LUÍS CARLOS GEHRKE[1]
RESUMO: A presente pesquisa tem por objetivo analisar a responsabilidade civil do adotante que desiste em meio ao processo de adoção, a partir de uma visão histórica em que os direitos e garantias das crianças/adolescentes não eram o foco, tal como o é contemporaneamente, cuja evolução implicou em maior proteção e preocupação para com estes indivíduos notoriamente em formação e, por conta disso, expostos a uma vulnerabilidade. Com isso, tem-se a adoção como ultima alternativa de assegurar a primazia do princípio do melhor interesse da criança/adolescente, bem como a garantia da convivência familiar e dignidade àqueles que outrora tiveram seus direitos fundamentais violados. Para tanto, realizou-se pesquisa doutrinária e jurisprudencial nos Tribunais da Região Sudeste/Sul do país, abrangendo os anos de 2018 a setembro de 2020, a fim de verificar os critérios das decisões que responsabilizam (ou não) o adotante por sua desistência em meio ao estágio de convivência, percebendo-se que eventual condenação em indenização por danos morais - quando aplicadas -, levou em consideração o tempo de permanência da criança/adolescente com a família adotiva e eventual dano àquela, em razão da frustração de sua expectativa. Para isso, utilizou-se o método de abordagem dedutivo e como método de procedimento o monográfico.
PALAVRAS-CHAVE: Convivência familiar. Desistência da adoção. Melhor interesse da criança/adolescente. Responsabilidade civil.
ABSTRACT: This research aims to analyze the civil liability of the adopter who gives up in the middle of the adoption process, from a historical view in which the rights and guarantees of children/adolescents were not the focus, as it is now, whose evolution it implied greater protection and concern for these individuals notoriously in training and, therefore, exposed to a vulnerability. With this, adoption is the last alternative to ensure the primacy of the principle of the best interest of the child/adolescent, as well as the guarantee of family coexistence and dignity for those who formerly had their fundamental rights violated. To this end, doctrinal and jurisprudential research was carried out in the Courts of the Southeast/South Region of the country, covering the years 2018 to September 2020, in order to verify the criteria of the decisions that hold (or not) the adopter responsible for his withdrawal in middle of the coexistence stage, realizing that eventual conviction in indemnity for moral damages – when applied - took into account the time the child/adolescent stayed with the adoptive family and possible damage to that family, due to the frustration of their expectation. For this, we used the deductive approach method and the monographic procedure method.
KEY-WORDS: Family living. Withdrawal from adoption. Best interest of the child/adolescent. Civil responsability.
SUMÁRIO: Introdução. 1 O instituto da adoção no direito brasileiro e o resgate da dignidade da pessoa humana; 2 O processo de adoção e o necessário estágio de convivência como uma das etapas da formação de vínculos; 3 A (im)possibilidade de responsabilização civil do adotante que desiste em meio ao processo de adoção; Considerações Finais; Referências.
INTRODUÇÃO
A adoção é instituto que visa garantir a convivência familiar a crianças/adolescentes que por algum motivo não pode ficar com sua família biológica. Desse modo, quando são adotados adquirem o status de filho, tendo os direitos como se filho biológico fosse, garantia constitucionalmente prevista. Porém, apesar de somente com a sentença de constituição da adoção tornar o adotando legalmente filho, talvez na concepção do deste, ele já integre a família do adotante quando do estágio de convivência.
Desse modo, o presente trabalho propõe-se a discorrer sobre a possibilidade de reparação civil do adotante que desiste em meio ao processo de adoção, haja vista que a lei somente trata como irrevogável o ato após a sentença de constituição da adoção. Cabe ressaltar nesse momento, que estar-se-á a tratar da adoção de menores de dezoito anos, porque àquelas que tem idade superior a isto, tem tratamento diferente do que será abordado neste trabalho. Nesse contexto, a pesquisa tem a pretensão de apresentar divergência de entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre a viabilidade ou não da desistência antes que ocorra a sentença de adoção e até que ponto isso implicará em condenação ao desistente, levando em conta que a adoção é um ato voluntário no qual o pretendente a adoção se propõe a assumir todas as responsabilidades perante o adotando, cujas perdas emocionais começaram com tenra idade e, por conta disso, devem ter seus direitos à dignidade preservados, pois não se trata de um objeto, mas de um cidadão em formação.
Com isso, inicialmente far-se-á uma análise bibliográfica, a fim de melhor contextualizar o assunto e após uma verificação jurisprudencial para demonstrar os critérios das decisões e como estão os posicionamentos de cada Tribunal em relação a condenação do adotante perante sua desistência da adoção. Para tanto, o presente trabalho tem por objetivo geral, analisar se o instituto da responsabilidade civil vem sendo empregado pelos Tribunais da Região Sul/Sudeste do Brasil, no ano de 2018 a setembro de 2020, nos casos do adotante desistir da adoção em meio a adaptação, interrompendo assim o processo de adoção, fazendo com que o adotando retorne ao lar e haja uma frustração na expectativa desta criança/adolescente, além de uma nova rejeição e a permanência em instituições, reduzindo as chances de sua adoção.
Desse modo, para realizar a presente pesquisa, utilizou-se como norte a Constituição da República Federativa do Brasil vigente, a jurisdição e as legislações específicas que regulam o assunto, em especial o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Nova Lei de Adoção (Lei 12.010/2009), a fim de trazer consistência ao trabalho. Assim, o trabalho será dividido em três capítulos, sendo que o primeiro abordará o instituto da adoção no direito brasileiro e o resgate da dignidade da pessoa humana, ou seja, partirá de uma abordagem histórica desde os primeiros indícios do surgimento da adoção, até o que se conhece hoje, mostrando assim grandes evoluções para a garantia da dignidade da pessoa humana a indivíduos em situação de vulnerabilidade.
Na sequência, o segundo capítulo analisará o processo de adoção e o necessário estágio de convivência como uma das etapas da formação de vínculos. Desta forma, o processo será estudado desde antes da criança/adolescente chegar à instituição de acolhimento, abordando o procedimento de destituição do poder familiar e tentativa de mantença com a família estendida. Entretanto, uma vez vencida esta fase, o caminho derradeiro para esta criança/adolescente é a adoção, sendo o estágio de convivência um momento de suma importância, no qual ocorre o primeiro contato com uma nova família, sem a supervisão de profissionais, no qual podem experimentar novamente a sensação de proteção e afeto que uma família deve propiciar.
Porém, a mesma fase que gera expectativas na criança/adolescente é também a que a lei permite desistências por parte do pretenso adotante, mas a depender da situação, poderá causar dano àquela, o que será discutido no terceiro capítulo, o qual abordará justamente a possibilidade de responsabilização civil do adotante que desiste em meio ao processo de adoção, capaz de ensejar a reparação em danos morais em prol do adotando que está em fase de formação de vínculos e com firme propósito de integrar o seio familiar do adotante.
Nesse passo, a pesquisa justifica-se por ter relevância notável tanto ao viés jurídico quanto social, no que se refere a real intenção do adotante, visto que a adoção não deve ser encarada como uma aventura, já que o ato se inicia voluntariamente pelo adotante, sabendo de todas as dificuldades a serem enfrentadas, podendo assim, ter uma nova interpretação da lei. Desta forma, devem ser analisadas as justificativas dos julgadores em suas decisões, pois a desistência poderá acarretar danos à saúde psicológica destes indivíduos vulneráveis. Para tanto, serão analisados julgados dos Tribunais da Região Sul e Sudeste do país, cuja escolha se deve ao fato de que são Estados que possuem o maior número de pretendentes cadastrados para a adoção, conforme dados do Cadastro Nacional de Adoção, os quais apontam que, de um total de 46.395 habilitados, 12.655 são da Região Sul e 22.263 são da Região Sudeste.
Para atingir o propósito, será empregado o método de abordagem dedutivo, pois partirá de uma visão mais ampla, analisando o processo de adoção a partir de uma abordagem mais histórica até a contemporaneidade perpassando por todas as fases do processo, bem como o instituto da reparação civil até chegar-se a uma análise mais específica, com pesquisa dos julgados em sites dos Tribunais das Regiões Sudeste/Sul do Brasil, tendo com método de procedimento o monográfico, pois se fará um estudo das decisões encontradas, para assim determinar as justificativas da aplicabilidade ou não de danos morais ocasionada pela desistência do adotante em meio ao processo de adoção. Ainda, como técnica de pesquisa será realizada através de documentação indireta, com pesquisas bibliográficas, livros, artigos, e jurisprudências. Por fim, importante destacar, que o estudo encontra-se adequado com a linha de pesquisa do Curso de Direito da Antônio Meneghetti Faculdade “Política, Direito, Ontologia e Sociedade”, uma vez que abordará direitos humanos e fundamentais das crianças/adolescentes.
1 O INSTITUTO DA ADOÇÃO NO DIREITO BRASILEIRO E O RESGATE DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
Não é desconhecido que a adoção existe há muitos anos, antes mesmo de ser regulada pela legislação, pois como mencionado por Jamara Rayssa Camelo da Silva “A Bíblia Sagrada narra a adoção do profeta Moisés pela filha do Faraó, no Egito[3]” (SILVA, 2018, p. 13). Outrossim, também Luiza Felipe narra a primeira codificação existente sobre a adoção “O Código de Hamurabi é considerado a primeira codificação jurídica da Antiguidade a tratar do instituto da adoção, o qual tinha o único fim de assegurar a continuidade dos bens e do nome, visando-se apenas o interesse dos adotantes” (FELIPE, 2016, p. 13). Conforme Maria Berenice Dias “[...] sempre existiram filhos não desejados, cujos pais não querem ou não podem assumir. Também há crianças que são afastadas do convívio familiar. Conclusão: há legiões de crianças abandonadas, jogadas no lixo, maltratadas, violadas e violentadas, que escancaram essa realidade” (DIAS, 2016, p. 813-814). Com isso, percebe-se que independente dos motivos que se levaram ao ‘abandono’ do filho, o instituto da adoção não é um ato praticado somente pela civilização atual, nem mesmo a falta de regulação não deteve a sua prática.
Desse modo, em 1916 institui-se o Código Civil, no Brasil, ainda muito limitado e com muitas desigualdades a serem superadas, restringindo somente aos maiores de 50 anos a possibilidade de adoção, desde que não tivesse descendentes. Sobre o assunto, Jamara Rayssa Camelo da Silva destaca que “[...] a adoção só era permitida às pessoas casadas que não possuíssem filhos, podia vir a ser revogada e o adotando não perdia o vínculo com a família biológica” (SILVA, 2018, p. 14). Assim, caso a adoção não ocorresse como o esperado, poderia o adotante ‘devolver’ a criança/adolescente, voltando muitas vezes para a família biológica, pois nesta época não se tinha a perda do poder familiar perante o adotando, permanecendo o vínculo com a família biológica.
