JANAINA GUIMARÃES MANSILIA
(orientadora)
RESUMO: O Código de Defesa do Consumidor foi criado em 1990, com o intuito de proteger o consumidor nas relações de consumo, pois o mesmo é vulnerável, ou seja, é a parte mais fraca da relação de consumo. Sendo assim é necessária a inversão do ônus da prova, visto que o fornecedor detém em seu poder todas as provas e possui todo conhecimento sobre o produto ou serviço, e o consumidor hipossuficiente não possui ao seu alcance algumas provas. O objetivo do presente trabalho é estudar a inversão do ônus da prova como um meio para facilitar a proteção dos direitos do consumidor, garantindo assim o verdadeiro acesso à justiça previsto nesse estatuto legal. A metodologia aplicada ao estudo será a pesquisa básica ou pura, análise bibliográfica, exploratória e qualitativa, ou seja, a pesquisa será realizada nas principais doutrinas, legislações e artigos científicos relacionados à temática. Percebe-se na pesquisa que a inversão do ônus da prova é fundamental para garantir a proteção dos direitos do consumidor, visto que esse é a parte indefesa da relação. Sendo assim, o instituto da inversão ônus da prova no código de defesa do consumidor deve ser utilizado com eficácia máxima para garantir o equilíbrio na relação de consumo.
Palavras-chave: Consumidor. Fornecedor. Inversão. Ônus da prova.
SUMÁRIO: 1 INTRODUÇÃO. 2 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. 2.1 Evolução Histórica. 2.2 Fundamento Constitucional. 2.3 Conceitos. 2.3.1 Conceito de consumidor. 2.3.2 Conceito de fornecedor. 2.3.3 Produto e serviço. 2.4 Princípios do Código de Defesa do Consumidor. 2.4.1 Principio da vulnerabilidade. 2.4.2 Principio da hipossuficiência . 2.4.3 Principio da boa-fé objetiva. 3 DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR. 3.1 Direito à Vida, Saúde e Segurança(Artigo 6°,I). 3.2 Direito à Educação, Liberdade de Escolha e Informação Adequada (Artigo 6°, II). 3.3 Direito a Informação Adequada e Clara (Artigo 6°, III). 3.4 Direito à Proteção Contra Publicidade Enganosa e Abusiva (Artigo 6°, IV) . 3.5 Direito à Proteção Contratual (Artigo 6°, V). 3.6 Direito à Prevenção e Reparação de Danos (Artigo 6°, VI). 3.7 Direito ao Acesso à Justiça (Artigo 6°, VIII). 3.8 Direito à Facilitação de Acesso à Justiça (Artigo IX). 3.9 Direito ao Serviço Público Eficaz (Artigo 6°, X).4. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. 4.1 A Prova. 4.2 O Ônus da Prova. 4.3 Inversão do Ônus da Prova. 4.4 Momento da Inversão. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
1 INTRODUÇÃO
A defesa do consumidor surgiu no Brasil a partir da Constituição Federal de 1988, (art. 5°, XXXII e 170, V), como garantia fundamental do indivíduo e princípio da ordem econômica, que se fez necessário visto o desequilíbrio notório entre as relações consumeristas existentes.
Em 11 de setembro, do ano de 1990, por meio da lei n° 8.078/90, foi criado o Código de Defesa do Consumidor, que tem como seu principal objetivo estabelecer direitos e obrigações dos consumidores e fornecedores, visando acabar com a desigualdade existente entre ambos, para evitar que haja prejuízo de qualquer tipo ao consumidor, visto ser esse o elo mais fraco.
O consumidor tem uma posição vulnerável e hipossuficiente em relação ao fornecedor, seja por falta de recursos financeiros ou de conhecimento técnico.
O fornecedor possui em seu poder diversas informações e provas que não estão ao alcance do consumidor, por isso o artigo 6°, VIII, do Código de Defesa do Consumidor prevê a possibilidade da inversão do ônus da prova, em casos concretos que serão analisados pelo Juiz.
A inversão do ônus da prova é um princípio de extrema necessidade, visto que caberia ao fornecedor demonstrar o contrário, que os fatos não ocorreram da forma como foram alegados pelo consumidor.
No entanto cabe ao Magistrado decidir a aplicação desse instituto, podendo concedê-lo desde que as afirmações do consumidor sejam verossímeis ou que esteja demonstrada a sua hipossuficiência.
