ROBERTA FAVALESSA DONINI
THALITA TOFFOLI PÁEZ
(orientadoras)
RESUMO: O artigo tem a finalidade, a partir do método teórico, de estudar o Instituto da Desconsideração Inversa da Personalidade Jurídica. Este é um dos principais mecanismos jurídicos que devem ser utilizados com o intuito de proteger o credor contra possíveis fraudes e desvios de finalidade da pessoa jurídica. Este método tem o propósito de coibir articulações do devedor em face ao credor mesmo antes ou durante uma execução judicial, em busca de satisfazer uma dívida. Trata-se de uma modalidade de intervenção de terceiros que permite incidentalmente ao processo, desconsiderar a personalidade jurídica e desse modo, conseguir responsabilizar pessoalmente o integrante da pessoa jurídica, o sócio ou administrador, nos casos em que a lei material o autoriza. Incialmente, é importante conceituar o nascimento da “pessoa” no âmbito jurídico e também da personalidade jurídica. A aquisição e finalidade de personalidade jurídica são consequências da pessoa jurídica de direito, que através das correntes doutrinárias da Teoria Menor e Teoria Maior são os principais requisitos para eficácia do instituto.
Palavras-chave: Desconsideração. Credor. Personalidade Jurídica. Sócio. Inversa.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; 1 PESSOA JURÍDICA DE DIREITO; 1.1 Conceitos; 1.2 Aquisição da Personalidade Jurídica; 1.2 Aquisição da Personalidade Jurídica; 2 A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E AS CORRENTES DOUTRINÁIRAS; 3 REQUISITOS PRESSUPOSTOS NO ÂMBITO JURÍDICO; 3.1 A Teoria Maior da Desconsideração da Personalidade Jurídica e seu Impacto frente o Desvio de Finalidade; 3.2 A Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Abuso de Direito; 4 A DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUAS FONTES DE INSPIRAÇÃO; 4.1 Rito Processual da Desconsideração pelo Código de Processo Civil; 4.2 Posicionamento do Superior Tribunal de Justiça; 5 A DESCONSIDERAÇÃO INVERSA E SUA APLICABILIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO; 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS; 7 REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O atual cenário político, cultural e moral, vivido pela sociedade brasileira, enfrenta uma inversão de valores sociais. Não se consegue distinguir o que é correto ou incorreto, a ponto de se ter como forma pejorativa de tratamento referência a determinada pessoa como forma de retidão “certa” ou “errada”. O agravante dessa evolução, acarreta a perpetração de fraudes das mais variadas com o intuito do locupletamento ou enriquecimento sem causa, e enriquecimento ilícito em detrimento de outrem, gerando fraudes processuais, cíveis e até penais.
A constituição de sociedades empresariais tem propósitos específicos quanto sua função e finalidade, porém a utilização da atividade irregular empresarial para alcançar objetivos ilegítimos, fraudulentos e até ilícitos com intuito de lesionar financeiramente o direito dos credores, baseando-se na aparência e camuflando patrimônio, estes devem ser protegidos e, nesse ponto, o direito vem garantir e resguardar através de instrumentos que visem coibir esses verdadeiros artifícios maliciosos, através do instituto da desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Esta se prestará garantindo, ao mesmo tempo, repressiva e preventivamente, na solução de litígios, para que a paz social seja alcançada. Mas, não se pretende tornar a exceção uma regra, e ao menos sequer banalizar o instituto, pois sua aplicação é necessária, em função do quadro social e sempre de forma precisa, eficaz e fundamentada, observados os requisitos norteadores.
Estudando o instituto da desconsideração inversa da personalidade jurídica, trata-se de uma medida que permite, com a reconsideração da autonomia patrimonial em caso de fraude, o que constitui o desvio de finalidade ou confusão patrimonial, em que a pessoa jurídica, seja responsabilizada pela obrigação do sócio. O desenvolvimento da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, ou “Disregard Doctrine” no direito estrangeiro, busca impedir que os sócios, valendo-se desta condição, pratiquem fraudes a ponto de esquivar-se de suas obrigações, dívidas e consequentemente exaurir todo o patrimônio.
A abordagem do tema, inicialmente se aterá à pessoa jurídica, em especial, sua autonomia patrimonial em relação aos sócios e sua função social. Em seguida, segue-se com o estudo sobre a desconsideração da pessoa jurídica, sua origem histórica, conceito, teorias e aplicação ao Direito Civil e demais ramos jurídicos. Por fim, o foco centra-se na desconsideração inversa da personalidade jurídica, aceita pela doutrina e jurisprudência, buscando a fixação das premissas de sua aplicação.
Sobretudo, quanto à importância do diploma, o trabalho tem o propósito de demonstrar e analisar o instituto da desconsideração da inversa da personalidade jurídica, analisando duas teorias pontuais do ordenamento jurídico, abordando suas aplicabilidades práticas e consequências dos sócios.
1 PESSOA JURÍDICA DE DIREITO
1.1 Conceitos
Antes de qualquer premissa devemos conceituar “pessoa”: no âmbito do direito, uma pessoa é todo ente ou organismo coletivo suscetível de adquirir direitos e contrair obrigações, sendo sinônimo de sujeito de direito.
A expressão sujeito de direito é utilizado para definir o cidadão, não engloba apenas a pessoa física, mas também as entidades coletivas, ou melhor, as empresas, as associações civis e organizações não governamentais. É aquele que tem de uma relação jurídica, e portando é o titular de direitos, deveres e obrigações. A possibilidade de alguém participar de relações jurídicas decorre de uma qualidade pertinente à pessoa de direito, que o torna titular dessas obrigações. Observando o conceito, a pessoa jurídica surge de uma necessidade da pessoa natural, surgindo através da união de pessoas para atingir determinados fins, é uma entidade formada por indivíduos e reconhecida pelo Estado e detentora de direitos e deveres como preceitua a eminente doutrinadora: “a pessoa jurídica é a unidade de pessoas naturais ou de patrimônios, que visa à consecução de certos fins, reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direitos e obrigações” (DINIZ, 2015, p. 270).
Outro grande doutrinador, Fábio Ulhoa Coelho, traz uma compreensão mais abrangente da pessoa jurídica:
Pessoa jurídica é o sujeito de direito personificado não humano. É também chamada de pessoa moral. Como sujeito de direito, tem aptidão para titularizar direitos e obrigações. Por ser personificada, está autorizada a praticar os atos em geral da vida civil — comprar, vender, tomar emprestado, dar em locação etc. —, independentemente de específicas autorizações da lei. Finalmente, como entidade não humana, está excluída da prática dos atos para os quais o atributo da humanidade é pressuposto, como casar, adotar, doar órgãos e outros (COELHO, 2012, p. 532).
