ÉRICA CRISTINA MOLINA DOS SANTOS.
(orientadora)
Resumo: A tecnologia tem revolucionado o mundo contemporâneo, bem como as relações preestabelecidas. Seguindo essa tendência, as bolsas de valores abandonaram o pregão presencial e adotaram o eletrônico, o que provocou o surgimento da negociação algorítmica. Costumeiramente referenciados como robôs investidores, os algoritmos de negociação surgiram causando alvoroço entre os operadores inexperientes, culminando na democratização do acesso à cultura de investimento, visto que certas transações financeiras passaram a ser executadas automaticamente. Entretanto, a crescente utilização e conjugação dos algoritmos de inteligência artificial e de aprendizagem de máquina, provocam incertezas na identificação de quem deverá arcar com a pretensão indenizatória ou ressarcitória avocada no âmbito da responsabilidade civil, quando os robôs investidores praticam atos geram prejuízo financeiro ao usuário. Dessarte, considerando que o exponencial crescimento da tecnologia modifica sobremaneira a realidade fática e que há lentidão na atualização de entendimentos doutrinários e jurisprudenciais sedimentados, o tema ganha notável relevância, mormente pelo eminente risco de ensejarem grandes prejuízos.
Palavras-chave: Responsabilidade civil. Robôs. Bolsa de valores.
Sumário: INTRODUÇÃO. 1 A PROGRAMAÇÃO TRADIONAL. 2 O ADVENTO DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL. 2.1 Aprendizado de Máquina. 3 NOÇÕES GERAIS DO SISTEMA FINANCEIRO. 3.1 Órgãos Reguladores do Sistema Financeiro Nacional. 4 O USO DE ALGORITMOS NA BOLSA DE VALORES. 4.1 A Personalidade Digital. 4.2 Efeitos Negativos Advindos da Implementação da Personalidade Digital. 5 A RESPONSABILIDADE CIVIL E O CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO DE 2002 (CC). 5.1 Sob a Ótica do Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC). 5.2 Sob a Ótica da Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 (CLT). 6 PRÉVIA ANÁLISE DO PERFIL DE RISCO DOS USUÁRIOS. 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
A bolsa de valores brasileira, conforme dados divulgados pela Brasil Bolsa Balcão (B3) (2020), não obstante a situação pandêmica vivenciada mundialmente, encontra-se em franca expansão, contabilizando altas mensais nos registros de pessoas físicas cadastradas junto à instituição. No entanto, em se tratando de mercado extremamente volátil e demandante de análise técnica criteriosa, enseja, muitas das vezes, elevadas perdas financeiras aos investidores novatos.
Neste escopo, considerando que a tecnologia algorítmica consegue analisar uma elevada quantidade de informações, além de ser rápida e isenta de emoção, era esperado que, visando maximizar a margem de lucro, tal ferramenta fosse implementada no mercado financeiro, o que de fato ocorreu através dos famigerados robôs investidores.
Todavia, em que pese a boa intenção dos programadores, a implementação de predita tecnologia para a tomada de decisões a partir de dados que se modificam rapidamente, não isenta o usuário das intempéries do mercado, as quais podem resultar em prejuízo financeiro. Soma-se a isso, o fato de estarem vulneráveis aos erros sistêmicos e aos ataques mal intencionados.
Outrossim, considerando que a criação de uma inteligência artificial envolve um grande número desenvolvedores, exsurge-se a problemática de a quem pertence a responsabilidade civil de indenizar os prejudicados por investimentos equivocados procedidos pelas inteligências artificiais. O tema ganha notável relevância quando consideramos a possibilidade de autoaprendizagem por parte da inteligência artificial que, em tese, possuiria o cunho de desconfigurar a responsabilidade objetiva de seu criador ou fornecedor.
Neste escopo, portanto, mostra-se necessário analisar a responsabilidade civil advinda de prejuízos causados por robôs investidores dotados de inteligência artificial na bolsa de valores, evidenciando a suficiência ou insuficiência da legislação atualmente em vigor. Ao ensejo, adotamos a metodologia de: a) quanto a sua finalidade, a pesquisa básica e pura; b) quanto ao seu objetivo, uma pesquisa exploratória; c) quanto aos procedimentos, a pesquisa bibliográfica; d) quanto a natureza, pesquisa qualitativa, e; e) quanto ao local, pesquisa de campo.
Em suma será necessário dispor sobre a programação tradicional, adentrando ao moderno tópico da inteligência artificial associada ao aprendizado de máquina, seguido de um breve adendo sobre a bolsa de valores e o sistema financeiro nacional. Após, haverá análise da responsabilidade civil decorrente de prejuízos causados pelas inteligências artificiais, observando-se disposições do Código Civil Brasileiro de 2002 (CC), Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC) e Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 (CLT).
Inicialmente, deve-se saber que, para alcançarem determinados objetivos, os programadores tradicionais desenvolvem seus projetos por meio de linhas de código, denominadas de algoritmos, que podem estar em diversas linguagens, tais como, entre outras, o Python, o C++ ou o Java. Logo, na programação tradicional o criador orienta a criatura de forma clara e precisa, sendo que a máquina sempre estará atada a uma ordem predeterminada. Frisa-se, para uma melhor compreensão, que os algoritmos podem ser definidos como uma sequência lógica de instruções que guiam as máquinas, possibilitando-as atingirem determinados objetivos.
Ademais, as unidades físicas de processamento presentes em diversos dispositivos eletrônicos, popularmente conhecidas como processadores, são compostas por bilhões de transistores que, recebendo comandos dos algoritmos, administram o fluxo e influxo de energia, bilhões de vezes por segundo. Simplificadamente, os algoritmos orientam o circuito físico a como executar certa tarefa por meio de impulsos elétricos e, sejam algoritmos complexos ou não, podem representar as seguintes operações: E, OU e NÃO” (DOMINGOS, 2017).
