RESUMO: O presente artigo traz uma importante e significativa discussão acerca dos direitos dos Povos Indígenas, posto que os territórios tradicionais exprimem condições primordiais para a concretização de outros direitos fundamentais para uma compreensão de vida digna, tais como: direito à vida, à saúde, à educação, à integridade física e psicológica, à preservação cultural, ao livre desenvolvimento, ao uso da língua, entre outros. Consequentemente, torna-se pertinente as considerações acerca das garantias de tais direitos, sobretudo, aos direitos territoriais. Com o advento da Tese do Marco Temporal é importante verificar se a definição da data de promulgação da constituição de 1988 como marco temporal é o único e insubstituível para a identificação de terras indígenas, conforme apresentado pelo Supremo Tribunal Federal no caso da Reserva Raposa Serra do Sol (RR) e com as consequentes implicações em outros processos que se discute o direito de comunidades indígenas às terras. Para o melhor entendimento sobre o tema foi imprescindível navegar pelos os principais pontos dos julgamentos do STF nos casos de demarcação das Terras Indígenas Raposa Serra do Sol, especificamente no que tange à definição do marco temporal para a aferição da ocupação indígena em outros processos que consequentemente podem comprometer na perda de terras de milhares de indígenas no país, com as quais guardam vínculos históricos, culturais e ancestrais, destruídos.
Palavras-chave: Povos Indígenas. Marco Temporal. Demarcação. Direitos Indígenas
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. A TESE DO MARCO TEMPORAL DAS TERRAS INDÍGENAS. 3. DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS. 4. REPERCURSÃO GERAL NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. 5. CONCLUSÃO. 6. REFERÊNCIAS.
1.INTRODUÇÃO
Os povos indígenas têm seus direitos preservados pela legislação brasileira e tem todos os direitos humanos reconhecidos no direito internacional. Entretanto, com o advento da Tese do Marco Temporal os direitos constitucionais dos povos indígenas podem sofrer restrições.
A terra é a matéria primordial do pleito indígena, que por diversas vezes foram motivos de angústias e conflitos em todo o país. No ano de 1988, a Constituição Federal estabeleceu uma nova ordem democrática, que assegurou, com uma maior eficácia, a proteção dos direitos indígenas. Devido às demarcações de terras indígenas, esses trâmites passaram a ser judicializados por aqueles que se sentiram lesados, aumentando o ar de inconstância e a insegurança jurídica. Diante desta circunstância, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi avocado a se pronunciar e elaborou a Teoria do Marco Temporal com o objetivo de orientar a questão e suprimir a mencionada insegurança.
Acerca da Teoria do Marco Temporal, pode-se afirmar que é uma teoria que vem sendo debatida nos últimos anos, sobretudo quando houve o julgamento do Supremo Tribunal Federal no caso da reserva indígena Raposa Serra do Sol, localizada no Estado de Roraima, pelo qual os povos indígenas só teriam direito as terras na qual estivessem ocupando no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Essa tese é extremamente prejudicial aos povos indígenas e vai de encontro com os direitos que a Constituição reconheceu.
A aplicabilidade desse entendimento é uma hipótese de possível parcialidade do judiciário, que vem cumprindo ordens junto à bancada ruralista do congresso nacional, contra os interesses dos povos indígenas e além da parcialidade, não vislumbrando a violação de um direito fundamental, qual seja, o direito à vida dos povos indígenas.
Vale ressaltar que a corte Interamericana de Direitos Humanos, cuja jurisdição foi reconhecida expressamente pelo Brasil, julgou diversos casos relacionados a terras indígenas. Isso significa que qualquer tentativa de estabelecimento de um Marco Temporal, se contrária aos instrumentos internacionais com os quais o Estado Brasileiro se comprometeu.
À vista disso, o presente artigo tem a finalidade de analisar os compromissos referentes aos povos indígenas firmados em nível internacional e verificar a eventual (in)compatibilidade de um possível acatamento do marco temporal com a Constituição Federal e os normativos internacionais.
2.A TESE DO MARCO TEMPORAL DAS TERRAS INDÍGENAS
A questão tem fundamental relevância, pois falar dos Direitos dos Povos Indígenas é falar da evolução da humanidade dentro da pluridimensionalidade dos direitos humanos. Além disso, é importante ressaltar que os indígenas têm uma importância capital por serem os formadores da história do país. Entretanto as questão dos povos indígenas no Brasil, infelizmente, ainda são chagas abertas em nossa sociedade.