Portando, o conceito global da personalidade jurídica é aquele que tem capacidade de adquirir direitos e contrair obrigações, ou seja, adquire seus próprios direitos decorrentes da lei, não sendo desmembrada ou segmentada proporcionalmente, em razão de obrigações dos sócios. Perceba-se que não é condição para divisão de ações ou percentuais de faturamento entre outros relacionados a divisão de operações financeiras, mas tão somente, a estrutura da pessoa jurídica, quanto a formação de uma entidade que será responsável pelo ato único e circunstancial.
A personalidade jurídica é uma particularidade as quais pessoas naturais ou não, constituem relações jurídicas como figuras em nome da uma sociedade empresarial. Assim sendo, a coletividade de grupos de pessoas interligados a um propósito comum, tornam-se organismos particulares das pessoas naturais que os compõe, e por essa particularidade, as pessoas jurídicas tem autonomia patrimonial diversa de seus componentes.
1.2 Aquisição da Personalidade Jurídica
O contrato de sociedade é constituído entre pessoas que desejam e obrigam-se bilateralmente em contribuir com bens e serviços com a finalidade do exercício de uma atividade econômica, sendo o resultado financeiro desejado e esperado, distribuírem proporcionalmente em conformidade com o percentual do capital social investido, conforme contido no artigo 981 do Código Civil:
Art. 981 CC/2002 Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício da atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à realização de um ou mais negócios determinados.
O Código Civil de 2002, tem a previsão legal do início da aquisição da personalidade jurídica, em seus artigos 45, 985 e 1.150, que determina que a existência legal da pessoa jurídica de direito privado se inicia à partir da efetivação do registro dos atos constitutivos nos órgãos competentes, ou seja na Junta Comercial. A personalidade pode ser adquirida por qualquer tipo societário previsto na legislação, exceto as sociedades em comum e as sociedades em conta de participação. E o registro pode ser feito nas Juntas Comerciais, para as sociedades empresárias, ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas, para as sociedades não empresariais. A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos.
Art. 45 CC/2002 Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.
Art. 985 CC/2002 A sociedade adquire personalidade jurídica com a inscrição, no registro próprio e na forma da lei, dos seus atos constitutivos.
A sociedade simples vincula-se ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas e a sociedade empresária, ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais.
Art. 1150 CC/2002 O empresário e a sociedade empresária vinculam-se ao Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais, e a sociedade simples ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas, o qual deverá obedecer às normas fixadas para aquele registro, se a sociedade simples adotar um dos tipos de sociedade empresária.
Preceitua o artigo 986 do Código Civil: as sociedades empresárias enquanto não forem inscritos os atos constitutivos em registro próprio, estes serão regidos pelas normas da sociedade não personificada ou simples. Importante destacar também, no que se refere o artigo 990, onde todos os sócios respondem solidariamente pelas obrigações sociais, pois é um ponto central no que diz respeito ao instituo que está sendo estudado.
Portanto se mantém evidente que o Código Civil de 2002, em seus artigos 45, 985 e 1.150, que a existência legal da pessoa jurídica de direito privado, inicia-se a partir da efetivação do registro dos atos constitutivos no órgão competente. Com efeito, na expressão da lei, somente após inscrito o contrato social no registro público, é que a sociedade adquire personalidade jurídica, e somente assim pode assumir obrigações e adquirir direitos em nome próprio. Diante disso, o legislador notadamente evidenciou a separação da pessoa dos sócios, da pessoa da sociedade ocorrendo apenas após de efetivado o registro.
A distinção do patrimônio pessoal com o empresarial, salienta-se a importância do assunto, pois é um dos principais motivos da associação das pessoas a constituírem uma sociedade, pois o que almejam, é evitar que um possível insucesso do empreendimento comum, e que seja responsabilizado unicamente com seus bens particulares.
1.3 Finalidade da Personalidade Jurídica
No cotidiano, os sócios e aqueles que administram a sociedade empresária podem atuar de forma fraudulenta ou de má-fé, em contraposição às legislações existentes, inclusive ao contrato social da pessoa jurídica. Em situações abarcadas pela lei vigente, há observância do instituto da desconsideração da personalidade jurídica. Havendo comprovação de ilegalidades ou má-fé para cumprir com as obrigações contraídas, há possibilidade de suspensão temporária do véu da personalidade da pessoa jurídica, visando alcançar o patrimônio dos sócios da pessoa jurídica.
Assim, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, em face da sua utilização imprópria, fornece segurança aos terceiros credores objetivando resguardá-los na tentativa de reparar eventual abuso cometido por aquelas pessoas que utilizam da pessoa jurídica a fim de dissimular patrimônio. Deste modo, é conferido ao Judiciário poder para remover brevemente a autonomia patrimonial da pessoa jurídica a fim de alcançar o patrimônio pessoal dos sócios, atribuindo-lhes a responsabilidade aos prejuízos causados em desfavor dos seus credores, os quais poderão solicitar a desconsideração da personalidade jurídica quando houver má-fé ou excessos na função e autonomia da mesma.
2 A TEORIA DA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA E AS CORRENTES DOUTRINÁRIAS
Os embrionários estudos foram iniciados no Brasil, através do jurista comercialista professor Rubens Requião, na década 60. Certamente, o Código Civil de 1916 não abordaria a “disregard doctrine”, o que ocorreria através dos julgados repetitivos e entendimentos jurisprudenciais, ao longo dos anos e assim a teoria foi desenvolvendo-se, determinando a responsabilização dos sócios e administradores das empresas em razão de abuso da personalidade jurídica da empresa.
A teoria da desconsideração da personalidade jurídica, foi batizada por Rubens Requião, com o nome de teoria da penetração, buscando responsabilizar o sócio quando a autonomia da personalidade jurídica da empresa teria sido utilizada arbitrária e contrariamente ao seu estatuto social.
A partir de então, os ordenamentos brasileiros passaram, juntamente com a doutrina, a encampar a aplicação e ampliação da teoria da desconsideração, embora a doutrina tenha evoluído muito mais que os ordenamentos, que apenas difundiram a codificação da teoria nos anos 90 e 2000, com o CDC e o CC, respectivamente. A dissemelhança da aplicação entre os dois ordenamentos abriu margem para a criação de duas correntes da desconsideração: a maior e a menor, sendo a menor aquela aplicada principalmente nas relações de consumo, e a maior nas demais relações contratuais.
4 REQUISITOS PRESSUPOSTOS NO ÂMBITO JURÍDICO
4.1 A Teoria Maior da Desconsideração da Personalidade Jurídica e seu Impacto frente o Desvio de Finalidade
A teoria maior subjetiva é predominante nos dias atuais, no campo jurídico brasileiro, perpetrado no artigo 50 do Código Civil, tendo como pressuposto, o desvio de finalidade pelo uso abusivo da empresa, isto é, fraudulento e contumaz:
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.