A metodologia aplicada ao estudo será a pesquisa básica ou pura, análise bibliográfica, exploratória e qualitativa, ou seja, a pesquisa será realizada nas principais doutrinas, legislações e artigos científicos relacionados à temática.
O presente artigo tem como objetivo estudar a inversão do ônus da prova como um meio para facilitar a proteção dos direitos do consumidor, haja vista que o consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo, buscando a efetividade das normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, para atingir o verdadeiro acesso à justiça previsto nesse estatuto legal.
No primeiro capítulo será apresentado a evolução histórica, o fundamento constitucional no Brasil e os conceitos e princípios do direito do consumidor. O segundo capítulo versa sobre os direitos básicos do consumidor. E por fim no terceiro capítulo será abordado tema mais específico, sendo a aplicabilidade da inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor.
A inversão do ônus da prova no direito do consumidor é de suma importância, para que os direitos dos consumidores sejam assegurados.
2 O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
2.1 Evolução histórica
Em decorrência da revolução industrial dos séculos XIII e XIX, houve o crescimento populacional nas metrópoles, o que desencadeou um aumento de demanda, fazendo com que as indústrias precisassem aumentar suas produções para servir um maior número de pessoas.
Em consequência desse cenário precisou-se de uma forma mais eficaz para crescer a produção, que foi a homogeneização da produção, possibilitando um aumento na oferta e diminuição no valor.
Já no século XX, após a Segunda Guerra Mundial, com o advento de novas tecnologias, esse sistema de produção foi expandido para diversos países, com o surgimento da globalização, tendo assim, a sociedade de massa.
Eis que surge o modelo de produção industrial, usado na sociedade capitalista, onde o fornecedor (fabricante ou prestador de serviços) planeja o produto, e após, há a sua reprodução em série. Já que assim teria um custo menor, pois teria custos com a criação do produto uma única vez, e poderia produzir quanto quisesse. Isso fez com que a valor do produto diminuísse e fosse mais acessível.
Porém, apareceram problemas, pois o fornecedor produzia o produto de forma unilateral, não sendo possível ao consumidor discutir as cláusulas previamente estabelecidas, restando apenas o aceite de tais formas e o pagamento do valor estipulado.
Com a nova filosofia de mercado, problemas começaram a surgir. Evidentemente, quando o fornecedor passa a prezar pela quantidade em detrimento da qualidade, o consumidor depara-se com produtos e serviços viciados ou portadores de defeitos que lhe causarão prejuízos de ordem econômica ou física, respectivamente (BOLZAN, 2014, p. 34).
Os vícios começaram a se tornar recorrentes, e naquela época, durante quase todo o século XX, no Brasil, as relações de consumo foram disciplinadas pelo Código Civil, que não era apto para julgar o caso de forma correta, visto que fora elaborado para disciplinar relações individualizadas, e não consumeristas, caso em que a demanda é coletiva.
Por isso, houve a necessidade de criar um código especifico para tratar das relações de consumo, visando proteger a parte mais fraca dessa relação.
Em 11 de setembro do ano de 1990, foi criada a Lei n. 8.078, nomeada de Código de Defesa do Consumidor, que entrou em vigência em 11 de março de 1991.
O Código de Defesa do Consumidor Brasileiro se tornou uma das leis mais avançadas no mundo todo, inclusive serviu de inspiração para outros países.
Traz expresso em seu ordenamento jurídico, os direitos e deveres do consumidor e do fornecedor, visando proteger o consumidor, que é a parte vulnerável, pois o fornecedor detém todas as informações a respeito do produto ou serviço, regulamentando melhor as relações de consumo.
2.2 Fundamento Constitucional
No Brasil, o Direito do Consumidor está amparado na Constituição Federal de 1988, mais precisamente no artigo 5°, XXXII, como garantia fundamental e no artigo 170, V, como princípio da ordem econômica:
Artigo 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade nos seguintes termos:
(...)
XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor (...)
Artigo 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da Justiça Social, observados os seguintes princípios:
(...)
V - defesa do consumidor.
Como as relações de consumo eram muito desiguais, fora necessário o direito do consumidor ser amparado pela Constituição Federal, sendo considerado um direito fundamental, se tornando o Estado responsável por promover a defesa do consumidor, parte vulnerabilizada da relação jurídica de consumo, estando acima das leis ordinárias.
Sendo assim a proteção constitucional é fundamental para assegurar os direitos dos consumidores.
