PEDRO MANOEL CALLADO MORAES.
(orientador)
RESUMO: A adoção intuitu personae é uma modalidade de adoção que ocorre quando a família biológica é quem escolhe os adotantes do filho, fora do procedimento preestabelecido para tanto. Portanto, não está contida na legislação brasileira, nem proibida expressamente no direito positivo, apesar de ser reconhecida pela jurisprudência nas situações em que já se constatam vínculo de afetividade entre a criança ou adolescente e os adotantes. O presente artigo científico, por meio da metodologia de revisão bibliográfica, busca ressaltar a importância do instituto da adoção para o desenvolvimento do infante, e analisar esse tipo específico de adoção sob a perspectiva do melhor interesse e proteção da criança ou adolescente. Para tanto, são apontados os princípios pertinentes e direitos relevantes que norteiam o assunto, além de reflexões a respeito das perspectivas contraditórias acerca do tema, concluindo pela exposição dos benefícios que poderiam advir da criação de uma legislação que normatize essa modalidade, flexibilizando o cadastro de adoção.
Palavras-chave: Adoção intuitu personae. Melhor Interesse. Proteção. Cadastro de Adoção. Estatuto da Criança e do Adolescente.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 ADOÇÃO. 1.1 Procedimento e Requisitos Legais para Concessão da Adoção. 2 ADOÇÃO INTUITU PERSONAE. 2.1 Distinção com a Adoção à Brasileira. 2.2 Posicionamento Recorrente do Poder Judiciário. 3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. 3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. 3.2 Princípio da Afetividade. 3.3 Princípio da Proteção Integral. 3.4 Princípio do Melhor Interesse do Menor. 4 DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA. 5 AS PERSPECTIVAS CONTRADITÓRIAS DA ADOÇÃO INTUITU PERSONAE E A NECESSÁRIA FLEXIBILIZAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA ADOÇÃO. 5.1 Vantagens da Elaboração de uma Legislação que Flexibilize o Cadastro de Adoção. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
O presente artigo aborda sobre a adoção intuitu personae, que é quando a família biológica intervém, escolhendo os adotantes da criança; é uma espécie de adoção que não é apreciada pela legislação, apesar de ser uma prática muito recorrente no Brasil.
Por não ser um tipo de adoção tipificada em lei, muitas vezes os adotantes irregulares, temerosos que o Poder Judiciário retire o infante de seus cuidados, decidem criá-lo sob o manto da clandestinidade. Essa situação permanece até que cultivem laços fortes de afetividade com a criança ou adolescente, a fim de solicitarem na Justiça seus direitos legais de adoção, pautado no melhor interesse do menor, o que por vezes é acatado pelo Poder Judiciário.
Destarte, o fato de não existir uma legislação clara que se posicione sobre o assunto, ocasiona um distanciamento do Poder Judiciário com relação a essa prática. Portanto, a família biológica entrega a criança para um casal desconhecido, que não se submeteu aos ditames, ou seja, às formalidades da lei, muitas vezes estando despreparado para o complexo processo intrafamiliar e social que é uma adoção.
Contudo, sob o âmbito do melhor interesse e proteção da criança, são manifestos os benefícios que podem advir desse tipo de adoção. Isto porque, nesse caso seria a própria família biológica quem escolheria os adotantes, em vez de inserir o menor em uma instituição de acolhimento, o que poderia causar inúmeros prejuízos para seu desenvolvimento.
Analisando por este lado, é de se ponderar: por que não criar uma legislação que abarque a adoção intuitu personae, ou ao menos flexibilize o cadastro de adoção? Será que não seria mais prejudicial à criança colocá-la em instituição de acolhimento, ou continuar permitindo essa prática de forma clandestina, do que preparar, por meio de requisitos judiciais, esses adotantes irregulares que já estão - ou pretendem estar - exercendo os cuidados sobre a criança?
Este trabalho é um artigo de revisão bibliográfica. A metodologia a ser utilizada, quanto a sua finalidade, se dará por pesquisa básica ou pura; quanto ao seu objetivo, será utilizada a pesquisa exploratória; com relação aos procedimentos, empregar-se-á a pesquisa bibliográfica; no que tange a natureza, pesquisa qualitativa; e quanto ao local, pesquisa de campo.
O objetivo deste artigo é refletir acerca das diversas perspectivas da adoção intuitu personae, analisando sob a égide do melhor interesse e proteção da criança e do adolescente; busca ponderar sobre os benefícios que poderiam advir da criação de uma legislação que englobe referida espécie de adoção, flexibilizando o cadastro de adoção.