Como visto, o direito a adoção no Código Civil de 1916, era proporcionado àquelas famílias que não podiam ter filhos biológicos, tendo propósito somente de uma perpetuação da origem da familiar. A preservação dos interesses do adotando não era o foco na adoção, mas tão somente do(s) adotante(s). Contudo, o advento da Lei n° 3.133/1957, trouxe alterações ao CCB/1916, trazendo algumas melhorias à adoção, conforme destaca Maria Cláudia Crespo Brauner e Andrea Aldrovandi:
Assim, em 1957, foi promulgada a Lei n° 3.133, que modificou o Código Civil vigente à época, alterando dispositivos legais sobre a adoção. Esta Lei introduziu importantes inovações, pois reduziu a idade dos adotantes de 50 para 30 anos, reduziu a diferença de idade entre adotantes e adotados, de 18 para 16 anos, e eliminou a exigência de inexistência de prole. A partir da vigência da Lei 3.133 de 1957, a possibilidade de adoção foi estendida aos adotantes com filhos biológicos. Com essa alteração, pela primeira vez a adoção no Brasil deixou de ser vista como um recurso para suprir a falta de filhos (BRAUNER; ALDROVANDI, 2010, p. 10).
E continuam os doutrinadores em sua obra:
Além disso, esta lei introduziu outro requisito, o consentimento do adotando maior, ou dos representantes legais, em caso de menores. Esta modificação representou importante passo, pois garantiu a preservação dos direitos dos demais envolvidos, e não somente dos adotantes. Anos depois foi aprovada a Lei n° 4.655, de 1965, também considerada como marco na evolução da adoção no Brasil. Esta lei introduziu no ordenamento jurídico brasileiro a legitimação adotiva, cuja aplicação era admitida nos casos de adoção de crianças com até 7 anos, abandonadas pelos pais biológicos. Nos demais casos, a adoção continuava com aqueles efeitos mais restritos, estabelecidos no Código Civil de 1916 (BRAUNER; ALDROVANDI, 2010, p. 10).
Logo, verificam-se algumas evoluções positivas na norma, porém ainda há muito a ser melhorada para assegurar garantias de dignidade à criança/adolescente no que tange a adoção, pois ainda há a participação dos representantes legais do adotando na vontade da adoção, mas considerou pela primeira vez os interesses da criança/adolescente, até então restrita as intenções do adotante.
Outrossim, implicou na diminuição de idade dos adotantes, reduziu a diferença de idade entre adotantes e adotando (para 16 anos), bem como permitindo a adoção por aqueles que já possuíam filhos, propiciando assim melhores oportunidades da criança/adolescente ser adotada. Entretanto, não lhes garantiu quanto ao direito sucessório, a equiparação com os filhos biológicos dos adotantes.
Tais conquistas na legislação brasileira foram influenciadas por legislações internacionais, sempre na busca do resguardo da proteção à criança/adolescente e seu melhor interesse, como descreve Rolf Madaleno:
Interesses superiores das crianças e adolescentes que tiveram como marco inicial a Declaração dos Direitos das Crianças no ano de 1924, na chamada Declaração de Genebra, que reconheceu que a humanidade deve às crianças o melhor que lhes pode dar e que se deve dar aos infantes os meios necessários para seu normal desenvolvimento material e espiritual. Posteriormente, a Declaração dos Direitos da Criança proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1959, dispôs que a criança gozará de uma proteção especial e disporá de oportunidades e serviços assegurados por lei e por todos os meios, para que possa desenvolver-se física, mental, espiritual e socialmente, de forma saudável e normal, em condições de liberdade e dignidade. Termos similares foram adotados na Conferência Internacional de Haia em 1961 (MADALENO, 2018, p. 837).
Na sequência foi instituído o Código de Menores (Lei n° 6.697/1979), nas palavras de Rosane Leal da Silva:
[...] a legislação específica que regulamentava a matéria era o chamado Código de Mello Mattos, de 1927, que perdurou até o advento do Código de Menores, produzido na década de 70 e que inaugurou no Brasil a Doutrina da Situação Irregular. Se na legislação anterior a grande preocupação era a imputabilidade do menor de idade, ou seja, centrava-se na questão do combate da criminalidade, colocando em prática a defesa da sociedade e não daquele que efetivamente merecia proteção em face da idade; sua sucessora acentuou ainda mais as preocupações de caráter higienista, agora disfarçada sob o discurso assistencialista. Ao juiz era concedido o poder de definir a situação irregular, que tanto poderia ter sido produzida por abandono, quanto causada por problemas relacionados à prática de ato infracional. Uma vez que a autoridade jurisdicional conferia esse rótulo ao menor de idade, ele então era recolhido a uma instituição, onde eram acolhidas crianças e adolescentes que se encontravam em diversas situações (SILVA, 2009, p. 31/32).
Nesse sentido, pode-se dizer que, apesar de haver preocupação com a situação do ‘menor’, ainda existiam muitas barreiras, pois a preocupação aqui é separar o ‘menor infrator’ em uma instituição, diferentemente dos outros presos, com mais de 18 anos, que estão em presídios. Contudo, aqueles ‘menores’ que estão em situação de abandono, eram recolhidos nas mesmas instituições que aqueles que cometeram algum delito, ou seja, havia paridade de tratamento, não assegurando o mínimo de dignidade à criança/adolescente abandonadas por sua família biológica, sofrendo agora uma nova segregação, pois eram tidas como infratoras.
Sobre o assunto, importante destacar a que a prerrogativa da dignidade da pessoa humana, foi importante fase vencida, com a extinção do Código de Menores, os quais rotulavam as crianças/adolescentes como incapazes ou inferiores, utilizando o termo ‘menores’, sendo abolido pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, regramento que resguardou direitos e garantias, tendo como esteio a Constituição da República Federativa de 1988, como norma superior, observando-se em seu artigo 1°[4] o princípio fundamental a todos, qual seja da dignidade da pessoa humana, como será abordado na sequência.
Nesse passo, sem sombra de dúvida, a promulgação da Constituição da República Federativa em 1988, importou em relevante ato para o Brasil, impactando em direitos de igualdade em prol do adotando, garantindo-lhe o mínimo de dignidade, estabelecendo a igualdade de tratamento aos filhos, sejam eles biológicos ou adotivos (artigo 227, parágrafo 6°[5]). Em ato contínuo, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n° 8.069/1990) e o Código Civil Brasileiro (Lei n° 10.406/2002) reforçaram este propósito de tutela a estas pessoas em vulnerabilidade, somado a Nova Lei da Adoção (Lei n° 12.010/2009).
Como visto, as crianças e adolescentes uma vez adotadas estão amparadas pela Carta Magna, não podendo sofrer qualquer discriminação ou distinção entre os filhos havidos da relação de casamento ou por adoção, garantindo-lhes os mesmos direitos, o que foi ratificado no ECA, artigo 41[6], o qual dispõe que com a adoção se assume a condição de filho ao adotado, com todos os seus direitos e deveres. Paulo Lôbo, destaca os efeitos da adoção:
Os efeitos da adoção começam com o trânsito em julgado da sentença. Observa a regra geral do trânsito em julgado, porque é suscetível de recurso das partes ou do Ministério Público. Um dos efeitos decorrentes do trânsito em julgado é sua inscrição no registro de nascimento. Porém, o registro tem natureza declaratória, significando dizer que o estado de filiação já se constitui no momento em que se der o trânsito em julgado da sentença. O registro do nascimento deverá consignar o nome dos adotantes como pais, sem qualquer referência à origem adotiva, e nome dos avós, ou seja, dos pais daqueles (LÔBO, 2014, p. 263).
Outrossim, Rolf Madaleno, também discorre sobre o registro de nascimento da criança/adolescente, relatando a importância de romper laços com a família natural:
Transitada em julgada a sentença de adoção, sua inscrição é procedida por mandado judicial no registro de nascimento, sendo consignados os nomes dos adotantes como pais, sem qualquer referência à origem da adoção e bem assim os nomes dos avós, pais dos adotantes, cancelando o registro original do adotado, e vedada qualquer referência acerca da origem da adoção, para que fique no esquecimento a ascendência biológica, porque a adoção faz desaparecer os vínculos do adotado para com os seus parentes naturais e assim também deveria ser na adoção à brasileira, em qualquer direção, seja do ponto de vista do adotante como do adotado, não podendo nenhum deles romper os vínculos de filiação nascidos do registro e da socioafetividade (MADALENO, 2018, p. 883).
Dessa forma, vê-se a preocupação do legislador no que tange ao novo registro de nascimento, proibindo qualquer informação de que a criança/adolescente advém de adoção, presumindo-se que seja um filho biológico. Nesse passo, diferentemente do que ocorria com o Código Civil de 1916, hoje preserva-se a proteção da criança/adolescente, inexistindo qualquer vínculo com a família biológica após a adoção e, mesmo que a adoção não se concretize, não se restabelecerá o poder familiar com a família natural.
Por conta disso, a adoção no ECA está positivada a partir do seu artigo 39[7], mas sempre tendo como esteio a garantia de direitos fundamentais às crianças e adolescentes, para que tenham seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade, estampado no artigo 3°[8] do Estatuto, o qual recentemente sofreu alteração com a inclusão do parágrafo único, alterado pela Lei n° 13.257/2016, a qual dispõe sobre as políticas públicas para a primeira infância, assegurando a aplicação da Lei n° 8.069/1990 à todas as crianças e adolescentes, sem qualquer tipo de discriminação.
Entretanto, sem dúvida a garantia constitucional estampada no artigo 227[9], exprime o direito a convivência familiar, além de outros direitos, como um dever da família, da sociedade e do Estado, o que se torna ainda mais uma necessidade quando se trata de adoção. Com isso, “a convivência familiar é fundamental para que a criança se adapte a vida em sociedade, seus valores e a sua solides prepara as relações com as adversidades culturais e sociais, características do período de maturidade” (SILVA, 2012, p. 16).
Porém, sem dúvida nenhuma, a leniência do Poder Judiciário é um aspecto a ser levado em consideração, a ponto de Rolf Madaleno relatar a preocupação pela morosidade do processo de adoção, inobstante avanços obtidos nos últimos anos em relação a esta questão:
Diante da óbvia morosidade dos processos de adoção e que aprisionam crianças e adolescentes nas instituições e abrigos, tramita o Projeto de Lei do Senado (PLS n. 394/2017), de iniciativa do IBDFAM, cuja proposição, encampada pelo Senador Randolfe Rodrigues, visa a eliminar entraves burocráticos e emprestar celeridade aos processos de destituição do poder familiar e de adoção, de modo a reformular a ótica de todo o sistema, para assegurar às crianças e aos adolescentes afastados da sua família natural o direito à convivência familiar que a Carta Política assegura prioridade absoluta. Ao passo que a Lei n. 13.509/2017 criou alguns mecanismos com vistas à celeridade e efetividade do processo de adoção e instrumentos legais que tornem menos traumática e angustiante a sensação de abandono das crianças e adolescentes que se encontram em programas de acolhimento institucional, ordenando, por exemplo, que a permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongue por mais de 18 meses, salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse (ECA, § 2°, art. 19), assim como a busca à família extensa, que respeitará o prazo máximo de 90 dias, prorrogável por igual período (ECA, art. 19-A, § 3°) (MADALENO, 2018, p. 841).