2.3 Conceitos
2.3.1 Conceito de consumidor
O Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 2° define consumidor como “toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. E em seu parágrafo único “equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo”.
Traz ainda em seu ordenamento jurídico outros conceitos de consumidores equiparados, sendo eles “as vítimas do evento” que se refere o artigo 17 e “todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas abusivas” que expressa o artigo 29, ambos do Código de Defesa do Consumidor.
O consumidor é a parte vulnerável na relação de consumo, aquele que adquire um produto ou serviço do fornecedor, não tendo a opção de discutir o contrato de adesão feito de forma unilateral pelo fornecedor, sendo o elo mais fraco da relação, por isso a necessidade de ser protegido.
Consumidor por equiparação é aquele que não adquiriu diretamente o produto ou serviço, mas sofreu algum tipo de dano com tal conduta, sendo exemplo disso o fato de ser cobrado por dívida inexistente, ter seu nome cadastrado em banco de dados como devedor, vítimas de acidente de trânsito em casos específicos, entre outros.
2.3.2 Conceito de fornecedor
O Código de Defesa do Consumidor estabelece no seu artigo 3º o que é fornecedor.
Artigo 3°. Toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como entes despersonalizados, que desempenham atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Fornecedor é todo aquele que disponibiliza no mercado de forma habitual produtos ou serviços, podendo ser comerciantes ou estabelecimentos. É aquele que fabrica, vende, que presta serviço, podendo ser pessoa física ou jurídica.
2.3.3 Produto e serviço
O objeto da relação jurídica de consumo são os produtos e serviços.
A definição de produto é expressa no §1°, do artigo 3°do Código de Defesa do Consumidor, “Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial”. Sendo qualquer bem adquirido pelo consumidor, para integrar no seu patrimônio.
Os bens móveis são aqueles passíveis de deslocamento, podendo ser qualquer objeto, e os bens imóveis são os que não podem ser deslocados, exemplo de uma residência.
Já os bens matérias são aqueles compostos de matéria prima, como um livro, por exemplo, e os imateriais são de propriedade intelectual, como um programa de computador.
A definição de serviço é expressa no §2, do artigo 3° do Código de Defesa do Consumidor.
Artigo 3°, §2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Serviço são atividades desenvolvidas pelo fornecedor, para suprir a necessidade do consumidor, sendo amparado pelo Código de Defesa do Consumidor apenas aquele que possui remuneração.
2.4 Princípios do Código de Defesa do Consumidor
Embora seja previsto diversos princípios no Código de Defesa do Consumidor, para garantir a defesa do consumidor, será abordado nesse artigo somente os mais pertinentes à temática discutida.
2.4.1 Princípio da vulnerabilidade
A Vulnerabilidade é assegurada no inciso I, do artigo 4° do Código de Defesa do Consumidor, sendo um princípio necessário ao consumidor, para a garantia de sua dignidade, segurança, proteção, saúde e melhoria da sua qualidade de vida.
O princípio da vulnerabilidade é de grande importância, visto que o consumidor é parte indefesa na relação de consumo, havendo uma desigualdade entre o consumidor e o fornecedor.
O fornecedor possui conhecimento sobre toda a linha de produção, porém o consumidor não tem acesso a todas as informações, além disso, o fornecedor possui conhecimento técnico, cujo consumidor não possui, fazendo com que se encontre em uma posição de vulnerabilidade em relação ao fornecedor que possui o poderio em suas mãos.
A publicidade e os demais meios de oferecimento do produto ou serviço estão relacionados a essa vulnerabilidade, eis que deixam o consumidor à mercê das vantagens sedutoras expostas pelos veículos de comunicação e informação (TARTUCE; NEVES, 2018, p.47).
Todo consumidor é vulnerável, por ser ele o destinatário final do produto ou serviço, associa-se a idéia de fraqueza ou debilidade do sujeito da relação de consumo, não importando a situação financeira, econômica, social ou política da pessoa, bastando se enquadrar como consumidor.
2.4.2 Princípio da hipossuficiência
A hipossuficiência é prevista no artigo 6°, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, sendo um dos requisitos para que ocorra a inversão do ônus da prova.