O código deixa claro, assim como a “disregard doctrine”, para haver aplicação legal do instituto da desconsideração da personalidade jurídica o elemento fraude deve estar presente, restringindo sua aplicabilidade em casos específicos, em que há comprovação do requisito. Nesse sentido, complementa Cristiano Chaves:
Partindo de um prisma, a teoria maior propugna que a desconsideração da personalidade jurídica somente será possível episodicamente, e cada caso concreto, e que apenas é cabível ignorar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica como uma forma de combate a fraudes e abusos praticados através dela. Em síntese: a teoria maior exige a presença de um requisito especifico para que se efetive a desconsideração (FARIAS; ROSENVALD, 2017).
Tais requisitos, foram assim discorridos por Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery (2013, p.312):
Desvio de Finalidade: a identificação do desvio de finalidade nas atividades da pessoa jurídica deve partir da constatação da efetiva desenvoltura com que a pessoa jurídica produz a circulação de serviços ou de mercadorias por atividade lícita, cumprindo ou não o seu papel social, nos termos dos traços de sua personalidade jurídica. Se a pessoa jurídica se põe a praticar atos ilícitos ou incompatíveis com sua atividade autorizada, bem como se com sua atividade favorece o enriquecimento de seus sócios e sua derrocada administrativa e econômica, dá-se ocasião do sistema de direito desconsiderar sua personalidade e alcançar o patrimônio das pessoas que se ocultam por detrás de sua existência jurídica.
Confusão patrimonial: também é aplicada a desconsideração nos casos em que houver confusão entre o patrimônio dos sócios e da pessoa jurídica. Essa situação decorre da não separação do patrimônio do sócio e da pessoa jurídica por conveniência da entidade moral. Neste caso, o sócio responde com seu patrimônio para evitar prejuízos aos credores, ressalvada a impenhorabilidade do bem de família e os limites do patrimônio da família. Portanto, consoante lição de César Fiúza37, ter-se-á desvio de finalidade quando a pessoa jurídica descumprir a finalidade a que se destina, causando prejuízo a terceiros, ou desrespeitar o próprio princípio da função social da empresa. De outro giro, a confusão patrimonial ocorrerá quando não for possível a delimitação do acervo patrimonial da pessoa jurídica e dos sócios ou evidenciada a dissolução irregular da pessoa jurídica. Desaparecimento desta, mas subsistência de débitos.
Neste contexto, seguindo esta corrente, corroboram os Enunciados nº 146 e 7 da III Jornada de Direito Civil, respectivamente: “Nas relações civis interpretam-se restritivamente os parâmetros de desconsideração da personalidade jurídica, previstos no artigo 50 (desvio de finalidade social ou confusão patrimonial)”. “Só se aplica a desconsideração da personalidade jurídica quando houver a prática de ato irregular e, limitadamente, aos administradores ou sócio que nela hajam incorrido.”
4.2 A Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica e o Abuso de Direito
A desconsideração da personalidade jurídica, era aplicada de modo diverso nas relações de consumo, modificados a partir dos pressupostos originários da promulgação do Código de Defesa do Consumidor, com a Lei 8078/90, reduzindo de modo particular as barreiras subjetivas do Código Civil de 1916, e de modo excepcional, quando combinado com o Código Civil de 2002, como culpa ou fraude, possibilitando a sua utilização em situações objetivas, como insolvência, por exemplo, conforme demonstra o artigo 28 do Código de Defesa do Consumidor:
O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocada por má administração.
Denota-se que a intenção do Código de Defesa do Consumidor, como prenuncia Nunes (2012, p.803) é: “[....] permitir a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica, mesmo nos casos em que o consumidor esteja sendo violado por simples responsabilidade objetiva dos atos praticados pelo fornecedor “.
De modo que a desconsideração de personalidade jurídica, advém da má gestão de unidade ou de grupo empresarial, causando dúvida na administração e também quais circunstâncias foram geradas ou caracterizadas. Neste contexto, e de modo particular entender-se que a má gestão seria decorrente de dolo, fraude ou simulação por parte de seus gestores, o que faria com que a desconsideração da personalidade jurídica, frente ao Código de Defesa do Consumidor incorresse nos mesmos pressupostos abordados pelo Código Civil. Não obstante, entende-se que a má gestão deve ser analisada de maneira extensiva, de modo mais abrangente, dado que a identificação e vinculação de um ato de má gestão como a causa da insolvência, é matéria extremamente difícil de produzir prova, além disso quando se leva em consideração a hipossuficiência do consumidor.
Na linha de interpretação complementada por Bruno Miragem:
[...] no que diz respeito à segunda parte do dispositivo, as hipóteses de falência, insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica não importam na desconsideração per se. Ao contrário, apenas decorrem quando tais circunstâncias decorram diretamente de má-administração. A exigência de simples incompetência administrativa abre a possibilidade de desconsideração, via interpretação extensiva, a qualquer espécie de falência ou estado de insolvência, uma vez que é de se pressupor que, racionalmente a consecução da finalidade lucrativa das sociedades não é alcançada em vista da falta de conhecimento ou competência na administração do negócio. Da mesma forma, a demonstração do que seria incompetência administrativa do sócio ou administrador, e sua vinculação como causa da falência ou insolvência do fornecedor, é prova de difícil produção (MIRAGEM, 2013, p.604).
Afastando completamente o entendimento e dúvida existente entre as duas teorias, trazendo de modo didático a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, como observa-se no julgado abaixo:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONSUMIDOR. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. AUSÊNCIA DE PATRIMÔNIO DA PESSOA JURÍDICA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INDÍCIOS DE FRAUDE. INEXIGÍVEL. APLICAÇÃO DA TEORIA MENOR. DECISÃO REFORMADA. 1. O Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor adotam teorias distintas para justificar a desconsideração da personalidade jurídica. Enquanto o primeiro acolheu a teoria maior, exigindo a demonstração de abuso ou fraude como pressuposto para sua decretação (CC art. 50), o CDC perfilha a teoria menor, a qual admite a responsabilização dos sócios quando a personalidade da sociedade empresária configurar impeditivo ao ressarcimento dos prejuízos causados ao consumidor (CDC art. 28, § 5º). 2. Na hipótese, tratando-se de relação de consumo, comprova-se a realização de diligências infrutíferas no sentido de encontrar bens passíveis de penhora, sendo suficiente para decretar a perda episódica da personalidade jurídica do fornecedor. 3. Somando-se a ausência de patrimônio, têm-se fortes indícios da prática de atos fraudulentos, uma vez que a executada não foi encontrada nos diversos endereços indicados nos sistemas de pesquisa, constando nos registros da Receita Federal como inapta. (Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Acórdão n.950088, 20150020332364AGI, Relatora: Maria Ivatônia, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 22/06/2016, publicado no DJE: 29/06/2016, p. 213/221).
