RESUMO: O presente estudo tem por escopo analisar a legitimidade jurídica da incidência ou não do IPTU sobre imóvel particular inserido em Estação Ecológica. Para tanto, será feito um estudo inicial acerca da regra matriz de incidência do IPTU. Em seguida, serão traçadas breves considerações sobre Estação Ecológica, Unidade de Conservação de Proteção Integral. Por fim, após detida análise da doutrina, legislação e jurisprudência pátrias, serão apresentadas as conclusões sobre a incidência ou não incidência do IPTU Estação Ecológica.
PALAVRAS-CHAVE: Estação Ecológica. Limitação administrativa. Esvaziamento do direito de propriedade. IPTU.
ABSTRACT: The purpose of this study is to analyze the legal legitimacy of the incidence or not of the IPTU on a private property inserted in an Ecological Station. For this purpose, an initial study of the IPTU incidence matrix rule will be made. Then, brief considerations about the Ecological Station, Integral Protection Conservation Unit will be outlined. Finally, after the analysis of the doctrine, legislation and jurisprudence of the country was held, supported as protected against the incidence or non-incidence of the IPTU Estação Ecológica.
KEYWORDS: Ecological Station. Administrative limitation. Emptying the right of property. IPTU.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO; 2 DESEVENVOLVIMENTO; 2.1 Do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana; 2.2 Da criação de Estação Ecológica em propriedade particular; 2.3 Da não incidência do IPTU no caso de inserção de imóvel privado em Estação Ecológica 3. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
O trabalho científico em tela tem por finalidade a discussão acerca a incidência ou não do Imposto sobre a Propriedade Territorial e Urbana (IPTU) sobre imóveis particulares inseridos por ato estatal em Estação Ecológica.
Desta feita, inicialmente, o presente artigo discorrerá, de forma pormenorizada, sobre a regra matriz de incidência do aludido imposto municipal sobre a propriedade predial e territorial urbana.
Nesta perspectiva, serão tecidas considerações sobre a o regramento constitucional e legal que rege a matéria. Analisar-se-á, ainda, entendimento sumulado do C. Superior Tribunal de Justiça sobre o tema em debate.
Em seguida, será feita uma abordagem de cunho teórico e legal sobre a Estação Ecológica, a qual trata-se de Unidade de Conservação de Proteção Integral.
Será demonstrado, em consequência, que o regime legal da Estação Ecológica importa em verdadeira limitação administrativa ao direito de propriedade do particular, restringindo, assim, os direitos do proprietário sobre o bem.
Para enfrentar as questões propostas e, por conseguinte, alcançar o desiderato científico, se buscará referências legais, doutrinárias e jurisprudenciais.
Por fim, ao final da leitura do presente trabalho, será possível identificar se incidirá ou não IPTU sobre o imóvel de propriedade particular que se encontre inserido Estação Ecológica, haja vista o esvaziamento do direito propriedade.
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 Do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana
O imposto sobre propriedade territorial e urbana (IPTU) é tributo de competência dos Municípios e está previsto no art. 156, inciso I, da Constituição Federal, in verbis:
CF, Art. 156: Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
I – propriedade predial e territorial urbana;
Segundo Alexandre (2017, 741): “O IPTU, por sua vez, possui característica predominantemente fiscal, sendo importante fonte de arrecadação municipal, sem prejuízo da sua excepcional utilização extrafiscal, prevista no art. 182, § 4.º, II, da CF/1988.”
Em consonância com as diretrizes constitucionais, o art. 32 do Código Tributário Nacional (CTN) estabeleceu o aspecto material do IPTU como o exercício da “propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.”.
Portanto, a hipótese de incidência do IPTU é a disponibilidade econômica da propriedade, do domínio útil ou da posse (art. 32, do CTN). Sendo assim, não está englobada como hipótese de incidência a posse de conteúdo não econômico, como aquela exercida pelo locatário ou mero detentor.
Sobre o tema em debate, “impende destacar que o conceito de bem imóvel, seja por natureza ou acessão física, é decorrente da legislação civil e está previsto nos arts. 79, primeira parte, e 1.248 do Código Civil.” (SABBAG, 2018, 308).
Com efeito, consoante ensina Lustoza (2015, 130):
No direito civil, o conceito de propriedade é definido pelo art. 1228 do Código Civil, o qual dispõe que o proprietário tem a faculdade de usar, gozar, dispor da coisa e reavê-la. A partir destes direitos que se poderá identificar o exercício de propriedade sobre determinado imóvel, de forma que somente haverá a transferência do imóvel com a sua transcrição no registro de imóveis, conforme prescreve o art. 1245 do Código Civil.