Como é cediço, o marco histórico do Brasil, marcado pela chegada dos portugueses resultou no extermínio de muitos povos nativos devido aos conflitos armados e pelo processo de escravização indígena.
O fato é, que, segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no último censo demográfico de 2010, foi constatado que mais de 800 mil índios vivem no país. Não há como negar que a legislação em favor aos povos indígenas avançou a partir da Constituição Federal de 1988, onde foram assegurados o respeito a sua organização social, costumes, línguas, crenças, tradições e principalmente aos seus direitos territoriais. Além disso, o movimento indigenista brasileiro conseguiu fazer alianças com movimentos regionais e internacionais, conseguindo mudar a Convenção da Organização Internacional do Trabalho que também falava da assimilação dos povos à comunidade nacional, reconhecendo territorialidades, domínio do grupo sobre aquele território, a possibilidade do grupo eleger o próprio destino de desenvolvimento e seu modelo de justiça.
Apesar do direito originário referente aos territórios indígenas ser reconhecido por uma série de instrumentos internacionais de Direitos Humanos, as quais foram promulgadas pelo Brasil, os povos nativos ainda enfrentam muitas dificuldades na implementação de seus direitos, oscilando entre o reconhecimento e a negativa de tais garantias.
No que se refere à Teoria do Marco Temporal, na qual foi utilizada no julgamento que decidiu a demarcação de terras indígenas das tribos Makuxi, Ingarikó, Taurepang, Wapixana e Patamona que vivem na reserva Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima que depois de uma espera de quase três décadas para que suas terras fossem devidamente demarcadas, finalmente tiveram suas áreas territoriais reconhecidas em março de 2009. Nesse dia, o Supremo Tribunal Federal reconheceu que a Raposa Serra do Sol era dos povos indígenas que originalmente habitavam naquela reserva e, que portanto, os garimpeiros, fazendeiros, plantadores de arroz que se recusavam a deixar a terra indígena, teriam que sair.
Entretanto, neste julgamento o STF argumentou pela primeira vez a Tese do Marco Temporal, onde o teor da decisão judicial relatava que só teriam direito à terra povos indígenas que estivessem ocupando as áreas no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou seja, o Supremo Tribunal Federal fez uma interpretação que diminuiria os direitos indígenas de um modo geral, isso porque a Constituição define que os direitos dos povos indígenas às terras que tradicionalmente ocupam é um direito originário e não existe essa data como condição para o direito aos territórios indígenas.
O fato é que a mencionada decisão passou a ser utilizada por diversos seguimentos contrários à demarcação de terras indígenas, como um suposto entendimento consolidado do Supremo Tribunal Federal sobre a questão da demarcação de territórios particulares, como por exemplo, os ruralistas que assumiram a tese do marco temporal como estratégia para barrar as demarcações de terras indígenas almejando que a referida tese seja aplicada em todos os processos de demarcação em andamento no Brasil.
Em 19 de julho de 2017, a Advocacia-Geral da União elaborou o Parecer Normativo 001/2017/GABCGU/AGU, onde obrigou toda a Administração Pública Federal a seguir nos processos de demarcação as condicionantes do caso Raposa Serra do Sol e a Teoria do Marco Temporal.
O pedido de suspensão dos efeitos do Marco Temporal foi feito pelo Ministro Edson Fakcin em maio de 2020, no julgamento do povo Xokleng, alvo de uma tentativa de reintegração de posse movida pelo Estado de Santa Catarina. O caso serve como base para outros processos de demarcação no país, a terra que está em jogo foi reconhecida pelo Ministério da Justiça em 2002 e é parte do território Ibirama-Laklaño, reduzida em 63% pelo extinto Serviço de Proteção ao Índio ao longo do século XX.
A partir de 1976 com a construção da Barragem do Norte para conter as enchentes na região do Vale do Itajaí, 95% da área cultivável do povo Xokleng foi inundada, incluindo as aldeias, hoje a falta da soberania alimentar tem tido efeitos no aumento da proliferação da COVID19, com mais de 200 casos entre a etnia.