5 A DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA E SUAS FONTES DE INSPIRAÇÃO
Quanto à modalidade inversa da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, observa-se que o direito brasileiro não se privou e decidiu abarcar fontes que trouxessem maior segurança jurídica para o cenário empresarial.
O instituto tem previsão legal, determinando o afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, por meio da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, com o objetivo de atingir o patrimônio do ente coletivo, desviado pelos sócios. Responsabiliza-se, pois, a pessoa jurídica por obrigações adquiridas pelos seus sócios-controladores, de modo a não invalidar a personalidade jurídica. Nesse sentido temos:
A utilização da desconsideração da personalidade jurídica de forma inversa, do mesmo modo que o instituto da desconsideração da personalidade jurídica, não tem como objetivo a invalidação da personalidade jurídica, mas somente a afirmação da impotência para determinado ato, sendo que aquela possui os mesmos pressupostos e requisitos desta (SANDRI ; OLIVEIRA, 2013, p.8).
O entendimento da teoria inversa de desconsideração da personalidade jurídica, é justamente combater o uso indevido da personalidade da empresa pelos seus sócios, o que pode ser observado, como supramencionado, na situação em que esse esvazia seu patrimônio pessoal para integralizar o patrimônio social da sociedade para não responder por dívidas e obrigações. Portanto:
A conveniência do instituto surge se o devedor esvazia o seu patrimônio, transferindo os seus bens para a titularidade da pessoa jurídica da qual é sócio. É artimanha comum, por exemplo, aos cônjuges ardilosos que, antecipando-se ao divórcio, retiram do patrimônio do casal bens que deveriam ser objeto de partilha, alocando-os na pessoa jurídica da qual é sócio, pulverizando assim os bens deslocados.
Em tais circunstâncias, pode o juiz desconsiderar a autonomia patrimonial da pessoa jurídica, alcançando bens que estão em seu próprio nome, entretanto, para responder por dívidas que não são suas, e sim de um ou mais de seus sócios (FERRIANI, 2016).
Assim, torna-se possível a aplicação da teoria da desconsideração inversa da personalidade jurídica da empresa, a partir da interpretação do art. 50 do Código Civil de 2002, pelo qual se atinge os bens da sociedade, em razão das dívidas adquiridas pelo sócio controlador, desde que estejam preenchidos os requisitos trazidos pela legislação.
Em tais circunstâncias, o magistrado concede uma ordem legal autorizando que a autonomia patrimonial da empresa seja desconsiderada, alcançando seus próprios bens, para responder por dívidas e obrigações efetuadas por seus sócios.
Trata-se, na verdade, de mecanismo de efetivação do princípio do resultado da tutela executiva, bem como a ocorrência da devida responsabilização civil pelas dívidas contraídas, garantindo, assim, mais uma medida para proteção ao credor quando constatadas medidas abusivas do devedor.
Notadamente, o direito evolui no caso concreto de maneira mais veloz do que a legislação, visando coibir práticas abusivas, na verdade, contra o desenvolvimento da economia brasileira, assim, relativizando-se, quando preenchidos requisitos que veremos a seguir, ao máximo a autonomia tanto das pessoas jurídicas quanto das pessoas físicas (PRIMON, 2016).
Nesse sentido, a utilização do instituto não deverá ser feita de maneira leviana, exigindo especial cautela do magistrado, configurando-se como medida excepcional. A desconsideração somente será deferida pelo juiz, a requerimento das partes ou do Ministério Público, quando em desconformidade com o art. 50 do Código Civil, e no caso da prova de insolvência estiverem claramente demonstrados os requisitos da teoria subjetiva da desconsideração da personalidade jurídica ou da teoria objetiva.
Aliás, essa desconsideração da personalidade jurídica não atua apenas no sentido da responsabilidade do controlador por dívidas da sociedade controlada, mas também em sentido inverso, ou seja, no da responsabilidade desta última por atos do seu controlador. A jurisprudência americana, por exemplo, já firmou o princípio de que os contratos celebrados pelo sócio único, ou pelo acionista largamente majoritário, em benefício da companhia, mesmo quando não foi a sociedade formalmente parte no negócio, obriga o patrimônio social, uma vez demonstrada a confusão patrimonial de facto (KONDER, 2016).
Portanto em regra, não poderá haver a responsabilização da sociedade em face de obrigações assumidas, de forma particular, pelos seus sócios, haja vista que, legalmente, os bens da sociedade fazem parte do patrimônio autônomo da pessoa jurídica. Todavia, tal regra não subsiste quando demonstrada a transferência de bens particulares para a sociedade, com o intuito de prejudicar terceiros.
Percebe-se então, que a desconsideração do véu da sociedade, de modo inverso, implicaria a aplicação de mais uma medida objetivando coibir fraudes contra credores e terceiros “que, lançando mão dos princípios sensíveis à constituição da pessoa jurídica, transferem seu patrimônio para a pessoa jurídica por ele controlada” (RANGEL, 2016).
Tauã Lima Verdan Rangel (2016), afirma:
caso não demonstrada a transferência de bens do patrimônio particular do sócio devedor, exsurge evidente que, na condição de sócio de fato da sociedade ou do grupo de sociedades, estar-se-ia retirando da sociedade o necessário para manutenção da pessoa jurídica existente.
Também será imprescindível a análise dos entendimentos jurisprudenciais sedimentados emanados pelos Tribunais de Justiça, “porquanto, ao se manifestarem sobre situações concretas, amoldam as normas genéricas e abstratas, bem como traçam linhas diretivas a serem observadas” (RANGEL, 2016). Assim, colhem-se os seguintes:
Decisão: Trata-se de agravo nos próprios autos (CPC, art. 544), interposto contra decisão que inadmitiu recurso especial sob os seguintes fundamentos (e-STJ, fls. 179/181): (a) inexistência de obscuridade, contradição ou omissão no acórdão recorrido; e (b) incidência da Súmula nº 7/STJ.
O acórdão recorrido tem a seguinte ementa (e-STJ, fl. 108):
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. GRUPO ECONÔMICO. POSSIBILIDADE. A desconsideração da personalidade jurídica, por se tratar de medida excepcional, requer a demonstração do desvio de finalidade, caracterizado pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica, ou a confusão patrimonial, demonstrada pela inexistência de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios. Havendo prova no sentido de que ocorre confusão patrimonial entre os bens das empresas integrantes do mesmo grupo econômico, deve-se autorizar a desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (e-STJ, fls. 130/138). Nas razões do recurso especial (e-STJ, fls. 145/158), fundado no art. 105, III, a e c, da CF, o recorrente aduziu violação dos arts. 535 e 458 do CPC, pois a rejeição de seus aclaratórios teria acarretado negativa de prestação jurisdicional, não tendo o TJDFT se manifestado especialmente sobre o suporte fático para preenchimento dos requisitos autorizadores da desconsideração da personalidade jurídica (CC/02, art. 50) e a respeito da norma que determina seja a execução feita da maneira menos gravosa ao devedor (CPC, art. 620).