Normalmente o tema epigrafado é associado a um futuro distante, porém os estudos científicos nesta área se iniciaram com o empenho de Warren McCulloch e Walter Pitts, nos Estados Unidos, em meados de 1943, sendo cunhado de “Inteligência Artificial” somente em 1956, durante um discurso de apresentação de John McCarthy em um evento promovido em Dartmouth College, no município norte-americano de Hanover (KAPLAN, 2016).
Embora os pesquisadores sustentassem que a inteligência artificial provocaria uma revolução dentro de poucos anos, os avanços aquém do esperado provocaram a diminuição nos incentivos financeiros destinados à área, dando ensejo ao termo “inverno da inteligência artificial”. O tema tornou a ser relevante após o advento do segundo milênio, devido a uma série de fatores, como o maior acesso à internet de banda larga, o aumento de circulação de dados e, principalmente, pelo aumento da capacidade de processamento dos circuitos eletrônicos (PARENTONI; VALENTINI; ALVES, 2020).
O desenvolvimento da área tem ocorrido com base em quatro métodos de estudo diferentes que conceituam a inteligência artificial como: a) “O novo e interessante esforço para fazer os computadores pensarem (...) máquinas com mentes, no sentido total e literal” (HAUGELAND, 1985); b) “O estudo das faculdades mentais pelo uso de modelos computacionais” (CHARNIAK; MCDERMOTT, 1985); c) “A arte de criar máquinas que executam funções que exigem inteligência quando executadas por pessoas.” (KURZWEIL, 1990), e; d) “Inteligência Computacional é o estudo do projeto de agentes inteligentes” (POOLE; GOEBEL; MACKWORTH, 1998).
Em linhas gerais, os itens “a” e “b” se relacionam aos processos de pensamento e raciocínio, enquanto os itens “c” e “d” se referem ao comportamento. De modo diverso, as definições acostadas pelos itens “a” e “c” medem o sucesso em termos de fidelidade ao desempenho humano, enquanto os itens “b” e “d” medem seu sucesso, comparando-os a um conceito ideal de inteligência, chamado de racionalidade. Cite-se que é considerada racional toda decisão baseada no conhecimento que determinado ente possui, mesmo que, do ponto de vista fático, não esteja correta (RUSSELL; NORVIG, 2013).
Pelas evoluções tecnológicas que ocorreram, o atual conceito de inteligência artificial em muito se difere daquele inicialmente apregoado. Como mencionado acima, embora não exista consenso, simplificadamente a inteligência artificial “pode ser definida como um ramo da ciência da computação que se ocupa da automação do comportamento inteligente” (LUGER, 2013).
Ressalte-se o fato de que esta ciência não deve ser limitada aos métodos biologicamente observáveis (MCCARTHY, 2007), haja vista que o homem só conseguiu alcançar os ares, após desconsiderar a ideia de desenvolver dispositivos que reproduzissem o voo de um pássaro (FREITAS, 2018). Abstraindo-se da ideia de inteligência biológica, talvez o ser humano consiga descobrir um meio para desenvolver o algoritmo mestre para inteligência artificial (DOMINGOS, 2017), o que ainda não ocorreu.
Desta maneira, a inteligência artificial é, ao mesmo tempo, um ramo da ciência que busca compreender o fenômeno do pensamento inteligente e um ramo da engenharia que almeja desenvolver meios aptos para que as máquinas executem tarefas que, atualmente, os seres humanos desenvolvem com maior excelência (RUSSELL; NORVIG, 2003).
A princípio, imprescindível salientar que o termo machine learning, amplamente conhecido como aprendizado de máquina, é uma espécie englobada pelo gênero denominado inteligência artificial, visto que a capacidade de aprendizagem é inerente àquele que é dotado de inteligência, isto é, esta somente ocorre quando há capacidade de agregar conhecimento e utilizá-lo para aperfeiçoar a execução de certa empreitada. Isso significa que há interdependência entre inteligência artificial e o aprendizado de máquina, sendo que o segundo é um dos pressupostos para a existência do primeiro (FACELI et al., 2011).
No método arcaico de criação de programas, pressupõe-se o conhecimento técnico e a criatividade do ser humano, pois a maioria dos softwares que atualmente se encontram em uso, utilizam-se de códigos programados por humanos. Neste escopo, pela programação tradicional, os dados entram no computador, são analisados por algoritmos predeterminados pelos programadores, alcançando-se certo resultado em sua saída.
Em se tratando de aprendizado de máquina, contudo, ocorre o contrário, visto que se fornece à máquina certa quantidade de dados, juntamente com o resultado almejado. A partir disso, a própria máquina produz o algoritmo que aparenta ser o mais adequado ao caso. Portanto, o denominado algoritmo de aprendizado detém a capacidade de desenvolver outros algoritmos, bem como de se aperfeiçoar por meio da análise dos dados e resultados. Logo, a própria máquina desenvolve o programa necessário, adequando-se ao resultado previamente apresentado (DOMINGOS, 2017).
Sem pormenorizar, os computadores são programados para aprender com experiências pretéritas, por meio do método dedutivo, auferindo conclusões de uma base estrita e preestabelecida de exemplos. Portanto, os preditos algoritmos de aprendizagem induzem uma função ou hipótese apta a solucionar certo infortúnio. Busca-se uma capacidade de conclusão genérica que possua precisão elevada (FACELI et al., 2011).