Como se depreende, as garantias de dignidade à criança e ao adolescente, no decorrer do tempo, são revistas, visando justamente o resguardo de tais prerrogativas. Entretanto, há que se evoluir ainda neste propósito, pois o retardo no trâmite dos processos de adoção implica na permanência maior da criança/adolescente em instituições de acolhimento, privando-os da convivência familiar, o que implicará em consequências para esse cidadão em formação, cuja permanência em tais instituições deveria restringir-se a no máximo 2 anos, foi alterado pela Lei 13.509/2017, estipulando novo prazo de 18 meses, o que por vezes não ocorre, estendendo-se não raras vezes até a idade adulta. Raquel Antunes de Oliveira Silva posiciona-se a respeito:
[...] o abrigo um lugar que oferece proteção, uma alternativa de moradia provisória dentro de um clima residencial, com atendimento personalizado, em pequenas unidades, para pequenos grupos de crianças. As crianças, por determinação legal, poderão permanecer nos abrigos apenas pelo prazo de dois anos – segundo a nova lei de adoção. O que na prática não acontece e, por muitas vezes, a permanência se alonga até a maioridade (SILVA, 2012, p. 16).
Contudo, com o advento da Lei de Adoção (Lei n° 12.010/2009), importantes alterações ao ECA surgem, havendo notável ganho à dignidade e direitos das crianças/adolescente, de realidade tão sofrida. Esta Lei tenta regulamentar estas questões ainda controversas no que tange a adoção, assegurando seu melhor interesse e garantia de convivência familiar, preservando sua dignidade. Sobre o assunto, Munnik Tayla Ribeiro Pedroza relata:
[...] a Lei Nacional de Adoção (12.010/2009), que inseriu inovações importantes para o aperfeiçoamento do direito das crianças e dos adolescentes. Entre as principais inclusões realizadas pela Lei de Adoção no Estatuto da Criança e do Adolescente, destacam-se a normatização do caráter irrevogável da adoção (art. 39, §1º), a fixação de um período máximo de institucionalização (art. 19, §3º), a oitiva dos menores e o acompanhamento durante o processo de adoção por equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude (parágrafos do art. 28 e § 4º do art. 46) e a maior divulgação do cadastro nacional de adoção (parágrafos do art. 50) (PEDROZA, 2017, p.16).
Por conseguinte, o caráter irrevogável da adoção, concederá ao adotando garantia de condições igualitária ao filho biológico, uma vez que não se desiste de filiação biológica. Do mesmo modo, na busca de proporcionar a convivência familiar, tem-se um tempo limite, de dezoito meses (alterado pela Lei 13.509/2017), de institucionalização, pois apesar da instituição sanar algumas necessidades básicas para estas crianças/adolescente, o amor, carinho e valores para uma formação de um cidadão, somente serão atingidas no seio familiar. Também, como um grande avanço, tem-se a participação do adotando em seu futuro, pois não há alguém melhor para decidir em seu favor, que saiba melhor seus interesses.
Ao depois, o paradigma da adoção passou a preservar a garantia constitucional da convivência familiar, amparando a criança/adolescente com uma rede de assistência de profissionais, desde o momento em que os adotantes se voluntariam para o ato de adoção estendendo-se até para após o ato, resguardando assim os direitos das crianças/adolescentes, pois a adoção é última alternativa para esses cidadãos brasileiros os quais somente foram levados a instituições de acolhimento - como lar provisório -, após vencidas todas as possibilidades da mantença junto a família biológica ou extensa, como a seguir será abordado, pois são assuntos que têm grandes discussões em termos de garantia de direitos à criança/adolescente.
2 O PROCESSO DE ADOÇÃO E O NECESSÁRIO ESTÁGIO DE CONVIVÊNCIA COMO UMA DAS ETAPAS DA FORMAÇÃO DE VÍNCULOS
Como já foi abordado no tópico anterior, a adoção é ato que se inicia voluntariamente, ou seja, surge da vontade de alguém de ser pai e/ou mãe, independentemente se possam ter ou não filhos biológicos, sempre tendo como norte o princípio do melhor para a criança/adolescente, conforme destaca Rolf Madaleno:
Os filhos adotivos já representaram uma forma de realização dos desejos para pessoas, matrimônios ou uniões estáveis sem descendência; com o advento da doutrina dos melhores interesses das crianças e dos adolescentes, também no instituto da adoção a prioridade deixou de ser a realização pessoal dos adotantes e passou a prestigiar os interesses superiores da criança e do adolescente, substancialmente integrando uma célula familiar, capaz de proporcionar efetiva felicidade ao adotado (MADALENO, 2018, p. 837).
Dessa forma, há que se destacar que o sentido para da adoção é sempre privilegiar o melhor interesse da criança/adolescente, haja vista que a adoção não serve para uma realização pessoal do adotante, o qual deve ter estrutura, tanto econômicas quanto psicológicas, para receber o adotando no seio de sua família, proporcionando-lhe bem estar em prol daquele que já vem de uma realidade sofrida.
Contudo, antes que a criança seja encaminhada para a adoção, regras devem ser seguidas, pois caso a família venha a falhar em seu dever para com a criança/adolescente, o Estado necessariamente é chamado a intervir, salvaguardando-a dos riscos em instituições de acolhimento, até para que a família se reorganize, recebendo-a novamente, como destaca Maria Berenice Dias:
São impostos enormes e intransponíveis obstáculos para que a mãe não abra mão daquela criança que gestou sem a querer. Os genitores recebem da equipe interprofissional orientações e esclarecimentos sobre a irrevogabilidade da adoção. Juiz e o promotor devem esgotar os esforços para manutenção da criança com os pais ou com a família natural ou extensa. [...] Seguindo a peregrinação, é dada preferência à família extensa ou ampliada. Pelo conceito legal, são os parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade (ECA, 25 parágrafo único). No entanto são feitas demoradas buscas de parentes que nem conhecem a criança. Só após incessantes e infrutíferas tentativas é que tem início o demorado processo de destituição do poder familiar. Mais um laudo psicossocial é realizado, na tentativa de manter o filho com a mãe. Inclusive a Defensoria Pública é orientada a recorrer sempre, até quando os genitores foram citados por edital (DIAS, 2016, p. 816).
Desse modo, percebe-se que a prioridade é que a criança/adolescente permaneça vinculado à família biológica e/ou estendida. Porém, o que se denota é que o demorado processo de destituição do poder familiar, bem como diligências no intuito de localizar algum familiar que possa assumir esta criança/adolescente, revela-se um tortuoso caminho a ser seguido e, enquanto isso, deverá permanecer em instituição de acolhimento, privando-a do convívio em um lar que possibilitasse a convivência familiar, tão necessária para a formação deste indivíduo como cidadão.
Nesse sentido, Maria Berenice Dias descreve:
O filho não é uma "coisa", um objeto de propriedade da família biológica. Quando a convivência com a família natural se revela impossível ou é desaconselhável, melhor atende ao seu interesse - quando a família não o deseja, ou não pode tê-lo consigo - ser entregue aos cuidados de quem sonha ter um filho. A celeridade deste processo é o que garante a convivência familiar, direito constitucionalmente preservado com absoluta prioridade (CF 227). Para esse fim - e infelizmente - não se presta a legislação e nem todos os esforços do Conselho Federal de Justiça, que nada mais fazem do que burocratizar e emperrar o direito à adoção de quem teve a desdita de não ser acolhido no seio de sua família biológica (DIAS, 2016, p. 815).
Com isso, Dias menciona sua insatisfação com o tempo perdido gerado a criança/adolescente em tentativas infrutíferas na mantença com a família natural. Porém esta burocratização, por vezes, apesar de demorado é necessário, para não acabar retirando destas crianças/adolescentes o direito de permanecerem com sua família natural por motivos que poderiam ser solucionados sem a necessidade da destituição do poder familiar. Sendo que, o objetivo é sempre o melhor interesse da criança/adolescente, primeiramente se tentará esta mantença com a família natural e somente com a impossibilidade desta, àqueles serão levados a instituições de acolhimento.
Assim, após verificar-se que a família biológica ou estendida não tenha condições de amparar esta criança/adolescente, surge a adoção como última alternativa, permanecendo sob a tutela do Estado nas instituições de acolhimento, espaço no qual não há efetivamente o convívio familiar. Sobre o tema, Tarciane Isabel Conrad relata:
[...] as instituições de acolhimento não conseguem suprir o papel fundamental da família, que é proteger e promover a dignidade de seus membros através da construção de vínculos afetivos, pois trata-se apenas de uma relação institucional, sem a construção de vínculos duradouros com um adulto. [...] diante da fragilidade e da precariedade dos vínculos que se estabelecem em instituições de acolhimento, o instituto da adoção surge nesse contexto como um instrumento capaz de promover a interação familiar, dando uma nova oportunidade para aquelas crianças que se encontrem abrigadas nessas instituições e afastadas de sua família natural, constituírem uma nova família. A adoção se revela importante alternativa na tentativa de promover a convivência familiar e comunitária da criança e do adolescente, pois é uma oportunidade para que o adotando possa desenvolver-se dignamente no seio de uma nova família, de um novo lar, com pais afetivos que se importem com ela e que forneçam os meios necessários para que cresça de forma saudável, uma vez que isso não foi possível no âmbito de sua família natural (CONRAD, 2019, p. 222).
Por certo, os abrigos ou instituições de acolhimento têm por objetivo o caráter provisório, com propósito de reinclusão em seu núcleo familiar e, uma vez superada esta possibilidade, avança-se no rito da adoção, permitindo-se que a criança/adolescente possa desfrutar de um convívio em família, e um lar sadio, como desde o início de sua vida era para ter sido. Por conta disso, a lei menciona, um prazo máximo de dezoito meses para a permanência nestas instituições, sendo que este prazo foi modificado em 2017 pela lei 13.509 em seu artigo 19, parágrafo 2°[10], no qual anteriormente o Estatuto da Criança e do Adolescente previa um prazo máximo de dois anos. Porém, por mais que a lei tenha tido alterações, na tentativa de assegurar melhores condições aos interesses da criança/adolescente, a realidade não é bem esta, seja por questões burocráticas ou de outra ordem, como será visto no decorrer deste trabalho.
