WELLINGTON GOMES MIRANDA[1]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo apresenta a Lei n° 13.709/2018, intitulada por Lei Geral de Proteção de Dados especialmente sob a ótica do consumidor. O texto transcorre desde a base principiológica constitucional, relacionando direitos fundamentais à intimidade, privacidade e outros pertinentes. O artigo conceitua a vulnerabilidade do consumidor e informa ferramentas para resolução de conflitos. Outrossim, discorre acerca do comércio eletrônico e como se desenvolve no decorrer dos anos. A perspectiva do consumidor e a titulação do direito é um tema relevante na atualidade devido à crescente circulação de dados e bens na internet. O artigo busca elucidar os dispositivos legais, esclarecer no que diz respeito à aplicação da mesma e pesquisar se há jurisprudência brasileira sobre o tema.
PALAVRAS-CHAVE: Privacidade; Comércio eletrônico; Consumidor.
ABSTRACT: This article presents Law No. 13,709 / 2018, entitled General Data Protection Law, especially from the consumer's perspective. The text goes from the constitutional principiological basis, relating fundamental rights to intimacy, privacy and other pertinent. The article conceptualizes consumer vulnerability and provides tools for conflict resolution. Furthermore, he talks about electronic commerce and how it has developed over the years. The perspective of the consumer and the title of the right is a relevant topic nowadays due to the increasing circulation of data and goods on the internet. The article seeks to elucidate the legal provisions, clarify with regard to its application and research whether there is Brazilian jurisprudence on the subject.
KEY WORDS: privacy; e-commerce; consumer.
INTRODUÇÃO
A eclosão da internet no final da década de 60 com o projeto ARPANET, facilitou e diminuiu a distância entre as pessoas, tendo um grande impacto na vida cotidiana da sociedade. No entanto, vale destacar que o seu crescimento levanta uma série de questões a serem debatidas a respeito de problemas em relação à proteção à privacidade dos usuários e qual o limite os órgãos públicos e empresas podem utilizar esses dados.
No decorrer dos anos com a divulgação de dados sensíveis e críticos de milhões de pessoas no mundo inteiro, vem se discutindo a implantação de normas e leis que assegurem a proteção dos dados na rede mundial de computadores, bem como formas de punição a empresas, órgãos, entidades e governos que armazenam esses dados sem a devida cautela.
As discussões acerca da responsabilidade civil pela utilização da internet, ocasionou a criação do Marco Civil (Lei n. º 12.965/2014) em que foram inseridos artigos que tratam dos direitos e deveres dos usuários na internet. Logo após, surgiu-se a necessidade de uma lei que tratasse especificamente sobre a proteção de dados pessoais, que ocasionou a Lei 13.709/2018.
A Lei geral de proteção de dados sancionada no ano de 2018 tem o objetivo de regulamentar como os dados pessoais dos usuários serão tratados, quanto ao seu correto armazenamento, proteção aos dados sensíveis no que tange às crianças, assim como diretrizes e normas a serem cumpridas pelos órgãos públicos e empresas que tenham em mãos a posse desses dados em seus servidores.
No Brasil, segundo o Boletim de Economia Empírica, até o ano de 2020 contabiliza mais de 58 milhões de consumidores on-line. Conforme esses dados, é possível verificar sua importância para a população brasileira, uma vez que, uma grande quantidade de pessoas acessa a internet para realizar compras.
Diante dessa realidade percebe-se alguns desdobramentos, como a divulgação de dados em massa de milhares de usuários por plataformas das redes sociais, cenário que vem se agravando com o passar dos anos por meio do acesso a sites que armazenam dados dos usuários como nome, endereço, profissão, escolaridade, entre outras informações privadas do usuário.
O direito fundamental à vida privada, honra e privacidade, previsto na constituição federal promulgada no ano de 1988 depara-se atualmente com novos obstáculos à efetivação de tal tutela.
Com o avanço das tecnologias aumentaram-se as plataformas em que há inserção de dados pessoais, de fotos, identificação, dados bancários, endereço, dentre outros, o que consequentemente dificulta a proteção das informações.