Neste meio há muita preocupação com a qualidade dos dados fornecidos à máquina, vez que os algoritmos os utilizam como base para se desenvolverem. Assim, pode acontecer de se fornecer dados acima ou abaixo do ideal. No primeiro caso a máquina pode se tornar especialista em um determinando assunto, atribuindo àquela chave um excessivo valor, prejudicando a análise global do assunto. No segundo os resultados serão imprecisos. Mencionados fenômenos, na ciência da computação, são referidos, respectivamente, como overfitting e underfitting (FACELI et al., 2011).
Por fim, insta salientar que estes algoritmos, normalmente, demandam grande quantidade de dados para se aperfeiçoarem, o que motivou os investimentos na área após o advento da internet. Sabendo disso, é evidente que as grandes startups, como a Google e o Facebook, utilizariam os dados de seus usuários para otimizar seus ganhos e melhorarem a usabilidade de seus ecossistemas (ALMEIDA, 2019), tal como ocorre com os robôs investidores.
Em uma sociedade moderna, o sistema financeiro é primordial para o crescimento estável dos países, possibilitando-os equilibrarem as diferenças sociais existentes e observarem a dignidade da pessoa humana. A ciência financeira tem como objetivo melhorar alocação de recursos econômicos, tendo em vista que geralmente os desejos superam a capacidade econômica dos agentes.
Conforme sustentava Robbins (1945), todos os bens são escassos e, dependendo de sua procura ou necessidade, não existirá o suficiente para suprir o desejo de todos os interessados. Entretanto, existem aqueles que são considerados superavitários, vez que, por motivos variados, constituem certa quantia de reserva.
Desde que não sejam direcionados às necessidades prementes, é comum que o superavitário desenvolva o interesse em emprestar sua reserva àquele considerado deficitário, tendo em vista que, ao aplicar sua receita, poderá auferir lucros com percentuais acima dos índices de inflação e de depreciação do poder econômico, além de adquirir o direito de cobrar pelos riscos e pela mora que a operação o expõe.
Todavia, com o decorrer do tempo, constatou-se que este processo era dificultado pelo fato de nem sempre os agentes possuíam contato direto uns com os outros (PINHEIRO; SADDI, 2005). Assim, criou-se a bolsa de valores, de modo a reunir os deficitários e os superavitários em um único ambiente. Conclui-se, por conseguinte, que a bolsa de valores é um ente facilitador de negócios e fomentador da circulação de riquezas, sendo que a necessidade de sua existência advém da indispensabilidade de velocidade e de baixo custo na negociação de bens ou ativos.
Vale mencionar que as transações celebradas por meio dela poderiam ser celebradas por meio de contrato particular com registro no cartório de notas, por exemplo. Este método, no entanto, prejudicaria a rapidez requerida pelo mercado contemporâneo, além de engessar os investimentos as modalidades de médio e longo prazo.
Anote-se que a presença de deficitários na economia é, concomitantemente, forte caraterística do sistema capitalista e um dos pressupostos para existência do mercado de capitais, um dos nichos presentes na bolsa de valores, tendo em vista que não haveriam motivos para ocorrência de investimentos, caso todos possuíssem receitas equivalentes às demandas.
É primordial não confundir o Sistema de Finanças Públicas (SFP), com o Sistema Financeiro Nacional (SFN), porquanto este diz respeito aos entes privados, inclusive as instituições administradas pelo poder público que atuam como pessoa jurídica de poder privado (LEITE, 2016). O Sistema Financeiro Nacional (SFN), é constituído pelos setores normativo, supervisor e operador.
O setor normativo, atendendo aos objetivos governamentais, legisla normas para o sistema, o qual é composto pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), o Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e o Conselho Nacional de Previdência Complementar (CNPC).
O setor supervisor monitora o respeito ao estabelecido pelo setor normativo, sendo formado por Banco Central do Brasil (BCB), Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) e Superintendência Nacional de Previdência Complementar (PREVIC).
O setor operador engloba todas as demais instituições, sejam públicas ou privadas, desde que ligadas às movimentações financeiras.
A Brasil Bolsa Balcão (B3), integrante deste último setor, fruto da fusão da Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA) e da Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos (CETIP), é a principal bolsa de valores em território nacional.
Por oportuno, é importante mencionar que, embora a Brasil Bolsa Balcão (B3) seja a principal e única bolsa brasileira habilitada para negociar ações, existem outras que mercantilizam valores, mercadorias e futuros que, igualmente a Brasil Bolsa Balcão (B3), são fiscalizadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
O atual método para aquisição e alienação de bens e ativos, em muito se difere do utilizado anos atrás, haja vista que, com o advento da tecnologia, o pregão presencial se tornou eletrônico. A atual velocidade de disseminação das informações do mercado financeiro, aliada aos recursos informáticos, fomentou novas modalidades de negociação no mercado financeiro, tal qual a por algoritmos.
Neste sentido, destaca-se o contínuo crescimento de utilização dos robôs de high frequency trading (HFT), conhecidos por operarem em alta frequência, os quais utilizam algoritmos de inteligência artificial associados a máquinas com alto poder de processamento e que determinam automaticamente os parâmetros de negociação, com pouca ou nenhuma intervenção humana. Nesta modalidade, o lucro provém da junção de três fatores: a) execução simultânea de muitos contratos; b) pequenos lucros em spread, ou seja, pequenas variações entre os valores de compra e de venda, e; c) operações que são iniciadas e finalizadas no intervalo de segundos ou milissegundos.
Consigna-se que predita tecnologia é disciplinada, entre outras, pelo disposto na Instrução n. 558/15 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), sendo seus usuários objetivamente responsáveis pelos danos eventualmente causados.