À vista disso, insta salientar, por oportuno, o que preconiza a Carta Magna, onde reconhece que a terra é o elemento fundamental de proteção de todos os outros direitos. Deste modo, ajuizar uma data onde esses direitos podem ser exercidos ou não, acaba por retirar a possibilidade do exercício das identidades e do direito dos índios continuarem a serem índios, gerando a violação de diversos direitos e da garantia fundamental dos índios em relação às suas terras.
3.DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS
Em relação às demarcações de terras indígenas, nos termos da Lei nº 6.001 de 1973 – Estatuto do Índio e do Decreto nº 1.775 de 1996, art. 2º, as demarcações são, então de responsabilidade administrativa da Fundação Nacional do índio (FUNAI):
Art. 2° A demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios será fundamentada em trabalhos desenvolvidos por antropólogo de qualificação reconhecida, que elaborará, em prazo fixado na portaria de nomeação baixada pelo titular do órgão federal de assistência ao índio, estudo antropológico de identificação.
Em conformidade com os registros recentes do citado órgão federal, existem 736 terras indígenas no Brasil, divididas entre as seguintes modalidades:
Terras Indígenas Tradicionalmente Ocupadas: São as terras indígenas de que trata o art. 231 da Constituição Federal de 1988, direito originário dos povos indígenas, cujo processo de demarcação é disciplinado pelo Decreto n.º 1775/96.
Reservas Indígenas: São terras doadas por terceiros, adquiridas ou desapropriadas pela União, que se destinam à posse permanente dos povos indígenas. São terras que também pertencem ao patrimônio da União, mas não se confundem com as terras de ocupação tradicional. Existem terras indígenas, no entanto, que foram reservadas pelos estados-membros, principalmente durante a primeira metade do século XX, que são reconhecidas como de ocupação tradicional.
Terras Dominiais: São as terras de propriedade das comunidades indígenas, havidas, por qualquer das formas de aquisição do domínio, nos termos da legislação civil.
Interditadas: São áreas interditadas pela Funai para proteção dos povos e grupos indígenas isolados, com o estabelecimento de restrição de ingresso e trânsito de terceiros na área. A interdição da área pode ser realizada concomitantemente ou não com o processo de demarcação, disciplinado pelo Decreto n.º 1775/96.
Cumpre mencionar o dispositivo da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas:
Art. 26. Os povos indígenas têm direito às terras, territórios, e recursos que possuem e ocupam tradicionalmente ou que tenham de outra forma utilizado ou adquirido
Artigo 10. Os povos indígenas não serão removidos à força de suas terras ou territórios. Nenhum traslado se realizará sem o consentimento livre, prévio e informado dos povos indígenas interessados e sem um acordo prévio sobre uma indenização justa e equitativa e, sempre que possível, com a opção do regresso.
A Constituição Federal destaca em seu art. 231 e incisos, sobre a proteção das terras indígenas:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais a seu bem-estar e as necessárias a sua produção física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
[...]
§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
[...]
§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.
Desta maneira, o Estado Brasileiro reconhece que o território indígena tem camadas que é determinado a partir dos costumes e tradições. A Constituição fala dos direitos originários fazendo uma espécie de justiça de transição, reconhecendo que os indígenas eram os primeiros “donos “ dessa terra, esses direitos subsistem e territorialidades e foram sendo construídas dentro das possibilidades do projeto colonial, desta forma, podemos observar que alguns aspectos foram reconfigurados, mas sempre de acordo com o modo de tradição do grupo. Assim, conforme as disposições legais abordadas, podemos perceber que o direito à terra é fundamental para sobrevivência e gozo dos direitos relativos aos povos indígenas.
4.REPERCURSÃO GERAL NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Acerca da teoria do Marco Temporal, na qual o Supremo Tribunal Federal sustenta a tese de que para se demarcar uma terra indígena, os nativos precisariam estar nelas na data do dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, é válido mencionar, por oportuno, as palavras do relator, o ministro Carlos Ayres Britto. Vejamos:
I - O Marco Temporal da ocupação. Aqui é preciso ver que a nossa Lei Maior trabalhou com data certa: a data da promulgação dela própria (5 de outubro de 1988) como insubstituível referencial para o reconhecimento, aos índios, “dos direitos sobre as terras que tradicionalmente ocupam”. Terras que tradicionalmente ocupam, atente-se, e não aquelas que venham a ocupar. Tampouco as terras já ocupadas em outras épocas, mas sem continuidade suficiente para alcançar o marco objetivo do dia 5 de outubro de 1988. Marco objetivo que reflete o decidido propósito constitucional de colocar uma pá de cal nas intermináveis discussões sobre qualquer outra referência temporal de ocupação da área indígena. Mesmo que essa referência estivesse grafada em Constituição anterior. É exprimir: a data de verificação do fato em si da ocupação fundiária é o dia 5 de outubro de 1988, e nenhum outro.
