INGO DIETER PIETZSCH
(orientador)
RESUMO: A terceirização de atividades pode ser definida como a transferência da responsabilidade de um serviço ou parte da produção de uma organização para outra, sendo que este processo atualmente é utilizado por diversos países. Uma particularidade da área da saúde é o uso intenso e diversificado de mão-de-obra, o que faz o setor absorver com muita rapidez as transformações do mercado de trabalho em geral. Isso implica não somente no aumento de trabalhadores subcontratados, mas a redução dos empregados contratados diretamente pelas empresas. Trata-se de um fenômeno mundial, alcançando todos os tipos de trabalho, na indústria, comércio e serviços, apresentando-se sob diversas formas de regulação e legislação nos diferentes países. Os serviços de saúde desde a sua reorganização na década de 1990 tem sido ampliado e a necessidade de mão-de-obra trabalhadora é evidente. Em razão disso, os custos com saúde aumentaram, levando os gestores a buscarem formas mais “econômicas” de contratação de pessoal.
Palavras-chave: Terceirização. Aplicabilidade. Serviços de saúde.
ABSTRTACT: The outsourcing of activities can be defined as the transfer of responsibility for a service or part of production from one organization to another, and this process is currently used by several countries. A particularity of the health area is the intense and diversified use of labor, which makes the sector absorb the changes in the labor market in general very quickly. This implies not only an increase in subcontracted workers, but a reduction in employees hired directly by companies. It is a worldwide phenomenon, reaching all types of work, in industry, commerce and services, presenting itself under different forms of regulation and legislation in different countries. Since their reorganization in the 1990s, health services have been expanded and the need for hard-working labor is evident. As a result, healthcare costs have increased, leading managers to look for more “economical” ways of hiring personnel.
Keywords: Outsourcing. Applicability. Health services.
1 Introdução
As transformações aceleradas no mundo do trabalho nos últimos anos têm provocado mudanças importantes no trabalho em saúde, especialmente em relação aos processos produtivos, ao trabalhador e às condições de trabalho. Sabe-se que todo brasileiro tem direito à saúde, com respaldo na Constituição Federal de 1988, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), regulamentado pela lei n. 8.080/90. O SUS consiste em uma conquista social decorrente do Movimento de Reforma Sanitária, que trouxe avanços à saúde pública brasileira, especificamente no âmbito de sua organização (SCHIMITH et al., 2017).
Essa nova política de saúde brasileira nasceu a partir da Constituição Federal de 1988 e, segundo Druk (2016), a aprovação da nova Constituição brasileira coincidiu com o início da implantação das políticas neoliberais, para a qual a expansão da terceirização é um marco importante: os programas de privatização de empresas e de serviços públicos criados nos anos 1990 e a reforma do Estado iniciada em 1995, com o Plano Diretor de Reforma do Aparelho de Estado, de responsabilidade do Ministério da Administração Federal e Reforma do Estado (Mare).
Para Sticca, Silva e Mandarini (2019), a terceirização de atividades pode ser definida como a transferência da responsabilidade de um serviço ou parte da produção de uma organização para outra, sendo que este processo atualmente é utilizado por diversos países. A decisão por terceirizar uma atividade normalmente está vinculada à redução de custos e de procedimentos burocráticos, à possibilidade de melhoria na qualidade dos produtos e serviços e ao aumento da flexibilidade para atender às exigências do mercado.
Ainda segundo esses autores, tal processo geralmente resulta em modificações na natureza das tarefas, na distribuição das atividades, na organização dos relacionamentos entre as empresas e na interação entre os funcionários de ambas as partes, além de causar impactos negativos aos trabalhadores na medida em que reforça as relações de dominação e controle social sobre a força de trabalho.
Como consequência, Lourenço (2015) evidenciou que o peso que as novas medidas de austeridade fiscal, acompanhadas da nova lei em tramitação no Congresso Nacional, de n. 4.330, terão para o trabalho e a saúde dos trabalhadores. As Medidas Provisórias ns. 664 e 665, acompanhadas da lei, que permite a terceirização em todas as fases da atividade empresarial, representam os esforços do capital para atingir a maximização da produtividade do trabalho sem efetivar investimentos nas inovações tecnológicas e de infraestrutura dos empreendimentos.