Destaque-se, ainda, que o termo “propriedade” previsto no art. 156, I, da CF deve ser interpretado de forma a englobar o domínio útil (conjunto de atributos conferidos ao titular de enfiteuse ou aforamento) e a posse com animus definitivo.
Nas lições de Machado (2011, 349-350):
Falando a Constituição em “propriedade” naturalmente abrangeu a posse, que nada mais é que um direito inerente à propriedade. A autorização constitucional é para tributar a propriedade, e o Código Tributário Nacional faculta a lei ordinária tomar para o fato gerador do tributo a propriedade, o domínio útil ou a posse, vale dizer, o direito pleno, total, que a propriedade, ou um de seus elementos, o domínio útil, ou ainda a posse.
Este é igualmente o entendimento adotado pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, que assim já decidiu:
A jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que somente a posse com animus domini é apta a gerar a exação predial urbana, o que não ocorre com o condomínio, in casu, que apenas possui a qualidade de administrador de bens de terceiros. (STJ, REsp 327539/DF, Rei. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 74/0812072, Dje 20/08/2012)
Por seu turno, no que tange ao aspecto espacial do IPTU, o art. 32, do CTN segue a regra da territorialidade, delimitando a circunscrição territorial em propriedade imobiliária “localizada na zona urbana do Município”.
No entanto, a definição de zona urbana em lei municipal não é suficiente para ensejar a tributação dos imóveis nela situados, considerando que o art. 32, § 1º, do CTN, exige a existência de alguns melhoramentos, senão vejamos:
CTN. Art. 32. Omissis.
§ 1º - Para os efeitos deste imposto, entende-se como zona urbana a definida em lei municipal; observado o requisito mínimo da existência de melhoramentos indicados em pelo menos 2 (dois) dos incisos seguintes, construídos ou mantidos pelo Poder Público:
I - meio-fio ou calçamento, com canalização de águas pluviais;
II - abastecimento de água;
III - sistema de esgotos sanitários;
IV - rede de iluminação pública, com ou sem posteamento para distribuição domiciliar;
V - escola primária ou posto de saúde a uma distância máxima de 3 (três) quilômetros do imóvel considerado.
Não se descure, contudo, que o art. 32, § 2º, do CTN, dispõe, ipsis litteris:
A lei municipal pode considerar urbanas as áreas urbanizáveis, ou de expansão urbana, constantes de loteamentos aprovados pelos órgãos competentes, destinados à habitação, à indústria ou ao comércio, mesmo que localizados fora das zonas definidas nos termos do parágrafo anterior.
Sobre o tema, o Colendo STJ editou o enunciado de Súmula 626, que trata especificamente sobre o aspecto espacial do imposto em estudo, in verbis:
Súmula 626-STJ: A incidência do IPTU sobre imóvel situado em área considerada pela lei local como urbanizável ou de expansão urbana NÃO está condicionada à existência dos melhoramentos elencados no art. 32, § 1º, do CTN.
Nesta esteira, verifica-se que o IPTU apenas incide sobre imóveis localizados na zona urbana ou urbanizável, e, de outra banda, há incidência do ITR (imposto sobre propriedade territorial rural) quando se tratar de bem imóvel em zona não urbana.
Ainda, insta destacar que a jurisprudência pátria adota, além do critério espacial (zona urbana x zona rural), o critério da destinação do imóvel, de forma que sobre a propriedade de imóveis com destinação rural, ainda que localizados em área urbana, não incide IPTU e sim ITR.
Em tempo, cumpre trazer à lume o brilhante entendimento sobre o tema exposto por Alexandre (2017,746):
Registre-se que mesmo o CTN tendo adotado o critério localização para definir um imóvel como urbano ou rural para fins de incidência de IPTU ou ITR, tanto STF como STJ entendem que estão em vigor as disposições do art. 15 do Decreto-lei 57/1966 segundo as quais o imóvel destinado a exploração extrativa, vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial se sujeita ao ITR, mesmo que situado na área urbana do Município.
No que pertine ao aspecto temporal, critério que está relacionado ao momento em que se considera consumado o fato imponível, mister trazer à lume os ensinamentos de Lustoza (2015, 134), in verbis:
É permitido ao ente municipal definir discricionariamente o aspecto temporal do IPTU, ou seja, o momento em que considera ocorrido o fato gerador. Com base neste permissivo, em geral, os Municípios elegem 1° de janeiro de cada ano como aspecto temporal, exigindo o
tributo com o envio de um carnê de cobrança aos contribuintes. Existem casos específicos em que as legislações municipais podem regulamentar de acordo com sua peculiaridade, como a ocupação originária de imóveis recém construídos. Nestes casos, a incidência do IPTU independe de quaisquer exigências legais para efetiva ocupação do imóvel, demandando apenas que possuam condições ele habitabilidade ou de utilização.