Um dos desafios na atualidade é oferecer de maneira clara e objetiva para o usuário o conjunto de termos de consentimento, isto é, o modo que as informações serão armazenadas e processadas por cada empresa. Assim como, fornecer à pessoa uma forma de assimilar quais serão os dados que a empresa utilizará através do consentimento aceito.
O cerne da questão baseia-se em compreender a necessidade da Lei n° 13.709/2018 e como ela se aplica no Brasil. Importa desvendar esses dispositivos considerados relativamente novos, vez que, a obrigação legal para o enquadramento e adequação à data de vigência será em 1° de agosto de 2021.
2 COMÉRCIO ELETRÔNICO
Inicialmente, apresenta-se a conceituação de comércio eletrônico, vez que é basilar para dedicar-se ao estudo da Lei Geral de Proteção de dados. No que concerne ao entendimento da aplicabilidade de dispositivos legais faz-se necessário perceber o contexto em que está inserida.
O comércio eletrônico é toda realização transacional que ocorre por meio da internet, pautando sua relação sobre bens físicos ou virtuais, aponta Abreu (2020). Necessário informar que antes do advento do Marco Civil já havia o decreto que estabelecia regras acerca da utilização do comércio eletrônico, qual seja, o decreto nº 7962/2013.
O decreto continha elementos importantes para a comercialização eletrônica, como a disposição de informações claras a respeito do serviço, atendimento facilitado e direito de arrependimento. Além disso, continha diretrizes que informam quanto a utilização do consumidor em sítios eletrônicos.
Ressalta-se que tanto o consumidor que realiza compras físicas como aqueles que realizam compras online estão assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor - CDC. Harmonizam-se, portanto, a vulnerabilidade do consumidor diante das empresas online.
Para melhor esclarecimento Moreira (2016, p. 56), define o comércio eletrônico:
[...] podemos entender o comércio eletrônico como um conjunto de transações comerciais realizadas em um ambiente virtual cujo objeto é a compra e venda de produtos ou a prestação de serviços. Neste sentido, as relações travadas virtualmente entre fornecedores e consumidores, por meio de transações eletrônicas de dados por meio de um computador ou qualquer veículo de comunicação em que não há contato físico entre as partes, pode ser conceituada como atividade de comércio eletrônico.
Percebe-se que o comércio eletrônico funciona como um conjunto de transações comerciais realizadas em um ambiente virtual como o propósito de compra e venda de produtos ou a prestação de serviços.
Devido ao desenvolvimento da internet e dos meios de comunicação, compras que eram realizadas presencialmente passaram a ser efetuadas pelo ambiente virtual, rede mundial de computadores, surgindo assim o denominado e-commerce em que empresas fornecem bens de consumo e serviço aos seus consumidores de maneira remota entre as partes.
Nesse sentido, as relações travadas virtualmente entre fornecedores e consumidores, por meio de transações eletrônicas de dados por meio de um computador ou qualquer veículo de comunicação em que não há contato físico entre as partes, pode ser conceituada como atividade de comércio eletrônico.
Moreira (2016) esclarece que o comércio eletrônico é dividido em quatro modelos mais conhecidos, são eles: business to business; business to government; business to consumers e, ainda, consumer to consumer.
O primeiro modelo (business to business) envolve a comercialização de produtos entre fabricantes, comerciantes e fornecedores não havendo o envolvimento do consumidor, somente a circulação de dados entre empresas, desse modo inexiste relação de consumo, não se aplicando o Código de Defesa do Consumidor.
Em sequência, o segundo modelo (business to government) compreende a relação entre empresas privadas e o Estado como business to government (B2G), tendo ainda a relação entre consumidor e o Estado chamada de consumers to government. Há também a relação entre consumidores e o Estado chamado de (consumers to government).
Sobre o terceiro (business to consumer - B2C) ocorre da relação entre empresas e consumidores finais em que se aplica o Código de Defesa do Consumidor por se tratar de relação consumerista. E por fim, o quarto modelo (consumer to consumer) que são relações entre dois consumidores finais como exemplo de sites de vendas, jornais, anúncios de bens pessoais como automóveis e residências.