Acrescentou ter havido falta de critério ao se aplicar o art. 50 do CC/02, haja vista a desconsideração da personalidade jurídica requerer, para sua aplicação, o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial, situações que não se teriam caracterizado no caso concreto.
No agravo (e-STJ, fls. 187/201), afirmam presentes todos os requisitos para admissão do recurso especial.
Contraminuta apresentada pelo recorrido (e-STJ, fls. 204/210). É o relatório. Decido.
Quanto à tese da negativa de prestação jurisdicional, decorrente da rejeição dos aclaratórios, cumpre dizer primeiramente, que a matéria relativa ao art. 620 do Código de Processo Civil foi submetida ao Tribunal de origem, pela primeira vez, nos embargos de declaração. Assim, como o tema não foi aventado no agravo de instrumento anterior, não estava mesmo o Tribunal obrigado a se manifestar sobre ele.
No que respeita ao art. 50 do CC/02, a desconsideração da personalidade foi o único assunto tratado no acórdão impugnado.
Descabido, portanto, cogitar de omissão sanável por embargos de declaração, que não se prestam para impugnar eventual insuficiência do acervo probatório.
No mais, verifica-se que o Tribunal de origem decidiu a matéria de forma fundamentada, ainda que as conclusões tenham sido contrárias aos interesses da recorrente. O julgador não fica compelido a analisar todos os argumentos invocados pela parte, desde que tenha encontrado motivação satisfatória para dirimir o litígio, não se identificando omissão, contradição ou obscuridade no acórdão impugnado. No mesmo sentido:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ART. 535 DO CPC. REAVALIAÇÃO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ. DECISÃO MANTIDA
Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido analisou todas as questões pertinentes para a solução da lide. O fato de a decisão ser contrária aos interesses da parte recorrente não configura negativa de prestação jurisdicional. (…)
Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 409.072/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 25.02.2014, DJe 05.03.2014)
Em relação aos requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica, o colegiado de segunda instância pronunciou-se da seguinte forma (e-STJ, fls. 112/113):
Na presente hipótese, tudo leva a crer que ocorreu o esgotamento do patrimônio da ré/agravante, dado o resultado das diligências frustradas comprovadas nos autos. E a decisão agravada expressamente consignou situação de confusão patrimonial que autoriza o deferimento da desconsideração inversa da personalidade jurídica da ré/agravante. Confira-se: ‘Sobre o caso em tela, alguns pontos em especial chamam a atenção deste juízo. O primeiro deles se deve ao fato de uma sociedade empresarial do porte da executada não possuir qualquer saldo positivo em suas contas bancárias, conforme extratos de pesquisa Bacen Jud às fls. 595-599 e 668-671. Ainda, conclui-se das diligências empreendidas pela parte exequente, às fls. 698-710, que a parte executada não possui nenhum imóvel sequer que não esteja gravado com ônus real, por meio de hipotecas, bem como que não seja objeto de diversas penhoras judiciais, o que torna inviável sua utilização para fins de saldar os débitos existentes. Por fim, todos os mandados de penhora expedidos no decorrer dos autos restaram infrutíferos, eis que não lograram êxito em localizar renda da parte executada, em que pese continuar em plena atividade.
Se o estabelecimento empresarial praticado pela executada/agravante é considerado uma macro empresa, não se pode presumir tampouco a possibilidade da manutenção do funcionamento da empresa desprovido de qualquer fonte de renda, bens móveis ou imóveis, evidenciando-se a ocorrência de confusão patrimonial e desvio de finalidade com as demais empresas do grupo econômico, portanto deve-se deferir a desconsideração inversa da personalidade jurídica.
Havendo o Tribunal de origem concluído, com base na prova dos autos, pela caracterização de confusão patrimonial, não é possível afirmar o contrário sem reexaminar fatos e provas, o que veda a Súmula nº 7/STJ:
AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. 1. VIOLAÇÃO DO ART. 50 DO CÓDIGO CIVIL. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. INDEFERIMENTO PELA CORTE A QUO. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES. INVERSÃO DO JULGADO. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. 2. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. A Corte local verificou, através do exame fático-probatório dos autos, que os requisitos autorizadores para a desconsideração da personalidade jurídica dos agravados não estavam presentes no caso.
Dessa forma, a inversão do julgado esbarra no óbice do Enunciado nº 7 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 596.007/SP, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, j. 18.12.2014, DJe 05.02.2015).
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APRECIAÇÃO DE TODAS AS QUESTÕES RELEVANTES DA LIDE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. AUSÊNCIA DE AFRONTA AO ART. 535 DO CPC. REAVALIAÇÃO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. O recurso especial não comporta o exame de questões que impliquem incursão no contexto fático-probatório dos autos, a teor do que dispõe a Súmula nº 7 do STJ. 3. No caso concreto, a análise das razões apresentadas pelos recorrentes quanto à ausência de requisitos para se decretar a desconsideração da personalidade jurídica da empresa demandaria o revolvimento de fatos e provas, o que é vedado em recurso especial. Agravo regimental a que se nega provimento.’ (AgRg no AREsp 473.873/MG, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 03.04.2014, DJe 25.04.2014)
Diante do exposto, nego provimento ao agravo, nos termos do art. 544, § 4º, II, a, do CPC. Publique-se e intimem-se.” (STJ, AREsp 653.915, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 03.03.2015).
Da mesma forma que a separação das personalidades dos sócios e da pessoa jurídica foi criada para gerar maior segurança jurídica, estabelecendo responsabilidades e autonomias diversas, por outro lado, tal delimitação possibilitou a utilização da personalidade da pessoa jurídica da empresa para fins indevidos, através de ações empresariais fraudulentas, buscando prejudicar credores além de ato atentatório à dignidade da justiça.
Nesse sentido surge então, a teoria inversa da desconsideração da personalidade jurídica, como mecanismo de atingir o obstáculo criado para o adimplemento dos credores. Afasta-se a autonomia patrimonial da sociedade para responsabilizar a pessoa jurídica, atingindo assim, o patrimônio social indevidamente constituído por determinado sócio e, consequentemente, o sócio devedor, pelas obrigações adquiridas por este.
Assim, mesmo que a consequência da sua aplicação seja inversa à da teoria da desconsideração da personalidade jurídica da empresa, ambas possuem o mesmo objetivo de buscar cercear o uso indevido do ente societário e de sua personalidade pelos seus sócios.