Desta feita, como regra, o aspecto temporal do IPTU se realizará no 1º dia de cada ano, caso a legislação municipal não tenha não tenha disciplinado de forma diversa. Caberá, contudo, à legislação municipal regulamentar a situação jurídica em caso de imóvel novo, respeitado o momento em que o imóvel esteja apto à moradia.
Em se tratando do aspecto subjetivo do imposto em análise, o sujeito ativo do IPTU é o Município da situação do imóvel, com exceção dos territórios federais sem divisão em Municípios, onde a União irá arrecadar o imposto, bem como o Distrito Federal que irá arrecadar tributos estaduais e municipais dentro de sua circunscrição, nos termos do art. 147 da CF.
De outra banda, poderá ser eleito como sujeito passivo, conforme faculta o art. 34 do CTN, o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil ou seu possuidor a qualquer título.
Frise-se, apesar do artigo retro incluir o possuidor a qualquer título entre os contribuintes do IPTU, consoante observado em linhas pretéritas, não é qualquer posse que autoriza a exigência do imposto, mas apenas aquelas hipóteses em que o possuidor se comporta como se legítimo proprietário do imóvel fosse.
Por fim, no que se refere ao aspecto quantitativo, a base de cálculo do IPTU imposta pelo art. 33, caput e parágrafo único, do CTN, “é o valor venal do imóvel”, não se considerando, para tal fim, “o valor dos bens móveis mantidos, em caráter permanente ou temporário, no imóvel, para efeito de sua utilização, exploração, aformoseamento ou comodidade.”
Por sua vez, as alíquotas, consoante as diretrizes constitucionais (art. 156, I e §1º, CF), serão definidas por lei municipal, que poderão ser progressivas em razão do valor do imóvel, bem como diferenciadas de acordo com a localização e uso do imóvel, sem prejuízo da progressividade no tempo a que se refere o art. 182, § 4º, inciso II, CF.
2.2 Da criação de Estação Ecológica em propriedade particular
A Estação Ecológica (ESEC) trata-se de área terrestre ou marinha instituída pelo poder público, que tem como objetivos a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas.
Consoante previsto no art. 8º, I, da Lei nº 9.985/2000, a aludida área é uma espécie de unidade de conservação da categoria de proteção integral.
Ainda, deve ser mencionado que nos termos do art. 49 da Lei nº 9.985/2000, “a área de uma unidade de conservação do Grupo de Proteção Integral é considerada zona rural, para os efeitos legais.”
Sobre a Unidade de Conservação ora sob apreciação, Melo (2018, 377) leciona:
Seus objetivos são a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas, autorizadas pelo órgão responsável pela administração da unidade. Como a posse e o domínio na estação ecológica são públicos, o que determina a desapropriação de propriedades privadas em seus limites (art. 9º, § 1º). É proibida a visitação pública, exceto a de objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico (art. 9º, § 2º).
Por seu turno, o regramento legal da matéria se encontra consolidado no art. 9º, da supramencionada Lei nº 9.985/2000, senão vejamos:
Art. 9º A Estação Ecológica tem como objetivo a preservação da natureza e a realização de pesquisas científicas.
§ 1º A Estação Ecológica é de posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites serão desapropriadas, de acordo com o que dispõe a lei.
§ 2o É proibida a visitação pública, exceto quando com objetivo educacional, de acordo com o que dispuser o Plano de Manejo da unidade ou regulamento específico.
§ 3o A pesquisa científica depende de autorização prévia do órgão responsável pela administração da unidade e está sujeita às condições e restrições por este estabelecidas, bem como àquelas previstas em regulamento.
§ 4º Na Estação Ecológica só podem ser permitidas alterações dos ecossistemas no caso de:
I - medidas que visem a restauração de ecossistemas modificados;
II - manejo de espécies com o fim de preservar a diversidade biológica;
III - coleta de componentes dos ecossistemas com finalidades científicas;
IV - pesquisas científicas cujo impacto sobre o ambiente seja maior do que aquele causado pela simples observação ou pela coleta controlada de componentes dos ecossistemas, em uma área correspondente a no máximo três por cento da extensão total da unidade e até o limite de um mil e quinhentos hectares.