É um conceito fático, diferente da vulnerabilidade, pois não são todos os consumidores que são hipossuficientes. Podendo ser técnica, pelo desconhecimento do produto ou serviço adquirido, ou fática devido a sua relação socioeconômica em relação ao fornecedor. Também é caracterizada quando o consumidor é impedido de conseguir prova indispensável para responsabilizar o fornecedor pelo dano, já que o mesmo possui todas as informações e conhecimento técnico do produto e serviço.
Depende da análise do caso concreto, não sendo aplicada a todos os consumidores como ocorre com a vulnerabilidade, pois deve ser identificada pelo Juiz no caso concreto.
2.4.3 Princípio da boa-fé objetiva
O princípio da boa-fé é um dos mais importantes do direito privado, e está previsto no artigo 4º, III, do Código de Defesa do Consumidor, como requisito para que haja o desenvolvimento econômico do fornecedor e a proteção do consumidor, à saúde, segurança e patrimônio econômico de modo que haja igualdade na relação, sendo necessário para tal acontecimento que ambas as partes haja com boa-fé.
E no artigo 51, IV, que expressa serem nulas as cláusulas contratuais que ferirem o princípio da boa-fé, colocando o consumidor em posição desfavorável, de desvantagem.
Constitui como dever de conduta e comportamento, a ética, honestidade, confiança, cooperação, respeito, informação, lealdade e transparência das partes, em todas as fases do negócio.
Dessa forma, exige-se no contrato de consumo colaboração e respeito entre as partes, para que ocorra um equilíbrio negocial entre ambos, e caso alguma das partes não cumpra com o combinado, agindo de má-fé, será penalizada, podendo haver a decretação da nulidade do negócio jurídico.
3 DIREITOS BÁSICOS DO CONSUMIDOR
Os direitos básicos do consumidor estão previstos no artigo 6° do Código de Defesa do Consumidor, dos incisos I ao IX, como será abordado a seguir.
3.1 Direito à Vida, Saúde e Segurança (Artigo 6°, I)
Esta previsão visa proteger a integridade dos consumidores, na relação de fornecimento de produtos e serviços, a riscos e perigos que podem gerar dano a vida, saúde e segurança do consumidor, inclusive acarretar perda da própria vida.
3.2 Direito à Educação, Liberdade de Escolha e Informação Adequada (Artigo 6°, II)
Esse direito visa garantir que o consumidor obtenha as informações necessárias advindas do fornecedor para que possa haver um equilíbrio maior na relação de consumo e o consumidor tenha liberdade de escolha e conhecimento para adquirir aquilo que está realmente buscando, evitando aquisições desnecessárias.
3.3 Direito a Informação Adequada e Clara (Artigo 6°, III)
É dever de o fornecedor fornecer todas as informações necessárias sobre os produtos e serviços, especificando quantidade, qualidade, composição e características para que o consumidor saiba de forma clara e adequada o que está adquirindo.
Além disso, deve também informar ao consumidor o valor pago equivalente aos tributos devidos.
3.4 Direito à Proteção Contra Publicidade Enganosa e Abusiva (Artigo 6°, IV)
Dispõe sobre a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, para que o consumidor não seja desacertado.
As propagandas enganosas são aquelas que emitem uma informação falsa, fazendo com que o consumidor seja induzido ao erro sobre qualquer dado do produto.
E abusivas são aquelas que, desrespeitam valores, regras, condutas, ou que possam ser prejudiciais a saúde do consumidor.
3.5 Direito à Proteção Contratual (Artigo 6°, V)
Garante em casos excepcionais, que mesmo após ser assinado o documento, o consumidor pode rever ou modificar as cláusulas contratuais caso haja algum fato posterior ao contrato que possa causar prejuízo ao mesmo.
3.6 Direito à Prevenção e Reparação de Danos (Artigo 6°, VI)
Prevê que o fornecedor tem o dever de indenizar o consumidor pelo dano causado a ele, podendo ser danos morais ou materiais, devendo ser o valor proporcional ao prejuízo que o consumidor sofreu, não podendo gerar enriquecimento ilícito.
3.7 Direito ao Acesso à Justiça (Artigo 6°, VII)
É direito básico do consumidor o acesso a justiça, possibilitando assim que quem não tem condições financeiras consiga ingressar na justiça do mesmo modo, para isso, são de suma importância a assistência judiciária gratuita e a Defensoria Pública.
3.8 Direito à Facilitação de Acesso à Justiça (Artigo 6°, VIII)
Destaca que o dever de apresentar provas é do consumidor, porém, pode o Juiz, através da inversão do ônus da prova, determinar que o fornecedor produza essas provas, devido à verossimilhança das alegações e a situação de hipossuficiência do consumidor, devendo o fornecedor provar que seu produto ou serviço não possui vício.