5.1 Rito Processual da Desconsideração pelo Código de Processo Civil
A datar da vigência do Código de Processo Civil, podemos observar, primeiramente, através da leitura do art. 133, o incidente de desconsideração da personalidade será proposto a requerimento da parte, ademais o Ministério Público igualmente terá legitimidade de agir, como parte ou como custos legis. Ainda, em seu art. 134, lê-se “o incidente da desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial”.
Além disso, no §2º do referido artigo indica que “dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica”.
A leitura do referido dispositivo transmite a ideia que o procedimento da desconsideração sempre irá tramitar como ação autônoma, em razão do próprio legislador referir que não haverá incidente caso, na peça exordial, a parte houver pleiteado a incidência do instituto. À vista disso, Macedo e Migliavacca clarificam:
O debate dar-se-á no ventre do processo em que debatida a questão principal, mas como o objetivo é a simplificação (marca do NCPC), nada obsta que, no caso concreto, possa o juiz deliberar pela autuação apartada, se assim recomendar a organização do incidente ou se houver justificativa para que o processo prossiga no trato das questões principais, sobretudo se existirem outros pedidos, eventualmente cumulados, que não se relacionem com o tema incidental.
Percebe-se, por conseguinte, a atenção do legislador com o princípio da celeridade processual, frente à redundância de ajuizar-se ação autônoma para processar o pedido de desconsideração da pessoa jurídica, caso tenha sido requerida na peça exordial.
Cabe ressaltar, que o art. 134, caput e § 2º, do CPC permite que o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, a qualquer tempo e em qualquer fase do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença ou na execução de título executivo extrajudicial, na forma de incidente processual, hipótese essa em que ocorre a suspensão do processo principal.
Insta referir, para a instauração do referido incidente, é necessária a comprovação dos pressupostos materiais da teoria maior ou menor da desconsideração da personalidade jurídica.
Evidencia-se que o NCPC faz menção expressa à viabilidade de aplicação da desconsideração inversa da personalidade jurídica. Além da ampla aceitação da tese da desconsideração inversa pelo Poder Judiciário, a redação dada pelo Novo Código de Processo Civil encerra quaisquer dúvidas quanto ao instituto, evidenciando a viabilidade de responsabilizar a sociedade por obrigações contraídas de forma abusiva por seu sócio.
Enfim, o CPC determina que a decisão do incidente, independentemente de deferimento ou indeferimento, é uma decisão interlocutória, recorrível, através de agravo de instrumento.
5.2 Posicionamento do Superior Tribunal de Justiça
Analise das jurisprudências do STJ, na integra:
DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA INVERSA. Discute-se, no REsp, se a regra contida no art. 50 do CC/02 autoriza a chamada desconsideração da personalidade jurídica inversa. Destacou a Ministra-Relatora, em princípio, que, a par de divergências doutrinárias, este Superior Tribunal sedimentou o entendimento de ser possível a desconstituição da personalidade jurídica dentro do processo de execução ou falimentar, independentemente de ação própria. Por outro lado, expõe que, da análise do art. 50 do CC/02, depreende-se que o ordenamento jurídico pátrio adotou a chamada teoria maior da desconsideração, segundo a qual se exige, além da prova de insolvência, a demonstração ou de desvio de finalidade (teoria subjetiva da desconsideração) ou de confusão patrimonial (teoria objetiva da desconsideração). Também explica que a interpretação literal do referido artigo, de que esse preceito de lei somente serviria para atingir bens dos sócios em razão de dívidas da sociedade, e não o inverso, não deve prevalecer. Anota, após essas considerações, que a desconsideração inversa da personalidade jurídica caracteriza-se pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade propriamente dita, atingir, então, o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações de seus sócios ou administradores. Assim, observa que o citado dispositivo, sob a ótica de uma interpretação teleológica, legitima a inferência de ser possível a teoria da desconsideração da personalidade jurídica em sua modalidade inversa, que encontra justificativa nos princípios éticos e jurídicos intrínsecos à própria disregard doctrine, que vedam o abuso de direito e a fraude contra credores. Dessa forma, a finalidade maior da disregard doctrine contida no preceito legal em comento é combater a utilização indevida do ente societário por seus sócios. Ressalta que, diante da desconsideração da personalidade jurídica inversa, com os efeitos sobre o patrimônio do ente societário, os sócios ou administradores possuem legitimidade para defesa de seus direitos mediante a interposição dos recursos tidos por cabíveis, sem ofensa ao contraditório, à ampla defesa e ao devido processo legal. No entanto, a Ministra-Relatora assinala que o juiz só poderá decidir por essa medida excepcional quando forem atendidos todos os pressupostos relacionados à fraude ou a abuso de direito estabelecidos no art. 50 do CC/02. No caso dos autos, tanto o juiz como o Tribunal a quo entenderam haver confusão patrimonial e abuso de direito por parte do recorrente. Nesse contexto, a Turma negou provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 279.273/SP, DJ 29.03.04; REsp 970.635/SP, DJe 01.12.09; e REsp 693.235/MT, DJe 30.11.09” (REsp 948.117/MS, Relª Minª Nancy Andrighi, j. 22.06.2010).
Legitimidade Ativa:
DIREITO CIVIL. LEGITIMIDADE ATIVA PARA REQUERER DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DE PERSONALIDADE JURÍDICA. Se o sócio controlador de sociedade empresária transferir parte de seus bens à pessoa jurídica controlada com o intuito de fraudar partilha em dissolução de união estável, a companheira prejudicada, ainda que integre a sociedade empresária na condição de sócia minoritária, terá legitimidade para requerer a desconsideração inversa da personalidade jurídica de modo a resguardar sua meação. Inicialmente, ressalte-se que a Terceira Turma do STJ já decidiu pela possibilidade de desconsideração inversa da personalidade jurídica – que se caracteriza pelo afastamento da autonomia patrimonial da sociedade, para, contrariamente do que ocorre na desconsideração da personalidade jurídica propriamente dita, atingir o ente coletivo e seu patrimônio social, de modo a responsabilizar a pessoa jurídica por obrigações do sócio -, em razão de uma interpretação teleológica do art. 50 do CC/02 (REsp 948.117/MS, DJe 03.08.2010). Quanto à legitimidade para atuar como parte no processo, por possuir, em regra, vinculação com o direito material, é conferida, na maioria das vezes, somente aos titulares da relação de direito material. Dessa forma, a legitimidade para requerer a desconsideração é atribuída, em regra, ao familiar que tenha sido lesado, titular do direito material perseguido, consoante a regra segundo a qual ‘ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei’ (art. 6º do CPC). Nota-se, nesse contexto, que a legitimidade para requerer a desconsideração inversa da personalidade jurídica da sociedade não decorre da condição de sócia, mas, sim, da condição de companheira do sócio controlador acusado de cometer abuso de direito com o intuito de fraudar a partilha. Além do mais, embora a companheira que se considera lesada também seja sócia, seria muito difícil a ela, quando não impossível, investigar os bens da empresa e garantir que eles não seriam indevidamente dissipados antes da conclusão da partilha, haja vista a condição de sócia minoritária.” (REsp 1.236.916/RS, Relª Minª Nancy Andrighi, j. 22.10.2013)
A Ministra Nancy Andrighi contextualiza, que cabe ao juiz agir com o devido poder de cautela, sobretudo quando da aplicação da forma inversa, já que a segurança jurídica intrínseca ao caso de criação de novos empreendimentos e a separação da autonomia patrimonial entre o capital social da empresa e o dos sócios são fundamentais.