Em análise aos tipos de modelos de comércio eletrônico fixados evidencia-se business to consumer, em que há implicação direta das empresas com a comunidade. Estabelecendo relação com o assunto abordado, isto é, comércio eletrônico e internet é justo informar acerca da nova lei que protege o direito neste caso.
Portanto, verifica-se de modo sucinto que a comercialização já conhecida pela população, assume novas proporções, atingindo outras esferas que não restringem a pessoalidade, mas vale-se de ferramentas como sites, aplicativos dentre outros que estão abarcados no ciberespaço.
2 PRIVACIDADE: DIREITO FUNDAMENTAL DO CONSUMIDOR
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 - CRFB/88, parâmetro de todas as leis brasileiras, dispõe acerca da existência de direitos e garantias fundamentais. O artigo 5°, inciso XII estipula que é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
A CRFB/88 também dispõe no artigo 5° inciso X que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Lindoso (2017) explica que atualmente a privacidade está diretamente relacionada à proteção de dados pessoais, uma vez que, houve uma verdadeira mudança que transporta as pessoas da realidade para o espaço virtual.
Não há um artigo que tutela expressamente a proteção de dados na constituição, Roman (2020). Verifica-se apenas a menção de proteção das comunicações telegráficas de dados, contudo devido à constituição ser basilar para todo o ordenamento jurídico, utiliza-se de seus princípios para nortear interpretações.
Segundo Roman (2020), o conceito de privacidade tem sido modificado no decorrer do tempo como consequência dos avanços tecnológicos e a maior exposição da sociedade. Conforme o pensamento da autora, o direito à privacidade clama por autonomia.
Depreende-se do artigo 5°, inciso XII que a regra é a inviolabilidade de dados, e o acesso por terceiros sem consentimento do titular dos dados é uma exceção que está condicionada ao detentor da informação ou ainda, a depender da situação de ingresso com ação para ordem judicial.
Enfatiza-se, o direito à privacidade está elencado no rol de direitos humanos. O artigo 12 da Declaração universal dos Direitos Humanos de 1948 declara que ninguém deverá ser submetido a interferências arbitrárias na sua vida privada, família, domicílio ou correspondência, nem ataques à sua honra e reputação.
Pode-se perceber a importância da proteção à vida privada ao observar que mesmo antes da explosão da internet já haviam dispositivos legais com o fito de proteger a vida íntima da pessoa. Complementando, Roman (2020) demonstra que deve haver preocupação com a proteção de dados pessoais em razão da exposição pública e transmissão de informações em tempo real, dado que, trata-se de direito fundamental para garantir o livre desenvolvimento da pessoa humana.
Em decorrência da necessidade de garantir mais especificamente acerca da proteção de dados pessoais, isto é, de resguardar as informações pessoais e privadas dos usuários frente aos provedores de internet nasce a Lei geral de proteção de dados pessoais (Lei nº 13.709/2018), que trata em seu texto do comércio eletrônico.
Primeiramente faz-se necessário explicar o conceito de consumidor. De acordo com o artigo 2° do Código de Defesa do consumidor, é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Verifica-se ainda, que o artigo 5° inciso XXXII da CRFB/88 institui que a defesa do consumidor é uma garantia a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país, sem distinção de qualquer natureza.
No mesmo sentido, o CDC contém artigos que tratam precipuamente da proteção do consumidor. Exemplifica-se pelo artigo 4° que manifesta que deve haver o respeito à dignidade, a proteção de interesses econômicos, transparência e harmonia, e intitula como princípio que rege as relações de consumo o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado.
Abreu (2020) explica que a vulnerabilidade do consumidor é considerada de caráter absoluto, visto que, o conceito não se refere exclusivamente à condição social da pessoa, isto é, classe econômica ou grau de instrução, e sim por significar o consumidor como a parte mais frágil na relação jurídica.
A vulnerabilidade do consumidor está posta em vista que ao realizar a compra de um produto, em regra, não há negociação quanto às cláusulas presentes no contrato, pelo contrário, há um contrato pré-estabelecido, em que o consumidor apenas anui concordando com todas as cláusulas que estão presentes.