Em síntese, será abordado um pouco sobre a adoção legal e seu procedimento, e depois mais especificadamente sobre a adoção intuitu personae, sua diferenciação com a adoção à brasileira, e o posicionamento recorrente do Poder Judiciário quanto a isso. Ademais, serão analisados os princípios e direitos norteadores da proteção da criança e do adolescente e, por fim, serão retratadas as perspectivas contraditórias dessa espécie de adoção, assim como os benefícios que poderiam advir da criação de uma legislação que integre essa modalidade de adoção.
A adoção é: “o ato jurídico solene pelo qual alguém recebe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha” (GONÇALVES, 2020, p. 376), podendo se dar tanto em situações em que o adotado seja criança ou adolescente, como até mesmo maior de idade. No mesmo sentido, expressa Diniz (2010, p. 522):
A adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha. Dá origem, portanto, a uma relação jurídica de parentesco civil entre adotante e adotado.
Assim, entende-se estabelecida uma relação fictícia de filiação, que é plena e irrevogável, pois dissocia completamente o adotado de suas origens biológicas. Além disso, conforme art. 41 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), transfere ao adotado os mesmos direitos e deveres de um filho biológico, inclusive de cunho sucessório, com a ressalva dos impedimentos matrimoniais, os quais continuam vigorando em relação à família biológica e, agora, também com a nova família, a dos adotantes.
E, mais do que isso, a adoção, como importante instituto do Direito de Família, representa um papel humanitário na sociedade, muito significativo para os adotantes e adotados, pois é forma de constituir família, criando os laços mais importantes que uma pessoa possui, com inúmeras consequências positivas para todos os envolvidos. Assim, deve atender ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, prevalecendo este sobre quaisquer outros, o que fica estampado no art. 43 do ECA.
Portanto, é tamanha a importância do instituto, tanto no âmbito intrafamiliar e social, quanto na esfera jurídica, pois se caracteriza como matéria de interesse geral, sendo ato complexo, deferido somente por meio de sentença judicial, conforme expressamente consolida o art. 47 do ECA.
1.1 Procedimento e Requisitos Legais para Concessão da Adoção
A partir do advento da Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009 (conhecida como Lei da Adoção), foram revogados expressamente os dispositivos legais do Código Civil que tratavam da adoção, restando apenas a informação, nos artigos 1.618 e 1.619, de remessa à Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1999 (ECA), que é onde estão compactuadas as normas fundamentais para o instituto da adoção.
Em regra, devido a seu caráter de interesse público - trazendo consequências para o adotante e para o adotado, inclusive para terceiros - a adoção depende de um procedimento judicial regulado por requisitos legais e preestabelecidos. É, por exemplo, competente a Vara da Infância e Juventude para análise de ações de adoção de menores, sempre com a intervenção do Ministério Público; e a Vara Cível da Família, no caso de adotando maior de 18 anos.
Antes de postular o processo específico de adoção, é necessário que os pretendentes ingressem com ação para sua habilitação, cujo procedimento está expresso nos artigos 197-A a 197-F do ECA. Somente quando deferida a habilitação é que os adotantes serão inseridos nos cadastros apontados no art. 50 desse mesmo estatuto. Em referida ação, o Judiciário terá acesso às diversas informações acerca dos postulantes, como qualificação completa, declaração de sanidade física e mental, certidões de antecedentes criminais, comprovante de renda e domicílio, entre outras, o que permite uma análise completa do perfil dessas pessoas.
Outrossim, os pretendentes à adoção são avaliados por uma equipe multidisciplinar do Poder Judiciário, que elabora um estudo psicossocial, a fim de averiguar a aptidão deles para o desempenho de uma paternidade ou maternidade responsável. Além disso, as partes serão submetidas a uma espécie de preparação para a adoção, por meio de programa ofertado pela Justiça da Infância e da Juventude, o que constitui requisito legal para o deferimento da habilitação; bem como, sempre que possível e recomendado, será incluído contato com crianças e adolescentes que estejam em acolhimento familiar ou institucional.
Conforme orientações do Conselho Nacional da Justiça (2019):
[...] O programa pretende oferecer aos postulantes o efetivo conhecimento sobre a adoção, tanto do ponto de vista jurídico quanto psicossocial; fornecer informações que possam ajudar os postulantes a decidirem com mais segurança sobre a adoção; preparar os pretendentes para superar possíveis dificuldades que possam haver durante a convivência inicial com a criança/adolescente; orientar e estimular à adoção interracial, de crianças ou de adolescentes com deficiência, com doenças crônicas ou com necessidades específicas de saúde, e de grupos de irmãos.
Com relação à capacidade para adotar, é possível aos maiores de 18 anos, desde que não sejam ascendentes ou irmãos do adotando. Também que entre adotante e adotado, pelo menos, tenham 16 anos de diferença de idade, independentemente do estado civil dos adotantes, deixando claro que no caso de adoção conjunta (realizada por um casal), é imprescindível que os adotantes sejam casados ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade familiar (art. 42, caput, §§§1º, 2º e 3º do ECA).