Deste modo:
“A Ministra Nancy Andrighi explica a desconsideração inversa num contexto no qual o sócio desvirtuoso, cujo patrimônio tenha transferido para a pessoa jurídica com o intuito de gerar uma confusão patrimonial, se livra de consequências jurídicas sobre seus atos ilegais” (SANDRI; OLIVEIRA, 2013, p. 9).
A jurisprudência supramencionada, não tendo sido deferida pela Exma. Srª. Ministra, a aplicação do instituto da desconsideração inversa da personalidade jurídica, se faz carregada de insegurança jurídica, sob pena de ver-se acobertado do manto da personalidade jurídica da empresa, conjuntamente com seus bens, para fins de fraudes e ilicitudes de seus sócios.
E, hodiernamente acerca do tema, colaciona-se as seguintes decisões:
[...] Configura-se a confusão patrimonial no caso de indistinção entre patrimônios do administrador ou sócio e da empresa, em afronta à autonomia patrimonial, com o objetivo de se esquivar ao cumprimento de obrigação; situação ainda mais evidente quando envolve empresa individual, que não possui personalidade própria. Na espécie, o empresário individual adquiriu a integralidade das cotas de uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI, por valor superior ao débito tributário exequendo, a fim de ocultar ou mesclar nesta o patrimônio da empresa individual que deveria ser objeto da execução fiscal, havendo indícios de que essa oneração levou esse devedor à insolvência. Precedentes citados: REsp n. 1.355.000/SP, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, DJe 10/11/2016; REsp n. 1.260.332/AL, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 12/9/2011.
VI - Incide o instituto da desconsideração inversa da personalidade jurídica (art. 50 do CC/2002 c/c art. 133, § 2º, do CPC/2015), na hipótese em que o administrador ou sócio esvazia seu patrimônio pessoal para ocultá-lo de credores sob o manto de uma pessoa jurídica. No presente caso, faz-se necessário o afastamento da autonomia patrimonial da pessoa jurídica integralmente adquirida (EIRELI), na qual é ocultado o patrimônio do empresário individual que deveria ser objeto da execução fiscal, ficando claro que a personalidade jurídica da empresa adquirida está servindo como cobertura para a fraude à satisfação do crédito tributário.
[...] VIII - Diante dos indícios de confusão patrimonial na referida aquisição presumidamente fraudulenta, deve ser restaurada a decisão de primeira instância que determinou a inclusão no polo passivo da execução fiscal da pessoa jurídica integralmente adquirida com bens que seriam objeto de satisfação do feito executivo. [...]
Além disso:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. PROCESSO CIVIL. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS PARA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA INVERSA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL PREJUDICADO. AGRAVO CONHECIDO PARA CONHECER PARCIALMENTE DO RECURSO ESPECIAL E, NESSA EXTENSÃO, NEGAR-LHE PROVIMENTO. [...] Quanto à aplicação da desconsideração da personalidade jurídica de forma inversa, a jurisprudência do STJ admite sua incidência, a fim de possibilitar a responsabilização patrimonial da pessoa jurídica por dívidas próprias dos sócios, quando demonstrada a utilização abusiva da personalidade jurídica. No que diz respeito à alegação de afronta ao art. 50 do CC/2002, verifica-se que o Tribunal de origem, soberano na análise de fatos e provas, concluiu pela ausência dos requisitos necessários à desconsideração inversa da personalidade jurídica. [...]
Há de se destacar que os referidos votos demonstram a consolidação da aplicação do instituto em nosso ordenamento jurídico, não restando incertezas quanto à sua aplicabilidade ante à extensa referenciação pelo STJ.
Cabe mencionar que os votos apontam constantemente em suas fundamentações o cumprimento dos requisitos necessários para a desconsideração da personalidade jurídica, de forma a consubstanciar a cautela exigida ao magistrado para a apreciação deste instituto em razão de sua complexidade.
Não obstante a recente jurisprudência supramencionada, a não aplicação da devida teoria traria um cenário de maior insegurança jurídica, em razão da possível intangibilidade da personalidade jurídica da empresa, bem como seu patrimônio, com o desígnio de perpetrar ilicitudes e fraudes de seus sócios.
A unicidade da aplicação da teoria inversa de desconsideração da personalidade jurídica viabiliza inferir que, embora a autonomia patrimonial da sociedade ser um princípio intrínseco do direito empresarial pátrio, quando comprovadas as exigências do art. 50 do Código Civil, a plausibilidade de aplicação do instituto, de forma embasada, sendo empregado com prudência.
6. A DESCONSIDERAÇÃO INVERSA E SUA APLICABILIDADE NO DIREITO TRIBUTÁRIO
A desconsideração da personalidade jurídica se mostra como importante maneira de coibir a fraudes na utilização de pessoas jurídicas para fins ilícitos, pois permite invadir o patrimônio daquele que utiliza o ente societário com desvio de finalidade, abuso de poder, confusão patrimonial, ou mesmo, no caso do Código de Defesa do Consumidor e dos crimes ambientais, aquele que utiliza de subterfúgios para se tornar inadimplente das obrigações que foram contraídas perante seus credores.
O instituto da desconsideração inversa da personalidade jurídica, como observamos e estudamos até o momento, consiste em alcançar os bens patrimoniais dos sócios e administradores no quesito da satisfação dos débitos da sociedade, e no sentido de afastar em casos específicos, a regra que delimita a autonomia patrimonial das pessoas jurídicas.
A evolução da jurisprudência e doutrina, do instituto denominado desconsideração inversa da personalidade jurídica, consiste única e exclusivamente no afastamento patrimonial do indivíduo como pessoa física, buscando alcançar os bens de uma pessoa jurídica, para o devido cumprimento de obrigações.
Nesse sentindo é saliente verificar a importância dessa evolução, pois o devedor e o sócio nesta mesma condição, caso haja o exaurimento de seus bens patrimoniais, este instituto visa buscar os bens da pessoa jurídica, por meio de transferência de seu patrimônio pessoal e particular, para a atividade societária empresarial, a qual este compõe seu quadro.
Facilmente identificamos essa situação, a qual ocorre frequentemente no direito de família, onde um dos cônjuges, no intuito de dissipar seus bens patrimoniais e não incluir na meação, destina o que possuía para ente societário.