Ainda sobre a referida teoria do marco temporal o Supremo Tribunal Federal explicitou esse entendimento no ARE 803.462-AgR/MS, a fim de delimitar as condições que entende cabíveis para a sua concretização:
EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. TERRA INDÍGENA “LIMÃO VERDE”. ÁREA TRADICIONALMENTE OCUPADA PELOS ÍNDIOS (ART. 231, § 1o, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL). MARCO TEMPORAL. PROMULGAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. NÃO CUMPRIMENTO. RENITENTE ESBULHO PERPETRADO POR NÃO ÍNDIOS: NÃO CONFIGURAÇÃO.
1. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Pet 3.388, Rel. Min. CARLOS BRITTO, DJe de 1o/7/2010, estabeleceu como marco temporal de ocupação da terra pelos índios, para efeito de reconhecimento como terra indígena, a data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988.
2. Conforme entendimento consubstanciado na Súmula 650/STF, o conceito de “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios” não abrange aquelas que eram possuídas pelos nativos no passado remoto. Precedente: RMS 29.087, Rel. p/ acórdão Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, DJe de 14/10/2014.
3. Renitente esbulho não pode ser confundido com ocupação passada ou com desocupação forçada, ocorrida no passado. Há de haver, para configuração de esbulho, situação de efetivo conflito possessório que, mesmo iniciado no passado, ainda persista até o marco demarcatório temporal atual (vale dizer, a data da promulgação da Constituição de 1988), conflito que se materializa por circunstâncias de fato ou, pelo menos, por uma controvérsia possessória judicializada.
4. Agravo regimental a que se dá provimento.
Isto posto, é oportuno concluir com o entendimento do Procurador da República Leonardo Gonçalves Juzinas:
A chamada tese do marco temporal importará grave retrocesso na garantia dos direitos fundamentais dos povos indígenas. Sob o pretexto de pacificar as homéricas tensões fundiárias decorrentes de processos de demarcação cada vez mais judicializados, essa falsa solução, em verdade, perpetua a situação caótica em que algumas populações se encontram e alimenta os conflitos em razão da realidade desses povos, que se veem obrigados a viver em situação de confinamento territorial e miséria.
Pode-se dizer que a consequência mais imediata desse entendimento é, sem dúvida, a banalização das consequências dos incontáveis esbulhos e massacres sofridos pelos povos indígenas antes da atual Constituição. Mostra-se inconteste que a tese do marco temporal, além de ser tecnicamente insustentável perante o instituto do indigenato, produz uma consequência inaceitável para a realidade do País, tendo em vista o que foi instituído pelo poder constituinte originário bem como mediante os compromissos internacionais assumidos por parte do Brasil em diversos instrumentos, a fim de superar o seu passado autoritário de violações dos direitos humanos.
Por fim, cumpri salientar que a aplicação da teoria do Marco Temporal para as novas demarcações de terras indígenas, bem como a revisão de territórios já demarcados, configuram um grave cenário de retrocesso para o Brasil.
No que que tange a o julgamento do Recurso Extraordinário n 1.017.365, vejamos a decisão:
DECISÃO: Por meio de Petição em eDOC 199, deduzida no bojo de pedido de tutela provisória incidental, a Comunidade Indígena Xokleng da Terra Indígena Ibirama La Klaño e diversos amicicuriae admitidos no pleito requerem que venha este Relator a “determinar a suspensão de todos os processos judiciais em curso, notadamente ações possessórias, anulatórias de processos administrativos de demarcação, bem como os recursos vinculados a essas ações até julgamento final da Repercussão Geral, nos termos do art. 1.035, §5º do CPC excluindo-se as ações judiciais movidas com a finalidade de reconhecer e efetivar os direitos territoriais dos povos indígenas”
Dessa maneira, se os ministros do Supremo Tribunal Federal reafirmarem o caráter originário dos direitos dos povos indígenas e, portanto, rechace definitivamente a tese do marco temporal, milhares de conflitos em todo Brasil terão o caminho aberto para a sua resolução, assim como dezenas de processos judiciais poderão ser imediatamente solucionados.