A consolidação da adoção fica subordinada ao consentimento do adotando, (caso tenha mais de 12 anos), e dos seus pais biológicos ou representante legal. Entretanto, esta declaração pode ser dispensada nos casos em que os pais não sejam conhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar, com fulcro no art. 45 do ECA.
Embasado no art. 46 do supracitado Estatuto, vê-se que também se faz necessário o chamado estágio de convivência entre os adotantes e a criança ou adolescente, que somente poderá ser dispensado se este já estiver sob a tutela ou guarda daqueles por tempo suficiente a avaliar se realmente é apropriada a constituição do vínculo. Referido estágio será assistido pela equipe interprofissional a serviço da Justiça da Infância e da Juventude, que apresentará relatório cuidadoso, e tem como principal objetivo observar e comprovar a sintonia entre as partes.
A Lei da Adoção também instituiu o Cadastro Nacional de Adoção, que em 2019, por meio da Resolução do CNJ nº 289, de 14 de agosto, obteve uma nova versão, denominada Sistema Nacional de Adoção. Esta, que surgiu da união do Cadastro Nacional de Adoção e do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas, mantém um registro de pessoas habilitadas para adoção e de crianças e adolescentes em condições para serem adotados, com o fim de alcançar maior celeridade e controle na resolução dos casos.
Em suma, referidos requisitos têm o objetivo precípuo de proteção dos adotados, bem como preparação dos adotantes. É necessário que haja compatibilidade entre eles, e que seja uma decisão favorável para ambos, considerando que se trata de um instituto que modifica consideravelmente a vida do adotando e adotante, além de ser irrevogável depois da decisão judicial definitiva que venha a deferir a adoção.
A adoção intuitu personae, também conhecida como adoção dirigida, consiste no fato de a própria família biológica escolher os adotantes da criança. É uma modalidade de adoção que não é permitida nem proibida pela legislação brasileira atual.
Dias (2015, p. 496) consubstancia que há esse tipo de adoção quando existe a vontade da genitora de entregar seu filho a uma pessoa determinada, bem como quando há a intenção de uma certa pessoa adotar uma criança determinada, o que pode ocorrer em circunstâncias de fato diversas.
Em complemento, Madaleno (2020, p. 701) aduz:
Adoção intuitu personae é aquela em que os pais dão consentimento para a adoção em relação a determinada pessoa, identificada como pessoa certa ou para um casal específico [...] Portanto, os pais biológicos intervêm nessa modalidade de adoção, concorrendo para a escolha da família adotante, porque essa aproximação entre os pais biológicos e os adotantes já vinha sucedendo, provavelmente, durante todo o período da gestação, ou porque mantinham vínculos de amizade e confiança com os adotantes indicados.
2.1 Distinção com a Adoção à Brasileira
A adoção à brasileira, também conhecida como adoção simulada, é uma criação da jurisprudência, hoje abordada pela doutrina, e consiste em registrar filho alheio como próprio, previamente combinado com a família biológica. É muito comum também nos casos em que o marido registra como seu o filho da esposa, quando este não o é.
Ou seja, tanto esse tipo de adoção, quanto a adoção intuitu personae, representam a “entrega” de filho a terceiro, de forma pactuada. Porém, tornar-se-á adoção à brasileira a partir do registro falso, o que é expressamente proibido pela legislação do país, caracterizando-se como uma prática ilícita, tipificada em lei como crime, previsto no art. 242 do Código Penal.
2.2 Posicionamento Recorrente do Poder Judiciário
A jurisprudência não é unânime quanto ao tema abordado. Entretanto, o posicionamento recorrente é no sentido de regularizar a adoção intuitu personae (assim como a adoção à brasileira), nos casos em que já existem vínculos de afetividade entre a criança e adolescente com os adotantes.
Para tanto, fundamenta-se no respeito ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, em prejuízo do atendimento ao Cadastro de Adotantes; bem como na primazia do acolhimento familiar em detrimento do acolhimento institucional.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em sede de Recurso Especial, deliberou que a exigência de cadastro para fins de adoção admite exceção para atingir o melhor interesse da criança. Em um fato julgado em 2010, havia forte vínculo afetivo da criança com relação ao casal, que esteve ininterruptamente exercendo os cuidados sob ela durante os seus oito primeiros meses de vida, sem informação de qualquer prejuízo ou ilicitude na relação:
RECURSO ESPECIAL - AFERIÇÃO DA PREVALÊNCIA ENTRE O CADASTRO DE ADOTANTES E A ADOÇÃO INTUITU PERSONAE - APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE DO MENOR - VEROSSÍMIL ESTABELECIMENTO DE VÍNCULO AFETIVO DA MENOR COM O CASAL DE ADOTANTES NÃO CADASTRADOS - PERMANÊNCIA DA CRIANÇA DURANTE OS PRIMEIROS OITO MESES DE VIDA - TRÁFICO DE CRIANÇA - NÃO VERIFICAÇÃO - FATOS QUE, POR SI, NÃO DENOTAM A PRÁTICA DE ILÍCITO - RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
I - A observância do cadastro de adotantes, vale dizer, a preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar determinada criança não é absoluta. Excepciona-se tal regramento, em observância a princípio do melhor interesse do menor, basilar e norteador de todo o sistema protecionista do menor, na hipótese de existir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, ainda que este não se encontre sequer cadastrado no referido registro; [...] (BRASIL, 2010).