Destarte, vislumbra-se que regime jurídico impõe ao Poder Público proteção integral da estação ecológica, sendo considerado suas dimensões de domínio público, independentemente de futura desapropriação, tanto que a lei expressamente afirma que a posse e o domínio passam a ser do Poder Público com a sua criação.
Consequentemente, essa espécie de unidade conservação limita de sobremaneira o direito de propriedade, considerando que retira do possuidor a faculdade de reivindicar o bem, uma vez que não há reivindicação de bem desapropriável, como institui o artigo 9º, § 1º, da Lei n. 9.985/2000.
Igualmente, não se permite o uso e o gozo do bem, pois se proíbe a utilização econômica do imóvel, conforme art. 9º, § 4º c/c o art. 28, da Lei n. 9.985/2000. E, ainda, inviabiliza a disposição do bem pelo proprietário, porquanto não se dispõe de algo cujo domínio é público.
Desta feita, vislumbra-se que, diante da incidência do regime de proteção integral da área, a criação de uma Estação Ecológica importa em verdadeiro esvaziamento dos poderes inerentes à propriedade; e o fato de o nome do proprietário ainda constar com essa qualificação no título do imóvel revela algo meramente formal, sem qualquer conteúdo que lhe garanta o uso e o gozo do bem.
2.3 Da não incidência do IPTU no caso de inserção de imóvel privado em Estação Ecológica
Tecidas as considerações acima sobre a regra matriz de incidência do IPTU, bem como sobre a conceituação e o regramento específico da Estação Ecológica, é de rigor a conclusão de que a inserção do bem imóvel do particular em Estação Ecológica, por acarretar limitação administrativa imposta pelo Estado, de alto conteúdo intervencionista, ocasionando, consequentemente, ao proprietário do imóvel restrição ao exercício dos poderes inerente à propriedade, importa em não incidência do IPTU.
Com efeito, o esvaziamento do direito de propriedade afasta a ocorrência do aspecto subjetivo da hipótese de incidência do IPTU, disposto no artigo 34 do CTN, e, em assim sendo, os imóveis particulares gravados com tal limitação administrativas não sofrem a incidência tributária do IPTU.
Isto é, o particular, pela simples criação de uma estação lógica que abrange o seu imóvel, termina por perder a propriedade e a posse que detinha sobre o bem, situação que afasta o fato gerador do IPTU.
Acerca do tema em debate, Cavalcante (2020) assenta:
A inclusão do imóvel do particular em Estação Ecológica representa uma evidente limitação administrativa imposta pelo Estado, ocasionando ao proprietário do imóvel, restrição ao exercício dos poderes inerente à propriedade.
O regime jurídico da Estação Ecológica impõe proteção integral da área, tanto que a lei afirma que a posse e o domínio passam a ser do Poder Público.
Desse modo, com a inclusão do imóvel na Estação Ecológica, a propriedade e a posse do particular sobre o bem ficam inteiramente comprometidas mesmo antes que o Poder Público realize o processo de desapropriação.
Assim, considerando estas limitações administrativas que desnaturam por completo o domínio útil exercido pelo particular, deve-se concluir que ele deixa de ser considerado sujeito passivo do IPTU em relação a este bem.
Mister consignar que, recentemente, o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1695340-MG, de Relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques (2ª Turma), julgado em 17/09/2019, firmou posicionamento que a qualificação de imóvel como unidade de conservação de proteção integral limita o direito de propriedade e, por consequência, afasta a incidência do IPTU.
De acordo com o voto do Ministro relator, a inclusão do imóvel em Estação Ecológica, categoria do Grupo de Unidade de Conservação de Proteção Integral, caracteriza evidente limitação administrativa imposta pelo Estado ao proprietário do imóvel, ainda que não tenha havido a desapropriação direta ou indireta do imóvel urbano pelo Estado, porquanto ocasiona restrição ao exercício dos poderes de propriedade pelo titular do domínio.
Acrescentou-se, ademais, que com as limitações administrativas impostas pela Estação Ecológica criada pelo Poder Público, o proprietário do imóvel deixa de ser contribuinte, pois não é mais titular e tampouco possuidor da propriedade urbana, nos termos do art. 34 do Código Tributário Nacional e 9º, §1º, da Lei 9.985/2000.
Ainda, ressaltou que o regime de unidade de conservação de proteção integral é de zona rural, conforme artigo 49 da Lei 9.985/2000, e, portanto, incompatível com a manutenção da cobrança do IPTU.