Evidente que a assinatura do contrato de compra e venda pelo consumidor diante de todas as cláusulas não significa que o comprador perca o direito de questioná-las se, havendo qualquer ilegalidade ou circunstância que a relação com o vendedor, produto ou serviço prejudicada pode-se buscar resolvê-la.
Enfim, o consumidor tem a possibilidade de buscar auxílio junto ao órgão governamental mais conhecido como PROCON - Programa de Proteção de Defesa do Consumidor que atua na esfera extrajudicial para a tratativa de resolução de conflitos na relação consumerista.
Ademais, há também a discussão judicial que refere-se ao ingresso de ações que possuam objetivo de resolver as controvérsias. Importa destacar que na via judicial o consumidor vale-se comumente de uma benesse chamada de inversão do ônus da prova, em que a prestadora de serviços deve apresentar os elementos que obstam a satisfação do direito do consumidor.
Isto posto, conferiu-se que o cidadão está amparado por uma amplitude de direitos atinentes ao consumo desde sua disposição como direito fundamental a um código próprio que versa sobre as relações consumeristas. A vulnerabilidade é posta conjuntamente nas ferramentas de solução.
3 A LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS
Na atualidade houve um aumento expressivo de acesso à internet, bem como cresceu o número de vendas online. Teixeira (2020), aponta que entre 15 de novembro a 24 de dezembro de 2019, a empresa especializada em e-commerce Compre&Confie divulgou que o varejo digital brasileiro faturou mais de R$14 bilhões.
Diante desses dados, percebe-se que a população vivencia novos hábitos, isto é, a inserção de um maior número de consumidores na esfera virtual. Por isso, vislumbrou-se a necessidade de uma lei que garanta a esses consumidores a satisfação dos seus direitos. Inicialmente, no Brasil essa discussão foi um dos pilares para a criação do Marco Civil da internet (Lei n. º 12.965/2014), que estabeleceu princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet.
A lei supramencionada introduziu uma nova perspectiva acerca da utilização da internet, dentre os direitos dispostos está a liberdade de expressão que caracteriza-se pelo respeito aos direitos humanos, à pluralidade e diversidade e à livre iniciativa.
O artigo 3° inciso III do Marco Civil disciplina como um de seus princípios a proteção de dados pessoais na forma da lei. Gehrke (2016), explica que este artigo dá a entender a futura criação de uma lei mais específica. Ademais destaca-se que o Marco Civil da internet encontra respaldo na Constituição Federal.
Lindoso (2017), diz que o fator mais significativo da Lei 12.965/2014 foi atentar-se à preservação da personalidade, privacidade, garantia de direitos e acesso. Trata-se, pois, da Lei 13.709/2018, leia-se, Lei Geral de Proteção de Dados. É uma lei nova, que abrange especificamente sobre a proteção de informações dos usuários na rede eletrônica, por conseguinte, tutela os direitos dos cidadãos que sejam consumidores online.
Importa dizer que a Lei 13.709/2018 alterou o Marco Civil da internet e supriu o artigo 3°, inciso III que declara como princípio a proteção de dados na forma da lei, aponta Carvalho (2018). Para melhor compreensão a que se deve a referida lei, observa-se o artigo 1°:
Esta Lei dispõe sobre o tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural. (BRASIL, 2018, on line)
Constata-se que a proteção de dados não é restrita aos dados em si, apesar disso implica violações aos direitos fundamentais dos usuários como a liberdade e o livre desenvolvimento da personalidade. Diante disso, verifica-se que a lei detém impacto significativo para a população, uma vez que faz-se necessária sua efetiva aplicação.
Neto e Klee (2019), apontam que o objetivo da lei supramencionada é a proteção de dados com o intuito de preservar a personalidade do indivíduo. Ainda aduzem que a sua função real se ampara no resguardo das garantias constitucionais da pessoa humana.
Cumpre elucidar que os dados são informações coletadas e armazenadas com intuito de identificar pessoas no meio digital, como nome, endereço, profissão, orientação religiosa dentre outras informações de carácter pessoal e individual. A criação da LGPD tem como maior destaque a proteção dos dados sensíveis dos usuários.