O instituto é de vital importância no direito tributário, pois rotineiramente está sendo utilizado como meio de escudo e proteção, a pessoa jurídica na organização patrimonial e planejamento tributário das pessoas físicas que obstam no recebimento interposto por meio da sociedade. Em matéria de direito no crédito tributário, os mesmos requisitos devem estar presentes e previstos para os créditos em geral, ou seja, deve ocorrer a tentativa de fuga de adimplemento de obrigação, através da fraude, ato ilícito e confusão patrimonial, para que ocorra essa invasão no patrimônio da sociedade por dívida dos sócios.
Em suma, os requisitos para a desconsideração inversa no campo do Direito Tributário, devem seguir os mesmos, e estão previstos no artigo 135 do Código Tributário Nacional, ou seja, a conduta do devedor é compreendida como prática com excesso de poderes ou infração de lei nos contratos sociais ou estatutos.
O art. 135, III do Código Tributário Nacional autoriza a responsabilização pessoal daquele que pratica atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, compreende e legitima o ingresso no patrimônio da pessoa jurídica ou mesmo da fundação para que se satisfaça a obrigação do sócio, em regra, controlador da instituição.
O ponto crucial da permissão jurídica dessa situação, é não admitir a natureza das operações em relação à finalidade a que se destinam, observando-se que não cabe manter a autonomia patrimonial de uma empresa no intuito de receber e administrar o patrimônio de pessoa física, ou mesmo de uma outra pessoa jurídica com maneira de fraudar a execução fiscal ou mesmo a dilapidar o patrimônio de quem possui débitos de natureza fiscal, consoante enuncia HENRIQUE, José Longo (2017):
A constituição de holding não afasta de modo algum, eventual responsabilidade do administrador, sócio ou não, que praticar atos com excesso de poderes ou infração de lei. E para o caso de sócio, a holding de participações serve apenas para fixar um compartimento patrimonial (onde se encontra a empresa operacional) na hipótese de liquidação da empresa operacional ou mesmo o reconhecimento de sua dissolução irregular. De qualquer modo, a interposição da holding não pode prevalecer jamais em caso de fraude objetivando a posterior fuga do cumprimento de obrigações regularmente constituídas. Nesse caso, a holding terá sua personalidade jurídica desconsiderada para que o sócio, pessoa física, responda pelas obrigações.
A ocorrência da desconsideração da personalidade jurídica, devem conjugar os requisitos previstos no art. 135, III do Código Tributário Nacional com o artigo 50 do Código Civil, considerando sempre as disposições constitucionais relacionadas à proteção da atividade econômica e a garantia da livre iniciativa.
Portanto, a ineficiência de atos de alienação do patrimônio do devedor para uma pessoa jurídica a qual é sócio, o instituto da desconsideração inversa da personalidade jurídica torna-se comprometido, pois os atos não surtiram efeitos em relação ao fisco credor, o que deve assegurar a licitude das operações no combate à sonegação fiscal e à evasão de divisas, por meio de ações planejadas e simuladas e sem substância fático jurídicas.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A desconsideração inversa da personalidade jurídica, tem como objetivo impedir a fraude de obrigações por meio da personalidade jurídica em prejuízo de terceiros.
A desconsideração inversa da personalidade jurídica, como o próprio nome remete, é a inversão da teoria da desconsideração da personalidade jurídica, ou seja, se esta visa impedir que a empresa camufle seus bens no patrimônio dos sócios, aquela visa impedir que o sócio oculte seus bens pessoais no patrimônio da empresa.
Para a aplicação dessa teoria, devem ser observados alguns elementos e principais requisitos. Em primeiro, e mais importante, a configuração de fraude ou abuso caracterizado pelo desvio de finalidade ou ainda pela confusão patrimonial conforme preceitua o artigo 50 do código civil, da sociedade jurídica contra os credores; em segundo, verificação do tipo societário, uma vez que apenas podem ter sua personalidade desconsiderada judicialmente para a invasão do patrimônio do sócio as sociedades limitada e a sociedade por ações, ou seja, aquelas que pelo seu tipo societário visam a separação de patrimônios; em terceiro, já em âmbito processual após a decretação da desconsideração da personalidade jurídica, a possibilidade de penhora de bens pessoais de terceiros.
Com relação às pessoas jurídicas, o reflexo se deu na imposição da satisfação de uma função social, superior ao interesse particular de seus sócios. Portanto, exige-se que a pessoa jurídica assim como a pessoa física, conduzam-se pautadas em elevados valores éticos e na boa-fé objetiva. A desconsideração da personalidade jurídica, seja na modalidade direta ou na inversa, objetiva justamente coibir a fraudulenta utilização da pessoa jurídica. A desconsideração inversa, cabível para se responsabilizar a sociedade por obrigação imputada ao sócio, assim como a modalidade direta. Por se tratar de medida excepcional, tem cabimento quando evidenciada a satisfação, no caso concreto, de seus requisitos (os mesmos previstos na modalidade direta). Por fim, consideramos consolidar relevantíssima medida a resguardar a legitimação das relações jurídicas, coibindo a perpetração de fraudes.
8 REFERÊNCIAS
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BRASIL. STJ - AgRg no AREsp 1552449/SP 2015/0215776-1, Relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Data de julgamento15/12/2015 TERCEIRA TURMA, Data de publicação, DJe 02 fev. 2016.
BRASIL. STJ - REsp: 279273 SP 2000/0097184-7, Relator: Ministro ARI PARGENDLER, Data de Julgamento: 04/12/2003, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: --> DJ 29 mar. 2004 p. 230RDR v. 29 p. 356
BRASIL. STJ - REsp: 948117 MS 2007/0045262-5, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 22/06/2010, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 03 ago. 2010
BRASIL. STJ - AgRg no AREsp 409.072/RJ, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, j. 25.02.2014, DJe 05 mar. 2014
BRASIL. Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Acórdão n.950088, 20150020332364AGI, Relatora: Maria Ivatônia, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 22/06/2016, publicado no DJE: 29 jun. 2016, p. 213,221
BRASIL. STJ – REsp: 1810414 RO 2019/0112568-5, Relator: Ministro FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 15/10/2019, T2 SEGUNDA TURMA, Data de Publicação; Dje 18 out. 2019.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.
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Formado em Administração de Empresas - UNIFEV Votuporanga/SP. Pós-graduado em Administração de Empresas (Desenvolvimento Gerencial) - FACULDADES TODELDO ARAÇATUBA/SP. Graduação em Bacharel em Direito - UNIVERSIDADE BRASIL (Unibrasil/Fernandópolis/SP).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MASSON, Marcelo. Desconsideração inversa da personalidade jurídica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jun 2021, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56717/desconsiderao-inversa-da-personalidade-jurdica. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
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Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
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