Prova disso, são os dados do Cadastro Nacional de Adoção, retirada da página eletrônica do Conselho Nacional de Justiça, que apontavam um total de 8.911 (oito mil novecentos e onze) crianças cadastradas para adoção enquanto que existem 46.395 (quarenta e seis mil trezentos e noventa e cinco) pretendentes habilitados para adoção no Brasil. Tais dados refletem exatamente o quadro da adoção no Brasil, pois existem mais pessoas dispostas a adotarem do que crianças disponíveis a adoção, o que poderia ser algo excelente, haja vista que implicaria na redução da permanência da criança/adolescente em instituições de acolhimento, assim como a diminuição no trâmite do processo de adoção. Porém, a busca do ‘filho perfeito’ acaba por gerar uma improporcionalidade destes números, conforme destaca Paula Andrade:
As casas de acolhimento e instituições públicas abrigavam em 26 de março de 2020, 34.820 crianças e adolescentes. Mais de 60% são adolescentes e a divisão entre os gêneros é quase idêntica. [...]
Os adolescentes compõem a maior parte dos acolhidos no Brasil: ao todo, são 9.420 com mais de 15 anos de idade. Destes, um terço está acolhido há mais de três anos e não têm irmãos nas mesmas condições. Em 3% dos casos, há diagnóstico de deficiência intelectual e, em 4%, há presença de problemas de saúde. No outro extremo, estão as crianças na fase da primeira infância – de 0 a 6 anos. Juntas, elas somam 9.160 acolhimentos. Cerca de 2.400 bebês com até 3 anos aguardam até seis meses pelo retorno a família de origem ou pela adoção. Este é o mesmo tempo de acolhimento a que estão submetidas a maioria das crianças com 3 a 6 anos (ANDRADE, 2020).
Igualmente, Lenir Camimura refere a preferência na busca de uma criança para adotar:
Os dados também confirmam que, à medida que a idade aumenta, o número de adoções é menor. De acordo com o relatório, do total de adoções realizadas, 5.204 (51%) foram de crianças de até 3 anos completos; 2.690 (27%) foram de crianças de 4 até 7 anos; 1.567 (15%) foram de crianças de 8 até 11 anos; e 649 (6%) foram de adolescentes acima de 12 anos. [...] Quanto aos pretendentes, há mais de 34 mil habilitados no cadastro do SNA. Desses, aproximadamente 93,8% ainda não estão vinculados a qualquer criança ou adolescente. Esses dados reforçam que o perfil desejado pode refletir na demora do andamento do processo, pois não é possível vincular os pretendentes ao perfil existente das crianças e adolescentes disponíveis para adoção (CAMIMURA, 2020).
Com isso, percebe-se que embora se tenha crianças/adolescentes para suprir toda a demanda de pessoas que queiram adotar, há fatores que impedem sua efetivação. A busca por crianças sem problemas de saúde e preferência de idade de até 3 anos, limita as crianças disponíveis, consequentemente retardando ou impossibilitando a adoção daqueles que não se enquadram neste contexto. Logo, dependendo do perfil da criança/adolescente, o prazo de permanência em instituições de acolhimento, supera o estabelecido em lei.
Contudo, apesar destes entraves a adoção se apresenta como última alternativa para a garantia de dignidade a estas crianças/adolescente, vítimas da desestrutura familiar e da ausência de reinserção em seu núcleo familiar original. Assim cabe conceituar a adoção, nas palavras de Raquel Antunes de Oliveira Silva:
Do ponto de vista jurídico, a adoção é um procedimento legal que consiste em transferir todos os direitos e deveres de pais biológicos para uma família substituta, conferindo para crianças/adolescentes todos os direitos e deveres de filho, quando e somente quando forem esgotados todos os recursos para que a convivência com a família original seja mantida. [...] A adoção representa também a possibilidade de ter e criar filhos para pais que não puderam ter filhos biológicos ou que optaram por ter filhos sem vinculação genética, além de eventualmente atender às necessidades da família de origem, que não pode cuidar de seu filho (SILVA, 2012, p. 27).
Importante registrar, uma vez mais, que a adoção tem o objetivo de garantir o melhor para a criança/adolescente, permitindo ao fim e ao cabo desse processo, que o ator principal desta celeuma tenha melhores condições na nova família do que na instituição de acolhimento.
Registre-se, por oportuno, que a doutrina aponta vários tipos de adoção – adoção a brasileira, adoção de maiores de idade, adoção póstuma, dentre outras -, as quais não serão objeto de análise neste trabalho, pois destina-se a discutir a adoção legal, com a rigorosa observância da lei, obedecendo-se o rito processual e as devidas fases da adoção, no qual o(s) adotante(s) tem total ciência das necessidades da criança/adolescente, foco de todo o processo. Além disso, haverá a atuação de profissionais, que acompanharão o(s) adotante(s) e adotando(s), verificando se aquele possui condições para receber em sua família uma criança/adolescente, capaz de garantir-lhe e propiciar-lhe um ambiente saudável para a formação do cidadão.
Dessa maneira, cumpre salientar as várias fases do procedimento de adoção, conforme o referido por Luiza Felipe:
O processo de adoção ocorrerá judicialmente à semelhança de uma demanda, respeitando-se os procedimentos previstos na Lei nº 8.069/1990 e na Lei nº 12.010/2009. O procedimento da adoção é dividido em seis principais fases, quais sejam: petição inicial de habilitação, etapa de preparação dos pretendentes a adotantes, deferimento do pedido de habilitação e inscrição no Cadastro Nacional de Adoção (CNA), requerimento de adoção, estágio de convivência e sentença (FELIPE, 2016, p. 26).
Importante destacar que a adoção é ato que se origina judicialmente, necessitando assim de uma petição inicial para que se de inicio. Dessa forma, Luiza Felipe relata o processo inicial:
[...] o processo de adoção deve se iniciar com uma petição inicial de habilitação, preparada por um defensor público ou particular, a qual deve ser protocolada no Juízo da Infância e da Juventude, acompanhada de alguns documentos, como certidão de casamento ou nascimento, cópia da cédula de identidade e inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas, entre outros. Só depois de aprovado, os nomes dos pretendentes à adoção serão habilitados a constar no Cadastro Nacional de Adoção (FELIPE, 2016, p. 27).
Antes de ser concedido o pedido de habilitação, o candidato adotante deve participar de uma preparação, conforme bem lembra Munnik Tayla Ribeiro Pedrosa, pois são modificações trazidas pela Lei 12.010/2009 e a Lei 13.509/2017, no Estatuto da Criança e do Adolescente, relatam a necessidade do candidato à adoção participar de programas oferecidos pela Justiça da Infância e da Juventude:
[...] tornou-se impreterível o período preparatório dos postulantes à adoção antes de seu cadastro nos sistemas de adoção, com a obrigatoriedade de participação em programas oferecidos pela Justiça da Infância e da Juventude e com a intervenção da equipe interprofissional a serviço do Juízo e dos grupos de apoio (PEDROSA, 2017, p. 17).
Nesta fase, o candidato adotante terá contato supervisionado por profissionais - como psicólogos e assistentes sociais -, com as crianças/adolescentes que estão aptas para adoção. Neste momento, eles serão analisados e instruídos de como é a adoção, os percalços a serem vencidos e as agruras que a criança/adolescente perpassou até chegar às instituições de acolhimento. Nas palavras de Munnik Tayla Ribeiro Pedrosa, “É preciso expor que as pessoas que esperam serem adotadas já passaram por um ciclo de rupturas e não são seres perfeitos” (PEDROSA, 2017, p. 18). Assim, terão que ter conhecimento da situação e paciência para saber ajudar estas crianças/adolescentes, para sempre preservar o seu melhor interesse.
Em seguida, verificando o juiz os laços formados entre os envolvidos, candidato a adoção e propenso adotando, deferirá o necessário estágio de convivência, cujo propósito é que os envolvidos consigam estreitar mais suas afinidades, visto que não são acompanhados de profissionais, tendo mais liberdades para se conhecer melhor, com uma maior interação e entrosamento, necessário passo para a formação de vínculos. Encontra-se positivado no artigo 46[11], do ECA e, conforme o disposto, terá uma duração de no máximo 90 dias, podendo ser prorrogado por igual período, na forma do parágrafo 2°[12] ou ainda dispensado, nas condições do parágrafo 1°[13], ambos do mesmo artigo alhures referido.
Importante destacar que no estágio de convivência, ainda não há vínculo jurídico entre o adotando e adotante, podendo legalmente, ocorrer a desistência da adoção neste período. Em virtude desta fase se tornar muito longa, há certos questionamentos em relação a esta desistência, é o que refere Majoí Coquemalla Thomé:
Embora os vínculos jurídicos ainda não tenham se formado, é possível que os vínculos afetivos já existam, assim, da perspectiva da criança, o abandono no estágio de convivência pode não diferir daquele efetuado após a adoção, se a criança já se sentir parte da família. Importante ressaltar que, em razão da não uniformidade dos procedimentos adotados nas Varas da Infância e Juventude no Brasil e da morosidade decorrente da carência de equipes técnicas e ausência de varas especializadas, há comarcas em que o estágio de convivência e/ou a guarda provisória são demasiadamente longos; assim, ainda que a adoção não tenha sido consumada no plano jurídico, pode já ter sido no plano psicológico, do ponto de vista da criança (TOMÉ, 2018).
Ainda sobre o estágio de convivência, Anna Carolina de Souza Fernandes explana sobre sua importância na já criação de laços entre adotante e adotado.
O período de adaptação não somente servirá para o magistrado avaliar, mas também para as partes criarem laços de afeto e convivência, mais calorosos do que aqueles feitos nas visitas supervisionadas no abrigo. Os pretendentes irão aprender mais sobre a criança ou adolescente, aprender como será o dia a dia com um novo integrante na família, o jeito que irão conduzir, a personalidade do adotando, do que mais gosta, os cuidados, educação e responsabilidades. Na situação de adotando, servirá para adaptação da criança no novo seio familiar, com pessoas novas, casa nova, e, consequentemente, uma nova vida (FERNANDES, 2019, p. 47).
Com isso, pode-se dizer que a contar desta etapa em diante, já há laços formados entre o adotante e adotando, gerando certa expectativa a criança/adolescente na constituição da nova família, surgindo a partir disso, o questionamento se há responsabilidade civil em caso de desistência da adoção por parte do(s) adotante(s) quando já iniciado o período de adaptação, o que será objeto de abordagem no próximo capítulo.