Sobre esse aspecto, as pesquisas sobre terceirização indicam que a precarização social do trabalho, além de se tornar uma temática central dos estudiosos, revela-se uma estratégia de dominação que atinge a todos os trabalhadores, mesmo que de forma diferenciada e hierarquizada, como parte da dinâmica de desenvolvimento do capitalismo flexível no contexto da globalização e da hegemonia neoliberal (DRUCK, 2016). Nesse contexto, surge-nos a seguinte pergunta de pesquisa: quais os efeitos da aplicabilidade da Lei 4330/04 pelos gestores de saúde, os trabalhadores do Sistema Único de Saúde?
Existe uma grave crise enfrentada pelo capitalismo a partir da década de 1970 que levou a sua reorganização com vistas à retomada do patamar de acumulação e à dominação global. Como consequência, houve a intensificação dos processos de trabalho existentes e a criação de novas formas de relações do trabalho. Ainda que essas transformações tenham se iniciado nas indústrias, elas vêm se expandindo para todos os setores da sociedade, incluindo serviços públicos voltados para as necessidades básicas da população, como os de educação e saúde (BERNARDO, VERRDE; PINZON, 2013).
Na linha da reforma do Estado, a Lei de Responsabilidade Fiscal de 2000, cujo objetivo principal para o controle das contas públicas é reduzir as despesas com o funcionalismo público, inibiu a realização de concursos públicos e incentivou a terceirização, pois as despesas com a subcontratação de empresas e com a contratação temporária, emergencial e de comissionados não são computadas como despesas com pessoal (DRUCK, 2016).
Com isso, criou-se e ampliou-se a diversidade de modalidades de terceirização na esfera pública, a exemplo de: concessão, permissão, parcerias, cooperativas, organizações não governamentais (ONGs), OSs e organizações da sociedade civil de interesse público (Oscips). Constituiu-se assim um quadro em que parte dos serviços públicos é realizada não mais pelo servidor público, profissional concursado, mas pelos mais diferentes tipos de trabalhadores, em geral empregados de forma precária, com contratos por tempo determinado, por projetos, sem os mesmos direitos que o funcionário público.
A questão é que estudos indicam que os trabalhadores terceirizados não se sentem pertencentes à empresa, que os gerentes da empresa contratante esperam que eles ainda ajam como subordinados, e que a exigência de comportamentos de flexibilidade, troca de informações e solidariedade no ambiente de trabalho afetam negativamente a percepção de ambiguidade de papéis (MANDARINI; ALVES. STICCA, 2016).
E mais, o medo do desemprego foi evidenciado nessa categoria como o principal elemento que favorece a perda da identidade individual e coletiva do trabalhador. A inconstância no emprego, a fragilidade dos vínculos, a falta de proteção dos contratos podem gerar esse tipo de sentimento que acarreta em preocupações para o trabalhador e dificulta o planejamento da sua vida individual e familiar (DASMACENA; VALE, 2020).
A relevância do estudo está e trazer à luz das discussões acadêmicas os efeitos da aplicabilidade da política de terceirização do trabalhador da saúde no Brasil afim de que possamos analisar sua constitucionalidade, uma vez que estudos indicam os efeitos negativos sobre o profissional o que vai de encontro com o que rege a política trabalhista e a política de saúde brasileira. Para tanto, o objetivo desse estudo foi identificar os efeitos da aplicabilidade da Lei 4330/04 nos trabalhadores de saúde do sistema público de saúde no Brasil.
2 Metodologia
Tratou-se de uma pesquisa de revisão bibliográfica, com abordagem qualitativa, descritiva.
Para esta revisão, depois de escolhido a questão norteadora do estudo, utilizamos títulos disponíveis nas bases de dados dispostas na internet como Scielo, BVS e Google acadêmico, onde utilizaremos termos como “terceirização”, “efeitos”, “trabalhador da saúde” e “constitucionalidade” para efetivação da busca por artigos, dissertações e teses que enfatizavam a temática estudada publicadas a partir de 2000 (Figura 1).