Os autores Neto e Klee (2019, p.16) descrevem o principal fundamento e relevância da Lei Geral de Proteção de Dados:
O principal fundamento da Lei é a proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos, sejam eles consumidores ou não. A relevância da proteção de dados nas relações de consumo está no fato de que a informação tem valor econômico e pode significar uma vantagem competitiva para as empresas que utilizam os dados pessoais de seus consumidores para fazer publicidade e ofertar produtos e serviços a um público consumidor em potencial, inclusive nos meios digitais.
Depreende-se que, apesar de o tratamento de dados ser essencial, trata-se também de um valor econômico, uma vez que, a detenção de dados sensíveis dos usuários serve como pilar para a criação de anúncios direcionados. Isto significa, as empresas que possuem informações privilegiadas dos consumidores podem obter mais lucros que outras gerando assim concorrência antiética, o que infringe as relações das empresas na economia brasileira.
Ressalta-se que a Lei 13.709/2018 dispõe em seu artigo 11 inciso II, a garantia de prevenção à fraude e segurança do titular em cadastros eletrônicos. Dispositivo essencial vez que busca a diferenciação e caracterização pessoal. O artigo citado resguarda que, havendo divergência de dados deve-se prevalecer os direitos e liberdades fundamentais do titular.
Salienta-se, um dos principais fundamentos elencados na LGPD e aplicado em função deste artigo, trata-se de garantir, proteger a livre-iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor.
4 A APLICABILIDADE DA LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS
A Lei n. 13.709, de 14 de agosto de 2018 apesar de aprovada em 2018, inicialmente teve condicionada a entrada em vigor à data 14 de agosto de 2020. No entanto, em sua maioria foi prorrogada para 1° de agosto de 2021. Reputa-se fundamental a adequação das empresas com os novos dispositivos da LGPD, vez que a sua aplicação está condicionada a uma mudança no tratamento de dados dos consumidores, no que tange a circulação de informações dispostas na internet.
Destaca-se, uma das finalidades da Lei contida no art.6° inciso X é a “responsabilização e prestação de contas: demonstração, pelo agente, da adoção de medidas eficazes e capazes de comprovar a observância e o cumprimento das normas de proteção de dados pessoais, e, inclusive, a eficácia dessas medidas”.
No mesmo sentido, a LGPD criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados - ANPD, órgão da administração federal que integra a Presidência da república com o fito de fiscalizar a aplicação de descumprimento da legislação, assim como conservar a motivação da lei.
Compete à ANP elaborar relatórios, editar regulamentos, promover estudos, dispor as formas de publicidade, elaborar diretrizes para a política nacional de proteção de dados pessoais e privacidade, dentre outros deveres atinentes ao dever de fazer valer a norma no Brasil.
Correlacionado à Autoridade Nacional de Proteção de Dados foi criado o Conselho nacional de proteção de dados pessoais e da privacidade. O conselho terá por composição 23 representantes, titulares e suplentes distribuídos entre o poder executivo federal, senado federal, câmara dos deputados, conselho nacional de justiça, conselho nacional do ministério público e comitê gestor de internet do Brasil.
No que tange às suas funções, o conselho nacional deve propor estratégias e fornecer subsídios para a ANDP, sugerir ações, elaborar estudos, disseminar conhecimento à população e ainda elaborar relatórios anuais de avaliação da execução das ações estabelecidas em políticas nacionais de proteção de dados.
A criação de uma estrutura de controle convalida o interesse social à lei. Quanto a sua amplitude e seriedade, a legislação brasileira reputa a privacidade do titular primordial, tendo em vista a criação de órgãos de controle e fiscalização, a aplicação da lei e a divulgação das informações, direitos, fundamentos e princípios da população em geral.
Apesar de sua vigência dá-se, em regra, somente em agosto de 2021, já é possível verificar a judicialização de temas relacionados à proteção do consumidor citando nova lei geral de proteção de dados. Identifica-se a existência de processos tramitando em tribunais de justiça, tribunais regionais federais.
