalidade brasileira em detrimento de outra nacionalidade; b) a capacidade civil do brasileiro para expressar sua vontade; c) a aquisição real de uma nacionalidade estrangeira. Ocorrendo tudo por processo administrativo no Ministério da Justiça (BULOS, 2017, p.873).
Ainda, é relevante abordar outras duas questões inerentes a perda da nacionalidade, a primeira delas ocorre com relação a uma nacionalidade adquirida fraudando-se a lei, ficando a cargo da legislação civil instituir os procedimentos da perda de nacionalidade. Houve com a constituição de 1967 a possibilidade da perda da nacionalidade quando o brasileiro aceitasse comissão, emprego ou pensão de governo estrangeiro sem a anuência do Presidente da República, entretanto a constituição de 1988 não trouxe essa hipótese em seu texto.
Pensando na reaquisição da nacionalidade brasileira uma vez perdida, é possível haver a reaquisição nos casos de cancelamento da naturalização por meio de uma ação rescisória. Já quanto a reaquisição da nacionalidade nos casos de aquisição de outra nacionalidade, há a necessidade de um Decreto Presidencial anuindo a reaquisição nos moldes do artigo 36 da Lei nº 818/49, com o pré-requisito de o ex-brasileiro estar com domicílio no país, observa-se que o brasileiro que antes era nato volta a ser nato e assim o naturalizado (BULOS, 2017, p. 875).
A Constituição Federal de 1988 tão conhecida como “Constituição Cidadã” por toda ideologia protetora dos seres humanos e seus direitos, não deixou a filosofia de lado ao abordar as nuances da nacionalidade brasileira. Embora existam exceções distintivas entre os brasileiros natos e naturalizados, muito para que haja uma proteção quanto a estrutura do Estado brasileiro, serão sujeitos de direitos e deveres todos os brasileiros natos e naturalizados.
Evidente que na prática existe diferenciação quanto às possibilidades de aquisição da nacionalidade, isso devido a classificação de quem pode ser considerado brasileiro nato ou naturalizado. Deve-se ter em mente requisitos de necessário cumprimento para que um indivíduo possa ser considerado brasileiro nato, de forma geral esses requisitos são intrínsecos aos requisitos conhecidos como ius solis e ius sanguinis.
Contudo, os estrangeiros que não se enquadram nas hipóteses necessárias para a aquisição da nacionalidade brasileira, devem cumprir os requisitos da aquisição da naturalização brasileira. Nesse caso, observa-se se o estrangeiro tem origem em países de língua portuguesa ou não, obviamente que aqueles que nasceram em países da mesma língua possuem alguns privilégios que os estrangeiros de outras origens não possuem. Mas, de forma ampla, o estrangeiro que busca a nacionalização necessita estabelecer domicílio no território brasileiro (em alguns casos por prazo estabelecido), manifestar a intenção com relação à aquisição da nacionalidade brasileira em gozo de seus plenos direitos civis (com a maioridade) e a nacionalidade deve ser concedida pelo Chefe do Poder Executivo da República Federativa do Brasil.
Conforme dito, é claro que os procedimentos para ser considerado brasileiro nato ou naturalizado apresenta-se diferentes entre si, justamente considerando toda a estrutura governamental e a necessidade constitucional das decisões concedendo a nacionalidade advirem de órgãos diferentes. Outrossim essa não é a única diferenciação, a própria Magna Carta estabelece dispositivos legais que diferenciam os brasileiros natos dos naturalizados, como por exemplo para cargos de governo específicos, como por exemplo os cargos de Presidente da República, Presidente da Câmara dos Deputados, Presidente do Senado Federa, etc., que podem ser preenchidos por brasileiros natos.
Conclui-se assim que o sistema de aquisição de nacionalidade brasileira tem seus requisitos e diferenciações entre si, na maioria das vezes visando proteger a estrutura da Estado, mas quando pensado no indivíduo que é considerado brasileiro – seja ele nato ou naturalizado – a lei não pode impor qualquer diferenciação de direitos ou deveres sejam eles básicos ou mais elaborados.
BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de direito constitucional/ Uadi Lammêgo Bulos. – 10 ed. – São Paulo: Saraiva, 2017;
MORAES, Alexandre de. Direito constitucional/ Alexandre de Moraes. – 33 ed. rev. e atual. até EC nº 95, de 15 de dezembro de 2016. Doc. Digital disponível versão e-book – São Paulo: Atlas, 2017;
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. – 25 ed. rev. e atual. nos termos da EC nº 48, de 10 de agosto de 2005 – São Paulo: Malheiros, 2006.
Advogada nas áreas cíveis, contratuais e imobiliárias; graduada em Direito e pós-graduanda em Direito Processual Civil (termino em agosto de 2020) pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LEME, Rafaela Vieira. Aspectos das espécies de nacionalidade na Constituição Federal de 1988 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 31 jul 2020, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54974/aspectos-das-espcies-de-nacionalidade-na-constituio-federal-de-1988. Acesso em: 22 nov 2024.
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