Outrossim, o STJ tem reconhecido, no mesmo sentido, a interposição de mandado de segurança, medida cautelar e habeas corpus, antes mesmo de admitido recurso especial, como é o exemplo do recente julgado de Habeas Corpus nº 575.883 – SP:
"HABEAS CORPUS". DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. BUSCA E APREENSÃO DE MENOR (1 ANO E DEZ MESES). SUSPEITA DE ADOÇÃO "INTUITU PERSONAE". ENTREGA PELA MÃE AO PAI REGISTRAL. PATERNIDADE BIOLÓGICA AFASTADA. ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL EM ABRIGO. ILEGALIDADE. PRIMAZIA DO ACOLHIMENTO FAMILIAR. AUSÊNCIA DE RISCO À INTEGRIDADE FÍSICA OU PSÍQUICA DO INFANTE. PRINCÍPIO DO MELHOR INTERESSE E DE PROTEÇÃO INTEGRAL DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. PRECEDENTES [...] 3. Inexistência, nos autos, de indício de fatos que desabonem o ambiente familiar em que a criança se encontrava. [...] 5. Primazia do acolhimento familiar em detrimento do acolhimento institucional, com a preservação de vínculos afetivos estabelecidos durante significativo período. Precedentes desta Corte Superior. [...] (BRASIL, 2020).
Em complemento, o Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) reconheceu a possibilidade jurídica da adoção intuitu personae, por meio da aprovação, em 2015, do Enunciado nº 13, que exprime: “na hipótese de adoção intuitu personae de criança e de adolescente, os pais biológicos podem eleger os adotantes”.
3 PRINCÍPIOS NORTEADORES DA PROTEÇÃO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
A adoção, tratando-se de importante instituto do Direito de Família, possui como alicerce os princípios constitucionais, bem como os próprios desse ramo do direito, que o regem e demonstram os valores que devem ser buscados e priorizados, alguns dos quais se fazem pertinentes para a reflexão acerca da adoção intuitu personae, como o princípio da dignidade da pessoa humana e o princípio da afetividade.
Além disso, quando se fala sobre infância e juventude, verifica-se que as crianças e os adolescentes são resguardados por alguns princípios específicos e doutrinas norteadoras para sua proteção, dentre eles o princípio da proteção integral; do melhor interesse do menor; e o direito à convivência familiar e comunitária.
3.1 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
O princípio da dignidade da pessoa humana, um dos mais importantes princípios constitucionais, elencado como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, conforme art. 1º, III, da Constituição Federal, não emitiu um conceito direto, mas tem como objetivo a concretização de uma vida digna a todas as pessoas, possibilitando uma interpretação extensiva. A doutrina elenca-o como um macroprincípio, que dá ensejo a todos os demais princípios e direitos constitucionais, devendo ser entendido como fundamento da ordem jurídica.
No âmbito da família, o princípio supracitado reflete-se no direito à busca pela felicidade - considerando que uma das formas de propiciá-la é por meio da família - procurando assim proporcionar dignidade para todos os tipos de constituição de entidades familiares, sem distinção ou qualquer tipo de tratamento desigual.
Nesse contexto, outro importante princípio para o direito familiar deve ser ressaltado: o princípio da afetividade, que atualmente alcança grande ascensão como norteador desse ramo jurídico. Gonçalves (2020, p. 24) reconhece: “os novos rumos conduzem à família socioafetiva, onde prevalecem os laços de afetividade sobre os elementos meramente formais”.
Portanto, o afeto revela grande valorização como formador de entidades familiares, até mesmo em razão de ser uma forma de proteger a dignidade da pessoa humana. Dias (2015, p. 49), acertadamente, expressa:
Excluir do âmbito da juridicidade entidades familiares que se compõem a partir de um elo de afetividade e que geram comprometimento mútuo e envolvimento pessoal e patrimonial é simplesmente chancelar o enriquecimento injustificado, é ser conivente com a injustiça.