No entanto, pelo grande volume de negociações simultâneas, ainda que o high frequency trading (HFT) utilize tecnologia avançada, requer uma estrutura apropriada para o seu adequado funcionamento. Isso porque a formalização de ordens de compra ou venda em lote, antes ou depois do tempo adequado, pode propiciar prejuízos de grande monta.
Atentos ao mencionado risco, seus usuários adotaram a prática do co-location, isto é, passaram a instalar servidores particulares junto ao centro de processamento de dados da bolsa de valores, a fim de anularem quaisquer riscos de auferirem prejuízos em decorrência da baixa latência entre a emissão da ordem de compra ou venda e sua respectiva recepção e execução pelo sistema informatizado da Brasil Bolsa Balcão (B3). Clarividente que, em função de seu alto custo de manutenção, somente as grandes instituições financeiras se utilizam da citada tecnologia, conforme é possível extrair de precedentes da Comissão de Comércio de Mercadorias e Futuros (CFTC) e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mencionados por Costa (2018).
Com efeito os robôs de alta frequência buscam lucros imediatos e possuem elevado poder de compra, visto que são administrados pelas grandes instituições. Considerando tais constatações, inevitavelmente, conclui-se que há grande possibilidade de tal tecnologia contribuir para o rápido agravamento de instabilidades no mercado financeiro, tal como ocorreu na fatalidade conhecida como Flash Crash em maio de 2010 (KIRILENKO et al., 2014).
Por outra banda, demandando um investimento consideravelmente menor, grande parcela dos investidores se tornou usuário de robôs advisors, conhecidos no Brasil como robôs consultores. Estes, que se subdividem em robôs consultores assistentes, robôs consultores gestores e os robôs consultores de ordens, derivam-se da programação tradicional, podendo ou não contar com alguns algoritmos de inteligência artificial.
Regulamentados pelo artigo 16 da Instrução n. 592/17 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), os robôs consultores assistentes atuam aconselhando seus usuários a executarem certos investimentos, com base no perfil de risco do usuário e na análise de mercado. Assim, considerando a liberdade detida pelos usuários desta subespécie, trata-se de ferramenta destinada a otimizar a negociação daqueles que já possuem um bom conhecimento do mercado.
Por outra banda, disciplinados pelo artigo 1º da Instrução n. 558/15 da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), os robôs consultores gestores administram a carteira de investimentos de maneira autônoma, emitindo ordens de compra e de venda sem prévia autorização do usuário, tendo como base o perfil de risco do utilizador e sua análise algorítmica do mercado. Na mesma linha procedimental dos robôs consultores gestores, existem os robôs consultores gestores de ordens, os quais buscam lucros rápidos em meio as variações do mercado.
Em outras palavras, os robôs consultores gestores gerem autonomamente a carteira do usuário mais conservador, por meio de aplicações de médio e longo prazo. Por sua vez, os robôs consultores gestores de ordens executam automaticamente transações que visam lucro em curto prazo, na modalidade de day trade, ou seja, operações financeiras que são iniciadas e finalizadas dentro do mesmo pregão (COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, 2019).
Vale ressaltar que, embora a autonomia do investidor seja completamente furtada, as duas espécies de robôs consultores gestores se mostram como um meio apto à democratização da cultura de investimentos, vez que é a porta de entrada àqueles que não possuem conhecimento suficiente para operar no mercado financeiro ou dispõem de pouco tempo para acompanhá-lo.
No entanto, habitualmente os robôs se tornam especialistas em certos cenários econômicos, apresentando ganhos consistentes em certos momentos, mas noutros, perdas consideráveis. Não raro, os usuários ou a corretora monitoram a aquisição e alienação dos contratos executados pelos robôs, a fim de dirimirem quaisquer prejuízos provenientes de negociações inadequadas.
Nesta conjuntura, é importante destacar que, pelo fato de alguns robôs consultores não possuírem engenharia computacional complexa, quando comparados com os de alta frequência, pode ocorrer de desconsiderarem informações que desestabilizam o mercado, de modo que o algoritmo continua com o mesmo método de atuação, mesmo que sempre resultem em prejuízo. Desigualmente, os robôs que contam com a inteligência artificial e o aprendizado de máquina, podem desenvolver tal habilidade com o decorrer do tempo, maximizando seus ganhos e minimizando suas perdas.
Em regra, pela sua natureza estritamente lógica, os robôs consultores executam ordens de compra e venda tendo por base indicadores gráficos. Além disso, a maioria dos usuários os configuram tendo por base as técnicas de price action, consistentes na tomada de decisões analisando somente as variações do preço de determinado bem ou ativo. Assim, diferentemente dos investidores humanos que podem acompanhar as especulações que surgem em noticiários, essa espécie de robô realiza as operações após analisar o mercado de um ponto de vista meramente estatístico.
Todavia, segundo relatório disponibilizado pela Bloomberg (2019), atualmente existem robôs que possuem algoritmos que reconhecem a linguagem natural e que, em tese, poderiam se conscientizar das expectativas por meio de análise das notícias, ajustando sua colocação no mercado. Predito documento evidencia que a maioria desses algoritmos não conseguem notar informações sutis e podem causar prejuízos de grande monta, inclusive, ressalta a necessidade do investidor se antecipar as notícias que causam impacto no mercado financeiro, bem como apresenta um modelo de classificação de notícias que combina dois algoritmos associados ao aprendizado de máquina, quais sejam, o Support Vector Machine (SVM) e K-Nearest Neighbors (KNN).