Ação civil pública proposta no Tribunal de Justiça do Distrito Federal /DF autos 07217351520198070001 por um particular em face da Telefônica Brasil S.A., questiona o uso de dados sensíveis devido aos anúncios da plataforma “Vivo Ads”. Segundo o autor, após a contratação de plano com a operadora passou a receber diversos anúncios, por isso sentiu violada a sua privacidade. Alegou em síntese que a empresa estaria repassando seus dados aos anunciantes.
No decorrer do processo, o juízo de primeira instância julgou improcedente os pedidos formulados pelo autor, tendo em consideração que a contestação juntada aos autos pela empresa, justificou-se quanto à circulação de anúncios, sendo que todas estas medidas estavam presentes no termo de contratação assinado pelo consumidor.
Por conseguinte a sentença ter julgado de forma insatisfatória o pedido do autor, recorreu à segunda instância, qual seja, 6° turma cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, veja-se:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA. EMPRESA DE TELEFONIA. PLATAFORMA DE PUBLICIDADE. USO DE DADOS DE CLIENTES. CONSENTIMENTO. OPÇÃO. OFENSA À INTIMIDADE E AO SIGILO DE DADOS. AUSÊNCIA. I. A Constituição Federal prevê ao cidadão garantias à inviolabilidade da intimidade, do sigilo de correspondência, dados e comunicações telefônicas (art. 5º, X e XII). II. Se a empresa de telefonia ré comprovou que, no momento da contratação, ao consumidor, por meio destacado, é dada a oportunidade de manifestar o seu consentimento ou discordância em receber ?ofertas e benefícios? da empresa e de parceiros, mediante uso de seus ?dados pessoais e de localização?, inclusive podendo, a qualquer momento, revogar a sua opção, observa-se que a sua atuação está em perfeita conformidade com os artigos 7º, inciso I e 8º da Lei nº 13.709/2018, não se vislumbrado ofensa aos princípios constitucionais apontados pelo parquet. III. Negou-se provimento ao recurso. grifo nosso
Evidencia-se, a decisão do tribunal aponta a LGPD em sua fundamentação, no sentido de verificar a aceitabilidade de sua aplicação. No caso apresentado, a empresa adequou-se à lei 13.709/2018 quando buscou o resguardo da violação de direitos no contrato com o consumidor.
Vê-se que a judicialização de temas relacionados à lei já possui alguns precedentes judiciais. Há pouco conheceu-se uma situação apreciada no Tribunal de Justiça do Distrito Federal, neste momento será apresentado a discussão judicial no Supremo Tribunal Federal.
A ação é objeto de discussão da Medida Provisória n. 954, de 17 de abril de 2020, que trata do compartilhamento de dados por empresas de serviços telefônicos com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE em consonância com a situação emergencial relacionada a Covid-19.
Veja-se ementa do STF, ADI 6390:
EMENTA MEDIDA CAUTELAR EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. REFERENDO. MEDIDA PROVISÓRIA Nº 954/2020. EMERGÊNCIA DE SAÚDE PÚBLICA DE IMPORTÂNCIA INTERNACIONAL DECORRENTE DO NOVO CORONAVÍRUS (COVID-19). COMPARTILHAMENTO DE DADOS DOS USUÁRIOS DO SERVIÇO TELEFÔNICO FIXO COMUTADO E DO SERVIÇO MÓVEL PESSOAL, PELAS EMPRESAS PRESTADORAS, COM O INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. FUMUS BONI JURIS. PERICULUM IN MORA. DEFERIMENTO. 1. Decorrências dos direitos da personalidade, o respeito à privacidade e à autodeterminação informativa foram positivados, no art. 2º, I e II, da Lei nº 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais), como fundamentos específicos da disciplina da proteção de dados pessoais. 7. Mostra-se excessiva a conservação de dados pessoais coletados, pelo ente público, por trinta dias após a decretação do fim da situação de emergência de saúde pública, tempo manifestamente excedente ao estritamente necessário para o atendimento da sua finalidade declarada. 8. Agrava a ausência de garantias de tratamento adequado e seguro dos dados compartilhados a circunstância de que, embora aprovada, ainda não vigora a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018), definidora dos critérios para a responsabilização dos agentes por eventuais danos ocorridos em virtude do tratamento de dados pessoais. O fragilizado ambiente protetivo impõe cuidadoso escrutínio sobre medidas como a implementada na MP nº 954/2020. 10. Fumus boni juris e periculum in mora demonstrados. Deferimento da medida cautelar para suspender a eficácia da Medida Provisória nº 954/2020, a fim de prevenir danos irreparáveis à intimidade e ao sigilo da vida privada de mais de uma centena de milhão de usuários dos serviços de telefonia fixa e móvel. 11. Medida cautelar referendada. (STF - ADI: 6390 DF 0090595-58.2020.1.00.0000, Relator: ROSA WEBER, Data de Julgamento: 07/05/2020, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 12/11/2020) grifo nosso
Observa-se que, na fundamentação da decisão supracitada percebe-se que negou-se a aplicação da Lei 13.709/2018 devido à falta de vigência. Importa dizer que a LGPD, novidade legislativa já está sendo citada nas decisões judiciais, tendo em vista que em alguns casos afirma-se seu enquadramento e aplicação e em outras nega-se.