Assim, conclui-se que o Estado não pode engessar a sociedade, impondo-lhe um modelo familiar pré-concebido pela legislação. Deve levar em consideração precipuamente se o arranjo familiar, ainda que não contido expressamente pelos moldes do direito, está atendendo à dignidade das pessoas envolvidas.
Isso se faz relevante principalmente quando se trata do interesse de crianças ou adolescentes. Inclusive, a Lei nº 12.010 (Lei Nacional da Adoção), por meio de suas diversas mudanças, reconheceu a afetividade e a afinidade como elementos primordiais para a constituição de uma família.
3.3 Princípio da Proteção Integral
O princípio da proteção integral da criança e do adolescente faz parte da doutrina da proteção integral, que foi consagrada pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, admitida em 1989 pela ONU e ratificada no país pelo Decreto 99.710, de 1990 (BARBOZA, 2000, p. 203). Encontra-se presente no direito brasileiro por meio do art. 227 da CF, que foi reproduzido pelos arts. 4º e 5º, do ECA.
Por meio de referida doutrina, a criança e o adolescente passaram a ser tratados como pessoa dotada de dignidade e respeito, incumbindo ao Estado, à família e à sociedade o dever de assegurar ao infante, com prioridade absoluta, os seus direitos fundamentais e cuidados necessários à sua formação, devido a sua condição mais frágil e situação peculiar de pessoa em desenvolvimento.
Destarte, o princípio da proteção integral acarreta um tratamento singular à infância e juventude, que se afirma por meio de uma proteção especial, sendo integral e maximizada, que deve ser a todo custo efetivada.
Rossato, Lépore e Cunha (2019, p. 62) denominam referido preceito como um metaprincípio, e sobre ele declaram:
[...] pretende, pois, que a família se responsabilize pela manutenção da integridade física e psíquica, a sociedade pela convivência coletiva harmônica, e o Estado pelo constante incentivo à criação de políticas públicas.
3.4 Princípio do Melhor Interesse do Menor
Conforme dizeres de Maciel et al. (2019, p. 77), o princípio do melhor interesse do menor, também conhecido como princípio do superior interesse da criança e do adolescente, surgiu, igualmente ao anterior, a partir da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. Esta foi introduzida no direito brasileiro por meio do art. 227, da Constituição Federal, tal como pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que abarcou a doutrina da proteção integral do infante, trazendo amplitude para este princípio.
O melhor interesse do menor se consubstancia na busca incessante pela garantia do maior número de direitos fundamentais da criança e do adolescente. O objetivo precípuo é proporcionar prioridade absoluta para os interesses deles, sejam nas decisões judiciais e interpretações legislativas, sejam nas aplicações de demais princípios e regras, bem como na elaboração de futuras normas, sempre observando o equilíbrio desses interesses.
Nesse contexto, Barboza (2000, p. 207) aduz:
[...] após a Constituição de 1988 o princípio do melhor interesse da criança passou a ser de observância obrigatória, com caráter de prioridade absoluta, em toda questão que envolva qualquer criança ou adolescente, e não apenas aqueles indicados pela lei, anteriormente considerados em situação irregular, já que todos, indiscriminadamente, têm iguais direitos.
Portanto, trata-se de um princípio orientador de todo o trâmite judiciário e social, que objetiva priorizar continuamente todas as crianças e adolescentes, assim como seus direitos fundamentais, com relação aos adultos e seus respectivos interesses e direitos. Isto porque as crianças e os adolescentes são pessoas em desenvolvimento, que estão em situação de vulnerabilidade, cuja dignidade deve ser protegida pelo Estado.
4 DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR E COMUNITÁRIA
O direito à convivência familiar e comunitária é um dos mais importantes para o âmbito da infância e juventude, levando em consideração que representa a garantia que toda pessoa tem de constituir uma família em ambiente de afeto e cuidados recíprocos, e assim fazer parte de uma comunidade.
Com a modernização do conceito de família, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, esta passou a significar:
[...] o ambiente de desenvolvimento da personalidade e da promoção da dignidade de seus membros, sejam adultos ou infantes, o qual pode apresentar uma pluralidade de formas decorrentes das variadas origens e que possui como elemento nuclear o afeto. [...] Desta sorte, a convivência em família é, sem dúvida, um porto seguro para a in-tegridade física e emocional de toda criança e todo adolescente. Ser criado e educado junto aos pais biológicos ou adotivos deve representar para o menor de 18 anos estar integrado a um núcleo de amor, respeito e proteção. (MACIEL et al., 2019, p. 151, 162).
Assim, fica nítido o relevante papel do convívio familiar no desenvolvimento do infante, que é um ser em formação. Trata-se da primeira influência socializadora do indivíduo, que proporcionará ensinamentos acerca de valores éticos, sociais e morais, além de ofertar-lhe afeto, segurança e fortalecimento emocional, para, enfim, estruturar o adulto que se tornará.