A seleção dos referenciais utilizados nessa pesquisa foi realizada após a criteriosa leitura dos títulos e resumos das referencias identificadas. Após a leitura, utilizamos o Formulário 1, desenvolvidos para este estudo, na qual coletamos os seguintes dados para inclusão do estudo nessa pesquisa: autor, data da publicação, título, objetivo do estudo, resultados e conclusão.
Para a fase da construção da discussão dos resultados e referencial teórico, realizamos a análise dos artigos selecionados para, em seguida, comparamos os dados evidenciados após a leitura dos artigos e acrescentarmos ao referencial teórico. Nessa fase, também foi possível identificar possíveis lacunas do conhecimento, assim como evidenciarmos pontos essenciais para estudos futuros. Os resultados foram apresentados na conclusão do estudo de forma clara e concisa, buscando responder a problemática do estudo com ênfase nos objetivos propostos.
3 O trabalho no serviço público de saúde
O SUS - é um dos maiores sistemas públicos de saúde do mundo, sendo o único a garantir assistência integral e completamente gratuita para a totalidade da população, abrangendo os 5.565 municípios brasileiros, distribuídos pelos 27 estados das cinco regiões geográficas. Uma particularidade da área da saúde é o uso intenso e diversificado de mão-de-obra, o que faz o setor absorver com muita rapidez as transformações do mercado de trabalho em geral. Tentativas de classificação de estabelecimentos, no sentido de criar grupos mais homogêneos da força de trabalho, têm-se mostrado uma tarefa nem sempre exitosa (MACHADO; OLIVEIRA; MOYSES, 2011).
Desde a promulgação da Lei Orgânica da Saúde, leis nºs. 8.080 e 8.142/90, a questão da força de trabalho em saúde no Sistema Único de Saúde (SUS) tem sido apontada como um dos seus nós críticos, sem, com isto, merecer o devido tratamento no que diz respeito à sua organização e gestão em nível nacional (FERREIRA, 2004).
Bernardo et al. (2013) afirma que a grave crise enfrentada pelo capitalismo a partir da década de 1970 levou a sua reorganização com vistas à retomada do patamar de acumulação e à dominação global. Como consequência, houve a intensificação dos processos de trabalho existentes e a criação de novas formas de relações do trabalho. Ainda que essas transformações tenham se iniciado nas indústrias, elas vêm se expandindo para todos os setores da sociedade, incluindo serviços públicos voltados para as necessidades básicas da população, como os de educação e saúde.
Sobre a precarização do trabalho do setor saúde, Damascena e Vale (2020) relataram que esta afeta diretamente a população, dificultando o acesso aos serviços, além de expor os usuários às condições precárias, o que repercute negativamente na segurança do paciente. Afeta também os trabalhadores, dado que os baixos salários, déficit de recursos e insumos, ambiente de trabalho inadequado e carga horária excessiva se constituem como motivos que geram insatisfação, desmotivação e sofrimento psíquico. Nesse cenário, emergem tendências de conflitos nas relações interpessoais enfraquecimento dos vínculos e modificações nos níveis de comprometimento do trabalhador, produzindo crise no processo de trabalho, distanciamento do seu objeto de trabalho, podendo resultar em baixa eficácia do seu cuidado.
Vale ressaltar que trabalhador da saúde é todo aquele se insere direta ou indiretamente na prestação de serviços de saúde, no interior dos estabelecimentos de saúde ou em atividades de saúde, podendo tendo ou formação específica para o desempenho de funções atinentes ao setor (PEREIRA, 2004). O medo do desemprego atenuou a capacidade combativa. Mais e mais empresas se transferem para áreas com baixa atividade sindical, com mão-de-obra barata e fartos incentivos fiscais propiciados pelo Estado (LIMA; COCKELL, 2008).
Nos serviços de saúde, ocorre a sobrecarregadas pela elevada demanda de atividades desenvolvidas no trabalho e pelo subdimensionamento de toda equipe. O déficit de recursos humanos gera excessiva carga de trabalho, acúmulo de atividades e um ritmo acelerado, que pode levar à exaustão profissional e prejudica a qualidade do atendimento prestado aos usuários (DAMASCENO; VALE, 2020).