De todo modo, cite-se que todos os robôs estão sujeitos as fatalidades imprevisíveis que podem acarretar desacertos sistêmicos, tais como o ataque de hackers, problemas em peças físicas que integram os sistemas computacionais ou a desacertada programação de algoritmos, seja por culpa do programador na ocorrência de overfitting e underfitting, ou decorrente de incoerências no processo de autoaprendizagem (BARBOSA, 2020).
A implementação da tecnologia algorítmica como ferramenta de otimização de ganhos na bolsa de valores, combinada com a inteligência artificial e o aprendizado de máquina, complicou a verificação da responsabilização civil por prejuízos resultantes de operações financeiras malsucedidas.
Há tempos somente investidor e corretora podiam ser considerados partes integrantes da predita relação jurídica. Todavia, parte da doutrina contemporânea sustenta ser necessário atribuir personalidade jurídica aos entes dotados de inteligência artificial e de aprendizado de máquina, porquanto poderão, em um futuro não distante, agirem autonomamente, contra a vontade de seu criador, proprietário ou usuário (CHOPRA; WHITE, 2011).
Neste escopo, alegam que o momento de aquisição de personalidade digital poderia, inclusive, ser aferido pelo teste de Turing (1950), no qual dois ou mais seres humanos e uma máquina seriam alocados em diferentes salas, a comunicação se limitaria à linguagem textual digitada e, caso os avaliadores não identificassem qual dos interlocutores era a máquina, a inteligência artificial seria considerada campeã da experiência. Ademais, na hipótese desta última iludir mais de um terço de seus avaliadores, estaria pensando por si própria.
A adoção da personalidade digital teria o cunho de aproximar o tratamento das inteligências artificiais ao fenômeno ocorrido com as empresas, as quais são conhecidas como pessoas jurídicas de direito privado, consoante ao artigo 44 do Código Civil Brasileiro de 2002 (CC), conferindo-as certos direitos e deveres perante a sociedade. Assim, ao menos em um primeiro momento, seus desenvolvedores, proprietários ou usuários se eximiriam da responsabilidade civil (RAMOS, 2019).
Todavia, considerando que o direito costuma se atualizar lentamente, pelo fato de possuir grande apreço aos usos e costumes, como explicita o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro de 1942 (LINDB), embora seja altamente recomendável se adiantar às controvérsias jurídicas que eventualmente surgirão, deve-se ressaltar que os impactos causados pela adoção da personalidade digital são incomensuráveis. Outrossim, a criação do mencionado instituto topa com óbices em aspectos gerais da personalidade civil das pessoas e da personalidade jurídica das empresas.
No primeiro caso a diferença se encontra na concepção, haja vista que o ser humano, segundo apregoa o artigo 2º do Código Civil Brasileiro de 2002 (CC), adquire personalidade jurídica a partir do nascimento com vida, enquanto que a personalidade digital seria auferida a partir do cumprimento de um marco legal a ser engendrado, talvez semelhante ao disposto pelo artigo 45 da citada norma. No segundo caso, considerando que são entes oriundos de uma ficção jurídica, as empresas são desprovidas de quaisquer emoções ou sentimentos, ao passo que as inteligências artificiais poderão desenvolver algoritmos que simulam emoções, posto que há anos existem robôs especialistas nesta área (CALVO et al., 2015).
Sem embargo ao disposto, há aqueles que afirmam que “não será justo que uma empresa tenha personalidade e um robot autónomo, com capacidade de aprender através da recolha de experiências, não a possa ter” (RAMOS, 2019).
Em que pese as considerações retro, insta consignar que a adesão à personalidade digital poderia transmitir, quando da criação de robôs investidores, a ideia de inexistência de responsabilidade de seus programadores, o que aumentaria a oferta de robôs inacabados e, inevitavelmente, propiciaria o aumento de ocorrência de prejuízos financeiros aos usuários.
Isso porque, na ânsia de oferecerem robôs com alta rentabilidade, os inventores e programadores poderiam desconsiderar o nível de risco das transações executadas, porquanto poderiam alegar estarem protegidos pela personalidade digital, tal como ocorre em casos que envolvem pessoas jurídicas de direito privado de responsabilidade limitada. Frise-se, conforme se depreende do artigo 50 do Código Civil Brasileiro de 2002 (CC), que o juiz poderá, em casos específicos, a requerimento da parte ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderar a autonomia patrimonial conferida pelo parágrafo único, do artigo 49-A, da mesma lei, para que os efeitos de certos débitos sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica (RAMOS, 2020).
Deste modo, como efeito reflexo, dado a necessidade de se comprovar o dolo dos fornecedores, fabricantes, produtores ou construtores, ocorreria uma sobrecarga nas atividades regulatórias, fiscalizatórias e sancionatórias promovidas pela BM&FBOVESPA Supervisão de Mercados (BSM), bem como pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), dada sua competência subsidiária prevista no artigo 17, da Lei n. 6.385/76.
Evidenciado o não cabimento de personalidade digital às inteligências artificiais dotadas de aprendizado de máquina, cogita-se a aplicação dos institutos previstos no Código Civil Brasileiro de 2002 (CC) e no Defesa do Consumidor de 1990 (CDC), pois a depender de sua forma de distribuição e utilização, podem ser considerados produtos ou serviços.
Em análise detida da responsabilidade civil, verifica-se que seu principal objetivo é restaurar o equilíbrio patrimonial e moral deturbado pelo dano causado. Neste sentido, estabelece-se penalidades patrimoniais àquele que, por sua conduta comissiva ou omissiva, gera prejuízo a outrem.