Pela sua clareza, pede-se vênia para transcrever a ementa do julgado ora sob apreciação:
PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 3/STJ. OFENSA AOS ARTIGOS 489, § 1º, VI, E, 1.022, II, AMBOS, DO CPC/2015. NÃO CARACTERIZAÇÃO. INCIDÊNCIA DE IPTU SOBRE IMÓVEL PARTICULAR SITUADO INTEGRALMENTE EM UNIDADE DE CONSERVAÇÃO INTEGRAL. ESTAÇÃO ECOLÓGICA. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVO NO CASO CONCRETO QUE IMPÕE RESTRIÇÃO DO PROPRIETÁRIO AO EXERCÍCIO DO DOMÍNIO ÚTIL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DA HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO ARTIGO 34 DO CTN. ÁREA CONSIDERADA RURAL. NÃO CABIMENTO DE IPTU, MAS ITR. COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA EXCLUSIVA DA UNIÃO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Não se configura a alegada ofensa aos artigos 489 e 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide, fundamentando seu proceder de acordo com os fatos apresentados e com a interpretação dos regramentos legais que entendeu aplicáveis, demonstrando as razões de seu convencimento.
2. Trata-se de embargos à execução fiscal manejados pelo contribuinte que visa desconstituir o IPTU exigido pela Município de Belo Horizonte, sobre imóvel situado em Unidade de Conservação, designada de Estação Ecológica Cercadinho, instituída pela Lei Estadual n° 15.979/06.
3. A limitação administrativa imposta pela Lei 9.985/2000 acarreta ao particular, o esvaziamento completo dos atributos inerente à propriedade, de reivindicação, disposição, de uso e gozo do bem, retirando-lhe na hipótese o domínio útil do imóvel, de modo que o aspecto subjetivo da hipótese de incidência do IPTU, disposto no artigo 34 do CTN, não se subsume à situação descrita neste autos, razão pela qual não se prospera a incidência do referido tributo;
4. Ademais, o artigo 49 da Lei 9.985/2000 assevera que a área de uma unidade de conservação de proteção integral é considerada zona rural para efeitos legais, motivo pelo qual, não se cogitaria a incidência de IPTU sobre o referido imóvel descritos nos autos, mas de ITR, sendo este último tributo de competência tributária exclusiva da União, não se prosperando a manutenção do Município como sujeito ativo da relação tributária.
5. Recurso Especial conhecido e parcialmente provido.
(REsp 1695340/MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/09/2019, DJe 24/09/2019)
Tecidas essas considerações, resta indene de dúvidas de que a inclusão do imóvel do particular em Estação Ecológica, e a consequente limitação administrativa imposta pela Lei n. 9.985/2000 acarreta ao particular o esvaziamento completo dos atributos inerente à propriedade, retirando-lhe o domínio útil do imóvel, de modo que o aspecto subjetivo da hipótese de incidência do IPTU, disposto no artigo 34 do CTN, não se subsume à situação, razão pela qual não se prospera a incidência do referido tributo.
3 CONCLUSÃO
Diante do exposto, concluiu-se que o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU) é um imposto cobrado pelos Municípios de todos aqueles que são proprietários, possuidores ou os titulares de domínio útil de bem imóvel, localizado na zona urbana ou de expansão urbana do Município.
Analisou-se que a Estação Ecológica, espécie de unidade de conservação da categoria de proteção integral, acarreta evidente limitação administrativa imposta pelo Estado, ocasionando, por consequência, o esvaziamento completo dos atributos inerentes à propriedade do particular, retirando-lhe, assim, o domínio útil do imóvel
Dessa forma, ao final do presente trabalho científico, constatou-se que, na esteira da novel jurisprudência do C. Superior Tribunal de Justiça, a inserção de bem imóvel privado em Estação Ecológica afasta a incidência do IPTU, haja vista que o proprietário do imóvel deixa de ser contribuinte, pois não é mais titular e tampouco possuidor da propriedade urbana, nos termos do art. 34 do Código Tributário Nacional e 9º, §1º, da Lei 9.985/2000.
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Advogada. Ex-Técnico do MPE/RN. Ex-Assessor Jurídico do MPE/RN. Graduada em direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Especialista em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Especialista em Direito Tributário e Planejamento Tributário pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SENA, Kamila Miranda. Análise sobre a incidência ou não de IPTU sobre imóvel inserido em Estação Ecológica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 maio 2021, 04:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56546/anlise-sobre-a-incidncia-ou-no-de-iptu-sobre-imvel-inserido-em-estao-ecolgica. Acesso em: 22 nov 2024.
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