Deste modo, a constituição familiar apresenta função fundamental na sociedade e, portanto, deve ser protegida pelo Estado, como bem estabelece a Carta Magna, em seu art. 226. Da mesma forma a convivência comunitária, que é tão relevante para a socialização e desenvolvimento da criança e do adolescente quanto fazer parte de uma família, inclusive como decorrente desta.
Referido direito foi inserido pela Constituição Federal, em seu art. 227, como um direito fundamental inerente à infância e juventude. Assim, obteve importantes reflexos no Estatuto da Criança e do Adolescente, cujos dispositivos legais, como exemplo o art. 19, buscam priorizar a manutenção da criança e do adolescente na família de origem (natural ou extensa), e caso assim não seja possível, proporcionar colocação em família adotiva, sempre priorizando o melhor interesse do menor.
5 AS PERSPECTIVAS CONTRADITÓRIAS DA ADOÇÃO INTUITU PERSONAE E A NECESSÁRIA FLEXIBILIZAÇÃO DOS REQUISITOS LEGAIS PARA ADOÇÃO
A adoção intuitu personae pode ser analisada sob diversas perspectivas, tanto em cunho negativo como positivo, a depender do enfoque. Por se tratar de uma modalidade de adoção que pode ser demasiadamente impactante ao infante, deve ser compreendida com cautela e ponderação.
Inegável a percepção de que essa espécie de adoção caracteriza-se como burla ao cadastro de adotantes, visto que normalmente as pessoas a quem a família biológica entrega a criança não estão cadastradas no Sistema Nacional de Adoção. Dessa forma, desrespeita o procedimento preestabelecido pela legislação, assim como as pessoas que estão há anos cadastradas na fila de adotantes.
Nessa perspectiva, Digiácomo (2010) afirma que a adoção dirigida converte a criança em mero objeto dos pais, além de caracterizar um retrocesso à legislação vigente, contrariando-a claramente. Segundo o autor, essa prática acoberta até mesmo atitudes criminosas, como paga ou promessa de vantagens em troca do filho (art. 238 do ECA). Sobre o assunto, referido autor complementa:
E nem seria razoável (além de juridicamente admissível) solução diversa, pois toda vez que a Justiça da Infância e da Juventude, abrindo mão de suas prerrogativas legais e constitucionais (e mesmo de seu poder jurisdicional), se limita a "homologar" situações pretensamente já consolidadas (concedendo "adoções intuitu personae", notadamente a pessoas não habilitadas previamente), mas que traduzem um "ato de disposição" dos pais em relação a seus filhos, não previsto e nem admitido pelo ordenamento jurídico vigente, que representa evidente burla à sistemática legal para adoção, está desestimulando e mesmo desrespeitando (e assim lesando, de forma absolutamente injustificada e injustificável) todos aqueles que confiaram no Poder Judiciário e se submeteram ao procedimento de habilitação à adoção, alimentando assim uma "espiral de ilegalidade" que já existe desde tempos imemoriais e que, a persistir tal mentalidade, jamais terá fim.
Entretanto, a fim de rechaçar referidos apontamentos, deve-se refletir acerca de duas circunstâncias: a questão da morosidade do sistema de adoção atual, reforçado pelos prejuízos que podem advir de um longo período em instituições de acolhimento; bem como a análise dos princípios já clarificados anteriormente, principalmente o da afetividade e o do melhor interesse do menor, que constituem os valores a serem observados nos dias de hoje pelas decisões na área da família.
A complexidade do processo de adoção é indiscutível, muitas vezes não atendendo à realidade atual da sociedade. Inevitavelmente, referida burocracia acaba ocasionando que muitas crianças e adolescentes passem períodos longínquos em instituições de acolhimento, sendo privados de uma convivência familiar adequada.
A institucionalização, fatalmente, não proporciona a segurança e direitos fundamentais ao crescimento saudável do infante, que fica suscetível à apresentar danos psicológicos, bem como atraso em seu desenvolvimento mental e emocional. Destarte, a adoção dirigida seria uma forma de possibilitar que o processo de adoção seja agilizado, inserindo a criança ou adolescente mais rapidamente em um lar, prevenindo os supracitados danos, que poderiam ser irreparáveis ou de difícil reparação.
Ademais, quando se analisa sob o olhar dos enfoques principiológicos, é seguro afirmar que a adoção deve atender a eles, não obstante o que diz a legislação. Isto porque a adoção significa muito além de uma relação meramente jurídica, mas uma conexão afetiva, representando a construção de uma entidade familiar importante e necessária para o adequado desenvolvimento de uma criança ou adolescente. Nesse sentido, Rezende (2016, p. 7) expressa:
Em suma, a verdadeira finalidade da adoção, hoje, é propiciar ao adotado as melhores condições de desenvolvimento humano e de realização pessoal, fornecendo-lhe uma família em que ele se sinta protegido, acolhido e querido.