Lima e Cockell (2008), relataram que demonstra que entre 1995 e 2005 houve um crescimento das formas de contratação dos servidores não-efetivos de 8,9%, em 1995, para 18,3%, em 2005, contrariando a lógica das decisões da Constituição de 1988 e do Regime Jurídico Único, que estabeleciam o concurso público como forma de ingresso no serviço público.
No entanto, é importante relatar que na linha da reforma do Estado, a Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, cujo objetivo principal para o controle das contas públicas é reduzir as despesas com o funcionalismo público, inibiu a realização de concursos públicos e incentivou a terceirização, pois as despesas com a subcontratação de empresas e com a contratação temporária, emergencial e de comissionados não são computadas como despesas com pessoal (DRUCK, 2016).
4 Terceirização no setor público de saúde
A terceirização de serviços no setor público tem se colocado como uma alternativa à reestruturação produtiva do Estado. Embora já utilizada no século XIX no contexto privado, no âmbito público a terceirização passou a se desenvolver de maneira acelerada a partir da década de 1990, após a reorganização do setor público, pautada na transferência de atividades consideradas de não exclusividade do Estado para o setor privado. Neste contexto, as atividades mais frequentemente terceirizadas são denominadas atividades-meio, que consistem em partes do processo de apoio à produção do bem ou serviço oferecido pela organização, ou seja, atividades auxiliares, como serviços de limpeza, segurança e informática (STICCA; SILVA; MANDARINI, 2019).
Constituiu-se assim um quadro em que parte dos serviços públicos é realizada não mais pelo servidor público, profissional concursado, mas pelos mais diferentes tipos de trabalhadores, em geral empregados de forma precária, com contratos por tempo determinado, por projetos, sem os mesmos direitos que o funcionário público (DRUCK, 2016).
Nesse sentido, Oliveira et al., (2018), mencionaram que ancoradas nos princípios neoliberais em voga desde os anos 1990, as mudanças na gestão foram transplantadas das empresas para os serviços públicos, desvirtuando sua natureza e função com modelos orientados para a produção e a comercialização. Em nome de uma suposta eficiência e de melhorias na qualidade, tais princípios, dentre os quais destacamos a flexibilização, têm sido implantados indiscriminadamente e vêm abrindo, progressivamente, terreno para a precarização do trabalho nos serviços públicos brasileiros.
Isso implica não somente no aumento de trabalhadores subcontratados, mas a redução dos empregados contratados diretamente pelas empresas. Trata-se de um fenômeno mundial, alcançando todos os tipos de trabalho, na indústria, comércio e serviços, apresentando-se sob diversas formas de regulação e legislação nos diferentes países (LIMA, 2010).
Ferreira (2004) divulgou que um importante documento para o subsídio da discussão realizada é o “Parecer sobre terceirização e parcerias na saúde pública”, do Subprocuradorgeral da República Wagner Gonçalves em 1998. O mesmo apresenta o quadro nacional de terceirizações e parcerias na saúde pública e esclarece que, sob a denominação de “convênio”, o que realmente está sendo realizado na saúde pública é a terceirização (via contratos) da prestação de serviços na área da saúde pública, em sua atividade-fim. Ainda este parcer afirma que o que vem sendo feito na saúde pública é a realização de contratos, através de pagamento, proveniente dos cofres públicos, a setores privados pela prestação de serviços na área de saúde. Segundo o documento deste cprocurador, essa terceirização é “ilegal e inconstitucional, por atentar contra as leis nºs. 8.080/90 e 8.152/90”.
Para Lourenço (2015), as mudanças ora propostas, que restringem os direitos trabalhistas e previdenciários, expressam o rompimento do ciclo civilizacional proposto pelo capitalismo a partir das lutas entre capital e trabalho, significam, entre outros, os limites do projeto civilizacional burguês. É a derruição dos limites outrora impostos à extração da mais-valia absoluta. A terceirização remete ao ciclo inicial da industrialização capitalista, combina elementos de más condições de trabalho, baixos salários e aumento da jornada. Portanto, tem consequências arrasadoras sobre o trabalho e as representações sindicais.