3 A POSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DO ADOTANTE QUE DESISTE EM MEIO AO PROCESSO DE ADOÇÃO
A responsabilidade civil é um instituto que tem por objetivo reparar, mediante indenização, o dano que alguém causou a outro, por ato ilícito, conforme prevê o artigo 927[14] do CCB. Desse modo, esse instituto é apenas a tentativa de reparar o que o agente sofreu, indenizando-o de acordo com o que se pode presumir do dano, com intuito de retorno a situação anterior. Desta forma, Munnik Tayla Ribeiro Pedroza, relata: “Portanto, a importância da responsabilidade civil está na busca pela reparação ou compensação do dano sofrido pela vítima, aproximando-lhe de uma situação mais próxima a que estava antes da ocorrência do prejuízo, além de penalizar o causador do dano” (PEDROSA, 2017, p. 21).
Contudo, a responsabilidade civil se divide em duas: contratual e extracontratual, podendo esta ser subjetiva (culpa provada e culpa presumida) ou objetiva (abuso do direito, atividade do risco, fato do produto, fato de outrem, fato da coisa, do Estado e dos prestadores de serviços públicos, nas relações de consumo); enquanto aquela, com obrigação de resultado, e com obrigação de meio (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 21).
Logo, cabe mencionar quanto culpa na responsabilidade civil, podendo ser objetiva ou subjetiva. A primeira, quando não se precisa comprovar culpa, ou seja, quando se presume pela atividade exercida, conforme o disposto no artigo 927, parágrafo único, do CCB[15]; já a segunda, quando há necessidade da comprovação do elemento culpa, tudo nos termos dos artigos 186 e 187, do CCB[16]. Para melhor compreensão, Anna Carolina de Souza Fernandes descreve:
Para que se configure a responsabilidade subjetiva, é necessário, além da conduta, nexo causal e dano ocasionado, que seja comprovado o elemento culpa. Ou seja, o agente age de forma comissiva ou omissiva, com intenção (dolo) ou por negligência, imprudência e imperícia (culpa), causando dano a outrem. A teoria objetiva, diferentemente da subjetiva, prescinde da culpa para sua configuração, admitindo, pois, a responsabilização do agente pelo dano causado, sem que seja configurado o elemento culpa (FERNANDES, 2019, p. 29).
Nesse mesma linha de pensamento, Sergio Cavalieri Filho menciona:
A ideia de culpa está visceralmente ligada à responsabilidade, por isso que, de regra, ninguém pode merecer censura ou juízo de reprovação sem que tenha faltado com o dever de cautela em seu agir. Daí ser a culpa, de acordo com a teoria clássica, o principal pressuposto da responsabilidade civil subjetiva (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 17).
E continua Sergio Cavalieri Filho, a discorrer sobre o direito subjetivo, em que em primeiro momento pensa-se somente em proteger direitos pactuados contratualmente, porém tem-se àqueles da esfera extracontratual, que merecem ser respeitados com absoluta prioridade, pois são direitos personalíssimos, garantidos constitucionalmente:
Por violação de direito deve-se entender todo e qualquer direito subjetivo, não só os relativos, que se fazem mais presentes no campo da responsabilidade contratual, como também e principalmente os absolutos, reais e personalíssimos, nestes incluídos o direito à vida, à saúde, à liberdade, à honra, à intimidade, ao nome e à imagem (CAVALIERI FILHO, 2012, p. 19).
Portanto, o elemento culpa, no direito subjetivo é essencial, por isso sempre que se estiver falando de possibilidade de reparação civil, deve ser analisada a conduta do agente que praticou o ato que causou dano a outrem. Nesse passo, a medida que se cogita uma reparação civil (indenização), há que se ter como premissa prejuízos materiais (de bens) ou também danos morais, quando direitos fundamentais são atingidos.
Feito esse necessário introito, mister analisar até que ponto há responsabilidade civil do adotante em razão da desistência da adoção, o que implica na análise de dois princípios constitucionais que amparam estas relações, conforme refere Luiza Felipe “[...] princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da prioridade absoluta em relação à proteção integral à infância e à juventude” (FELIPE, 2016, p. 46). Estes princípios devem sempre ser observados, visto que o princípio da dignidade da pessoa humana vai assegurar direitos básicos para todos os seres humanos, como saúde, educação, a alimentação, etc.; bem como, aqueles que atingem sua personalidade. Em seguida, importante destacar quando se fala em criança/adolescente, o princípio da proteção integral à infância e à juventude, cabendo desta forma, ao Estado, à família e à sociedade assegurar as melhores condições a estas crianças/adolescentes. Quando a família falha, necessariamente o Estado é chamado a intervir.
Contudo, faz-se necessária uma breve explanação sobre termos utilizados para designar a desistência da adoção em relação ao adotando, ou seja, a forma mais correta de nominar esse rompimento: devolução ou reabandono da criança/adolescente, como destaca Majoí Coquemalla Thomé:
Ao tratar os casos como “reabandono” e não “devolução” imprime-se aos adultos a condição de abandonadores, tirando-os da posição de pessoas que estão devolvendo algo danificado ou que não as pertence. Também se modifica o papel da criança, que deixa de ser tratada como objeto e passa a ser vista como pessoa, alguém que não teve sua vontade considerada (THOMÉ, 2018).
Assim sendo, o termo a ser utilizado vai interferir significativamente no resultado a que se almeja referir, ou seja, quando se desiste da adoção, é ato praticado pelo adotante e o termo ‘devolução’ remete que a culpa é do adotando, objetificando a criança/adolescente. Torna, simples e fácil a conduta, ‘caso não der certo, devolve’. Já por ‘reabandono’, coloca-se a criança/adolescente com sujeitos de direitos, e o adotante como um sujeito infrator.
Nesse passo, mister sempre repisar que a criança/adolescente merece uma vida digna com todos os seus direitos garantidos e, quando se cogita em ‘devolução’ do propenso adotado, estar-se-á violando estes princípios, implicando a devida responsabilização, nas palavras Luiza Felipe:
[...] é patente que com a ocorrência deste ato odioso de devolução, esses seres têm os seus direitos mais elementares violados, de maneira que não se pode permitir que atitudes como essa saiam impunes, sendo necessário encontrar meios para desencorajar tal prática, como a possibilidade de indenização por danos morais [...] (FELIPE, 2016, p. 46).
Dessa forma, quando se refere desistência da adoção, é importante pensar-se que o pólo mais afetado e que mais sofre na relação, é o adotando, cujo depoimento perante o magistrado é de grande relevância, conforme Majoí Coquemalla Thomé:
Por se tratar de um ser humano, e não de um objeto, é interessante que os juízes sempre ouçam a criança ou o adolescente nos processos que versam sobre eles, respeitando as possibilidades e o desenvolvimento de cada um. Ao ser ouvida, a criança participa da definição do seu destino e pode ajudar a nortear o Juiz sobre qual seria a melhor solução para seu caso (THOMÉ, 2018).
Registre-se que não há que se cogitar em desistência da adoção após a sentença de constituição de mérito, visto que a própria Lei 8.069/1990, em seu artigo 39, parágrafo 1°[17], remete que a adoção é ato irrevogável, produzindo efeitos após o trânsito em julgado da sentença constitutiva, conforme artigo 47, parágrafo 7°[18]. Sobre isso, refere Jamara Rayssa Camelo da Silva:
A devolução do adotando fere a dignidade da pessoa humana, causando-lhe evidente dano moral. E, nos casos da desistência após a sentença constitutiva, ofende, além da dignidade, o princípio da responsabilidade parental (art. 100, parágrafo único, IX, do ECA) e o princípio da não discriminação entre filhos pela origem da filiação. O primeiro efeito da sentença constitutiva é a condição de filho, passando a criança/adolescente a gozar dos mesmos direitos e deveres atribuídos aos demais filhos, sejam biológicos ou não. A irrevogabilidade da adoção, após o trânsito em julgado da sentença, surge dessa condição de igualdade entre os filhos, uma vez que a filiação é eterna, independentemente de qual seja a sua origem. Não se extingue o vínculo de filiação nem mesmo com a morte dos adotantes ou do adotando. Quando o adotante devolve o filho, já legalmente adotado, está negando a sua responsabilidade parental, abandonando afetivamente a criança/adolescente que já é seu filho (SILVA, 2018, p. 38-39).
Seguindo nesta mesma linha de raciocínio, há que se estudar sobre a possibilidade ou não da desistência da adoção durante o estágio de convivência. Como já abordado anteriormente, esta etapa está vinculada a um período de adaptação tanto para o adotando como para o adotante. Porém, não se pode negar que o tempo havido em família gera expectativas na efetivação da adoção, a qual é muito maior por parte do adotando. Sobre isso, Anna Carolina de Souza Fernandes refere:
Durante esse período a devolução do adotando ao lar estatal é lícita, tendo em vista que a sentença que defere a adoção ainda não fora proferida. No entanto, o que se nota é a desistência do processo de adoção de forma injustificada, de forma que não gera nenhuma responsabilização para estes pais, em que pese essa devolução durante o período probatório nem sempre seja passível de responsabilização. Porém, salienta-se para que o procedimento da adoção chegue no estágio de convivência, os pretendentes e o adotando já passaram por outras avaliações e análises que o antecedem (FERNANDES, 2019, p. 49).
Com isso, verifica-se que muitas vezes a desistência da adoção no estágio de convivência passa impune, em virtude de não ser ilícita a devolução nesta fase, haja vista que a sentença de adoção ainda não ter sido proferida. Porém Anna Carolina de Souza Fernandes destaca:
A responsabilização destes pretendentes não é pautada somente no ato de devolução da criança, mas sim quando estes excedem os limites de boa-fé, quando devolvem essas crianças sem um motivo justificável, por motivos banais, falta de compreensão. Como explicado, a devolução neste período ela é licita, podendo o pretendente o fazer até a sentença. Porém, nas circunstâncias em que as crianças são devolvidas, poderá haver responsabilização destes pais que já passaram por tantas outras avaliações antes de obter a guarda da criança. Assim, é possível concluir que a desistência do processo pode causar danos na criança e/ou adolescente (FERNANDES, 2019, p. 53).
Dessa maneira, quando se aborda o assunto atinente a desistência da adoção, é relevante analisar os motivos que levaram a tal ato, pois isso será ponto primordial para responsabilizar (ou não) o adotante moralmente, uma vez que a possível justificativa desta desistência talvez seja algo que já estavam cientes que poderia ocorrer, pois foram preparados nas primeiras fases da adoção e mesmo assim deram prosseguimento ao processo de adoção.
Sobre o assunto, Fernando Moreira Freitas da Silva manifesta sua preocupação quanto a desistência da adoção, trazendo como exemplo o caso ocorrido no Tribunal de Justiça da Paraíba, envolvendo duas irmãs ‘devolvidas’ após três anos de convivência com a família adotiva:
“Todos os conflitos narrados na decisão – comportamento agressivo, pequenos furtos na escola, mentiras, desrespeito aos limites, dificuldades de adaptação ao lar – podem ocorrer tanto com filhos adotivos quanto com filhos biológicos. Nunca fui procurado por uma família biológica para entregar o seu filho por tais comportamentos, apesar de eles existirem” (SILVA, 2020).