As 310 terras indígenas que estão estagnadas em alguma etapa do processo de demarcação já não teriam, em tese, nenhum impedimento para que seus processos administrativos fossem concluídos.
Por outro lado, caso o STF opte pela tese anti-indígena do marco temporal, acabará por legalizar o esbulho e as violações ocorridas no passado contra os povos originários. Nesse caso, pode-se prever uma enxurrada de outras decisões anulando demarcações, com o consequente surgimento de conflitos em regiões paci0ficadas e o acirramento dos conflitos em áreas já deflagradas. Essa decisão poderia incentivar, ainda, um novo processo de invasão e esbulho possessório e terras demarcadas – situação que já está em curso em várias regiões do país, especialmente na Amazônia.
5.CONCLUSÃO
Nesse prisma, espera-se que o STF interprete de maneira coerente com o que preconiza a Constituição e as legislações que asseguram os direitos dos povos indígenas, afastando a tese do marco temporal e acolhendo a tese do indigenato.
Atualmente, o julgamento da ação não possui data prevista para iniciar. O Supremo Tribunal Federal havia incluído na pauta do dia 28 de outubro de 2020, pelo novo presidente da Corte, ministro Luiz Fux, entretanto, foi retirado de pauta. O Relator do caso, Ministro Edson Fachin, defendeu a ampla participação de todos os setores interessados no tema, dada a importância da matéria. Serão quase 40 grupos que estão habilitados para contribuir na defesa dos povos indígenas nesse julgamento.
6.REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição Federal do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.>.
BRASIL. Decreto N° 1.775, de 8 de janeiro de 1996. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/d1775.htm>.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). Pet 3.388/RR. Relator: Ministro Carlos Ayres Britto. Brasília, 19 mar. 2009. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/ paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=630133.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (Tribunal Pleno). Recurso Extraordinário 1.017.365. Relator: Ministro Edson Fachin. Brasília, 06 mai. 2020. Disponível em: file:///C:/Users/conceição/Downloads/texto_15343026860%20(1).pdf
BRASIL. Supremo Tribunal Federal (2. Turma). ARE 803.462-AgR/MS. Terra indígena Limão Verde. Área tradicionalmente ocupada pelos índios (art. 231, § 1o, da Constituição Federal). Marco temporal. Promulgação da Constituição Federal. Não cumprimento. Renitente esbulho perpetrado por não índios: não configuração. Relator: ministro Teori Zavascki. Brasília, 9 dez. 2014. p. 1-2. Disponível em: http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=7734834.
DECLARAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE OS DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS. Rio de Janeiro, 2008. Disponível em: 2008https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BDL/Declaracao_das_Nacoes_Unidas_sobre_os_Direitos_dos_Povos_Indigenas.pdf
FUNAI. ÍNDIOS NO BRASIL – TERRAS INDÍGENAS. Disponível em: http://www.funai.gov.br/index.php/indios-no-brasil/terras-indigenas>.
JUZINSKAS, Leonardo Gonçalves. Boletim Científico nº 53, 2019. Disponível em: http://escola.mpu.mp.br/publicacoes/boletim-cientifico/edicoes-do-boletim/boletim-cientifico-n-53-janeiro-junho-2019/breves-apontamentos-acerca-de-causas-e-consequencias-na-adocao-do-marco-temporal-em-materia-de-terra-indigena
MARCO TEMPORAL. Goiânia: PUC Goiás. 2016. pp. 55-83. Disponível em: <https://racismoambiental.net.br/wp-184
Bacharelando do curso de Direito pela Centro Universitário Luterano de Manaus (CEULM/ULBRA), Servidor Público do Estado do Amazonas.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, ALEX RODRIGUES DE. Direitos dos povos indígenas e os efeitos da aplicação do marco temporal nas demarcações de terras indígenas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 nov 2020, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55629/direitos-dos-povos-indgenas-e-os-efeitos-da-aplicao-do-marco-temporal-nas-demarcaes-de-terras-indgenas. Acesso em: 22 nov 2024.
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