3.9 Direito ao Serviço Público Eficaz (Artigo 6°, IX)
Ressalta a importância da eficiência dos serviços públicos, para que possam cumprir com a sua função, e suprir a necessidade a qual foram criados.
4 INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
4.1 A Prova
A prova como resultado tem por escopo a formação do convencimento judicial: “provar significa formar a convicção do Juiz sobre a existência ou não de fatos relevantes no processo” (CHIOVENDA, 2002, apud LEITE, 2018, p.49).
Os objetos de prova são aqueles que constituem as alegações dos fatos relevantes ao processo pelas partes. E os meios de prova são de acordo com o Código de Processo Civil, o depoimento pessoal, confissão, exibição de documento ou coisa, prova documental, prova testemunhal, prova pericial e inspeção judicial.
Adverte a Constituição Federal, em seu artigo 5°, inciso LVI que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”, ou seja, é preciso que a prova seja obtida por meio previsto em lei para que o julgador a considere. Podendo ainda, o Magistrado, em determinados casos, entender pela desnecessidade da produção de determinado meio de prova.
O Código de Processo Civil estabelece em seu artigo 371, que “o Juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento”, portanto o Juiz após analisar o caso e as provas nele presentes, decidirá, podendo apreciar e valorar a prova.
A prova é formada por elementos imprescindíveis a causa, para provar a veracidade das alegações, levando os fatos a conhecimento do Juiz, para que assim gere o convencimento do mesmo do caso concreto.
4.2 O Ônus da Prova
Ônus da prova significa que aquele que tem o dever de provar, deverá produzir determinadas provas, sendo esse dever de quem faz as alegações, ou seja, inicialmente pertence ao autor.
A doutrina divide o ônus da prova em dois aspectos: subjetivo e objetivo. O subjetivo analisa quem é o responsável pela produção de determinada prova, e o objetivo analisa uma regra de julgamento existente, a ser aplicada pelo Juiz no momento da decisão, caso a prova se mostrar inexistente ou insuficiente.
O ônus da prova é, portanto, regra de julgamento, aplicando-se para as situações em que, ao final da demanda, persistam fatos controvertidos não devidamente comprovados durante a instrução probatória. Trata-se de ônus imperfeito, porque nem sempre a parte que tinha o ônus de prova e não a produziu será colocada num estado de desvantagem processual, bastando imaginar a hipótese de produção de prova de ofício ou, ainda, de a prova ser produzida pela parte contrária. Mas também é regra de conduta das partes, porque indica a elas quem potencialmente será prejudicado diante da ausência ou insuficiência da prova (TARTUCE; NEVES, 2018, p.630).
O ônus da prova cabe ao autor dos fatos, e ao réu somente em casos específicos, segundo o artigo 373, do Código de Processo Civil.
Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Ao autor cabe provar os fatos apresentados na inicial do pedido, já ao réu cabe se desvincular das alegações feitas pelo autor, caso não faça, não ficará em uma posição de desvantagem, somente se o autor provar comprovar a veracidade dos fatos.
O ônus somente passa a ser do réu caso o autor possa se desincumbir de tal obrigação, devendo o Juiz em casos onde ambas as partes não se desobrigarem do ônus, decidir improcedente o pedido do autor.
Será aplicado no final da demanda antes de o Juiz proferir sentença, em casos de inexistência ou insuficiência de prova, julgando de acordo com as provas produzidas.
4.3 Inversão do Ônus da Prova
O Código de Defesa do Consumidor prevê a possibilidade da inversão do ônus da prova, como facilitação da defesa dos direitos do consumidor, em seu artigo 6°, inciso VIII.
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.
Cumpre salientar que a inversão do ônus da prova ocorre com o objetivo de facilitar a defesa do consumidor, sendo de extrema importância, visto que o consumidor é vulnerável em relação ao fornecedor.
O Consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo, por isso é necessário que tenha vantagens em relação à parte contrária da relação.
A inversão do ônus da prova é medida de muita utilidade para que o consumidor possa ter facilitada a defesa de seus bens direitos, no que tange à prova de suas alegações. Essa dita inversão é de extrema importância para que as desigualdades entre consumidores e fornecedores possam ser compensadas, relativizadas (FINKELSTEN; NETO, 2010,p. 175).