Com isso, percebe-se que os motivos elencados para justificar a desistência da adoção já são sabidos pelas pessoas que pretendem adotar, haja vista, saberem da realidade das crianças disponíveis a adoção. Existe a necessidade de transpor estas barreiras, visto que, como dito por Silva, estas dificuldades com comportamentos reprováveis, poderão ocorrer até mesmo com filhos biológicos, porém estes não são ‘devolvidos’.
Diante disso, cabe expor que a ‘devolução’ da criança a instituição de acolhimento ocasiona o sentimento de frustração e nova rejeição a criança/adolescente. Nesse sentido, alude Tarciane Isabel Conrad:
[...] o resultado esperado do estágio de convivência é que resulte na concretização da adoção, com a construção de uma nova família, fraterna e amorosa. Portanto, quando ocorre a devolução da criança às instituições de acolhimento, elas acabam sofrendo um forte abalado emocional ao ver frustrada sua expectativa de ser efetivamente adotada e tornam-se as principais vítimas da situação, visto que além de retornarem para as instituições de acolhimento, vão carregar essa experiência traumática, de ser devolvida, ao longo de suas vidas (CONRAD, 2019, p. 231).
Ainda cumpre salientar as conclusões de Samara Silva dos Santos:
[...] embora não haja vedação legal impedindo a devolução do adotando durante o estágio de convivência, busca-se, acima de tudo, a proteção integral da criança e do adolescente. Assim, entende-se cabível a responsabilização civil do adotante pelos danos morais causados ao adotando pela sua devolução durante o estágio de convivência nos casos em se configuram os atos ilícitos previstos nos artigos 186 e 187 do Código Civil. Não com o objetivo somente de reparar o prejuízo experimentado pela criança ou pelo adolescente, mas para desestimular condutas desta natureza, alertando os adotantes para a seriedade do ato de inscrição para adoção (SANTOS, 2019, p. 45).
Desse modo, entende-se que para a responsabilidade civil do adotante leva-se em consideração o quanto esta criança/adolescente foi atingida pelo ato da ‘devolução’, que sentimentos as proporcionaram. Considerando se esta era uma vontade, também, da criança/adolescente ou foi gerado expectativa de fazer parte da família, rompendo bruscamente este desejo, trazendo-lhes problemas psicológicos, fruto de nova rejeição.
Contudo, o que geralmente é confundido pelo adotante no estágio de convivência é o seu real objetivo, haja vista que diferentemente do que se pensa, esta etapa não serve para testar se aquele pode ser seu ‘filho ideal’, e sim período para integração com a família. Assim dispõe Majoí Coquemalla Thomé: “O período antecedente à adoção tem a finalidade avaliar a integração da criança à família e a adaptação mútua; não deve ser encarado como a possibilidade de os adotantes “testarem” a criança para decidir se ela se enquadraria como filha” (THOMÉ, 2018).
Dessa forma, insta destacar que a adoção é ato que se inicia voluntariamente e, após iniciada, gera obrigações e deveres, pois no momento em que as crianças/adolescentes são destituídas do poder familiar e colocadas em instituições, o objetivo é assegurar seu melhor interesse. Desta forma, a adoção, independentemente da fase em que se encontre, deverá o pretenso adotante ter todo cuidado com estas crianças/adolescentes, pois vínculos familiares para estes, poderá já estar formado em sua concepção, tendo expectativa na concretização da adoção.
Outrossim, há que se entender que a desistência da adoção é matéria que diz respeito a responsabilidade civil subjetiva, visto que deve ser analisado cada caso e suas peculiaridades, por se tratar da culpa, pois no momento em que se cogita a desistência da adoção, deve ser levado em consideração que um dos pólos desta relação é integrado por uma criança/adolescente, cujos direitos são personalíssimos.
Para Jamara Rayssa Camelo da Silva, ainda é importante referir sobre perda de uma chance, em que crianças com mais de 5 anos teriam menos probabilidade de serem adotadas sendo desta forma, que ao serem retiradas das instituições de acolhimento e após devolvê-la, implicaria em redução de suas chances para que venha a ser adotada, como bem destaca:
Infelizmente, crianças acima de 5 anos já não estão no interesse da maioria dos adotantes. Assim, é evidente que, conseguir a guarda de uma criança que ainda está na idade mais procurada pelos adotantes e devolvê-la quando já pertence a outro grupo não tão desejável, reduz consideravelmente suas chances de ser adotada posteriormente por outra família. E, como exposto alhures neste trabalho, a devolução passará a constar no histórico do adotando, podendo gerar nos próximos pretendentes um certo preconceito contra o adotando. Conclui-se, portanto, que a devolução, de fato, reduz as chances de a criança/adolescente vir a ser adotada por uma família que possa lhe oferecer condições dignas, afeto e amparo que os adotantes não conseguiram oferecer (SILVA, 2018, p. 40-41).
Ainda, Carlos Roberto Gonçalves relata a o surgimento deste instituto da perda de uma chance e no que consiste sua configuração:
[...] deve-se à jurisprudência francesa, que desde o final do século XIX entende indenizável o dano resultante da diminuição de probabilidades de um futuro êxito, isto é, nos casos em que o fato gerador da responsabilidade faz perder a outrem a possibilidade (chance) de realizar um lucro ou evitar um prejuízo. Se a chance existia, e era séria, então entra no domínio do dano ressarcível (GONÇALVES, 2012, p.242).
Com isso, entende-se que para incidir a perda de uma chance, deverá o atingido ter um certo prejuízo com a atitude de outrem, na aplicabilidade ao tema, a desistência da adoção deverá ter ocasionado algum dano ao adotando, dano este que não terá como recuperar por não poder voltar o tempo. Além disso, refere que a “Mera possibilidade não é passível de indenização, pois a chance deve ser séria e real para ingressar no domínio do dano ressarcível” (GONÇALVES, 2012, p. 256), desta forma, o dano suportado pelo adotando para ter a condenação em indenização, mesmo que moral deve realmente perceptível.
Desse modo, verifica-se que apesar de ser legal a desistência da adoção no estágio de convivência – pois a irrevogabilidade no que tange a adoção, somente dar-se-á com a sentença definitiva -, o que será analisado quanto a eventual responsabilização civil por condenação em indenização por dano moral é a justificativa da desistência da adoção.
Nessa lógica, Majoí Coquemalla Thomé tem a seguinte contribuição:
[...] algumas desistências durante o estágio de convivência ou guarda provisória são tão devastadoras quanto o abandono e o reabandono. Necessário seria que se analisasse o caso, considerando o tempo de duração do estágio de convivência, o período em guarda provisória e os vínculos formados entre adotantes e adotandos. Afinal, é provável que uma ruptura após bastante tempo de coabitação seja mais danosa do que a desistência já nos primeiros meses de convívio (THOMÉ, 2018).
Salienta-se, que apesar da desistência da adoção no período do estágio de convivência ser legal, deve ser levado em apreço fatores condicionantes que levaram a esta medida, além do tempo que esta fase se perdurou, pois quanto mais tempo conviveram, naturalmente mais laços foram criados, podendo gerar sentimento de novo abandono ou reabandono na criança/adolescente.
Do mesmo modo, Pablo Stolze Gagliano e Fernanda Carvalho Leão Barretto relatam que a desistência da adoção durante o estágio de convivência, em seu sentido estrito, não é ilegal, ou seja, não sendo passível de reparação civil. No entanto, há que se considerar outros aspectos do andamento do processo, a fim de verificar se há incidência de reparação civil ou não:
Não desconsideramos, contudo, que possa haver intenso sofrimento psíquico para a criança ou o adolescente se, por exemplo, o estágio de convivência se estender por tempo significativo, se ocorrer majoritariamente fora dos limites do abrigo ou se o laço entre as partes se desenvolver com aparência de firmeza, por meio de atitudes capazes de criar no candidato a filho a sólida expectativa de que seria adotado (GAGLIANO; BARRETTO, 2020).
Como se pode perceber, a condenação em danos morais ao adotante desistente durante o período de convivência é um tema que desperta discussão no meio jurídico, tanto no âmbito doutrinário como jurisprudencial, como será na sequência analisado, mas tudo dependerá dos motivos ou tempo que se levou para esta decisão. Além do que, há que se observar a questão sob outro prisma, haja vista que eventual condenação por danos morais ao pretenso adotante poderá implicar em reflexos aos futuros adotantes, conforme destaca Fernando Moreira Freitas da Silva em site de notícia do IBDFAM, quando abordava o assunto: “Outra preocupação que tenho é que a condenação por danos morais iniba novas famílias adotivas de se habilitarem à adoção por terem medo de não conseguirem e ainda saírem condenadas” (SILVA, 2020).
Desta forma, a indenização, caso venha a ser aplicada, deve ter o condão para desestimular a prática e para reparar o dano que a criança/adolescente sofreu e, somente, quando o estágio de convivência extrapola seu fundamento para aquilo que foi destinado. Nesse passo e com intuito de dar maior credibilidade à pesquisa do presente trabalho, realizou-se pesquisa jurisprudencial nos Tribunais da Região Sudeste e Sul do Brasil, restritivamente aos anos de 2018 a setembro de 2020, tendo as seguintes palavras-chave: “estágio de convivência”, “desistência da adoção” e “adoção”, para assim verificar como o tema da responsabilização do adotante desistente em meio ao estágio de convivência vem sendo abordado pelos julgadores desses Tribunais.
Desta forma, importante frisar que compõem os Tribunais da Região Sudeste, o Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro; enquanto o Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul integram os Tribunais da Região Sul. Assim, a pesquisa nas páginas eletrônicas destes Tribunais, utilizando os critérios já mencionados, obteve-se os seguintes resultados relacionados ao tema, localizando zero, um, três, cinco, zero, dois e dois, julgados respectivamente.