“Precarização” compreendida como a piora geral das condições de trabalho e de vida decorrente da ruptura do modelo taylorista-fordista, da busca pela redução de custos de produção e pelo retorno às ideias liberais, principalmente a de estado mínimo, o que engloba a fragilização dos vínculos de trabalho, a perda de direitos, o enfraquecimento das políticas de proteção social, a degradação dos ambientes de trabalho, a intensificação das formas de exploração, a desarticulação política dos trabalhadores (Oliveira et al., (2018).
Ainda nesse sentido, a precarização, ou processo de precarização, vincula-se a uma maior desregulamentação da utilização da força de trabalho com a redução de postos de trabalho, a intensificação do trabalho e mudanças nos contratos nos quais se tenta enxugar os custos com direitos trabalhistas e sociais nas relações salariais (LIMA, 2010).
Para Dasmascena e Vale (2020), a precarização do trabalho é o modo de dominação que institui uma situação generalizada e permanente de insegurança, com o objetivo de obrigar os trabalhadores à submissão e aceitação da exploração.
Tradicionalmente, as modalidades de especialização do trabalho, os critérios de permanência e mobilidade dos funcionários, assim como o caráter da tradição cultural, refletem a solidez e a estabilidade dos vínculos de trabalho nos serviços de saúde pública, os quais têm se caracterizado por conter disciplinas e profissões vocacionais baseadas em critérios éticos e de valor social. Esses espaços conferiam ao trabalho um estilo de independência e liberdade de exercício das atividades, sem as pressões e a ingerência do "mercado" (BERNARDO et al., 2013).
Ainda Bernardo et al. (2013), tradicionalmente, as modalidades de especialização do trabalho, os critérios de permanência e mobilidade dos funcionários, assim como o caráter da tradição cultural, refletem a solidez e a estabilidade dos vínculos de trabalho nos serviços de saúde pública, os quais têm se caracterizado por conter disciplinas e profissões vocacionais baseadas em critérios éticos e de valor social. Esses espaços conferiam ao trabalho um estilo de independência e liberdade de exercício das atividades, sem as pressões e a ingerência do “mercado”.
Segundo Andreazzi e Bravo (2014), as mudanças da gestão dos programas e unidades de saúde do Estado, nos anos recentes, por meio dos chamados novos modelos de gestão, trazem desafios importantes sobre a configuração do sistema de saúde brasileiro.
A terceirização pode ser definida como o ato de transferir a responsabilidade de um serviço, ou de determinada fase da produção ou comercialização, de uma empresa para outra. Isso possibilita que a empresa centre-se na realização de algumas ações, havendo racionalização e consequente aumento da produtividade. No entanto, a terceirização tem sido mais uma tática de redução de custos, pela exploração de relações precárias do trabalho, do que uma redução dos custos baseados no aumento da eficiência e da produtividade (CHILIDA; COCO, 2004, p.272).
Zamberlan e Siqueira et al., (2005), definem este processo como sendo a busca pela qual a instituição visa alcançar maior e melhor qualidade e produtividade, redução de custos e, desta forma, a atividade deixa de ser realizada pelos funcionários de uma empresa A (instituição hospitalar) para ser transferida aos funcionários de uma empresa B (serviço terceirizado) ocorrendo assim um processo de transferência de funções e/ou atividades podendo incluir tanto as etapas do processo produtivo, ou atividades-fins da chamada "empresa origem" como atividades ou serviços de apoio, também denominados de meios, nestes casos pode-se citar como exemplos: os serviços das lavanderias, de limpeza, manutenção, nutrição, dentre outros.
Para Lima (2010), a terceirização permite flexibilizar o processo produtivo. Trata-se da reorganização da produção com a focalização das atividades fins das empresas e a externalização das demais. As empresas eliminam setores produtivos, administrativos ou de serviços, considerados complementares às suas atividades fins e transferem sua realização para outras empresas, concentrando-se no produto principal.