Assim, é cediço que a responsabilização civil possui três funções principais: a) compensatória; b) sancionatória, e; c) preventiva. Estes institutos almejam, respectivamente, a reparação integral dos danos (art. 944 do CC/2002 e art. 6º, inciso VI, do CDC); o desestímulo de condutas parecidas, e; que tais condutas jamais sejam admitidas (TARTUCE, 2018).
Os juristas civilistas, em grande maioria, subdividem o gênero responsabilidade civil em: a) responsabilidade contratual e responsabilidade extracontratual, e; b) responsabilidade subjetiva e responsabilidade objetiva.
A responsabilidade contratual se caracteriza pelo vínculo preexistente entre as partes, sendo que o dever de reparar advém do inadimplemento de obrigação prevista no acordo. Por sua vez, na responsabilidade extracontratual inexiste vínculo preexistente entre as partes e o dever de indenizar surge de uma obrigação legal e moral de não lesar outrem.
No mais, efetivada no ordenamento nacional desde o Código Civil Brasileiro de 1916 (CC), atualmente disposta nos artigos 186 e 187 da norma civilista de 2002, a responsabilidade subjetiva pressupõe que ação ou omissão seja minada de dolo ou de culpa. Referente ao dolo e a culpa, Tartuce (2018) preleciona:
Pode-se afirmar que a culpa deve ser entendida em sentido amplo (lato sensu) e em sentido estrito (stricto sensu). No primeiro sentido, a culpa engloba o dolo – a intenção de prejudicar outrem, a ação ou omissão voluntária mencionada no art. 186 do Código Civil brasileiro – e a culpa estrita – que vem a ser o desrespeito a um dever preexistente ou a violação de um direito subjetivo alheio, pela fuga de um padrão geral de conduta. Pelo que consta do último dispositivo citado, e também pelo que previa o art. 159 da codificação nacional anterior, a culpa em sentido estrito é relacionada a três modelos jurídicos, quais sejam, a imprudência, a negligência e a imperícia. A imprudência vem a ser uma falta de cuidado somada a uma ação, algo próximo da ideia de culpa in comittendo dos romanos. A negligência, por sua vez, é uma falta de cuidado somada a uma omissão (culpa in omittendo). Por fim, a imperícia pode ser definida como a falta de qualificação geral para desempenho de uma função ou atribuição. Apesar da ausência de menção à imperícia no art. 186 do Código Civil de 2002, foi clara a intenção do legislador civil em diferenciar os três conceitos no art. 951.
Observando-se as particularidades decorrentes do disposto no inciso IV, do artigo 1º, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB), constata-se que houve manifesta predileção ao modelo capitalista, vez que a livre iniciativa de atividade de exploração econômica é o seu traço mais marcante. Por sua vez, a ocorrência de risco é inerente a qualquer atividade de exploração econômica, de modo que todas submetem os empreendedores às possibilidades de bancarrota e “a boa avaliação dessas possibilidades por parte do empresário é fundamental para o investimento” (NUNES, 2019).
Atentando-se a tal circunstância, o Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC) foi o primeiro a adotar a responsabilidade objetiva, na qual se dispensou a comprovação de dolo ou culpa para condenação de fornecedores, fabricantes, produtores e construtores de produtos ou serviços. Nos artigos 12 a 14 da mencionada lei, acolheu-se a teoria do risco do negócio, obrigando aqueles indivíduos a arcarem com todo dano causado ao consumidor, por ser inerente a sua atividade (MAGRANI, 2018).
O Código Civil Brasileiro de 2002 (CC), em seu artigo 927, ratificou o mesmo entendimento, porquanto a teoria do risco assevera que os atuantes em ramo cuja atividade oferece risco inerente, assumem a obrigação de indenizar o superveniente prejudicado, independentemente da ocorrência de dolo ou culpa (GONÇALVES, 2019). Neste sentido, Direito e Filho (2004), dispõe que:
Todo aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecidos, independentemente de culpa. Esse dever é imanente ao dever de obediência às normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança destes.
Em detrimento a parte autossuficiente, tal instituto promoveu maior equidade, pois isentou a parte hipossuficiente da desarrazoada obrigação imposta pelo inciso I, do artigo 373, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC), por meio da junção da culpa presumida e da inversão do ônus da prova, conforme sustenta Stoco (2014). Simplificando, a responsabilidade objetiva se configura quando presentes os seguintes requisitos: a) ato ilícito; b) dano, e; c) nexo causal. A culpa ou dolo seria essencial somente para a tipificação da responsabilidade subjetiva.
Posto isto, considerando que o Brasil é um país declaradamente capitalista, cabe ressaltar que a grande maioria dos negócios jurídicos envolvendo robôs investidores serão analisados de acordo com o Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC), vez que seus criadores ou fornecedores buscam auferir lucros por meio de sua comercialização, caracterizando a relação de consumo. Nos demais casos seguirão a regra disposta no Código Civil Brasileiro de 2002 (CC) e no Código de Processo Civil de 2015 (CPC), obrigando a suposta vítima a explicitar conduta dolosa ou culposa do indivíduo que o forneceu mencionado robô investidor.
São incontáveis os particulares que programam seus próprios robôs investidores para não passarem horas à frente de um computador analisando gráficos e notícias do mercado financeiro. No entanto, por óbvio, existem inúmeros robôs que são comercializados como produtos e como serviços, sob a promessa de alta rentabilidade e confiabilidade.
Infelizmente, como mencionado em tópico anterior, a utilização de algoritmos para negociações de bens ou ativos expõem os usuários não só aos riscos inerentes às operações, como também aos riscos de o robô não agir como esperado, causando prejuízos aos usuários. A par desta problemática, vários programadores tornam público o desempenho de seus robôs, como se pode observar no sítio eletrônico da MQL5 (METAQUOTES SOFTWARE CORP., 2020), a principal plataforma para a programação de robôs de investimento.