Não é em todos os casos que ocorrerá a inversão, o Juiz deverá analisar o caso, e observar se houve verossimilhança nas alegações do consumidor e esse fora caracterizado como hipossuficiente, bastando estar presente somente um desses requisitos para que ocorra obrigatoriamente a inversão.
A verossimilhança das alegações é quando a alegação parece ser verdadeira, mesmo não havendo provas ainda para comprová-la. O consumidor deve demonstrar que o fato é provavelmente verdadeiro, e o Juiz não precisa entender que esse fato é comprovadamente verdadeiro, visto que esse é o intuito de ocorrer a inversão do ônus da prova, apenas tem que entender o fato como possivelmente verdadeiro.
A hipossuficiência como já mencionado anteriormente não é característica de todo o consumidor. Devendo ser técnica, quando o consumidor não possui conhecimento sobre o produto ou serviço, ou fática em relação a condição socioeconômica existente.
Quando estiverem presentes esses requisitos, o julgador deverá inverter o ônus sem necessidade de aviso prévio ao fornecedor, já que é pressuposto previsto em lei, tendo este que trazer aos autos as provas necessárias para ilidir sua responsabilidade objetiva
A inversão do ônus da prova somente ocorrerá em favor do consumidor, em vista da fragilidade existente, porém o Juiz determinar a inversão, não significa que o consumidor é a parte vencedora da ação, somente irá analisar todas as provas apresentadas por quem as detém, nesse caso o fornecedor é o maior detentor de provas, portanto com a inversão ele deve as apresentar em juízo para que o Magistrado conheça o conflito e assim possa chegar à uma conclusão mais justa.
A lei não prevê que o Juiz deve sempre decidir em favor do consumidor, apenas estabelece que esse é a parte vulnerável da relação de consumo, por isso o ônus da prova deve ser invertido em favor deste.
Cabe ao consumidor demonstrar o nexo de causalidade existente entre o dano e o fato danoso, e ao fornecedor produzir provas em relação ao fato danoso, já que possui todas as informações, inclusive aquelas que não chegam ao consumidor.
Mesmo esse princípio sendo limitado, ocorrendo somente em casos específicos, onde há necessidade de provas que somente poderiam ser fornecidas pelo fornecedor, ainda é de suma importância para o consumidor
4.4 Momento da Inversão
Segundo Nunes (2018, p.583) “a inversão se dá por decisão do juiz diante de alternativas postas pela norma: ele inverterá o ônus se for verossímil a alegação ou se for hipossuficiente o consumidor”.
É preciso que o Juiz tome conhecimento do caso concreto, para que possa analisar a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência do consumidor, para assim inverter o ônus da prova.
A lei é omissa em relação ao momento cabível a inversão do ônus da prova, ocorrendo grande divergência doutrinária e jurisprudencial, existindo três versões
Para parcela da doutrina o momento adequado seria na sentença, onde o Juiz já teria conhecimento de todas as provas colhidas durante a instrução processual, para que assim possa decidir se houve verossilhança das alegações do consumidor ou hipossuficiência, apenas estando apto para deferir ou não a inversão neste momento, visto que não seria possível ser realizado antes de ser encerrada a fase instrutória.
Afirmam que não é considerado ofensa ao princípio da ampla defesa e contraditório, visto que as partes tinham conhecimento desde o inicio da ação que esse momento poderia vir a ocorrer, e que deveriam apresentar todas as provas necessárias no processo, devendo suportar uma possível desvantagem caso ocorra.
É entendimento firmado em Jurisprudência que o momento da inversão do ônus da prova também pode ocorrer em grau recursal.
Agravo regimental. Agravo de instrumento. Inversão do ônus da prova em 2.º grau de jurisdição. Possibilidade. Regra de julgamento. 1. Essa Corte firmou o entendimento de que é plenamente possível a inversão do ônus da prova em 2.º grau de jurisdição, pois cuida-se
de uma regra de julgamento, que não implica em cerceamento de defesa para nenhuma das partes. 2. Agravo regimental não provido” (STJ – AgRg no Ag 1.028.085/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Vasco Della Giustina, Des. convocado – j. 04.02.2010 – DJe 16.04.2010).