Já Aquino et al. (2016), entendem a terceirização como processo de vulnerabilização de uma parcela significativa da população, que não encontra um caminho de inserção plena no mercado de trabalho, acarretando, de forma concomitante, uma ausência de acesso a diversos benefícios sociais e bens materiais que a condição de trabalho pleno pode permitir.
A hipótese é de que a terceirização do serviço público no Brasil, além de ser um dos mecanismos mais importantes e eficientes de desmonte do conteúdo social do Estado e de sua privatização, é a via que o Estado neoliberal encontrou para pôr fim a um segmento dos trabalhadores, o funcionalismo público, que tem papel crucial para garantir o direito e o acesso aos serviços públicos necessários à sociedade e, sobretudo à classe trabalhadora, impossibilitada de recorrer a esses serviços no mercado. São várias as modalidades de ataques aos direitos, ao padrão salarial e às condições de trabalho do funcionalismo, consubstanciadas nos ajustes fiscais implantados pelos vários governos desde o início dos anos 1990 até hoje, ajustes esses recomendados e exigidos pelas instituições e classes que representam o capital financeiro globalizado (DRUCK, 2016, p.18).
Há igualmente o aumento da terceirização, não apenas nas formas de contratação, como também na externalização de serviços públicos nas três esferas do governo, motivado por (LIMA; COCKELL, 2008):
1. Promessa de eficácia e eficiência dos métodos de gestão privada, verificados posteriormente como inadequados devido às especificidades do setor público;
2. Possibilidade de driblar a Lei de Responsabilidade Fiscal, uma vez que os gastos com terceirização não são calculados como despesa com pessoal;
3. Facilidade dos administradores em ‘manusear’ a força de trabalho terceirizada em prol das suas finalidades políticas e administrativas; e
4. Inexistência de investimentos, corroborando com o mecanismo de financiamento das campanhas eleitorais.
Segundo Bernardo et al. (2013), a vivência dos trabalhadores terceirizados é permeada por um desgaste mental maior do que a dos funcionários concursados. Entretanto, apesar dessas diferenças de envolvimento e/ou sofrimento no trabalho, as entrevistas indicam que ambos os trabalhadores, cada um a sua maneira, sofrem com a situação imposta pela ideologia neoliberal que busca terceirizar o serviço público de saúde.
A terceirização que vem ocorrendo no serviço público de saúde é exemplar para indicar a renúncia do Estado à sua responsabilidade social e, ao mesmo tempo, revelar a promiscuidade das relações público–privado, com a transferência de altas somas de recursos públicos para instituições privadas, sem qualquer avaliação, planejamento, supervisão ou controle de como esse recurso é utilizado e de quais serviços e por quem e em quais condições estão sendo prestados (DRUCK, 2016).
4 Conclusão
Os serviços de saúde desde a sua reorganização na década de 1990 tem sido ampliado e a necessidade de mão-de-obra trabalhadora é evidente. Em razão disso, os custos com saúde aumentaram, levando os gestores a buscarem formas mais “econômicas” de contratação de pessoal.
A questão é que, essas formas buscadas pelas organizações como processo de facilitação de atendimento e diminuição de custos, podem decorrer em falta de interação intersetorial o que, por vezes, leva à demora nas informações e resolutividade de problemas apresentados.
No mais, observa-se ainda precarização do trabalho, redução ou ausência dos direitos trabalhistas, onde os trabalhadores terceirizados são vistos como inferiores, sem vínculo empregatício, porém, por outro lado, os mesmos evidenciam a injustiça da diferença desses vínculos empregatícios e até a lógica da produtividade.
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Bacharelanda em Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus -CULBRA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, ANA CLAUDIA RODRIGUES DA. Os efeitos da aplicabilidade da Lei 4330/04 no trabalhador da saúde no Brasil: análise da (in) constitucionalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 jun 2021, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56905/os-efeitos-da-aplicabilidade-da-lei-4330-04-no-trabalhador-da-sade-no-brasil-anlise-da-in-constitucionalidade. Acesso em: 22 nov 2024.
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