Dito isso, é necessário esclarecer que embora a regra seja pela vigência da lei somente em 1° de agosto de 2021, há dispositivos da Lei 13.709/2018 que já estão tem sua vigência confirmada, como os artigos 55-A, 55-B, 55-C, 55-D, 55-E, 55-F, 55-G, 55-H, 55-I, 55-J, 55-K, 55-L, 58-A e 58-B que entraram em vigor dia 28 de dezembro de 2018.
Portanto, além de ser uma lei novíssima, vê-se que há complexidade na fixação da sua aplicação e vigência em se tratando de qual dispositivo da Lei 13.709/2018 está em discussão. Por fim, restou evidente que a Lei geral de proteção de dados é uma necessária na realidade atual.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O chamamento do tema relacionado à privacidade, proteção de dados e internet é amplamente discutido e tem sua importância socialmente, vez que, o acesso e uso das redes para realizar compras tem crescido exponencialmente. No que lhe concerne a evolução, o fluxo comercial eletrônico tem se intensificado ordinariamente.
Destaca-se, a lei 13.709/2018, criada antes da pandemia de covid-19 tornou-se ainda mais fundamental à proteção de dados pessoais dos brasileiros, pois segundo pesquisa realizada pelo G1- Economia o faturamento de compras online cresceu em 40% no ano de 2020. Ainda segundo o site, foram 194 milhões de compras realizadas somente no ano de 2020.
Dito isso, reflete a quantidade de dados pessoais de consumidores que estão disponíveis nos sites de compras, desde nome completo, cpf, endereço até os dados bancários. Todas são informações valiosas tanto ao titular como ao conhecimento das empresas para traçar o perfil de cada comprador, para anúncios e ofertas, por exemplo.
Um dos motivos que merece destaque à criação da Lei geral de proteção de dados é exatamente a proteção ao livre comércio, de modo que o sigilo de informações pessoais preserva a livre concorrência que influem diretamente na economia do país.
Outro ponto a ser rememorado é a segurança jurídica que a lei confere ao consumidor, dado que, além de contar na constituição federal a salvaguarda da pessoalidade de cada indivíduo, no que tange a suas peculiaridades, a LGPD específica, tutela, garante e fiscalização de sua utilização.
Em síntese, é inegável que o estudo e discussão da lei 13.709/2018 tem razão em seus próprios fundamentos, encontra complexidade quanto a vigência de sua aplicação, contudo é essencial às mudanças habituais e crescentes dos consumidores nos últimos anos.
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[1] Mestre em prestação jurisdicional e Direitos Humanos pela Escola da Magistratura Tocantinense (ESMAT) e Universidade Federal do Tocantins (UFT) Docente do Centro Universitário Católica do Tocantins - UniCatólica.
Graduando em Direito pelo Centro Universitário Católica do Tocantins - UniCatólica
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BILLIG, Luciano. A Lei 13.709/2018 sob o prisma de proteção ao consumidor em sites de e-commerce Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 14 jun 2021, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56745/a-lei-13-709-2018-sob-o-prisma-de-proteo-ao-consumidor-em-sites-de-e-commerce. Acesso em: 26 nov 2024.
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