Mas para a grande maioria, o momento adequado seria o do despacho saneador, antes da instrução do processo, no qual o Juiz toma conhecimento dos fatos alegados, e examinando-os teria que observar se houve os requisitos processuais necessários, sendo a verossimilhança das alegações e hipossuficiência do consumidor, para que nesse momento deferisse a inversão do ônus da prova em favor do consumidor.
Desse modo não haveria ferimento ao princípio do contraditório, e o fornecedor não seria surpreendido com essa decisão posteriormente, não tendo como se defender, visto que apesar de o fornecedor ter o dever de apresentar todas as provas necessárias no processo, ele não apresentará provas que possam o prejudicar caso tenha convicção de que a causa esteja favorável a si, quando o consumidor não possuir as provas necessárias.
Nesse sentido, é que a maioria dos doutrinadores e jurisprudência defendem ser esse o momento mais adequado para ocorrer a inversão.
[...] - A inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, como exceção à regra do artigo 333 do Código de Processo Civil, sempre deve vir acompanhada de decisão devidamente fundamentada, e o momento apropriado para tal reconhecimento se dá antes do término da instrução processual, inadmitida a aplicação da regra só quando da sentença proferida (STJ. REsp 881651 / BA. Relator: Ministro Hélio Quaglia Barbosa. Data do Julgamento: 10.04.2007. Votação Unânime).
Portanto a inversão do ônus da prova pode ocorrer em despacho saneador, na sentença ou até mesmo em grau recursal, mas o mais defendido e praticado é o momento do despacho saneador, antes da instrução processual.
Durante a pesquisa nota-se que o consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo, é vulnerável em relação ao fornecedor, por isso a necessidade de criar o Código de Defesa do Consumidor, que tem como objetivo proteger o consumidor e acabar com essa desigualdade existente.
Como mencionado no presente artigo, o ônus da prova é um instituto ao qual tem a parte o dever de provar, de apresentar provas no processo, sendo esse ônus inicialmente do autor, pertencendo ao réu somente em casos de existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Nesse aspecto faz-se necessário a facilitação da defesa dos direitos do consumidor, através do instituto da inversão do ônus da prova, pois através deste, caberia ao fornecedor, trazer aos autos as provas necessárias, devendo provar que os fatos ocorreram de modo contrário ao alegado pelo consumidor, já que o fornecedor detém poderio econômico, social e intelectual em relação ao consumidor.
O consumidor, encontra-se em posição de desvantagem, visto que na maioria das vezes não detém em seu poder as provas necessárias para que o Juiz tenha o devido conhecimento do caso, desse modo encontra-se prejudicado, não tendo a possibilidade de se defender de forma correta.
Mesmo o fornecedor sendo obrigado a apresentar as provas que possui, para que possa provar sua defesa, isso não significa que irá perder a causa, apenas deverá trazer aos autos as provas para que o Juiz tenha conhecimento de todos os fatos.
Apesar disso, essa inversão não ocorre de maneira automática, depende de decisão do Magistrado, que deve analisar se houve verossimilhança nas alegações do consumidor e se esse é hipossuficiente em relação ao fornecedor, devendo apenas estar presente um desses requisitos para que obrigatoriamente o Juiz defira a inversão do ônus da prova em favor do consumidor.
Como visto, o momento mais adequado para ocorrer a inversão seria no despacho saneador, antes da sentença, para que assim o julgador entenda os fatos e esteja apto para deferir sentença justa, havendo assim o devido processo legal.
Posto isso, constata-se diante da pesquisa que a inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor é fundamental, devendo ocorrer em todos os casos, para assim haver a proteção do consumidor de maneira mais eficaz, visto que através deste instituto o consumidor terá um julgamento mais justo, já que o Juiz terá em seu poder todas as provas necessárias ao processo, ocorrendo assim um equilíbrio na relação.
BESSA, Leonardo Rosco; MOURA, Walter José Faiad de. Manual de direito do consumidor. 4. ed. Brasília: Escola Nacional de Defesa do Consumidor, 2014.
BOLZAN, Fabrício de Almeida. Direito do consumidor esquematizado. 7.
ed. São Paulo : Saraiva Educação, 2019.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
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Bacharelanda em Direito pela Universidade Brasil
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MARTINEZ, Leticia Fernanda. A facilitação da defesa dos direitos do consumidor e a inversão do ônus da prova Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 maio 2021, 04:13. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56596/a-facilitao-da-defesa-dos-direitos-do-consumidor-e-a-inverso-do-nus-da-prova. Acesso em: 22 nov 2024.
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