A comercialização dos robôs investidores caracteriza a responsabilidade objetiva de seus criadores e fornecedores, sejam eles pessoas físicas ou jurídicas, vez que, a depender da situação, podem figurar como produto ou como serviço. Conforme dispõe os artigos 12 a 14 do Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC).
Nos casos em que se vendem robôs como produtos, por força da responsabilidade objetiva associada a teoria do risco, a aplicação dos artigos 12 e 13 do mencionado códex ocorreria somente nos casos em que o defeito apresentado pela inteligência artificial fosse anterior ao seu oferecimento ao consumidor final. Isso porque, iniciada o uso da inteligência artificial sem a vigilância de seu criador ou fornecedor, há chances de que ocorram mudanças substanciais no comportamento dos algoritmos, haja vista que estarão recalculando seus parâmetros continuamente com base no que é oferecido pelo sistema eletrônico no qual foi instalado e pelos comportamentos de seu usuário (BARFIELD, 2018).
No mais, Barfield (2018) sustenta que devido ao disposto pelo artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC), não prosperaria ação que buscasse a responsabilização daquele indivíduo que, por exemplo, prestasse serviço ao usuário auferindo pagamentos mensais em contrapartida. A fundamentação seria a mesma, visto que a imprevisibilidade do comportamento da inteligência artificial, em tese, possuiria a capacidade de excluir a responsabilidade.
Malgrado as interpretações retro, ambos casos a responsabilização do criador ou fornecedor se tornaria custosa para o usuário prejudicado, considerando que este deveria constituir prova do dolo ou culpa daqueles, em função do inciso I, do art. 373, do Código de Processo Civil de 2015 (CPC). Sem prejuízo, como poucos detêm conhecimento básico em programação algorítmica, haveria necessidade de prova técnica, o que muitas vezes causaria a desistência de ações com pretensões indenizatórias e ressarcitórias em âmbito privado.
Vale salientar que o reconhecimento de prejuízos advindos de robôs investidores, conjugado com a necessidade de transparência com os usuários, decorre do próprio ordenamento jurídico brasileiro, que também adotada o princípio da accountability nos seguintes casos: a) o princípio da prestação de contas, expresso no artigo 70 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB); b) o dever de transparência e eficiência, disposto no artigo 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB), e; c) a existência de entes que exercem o controle técnico da gestão de outros, como os Tribunais de Contas, o Ministério Público, o Poder Judiciário, o Poder Legislativo e as Agências Reguladoras (PASCOAL, 2019).
Em todo caso, não obstante na teoria exista esse impasse, segundo relatório anual do órgão fiscalizador, tem sido comum as corretoras reembolsarem os investidores “nos casos em que são constatados prejuízos decorrentes de erros operacionais, atrasos ou entradas e saídas fora do padrão descrito” (COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, 2019).
Corriqueiramente são contratados programadores para o desenvolvimento de robôs investidores, seja como trabalhador autônomo ou como empregado registrado, os quais laboram tendo por base estratégias desenvolvidas pelo contratante.
Logo, pelo desenvolvimento em conjunto, a responsabilidade dos erros é rateada da seguinte forma: a) ao programador pertence a responsabilidade de erros ou instabilidades referentes à codificação, e; b) ao contratante remanesce a responsabilidade sobre os prejuízos decorrentes da adoção de estratégias inadequadas.
Em seu artigo 462 a Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 (CLT) adota o princípio da integralidade salarial como regra geral, sendo defeso ao empregador proceder qualquer desconto nos salários, com exceção dos referentes a aditamento, dispositivos de lei ou convenção coletiva de trabalho (LEITE, 2020).
No entanto, é lícito descontos por danos causados pelo empregado, desde que previsto em contrato de trabalho ou pela incorrência deste último em dolo. Portanto, para que os descontos sejam lícitos, necessário prova de que o empregado agiu com dolo de o causar. Caso o dano tenha sido provocado por culpa do mesmo, o desconto somente poderá ser efetuado caso haja previsão em acordo previamente celebrado (MARTINEZ, 2020).
De qualquer modo, tratando-se de relação consumerista, os responsáveis por sua criação e codificação serão, no mínimo, devedores solidários em eventuais pleitos indenizatórios ou ressarcitórios promovidos pelos consumidores. Nestes casos, preenchidos os requisitos legais, a parte que tenha indenizado o prejuízo causado ao consumidor terá direito de regresso.
Os robôs investidores oferecidos comercialmente, em sua grande maioria, promovem a suitability, que nada mais é que a avaliação do perfil de risco do usuário, por meio de análise de um sucinto questionário formulado pela inteligência artificial. Entretanto, como era de se esperar, alguns questionários podem não capturar características ou traços importantes do comportamento humano, prejudicando sobremaneira uma adequada determinação do seu perfil de risco e expor os usuários a um grau de risco acima ou abaixo do ideal.
De acordo com o relatório anual da Comissão de Valores Mobiliários (2019), já havia se identificado essa deficiência, visto que as plataformas não realizavam a suitability dos clientes, a qual era procedida somente pelas corretoras. É importante destacar que, muitas vezes, os robôs investidores são desenvolvidos ou distribuídos por agentes desvinculados das corretoras e que esta última, na maioria das vezes, é tão somente uma intermediária entre o investidor e a bolsa de valores.