Em complemento, é importante ressaltar que o superior interesse a ser protegido nessa relação deve ser o da criança ou adolescente, pois a adoção deve considerar, prioritariamente, o interesse do menor, como reforça o art. 43, do ECA.
Assim, quando se defere uma adoção intuitu personae, o magistrado não está menosprezando o direito das pessoas que estão na fila de adoção, ou prevalecendo sobre elas os adotantes irregulares, mas sim priorizando os direitos e interesses dos menores em questão. Afinal, o melhor interesse da criança ou adolescente seria inevitavelmente continuar sob a guarda daqueles que ofertaram-lhe desde sempre cuidados, amor e proteção, pois esta é a intenção de se constituir família.
Como bem expressa Souza (2020, p. 3):
Não se trata da busca de uma criança para uma família, trata-se de uma busca de uma família que acolha, represente e garanta os princípios superiores e fundamentais a um ser humano, ligado por vínculos afetivos.
Outrossim, com base no princípio do melhor interesse do menor, é razoável concluir que os pais biológicos, ainda detentores do poder familiar, mais do que qualquer pessoa ou órgão jurídico, são os melhores titulares do direito de escolher as pessoas ideais para cuidarem de seus filhos, não porque os consideram como objetos, mas porque prezam pelo melhor para eles. E o fazem por diversos motivos, geralmente relacionados à uma ligação de inteira confiança ou amizade com os adotantes, cuja intenção maior é que as crianças sejam imediatamente adotadas e acolhidas em um novo seio familiar, para que não sejam institucionalizadas.
O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente demonstra, em diversos dispositivos legais, inclusive na subseção que trata da adoção (art. 45), assim como no art. 166, a prevalência para o consentimento dos pais. No mesmo sentido dispõe o Código Civil, que garante aos pais o direito de escolher os tutores de seus filhos, em caso de falecimento, conforme art. 1.729.
Sobre o assunto, Dias (2015, p. 498) brilhantemente aduz:
E nada, absolutamente nada, deveria impedir a mãe de escolher a quem entregar o seu filho. Às vezes é a patroa, às vezes uma vizinha, em outros casos é um casal de amigos, que têm certa maneira de ver a vida, ou uma retidão de caráter, que a mãe considera serem os pais ideais para o seu filho.
5.1 Vantagens da Elaboração de uma Legislação que Flexibilize o Cadastro de Adoção
É certo que existem determinadas hipóteses de adoção, previstas no art. 50, §13º do ECA, que dispensam o cadastro prévio, quais sejam: nos casos em que a adoção é realizada por um dos cônjuges ou companheiros com relação ao filho legítimo do outro, denominada adoção unilateral; quando o pedido de adoção é formulado por algum ente da família extensa, ou seja, parentes próximos com os quais o infante possui convívio, afinidade e afetividade; e nas situações em que o pedido provém de pessoa que já possua a guarda ou tutela da criança maior de três anos ou adolescente, em situação em que seja percebível laços de afinidade e afetividade criados, desde que não tenha havido má-fé ou fraude.
Contudo, apesar de ser uma prática muito recorrente no Brasil, nenhuma das supracitadas hipóteses abarca a adoção intuitu personae, que somente tem a possibilidade de ser formalizada por meio de decisão judicial, ficando sujeita ao critério do magistrado, que pode ou não ser favorável à ela.
Consequentemente, o que acontece na prática é que os adotantes irregulares criam a criança ou o adolescente sob o manto da clandestinidade, ao menos até que se estabeleçam indícios seguros de afetividade com aquele, já que a jurisprudência tende a ser favorável à adoção dirigida nesses casos. Isto porque, ausente referida circunstância, temem que o Poder Judiciário retire-lhes a guarda de fato, o que por vezes é o que acontece. Dias (2015, p. 498) assim exemplifica, verificando-se claramente a problemática causada:
O juiz não avalia sequer quem a mãe entregou o filho, para verificar se a situação em que se encontra a criança atende ao seu melhor interesse. Não, imediatamente arranca a criança dos braços que sempre a acalentou e determina sua institucionalização. Lá permanece até findar o processo de destituição do poder familiar, o que frequentemente chega a demorar anos. Só depois a criança é entregue em adoção ao primeiro inscrito da lista que esteja disposto a adotá-la. Como, de modo geral, todos desejam adotar crianças de pouca idade, retirada de quem a quis, acaba sem ninguém que a queira.
Em decorrência disso, normalmente os adotantes e os pais naturais do infante constituem a adoção dirigida de forma velada, oculta do Poder Judiciário, o qual não tem como exercer nenhum tipo de controle sobre ela, sequer proteger ou preparar os adotados e adotantes, respectivamente.