Partindo-se para uma análise pontual destas decisões - mas que não engloba a todas elas, em razão da limitação do número de laudas da presente pesquisa -, cabe destacar a Apelação Cível n° 1.0702.14.059612-4/001, extraída do site do TJMG, no qual a Desembargadora Hilda Teixeira da Costa acompanhou o voto do Relator Caetano Levi Lopes, condenando os desistentes ao pagamento de indenização por danos morais ocasionados ao adolescente, inobstante a argumentação daqueles quanto as dificuldades de relacionamento do adotando após o nascimento do filho biológico do casal adotante, numa demonstração de ciúmes, insurgindo-se em relação ao tempo dedicado ao recém-nascido, implicando em uma incompreensão e retorno a comportamentos existentes a época do acolhimento institucional. Contudo, o que foi motivador para a condenação dos desistentes foi o fato do vínculo familiar já existir na concepção do adotando, como infere-se de seu voto:
É dizer, o estágio de convivência se constitui em prol da criança e visa à verificação da adaptação ou não do adotando ao novo lar, não se prestando este estágio para que os pretensos pais adotivos decidam se vão adotar ou não. Isso porque tal decisão deve anteceder o efetivo ajuizamento do processo de adoção, para o fim de evitar danos à criança ou adolescente que já não puderam ficar com seus pais por algum motivo. [...] Neste ínterim, entendo que o ato ilícito que gera o direito a reparação decorre do fato de que os apelantes buscaram, de forma voluntária, o processo de adoção do menor, manifestando, expressamente, a vontade de adotá-lo, obtendo sua guarda durante um lapso de tempo razoável, quando, de maneira súbita e imprudente, resolveram devolver o adolescente, de sorte a romper bruscamente o vínculo familiar, o que implica no abandono do adolescente. [...] Ademais, não há "direito de devolução", posto que se trata de um adolescente que possui direitos fundamentais a serem resguardados [...] (BRASIL, 2018, p. 17-18).
Prosseguindo, menciona o cerne do processo de adoção, e sua necessidade de ser encarado como algo mais sério, visto que é iniciado por ato voluntário dos candidatos a adoção, sabendo que enfrentarão diversas dificuldades com o adotando:
Com efeito, cabe enfatizar que a adoção tem de ser vista com mais seriedade pelas pessoas que se dispõem a tal ato, devendo estas ter a consciência e atitude de verdadeiros "pais", o que pressupõe a vontade de enfrentar as dificuldades e condições adversas - as quais possam eventualmente aparecer -, a fim de tutelar o menor adotado, assumindo-o de forma incondicional como filho, com o claro objetivo de ver construído e fortalecido o vínculo filial. Desta feita, tendo que em vista que a indenização por dano moral deve ser deferida, nas hipóteses em que se verificar abalo à honra e imagem da pessoa, dor, sofrimento, tristeza, humilhação, prejuízo à saúde e à integridade psicológica de alguém, que interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, de maneira a causar aflição e desequilíbrio em seu bem estar, entendo que restou configurado, in concreto, o dever dos apelantes em reparar o dano causado ao menor (BRASIL, 2018, p. 18).
Já no TJSP, cabe destacar a Apelação Cível n° 0003499-48.2013.8.26.0127, a qual trata da adoção de dois irmãos, os quais estavam sob a guarda por quatro anos, ocasião em que os adotantes manifestaram a desistência da adoção em relação ao irmão mais velho, mesmo que isso importasse na não adoção do mais novo. Relataram que a desistência foi ocasionada pelo mau comportamento do adotando, porém durante todo o período de guarda não procuraram os serviços técnicos do juízo, para os auxiliarem nas dificuldades. Desse modo, o Relator Fernando Torres Garcia menciona sobre o objetivo do estágio de convivência, justificando sua decisão:
Não se está aqui a afirmar que os pretendentes à adoção não tenham o direito de desistir do processo como um todo ou da tentativa de se adaptar a determinada criança. Tal desistência, assim como o pedido de adoção em si, é um direito potestativo garantido a todos os adotantes e, bem por isto, prevê a legislação o estágio de convivência, previsto no art. 46, da Lei 8.069/1990. E, por ser potestativo, está à disposição do sujeito para, a partir de escolhas pessoais e imotivadas, optar por exercer ou não determinada opção dada pela legislação. Mas o caso concreto vai além do exercício do direito potestativo de continuar ou não em seu intento de adotar, a partir do exercício da guardiania como medida antecedente à adoção. Envolve o exercício abusivo de tal direito, configurado quanto à omissão na tomada de decisões que reflitam seus efeitos sobre as crianças, levando à construção de um vínculo afetivo concreto que, posteriormente, será quebrado (BRASIL, 2020, p. 15).
Ainda, justifica a condenação em danos morais da seguinte forma:
Sendo ilícita a conduta, configura-se o dever de indenizar que, no caso, bem sopesou os danos de natureza moral sofridos pelas crianças, seja pelo sentimento de repulsa decorrente de uma devolução após a construção da condição psicológica de filho, seja pela efetiva perda da chance de conseguir uma família substituta, bem sabido o aumento da dificuldade de adoção para crianças que chegam à pré-adolescência em abrigos. [...] o pensionamento imposto aqui ganha ares de reparação pela perda da chance, conferindo aos irmãos a oportunidade de construírem, no primeiro momento da idade adulta, uma vida minimamente estruturada por si mesmos [...] (BRASIL, 2020, p. 18-20) [grifo do autor].
Entretanto, o mesmo TJSP, por ocasião do julgamento da Apelação Cível n° 0000189-77.2017.8.26.0229, restou por não acolher o pedido de condenação por dano moral dos desistentes da adoção, para fins de custear tratamento psicológico e a prestar alimentos, inobstante o transcurso de mais de um ano de estágio de convivência. Para tanto, levou em consideração que as adotantes tentaram de todos os meios estabelecer um bom relacionamento com o adotando, os quais restaram infrutíferos em razão dos vícios da relação familiar anterior, inobstante o esgotamento dos recursos empreendidos para tentar superar as experiências traumáticas desde o início da fase de convivência.
Contudo, o entendimento do TJRS demostra a não condenação a título de dano moral em casos de desistência da adoção durante período de estágio de convivência, conforme verifica-se na Apelação Cível nº 70080332737, haja vista que presta-se justamente o estágio de convivência como período de adaptabilidade entre o adotante e adotando, tendo o legislador facultado a desistência antes da concretização da adoção, caso não haja a adaptação esperada.
Do mesmo modo, na Apelação Cível n° 70079126850, os Desembargadores mantiveram a decisão de primeiro grau que havia julgado pela improcedência no pedido de indenização por danos morais em relação aos adotandos, apesar do Ministério Público sustentar que os problemas de convivência poderiam ter sido superados se os adotantes desistentes tivessem aceitado a ajuda da equipe técnica do MM Juízo, demonstrando a despreocupação com os danos que ocasionariam às crianças, as quais não eram perfeitas como idealizavam. Ainda pontua em suas razões recursais, “que as dificuldades apresentadas na convivência foram dificuldades normais, usualmente verificadas na adaptação de qualquer estágio de convivência, prévio à adoção” (BRASIL, 2019, p. 6). Nesse sentido, pertinente transcrever parte das razões do recurso, as quais foram transcritas no acórdão:
O primeiro abandono já macula a vida e a psique de uma criança ou adolescente. O menor passa a residir em um acolhimento institucional onde é bem tratado, mas, não se pode comparar com o aconchego e a segurança que uma família traz. Uma criança de 8 anos, por exemplo, não saberá distinguir que aquele “estágio de convivência” é um tempo para quem lhe esta adotando obtenha a certeza se a quer ou não; para o menor, ele finalmente está encontrando o amor e carinho que tanto precisava. Entende-se que este período de adaptação é viável, mas, não dando direito aos adotantes de uma forma injustificada e inescrupulosa devolver o adotando sem motivação, fazendo com que o menor sofra com a rejeição novamente (BRASIL, 2019, p.16-17) [grifo do autor].
No entanto, o Desembargador Ricardo Moreira Lins Pastl, redator, diverge do MP não condenando os adotantes em dano moral, acompanhando a divergência os outros Desembargadores. Sua justificativa seria que o estágio de convivência teria a serventia de verificação de vínculos entre adotante e adotando e que o pouco período - de menos de um mês -, não poderia ter gerado dano. Desta forma, declara:
Ora, entender de forma contrária, além de não possuir respaldo legal, causaria efeito danoso no sistema de adoção, pois acabaria por afastar os casais que, receosos de sofrerem futuro processo judicial de reparação de danos, sequer se habilitariam a adotar uma criança. Além disso, não houve qualquer demonstração de que o pouco convívio havido entre os demandados e as crianças tenha gerado algum vínculo afetivo entre os mesmos, tendo a Assistente Social Andréa Panozzo, ouvida à fl. 109, informado, inclusive, que não mudança comportamental das crianças ao voltarem para o lar, que facilmente voltaram à rotina que possuíam antes (BRASIL, 2019, p. 33).
No que tange ao TJSC e TJRJ, não foi possível a análise dos julgados na íntegra, em razão de se encontrarem em segredo de justiça, não sendo disponibilizados o seu inteiro teor para uma análise mais precisa. Cabe mencionar, que com na análise destes julgados observou-se que as demandas foram requeridas pelo Ministério Público, a quem representa as crianças/adolescentes e tinham como valor médio de indenização por dano moral o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
Realizou-se a pesquisa no âmbito do STJ, a fim de verificar se o tema abordado já estaria pacificado nesta Corte, com isso obteve-se quatro decisões monocráticas sobre o assunto. No entanto, os julgados por se tratarem recurso especial, não discutem os fatos abordados em sede ordinária, mencionando somente sobre o valor de indenização e cabimento dos recursos, motivo pelo qual não foram objeto de maior digressão por parte da presente pesquisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho buscou compreender se o instituto da responsabilização civil seria cabível (ou não) ao pretenso adotante em razão da desistência em meio ao estágio de convivência – uma das fases do processo de adoção -, ato que a lei trata como legalmente possível, mas que, em razão da frustração da expectativa criada junto ao adotando, implicaria na configuração de ato ilícito, podendo ensejar danos e por consequência o pagamento de indenização. Dessa forma, objetivou-se com a presente pesquisa analisar se há efetivamente a proteção a criança/adolescente diante deste aspecto, preservando sua dignidade humana, além da convivência familiar e seu melhor interesse. Nesse passo, para atingir esse propósito, foi realizada análise dos julgados dos Tribunais da Região Sudeste e Sul do país disponibilizados na página eletrônica oficial de tais órgãos julgadores, limitado àquelas decisões que não estavam sob segredo de justiça, o que impediu uma análise do inteiro teor do acórdão e, por óbvio, um estudo mais aprofundado.
Para isto, o primeiro capítulo abordou a evolução histórica do instituto da adoção, desde antes mesmo de ser regulada por legislação, perpassando por positivação da lei cujo objetivo não era preservar os direitos do adotando, mas tão somente os interesses do adotante. Contudo, o estudo mostrou que a partir da promulgação da CRFB/1988, calcada sob o viés da dignidade da pessoa humana, ratificada pelas leis infraconstitucionais como o ECA/1990 e pela recente Lei de Adoção, o paradigma central passou a ser a proteção às crianças/adolescentes, rendendo-lhes maiores garantias e o merecido protagonismo.