Assim, por força da Instrução n. 539/13 e do Ofício-Circular n. 9/2019, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), aliado ao fato de comercializarem os robôs investidores como produto ou serviço sem prévia determinação do perfil de risco do adquirente, o que provoca o aumento da quantidade de usuários insatisfeitos, evidencia-se a inobservância generalizada do disposto ao disposto no artigo 4º, conjugado com o inciso III, do artigo 6º, do Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC).
Destarte, além de multa sancionatória pela não cumprimento de regras estabelecidas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o fornecedor de robôs investidores poderá ser alvo de ações judiciais por infringir direitos do consumidor.
Os robôs de investimento contemporaneamente comercializados como produtos ou como prestação de serviços, ainda não são dotados de inteligência artificial e de aprendizado de máquina em escala algorítmica que ensejam a desconfiguração da responsabilidade civil de seu respectivo desenvolvedor ou fornecedor. No entanto, o tema merece destaque, pois atualmente já ocorrem incidentes envolvendo dispositivos dotados de inteligência artificial.
Especificadamente nos casos em que envolvem robôs investidores dotados de inteligência artificial associada ao aprendizado de máquina, a importância é ainda maior. Isso porque, embora a grande maioria dos robôs consultores não são munidos de tais algoritmos, os robôs de alta frequência já os utilizam em maior proporção. Depreende-se, portanto, que é questão de tempo para que os robôs com tal tecnologia se tornem acessíveis a todos os interessados.
A exigência de que os criadores ou fornecedores de robôs investidores disponibilizem o código-fonte para que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) possa averiguá-los, mostra-se completamente pertinente, vez que isso facilita a constatação de supostas irregularidades em sua programação. Para tanto, os órgãos fiscalizados deverão possuir vários especialistas na área, haja vista a tendência de crescimento desta modalidade de negociação e o gradativo aumento na complexidade dos algoritmos.
Em tese, a adoção de uma personalidade digital para as inteligências artificiais, impulsionaria o desenvolvimento deste tipo de tecnologia, porém os riscos advindos desta evolução são imprevisíveis. Os algoritmos de inteligência artificial conjugado com o de aprendizado de máquina ainda estão em desenvolvimento, desconhecendo-se as áreas em que serão efetivamente aplicados.
Aliás, deve ser ressaltado que os algoritmos de autoaprendizagem podem ser salvos a cada novo ciclo, bem como desativados a qualquer momento, preservando-se os ajustes efetuados durante os ciclos anteriores. Ciente disso, ao menos por ora, têm-se a desnecessidade da implementação da personalidade digitais das inteligências artificiais dos robôs investidores.
Conforme apregoa o inciso V, do artigo 170, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB), a livre iniciativa é limitada pela proteção ao consumidor. Assim, durante todo o período da programação inicial dos robôs investidores, o Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC) já deve estar sendo observado por aqueles que desejam comercializá-los. Tal como se busca o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação do meio ambiente, deve-se pretender o equilíbrio entre a livre iniciativa e os direitos dos consumidores.
A admissão de predita prerrogativa às inteligências artificias, seria o mesmo que admitir práticas abusivas, menosprezando todo o arcabouço jurídico brasileiro, em especial o Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC) e a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB).
Considerando todos os argumentos retro, clarividente que o dever de cuidado do criador ou fornecedor de robôs investidores dotados de inteligência artificial e aprendizado de máquina, antecedem à comercialização e alcançam a fase de desenvolvimento. Dessarte, ainda que o produto ou serviço não esteja sobre o controle do criador ou fornecedor e que, por sua própria natureza, a inteligência artificial seja imantada de imprevisibilidade, o dever de cuidado do criador ou fornecedor subsistiria, pois devia ter em mente, desde a concepção da ideia, a prestação de um serviço com qualidade e segurança, como exigido pelo Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC).
Já a Consolidação das Leis do Trabalho de 1943 (CLT), estabelece que a responsabilidade de restituir o dano somente será do empregado quando restar demostrado seu dolo, ou seja, sua intenção de causar prejuízo a qualquer das partes envolvidas. Por outro lado, caso tenha incorrido em culpa, o empregado somente será responsável pelos prejuízos se houver previsão em acordo. Destaca-se que a responsabilidade subsidiária do subordinado e solidariedade da pessoa física ou jurídica que o contratou, é manifesto desdobramento da teoria do risco.
Ademais, verifica-se que a suitability é pressuposto para materialização da accountability, em outras palavras, a avaliação do perfil de risco do usuário é pressuposto para que haja transparência. Neste sentido, os criadores ou fornecedores de robôs investidores deveriam avaliar o perfil de risco dos pretensos usuários, antes da efetivação de qualquer espécie de vínculo contratual. Caso não procedam a avaliação de perfil de risco do usuário em momento anterior a qualquer espécie de vínculo, considerando se tratar de relação de consumo, restaria configurado a falta de transparência e a transgressão ao disposto no artigo 4º, conjugado com o inciso III, do artigo 6º, todos do Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC).
Por fim, como meio de evitar a bancarrota, ao menos em relação aos robôs consultores de ordens dotados de inteligência artificial, os desenvolvedores e fornecedores podem fixar cláusula contratual obrigando os usuários a sacarem diariamente os lucros auferidos do início ao fim do pregão. Está simples medida, reduziria significativamente o montante indenizatório ou ressarcitório na ocorrência de eventuais fatalidades.
Ante todo o exposto, tratando-se de robôs investidores dotados de inteligência artificial, assevera-se a suficiência da legislação pátria. No mais, apesar do disposto no Código de Defesa do Consumidor de 1990 (CDC) atravancar sobremodo o desenvolvimento desta tecnologia, sua aplicação deve ser mantida integralmente, considerando o eminente risco de abuso por parte dos desenvolvedores e fornecedores.
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