Assim, na adoção intuitu personae os adotantes não se submetem ao trâmite judiciário, já exposto, que é necessário para se concretizar uma adoção. Ou seja, não são avaliados psicossocialmente por uma equipe técnica especializada, não têm seus dados analisados por servidores da justiça, assim como não passam pelo curso preparatório para adoção, estando totalmente despreparados para tanto.
Além disso, algumas das controvérsias acerca das consequências dessa modalidade de adoção, como a objetificação do infante, o tráfico infantil, ou a comercialização de bebês, não têm como serem prevenidas concretamente sem a salvaguarda do Poder Judiciário.
Por todo o exposto, seria de grande valia a elaboração de uma legislação que flexibilizasse o cadastro de adoção e reconhecesse a adoção intuitu personae. Desse modo, esse tipo de adoção atenderia aos requisitos legais, essenciais para proteção e preparação dos envolvidos, além de proporcionar uma forma mais célere de inserir a criança ou adolescente em uma entidade familiar. Tudo de acordo com a manifestação de vontade dos pais biológicos do infante, assim como priorizando o melhor interesse do menor, garantindo a ele um amadurecimento saudável e seguro, no seio de uma família.
Importante destacar que a legislação deve sempre acompanhar as mudanças da sociedade, e a justiça se adequar da melhor forma à elas, até mesmo para que proporcione segurança jurídica à sociedade, evitando decisões divergentes sobre uma mesma situação.
Em busca dessa perspectiva, já há um projeto de lei do Senado Federal sobre a adoção intuitu personae (Projeto de Lei nº 369/2016), com o fim de incluí-la em uma das situações em que se permite o deferimento da adoção sem que haja cadastro prévio, “mediante a comprovação de prévio conhecimento, convívio ou amizade entre adotantes e a família natural, bem como, para criança maior de dois anos, do vínculo afetivo entre adotantes e adotando” (PL 396, 2016), respeitando-se o preenchimento dos requisitos necessários à adoção.
A adoção é um instituto jurídico muito relevante, além de ser fundamental para o desenvolvimento da criança ou adolescente adotado, bem como modificar consideravelmente a vida do adotante. À vista disso, depende do atendimento de diversos requisitos, preestabelecidos pela lei, que prezam prioritariamente pela proteção do adotando e preparação do adotante.
Considerando esse aspecto, é certo que a adoção intuitu personae possui alguns pontos controversos, justamente por não atender aos específicos requisitos legais e estar efetivamente fora do resguardo da legislação. Assim, caracteriza burla ao cadastro de adotantes e pode até mesmo ser meio para práticas ilícitas e/ou prejudiciais ao menor, como tráfico de crianças, objetificação do infante, adotantes despreparados, entre outras.
No entanto, as vantagens que podem resultar dessa modalidade de adoção são sobressalentes, considerando a busca pelo melhor interesse e proteção integral da criança e do adolescente. Isso em razão de serem pessoas em situação peculiar de desenvolvimento, que possuem direito à uma vida digna, no seio de uma família que lhes proporcione afeto, proteção e um desenvolvimento saudável. Assim, o princípio do melhor interesse do menor deve ser observado tanto na criação das leis, quanto na análise das situações concretas e posteriores decisões judiciais, como o superior interesse a ser protegido, acima de todos os demais.
Nesse contexto, a adoção intuitu personae caracteriza-se por ser uma forma de concretizar referido princípio, pois tende a agilizar o seguimento da adoção, afastando longos períodos de institucionalização do menor - o que comumente ocasiona atrasos consideráveis em seu desenvolvimento psicológico, social e afetivo - e propiciando a colocação em família socioafetiva. Além disso, esse tipo de adoção é intermediado pela própria família biológica, que em tese seria a melhor detentora do direito de escolher os adotantes ideais para seus filhos.
Destarte, os aspectos questionáveis advindos dessa modalidade de adoção indubitavelmente seriam prevenidos por meio da criação de uma legislação que trate da adoção dirigida, isto é, que possibilite que o Poder Judiciário acompanhe referida prática. Dessa forma, inibe a clandestinidade na criação dessas crianças ou adolescentes e proporciona a adequada preparação dos adotantes, para que enfim possam propiciar um lar saudável e seguro para os adotantes, em atendimento aos princípios e direitos da criança e do adolescente e ao fundamento da adoção em si.
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Advogada, pós-graduanda em Direito de Família e Sucessões na Faculdade Legale.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VIANA, Carolina Ferraz. A adoção intuitu personae sob a égide do melhor interesse e proteção da criança e do adolescente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 abr 2021, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56336/a-adoo-intuitu-personae-sob-a-gide-do-melhor-interesse-e-proteo-da-criana-e-do-adolescente. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
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