Por seu turno, o segundo capítulo abordou o processo de adoção em todas as suas fases, com ênfase ao estágio de convivência, que nada mais é do que um período de adaptação que ocorre antes da guarda definitiva da criança/adolescente, prevendo expressamente a lei a possibilidade de ocorrência da desistência pelo pretenso adotante, o qual almeja seu ‘filho ideal’, expectativa diametralmente oposta ao adotando, que entende como uma oportunidade de constituição de uma nova família. Outrossim, no presente capítulo verificou-se que, apesar da lei ter evoluído na tentativa de tornar menos moroso o tempo de permanência em instituição de acolhimento, não é o que ocorre na realidade, seja pela demora na destituição do poder familiar, seja pela espera por um pretenso adotante ou o desfecho do processo de adoção, com a sentença.
Por último, o terceiro capítulo buscou propiciar que o tema fosse evidenciado na prática, tornando-o mais próximo ao analisar os julgados dos Tribunais, mencionando as justificativas das decisões que condenaram ou não o(s) adotante(s) por sua desistência em meio ao estágio de convivência, as quais tinham por esteio o tempo de contato havido entre adotante e adotando, o que implicaria na configuração de grandes laços afetivos formados, gerando na criança/adolescente grandes expectativas na concretização da adoção, acarretando-lhes danos psicológicos em razão de uma nova rejeição.
Ante todo o exposto, pode-se perceber que o direito não é estático, ou pelo menos não é assim de deve ser entendido: a norma existe para ser aplicada, mas também interpretada. Certamente, o Direito evoluiu para o que existe hoje devido a uma nova concepção da letra da lei, ou seja, uma nova interpretação para garantia da dignidade e direitos fundamentais a todos que necessitem. Por outras palavras, o direito nada mais é, do que uma resposta aos anseios de uma sociedade, devendo se adequar de acordo com os problemas vividos e descobertos ao longo dos anos.
Por conta disso, pode-se entender que os julgadores não menosprezam o direito de nenhum dos polos envolvidos, tratando para que as pessoas que tenham vontade de adotar não fiquem com receio de se habilitar a adoção por medo de que, mesmo com reais expectativas na concretização da adoção e por motivos justificáveis na desistência, ainda assim sofrerem condenação ao pagamento de indenização. De outra parte, protegem o adotando, preservando seus direitos - já fragilizados por toda a vulnerabilidade a que foi exposto -, zelando para que seus sentimentos não sejam novamente feridos, especialmente frente a expetativa de inserção em uma nova família, preservando assim seu melhor interesse. Neste cenário, de um total de treze decisões referentes ao estudo, tem-se sete deles pela condenação do adotante desistente e seis pela não condenação, com isso percebe-se que os julgadores estão realmente analisando cada caso, para assim verificar se a aplicabilidade da indenização está realmente cumprindo sua função, ou seja, a tentativa de reparar a criança/adolescente que obteve algum prejuízo com a desistência.
Nesse contexto, conclui-se a partir da análise dos julgados e da doutrina, que a fixação de dano moral pela desistência em meio ao processo de adoção é plenamente possível, inobstante não seja vedado pela lei. Contudo, tendo como norte o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, somado ao fato de que o protagonismo durante o processo de adoção é da criança/adolescente, há a possibilidade real de que o desistente venha a ser condenado, especialmente após um considerável tempo de convivência com o adotando, pois estariam já consolidados os laços de afeto com a família adotiva, além do que uma nova rejeição poderia impactar negativamente neste indivíduo em formação. Entretanto, há que se também registrar, que o julgador deve ter em mente que a condenação em danos morais ao adotante que desiste em meio ao processo de adoção não pode ser banalizado, sob pena de implicar reflexos desfavoráveis ao instituto da adoção, afastando os interessados em adotar, ato que acima de tudo deve ser pautado pelo amor, carinho, empatia e abnegação.
REFERÊNCIAS
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BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (1ª Vara Criminal). Apelação Cível n. 0003499-48.2013.8.26.0127. Responsabilidade civil – Indenização por danos morais – Casal que obtém a guarda de irmãos para fins de adoção, após visitas e convivência prévia – Exercício da guarda por mais de quatro anos, sem qualquer pedido comprovado de acompanhamento psicológico ou manifestação de desistência na preparação para a adoção – Manifestação pela desistência em relação a um dos irmãos depois que os laços afetivos já haviam se consolidado, gerando nas crianças sentimento de integração à família e formação de parentesco pela socioafetividade [...]. Recorrente: Getúlio Carlos Nunes e Aparecida Tsuzuke. Recorrido: Ministério Público do Estado de São Paulo. Relator: Fernando Torres Garcia (Pres. Seção de Direito Criminal), 10 de agosto de 2020. Disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/cjsg/getarquivo.do?conversationid=&cdacordao=13855949&cdforo=0&uuidcaptcha=sajcaptcha_435e516f83fd41368b077f119206c808&grecaptcharesponse=03agdbq25ipf35lc7mzeb6bdy6w6yqfvmuurvvz5zhsi36ylbers2q4mv5m5wlsohi8dg3txu1ecy8fa90v5vtcvajzgbczudglnhy5ln4w07x7mgsvfeqpu2rpm7u0sfslutc4mkuunllcl02dhhtizuqjlgh6npgdg2lw5bfuw0gs9dfdbekxldvfhkbeknrzso86kge9nxubdcrr18kt51ibns0kaov1ykorhmtrnoc-ftaso041rvvghjf6rvo0m_qd e9x3gpaeskac35m0fw3kpq_gfzdft_copuqyeryj_cjs_kdqirweevmtifgm6xtfq7qsx5vfexmkxc5opu2gpat4yn66wgalp9afradbpi0y3leuk5rilnengoqbyzfxvwmolqu7r5b2t97zlfkpueotcmb1je7jzg9wptcl2d5mjqdqjdqqwweoztuutg1kaekeiyeyldxntg. Acesso em: 15 out. 2020.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (2ª Vara Judicial). Apelação Cível n. 0000189-77.2017.8.26.0229. Apelação. Ação de adoção. Sentença de improcedência. Condenação das postulantes a custear tratamento psicológico e a prestar alimentos. Reacolhimento. Menor entregue ao Juízo durante o estágio de convivência com as pretendentes. Impossibilidade de impor, neste feito, a condenação das recorrentes. Pedido formulado que visava tão somente à adoção do menino. Inobservância do limite objetivo da demanda. Aplicação do princípio da adstrição. Inteligência do art. 492 do CPC. Condenação das antigas guardiãs. Transferência do múnus à instituição de acolhimento. Cessada a guarda, inexiste obrigação à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente. [...]. Recurso provido. Recorrente: Renata Floriano Costa e Juliana Cristina Alves Costa. Recorrido: Ministério Público do Estado de São Paulo. Relator: Sulaiman Miguel, 15 de junho de 2020. Disponível em: https://esaj.tjsp.jus.br/getArquivo.do?cdAcordao=13660534&cdForo=0. Acesso em: 15 out. 2020.
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SANTOS, Samara Silva dos. Da desistência da adoção e da responsabilização do adotante pelos danos morais causados ao adotando. 2019. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito)- Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis, 2019. Disponível em: http://www.riuni.unisul.br/handle/12345/7592. Acesso em: 05 maio 2020.
SILVA, Jamara Rayssa Camelo da. A Responsabilidade Civil decorrente da desistência da adoção. 2018. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharel em Ciências Jurídicas)- Centro de Ciências Jurídicas, Universidade Federal de Paraíba, Santa Rita, 2018.Disponível em: https://repositorio.ufb.br/jspui/bitstream/12345689/JRCS15062018.pdf. Acesso em: 25 jun. 2020.
SILVA, Raquel Antunes de Oliveira. A adoção de crianças no Brasil: os entraves jurídicos e institucionais. 2012. Dissertação (Mestrado em Psicologia Educacional)- UNIFIEO - Centro Universitário FIEO, Osasco, 2012. Disponível em: http://www.unifieo.br/pdfs/dissertacoes_psico_2012/Raquel_Silva.pdf. Acesso em: 28 maio 2020.
SILVA, Rosane Leal da. A Proteção Integral dos Adolescentes Internautas: limites e possibilidades em face dos riscos do ciberespaço. 2009. Tese (Doutorado em Direito)- Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas. Programa de Pós- Graduação em Direito, Santa Catarina, 2009. Disponível em: http://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/93433. Acesso em: 14 set. 2020.
THOMÉ, Majoí Coquemalla. De devolução para reabandono: a criança como sujeito de direitos. 2018. Disponível em: https://www.ibdfam.org.br/.../De+devolução+para+reabandono%3A+a+ criança+como+sujeito+de+direitos. Acesso em: 24 ago. 2020.
[1] Docente do Curso de Direito da Antonio Meneghetti Faculdade – AMF.
[3] Bíblia Sagrada, Êxodo 2:10
[4] Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[5] Art. 227. [...]
§ 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
[6] Art. 41. A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais.
[7] Art. 39. A adoção de criança e de adolescente reger-se-á segundo o disposto nesta Lei
[8] Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
Parágrafo único. Os direitos enunciados nesta Lei aplicam-se a todas as crianças e adolescentes, sem discriminação de nascimento, situação familiar, idade, sexo, raça, etnia ou cor, religião ou crença, deficiência, condição pessoal de desenvolvimento e aprendizagem, condição econômica, ambiente social, região e local de moradia ou outra condição que diferencie as pessoas, as famílias ou a comunidade em que vivem.
[9] Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[10] Art. 19. [...]
§ 2°. A permanência da criança e do adolescente em programa de acolhimento institucional não se prolongará por mais de 18 (dezoito meses), salvo comprovada necessidade que atenda ao seu superior interesse, devidamente fundamentada pela autoridade judiciária.
[11] Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo máximo de 90 (noventa) dias, observadas a idade da criança ou adolescente e as peculiaridades do caso.
[12] Art. 46. [...]
§ 2º. A simples guarda de fato não autoriza, por si só, a dispensa da realização do estágio de convivência.
[13] Art. 46. [...]
§ 1º. O estágio de convivência poderá ser dispensado se o adotando já estiver sob a tutela ou guarda legal do adotante durante tempo suficiente para que seja possível avaliar a conveniência da constituição do vínculo.
[14] Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
[15] Art. 927. [...]
Parágrafo único. haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem
[16] Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comente ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, exerce manifestadamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.
[17] Art. 39. [...]
§1°. A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei.
[18] Art.47. [...]
§7°. A adoção produz seus efeitos a partir do trânsito em julgado da sentença constitutiva, exceto na hipótese prevista no §6 do art. 42 desta Lei, caso em que terá força retroativa à data do óbito.
Bacharelanda em Direito, Curso de Graduação em Direito, Faculdade Antonio Meneghetti.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BENETTI, Geisiane Pereira da Rosa. A desistência da adoção em meio ao estágio de convivência e a possibilidade de reparação civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jan 2021, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56097/a-desistncia-da-adoo-em-meio-ao-estgio-de-convivncia-e-a-possibilidade-de-reparao-civil. Acesso em: 22 nov 2024.
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