VALDIVINO PASSOS SANTOS[1]
(orientador)
RESUMO: Em meados dos fins do ano de 2019 o mundo se encontrou em uma situação atípica, causada pelo contágio da Covid-19. Essa situação trouxe um significativo impacto em várias áreas, em especial a da saúde. Nesse sentido, a relação contratual entre o consumidor e as empresas privadas de plano de saúde ficaram vulneráveis diante desse fato. Com isso, o presente estudo tem como objetivo discorrer sobre a função social do contrato de plano de saúde em tempos de pandemia. Busca-se encontrar de que forma esse princípio constitucional aplicado às regras civilistas e consumeristas podem ser preservadas diante da pandemia provocada pela Covid-19. Na metodologia, trata-se de uma revisão da literatura, tendo como base livros, artigos científicos, legislação nacional e jurisprudência. A coleta de dados se deu em banco de dados digitais tais como Scielo, Google Acadêmico, dentre outros, no período do mês de agosto de 2021. Nos resultados, ficou claro observar que no cenário apresentado deve ser analisada de modo particular, ou seja, observando as subjetividades de cada caso, para somente assim encontrar um equilíbrio na relação.
Palavras-chave: Pandemia. Plano de Saúde. Contrato. Covid-19. Legislação.
ABSTRACT: In mid-late 2019, the world found itself in an atypical situation, caused by the Covid-19 contagion. This situation had a significant impact on several areas, especially health. In this sense, the contractual relationship between the consumer and private health insurance companies became vulnerable in view of this fact. Thus, this study aims to discuss the social function of the health plan contract in times of pandemic. It seeks to find how this constitutional principle applied to civil and consumer rules can be preserved in the face of the pandemic caused by Covid-19. In terms of methodology, it is a literature review, based on books, scientific articles, national legislation and jurisprudence. Data collection took place in digital databases such as Scielo, Google Academic, among others, in the period of August 2021. In the results, it was clear that the scenario presented must be analyzed in a particular way, that is, observing the subjectivities of each case, only to find a balance in the relationship.
Keyword: Pandemic. Health Plan. Contract. Covid-19. Legislation.
1 INTRODUÇÃO
O consumidor é o beneficiário do plano privado de assistência à saúde, enquanto as operadoras figuram na qualidade de fornecedoras do serviço prestado. Dessa forma, contratar plano de saúde consiste essencialmente na contratação de um pacote de serviços, havendo vários prestadores, operadoras, profissionais, os quais serão escolhidos.
Nesse tipo de contrato tem-se como base o Princípio da Função Social dos Contratos, que traz em suas cláusulas um cunho assistencial, sendo observada a busca pelo equilíbrio contratual sem, contudo, transformá-las em instrumentos para práticas abusivas que poderão ocasionar danos aos usuários.
Ocorre que desde meados dos fins do ano de 2019 o mundo se encontrou em uma situação atípica, causada pelo contágio da Covid-19 que se tornou uma pandemia. Nesse cenário, onde há calamidade, muita procura e pouca disponibilidade, os contratos de plano de saúde devem, sobretudo, respeitar o princípio acima descrito, uma vez que o foco central é a proteção da vida do consumidor que venha a necessitar de tratamento médico-hospitalar, mesmo em situações em que o usuário não necessite efetivamente do serviço, sendo observada, nesse sentido, a função social do contrato em tela.
Diante disso, o tema apresentado a esse estudo é em relação a função social do contrato de plano de saúde em tempos de pandemia. Para isso, busca-se encontrar respostas para a seguinte problemática: qual o impacto da pandemia na função social dos contratos de plano de saúde?
O estudo do princípio da função social é de suma importância na presente temática, posto que na relação consumerista entre o Plano de Saúde e seus usuários, deve haver proteção da parte hipossuficiente da relação: o consumidor, que frente ao período enfrentado em decorrência da pandemia do Covid-19, tem tido seu direito à saúde mais limitado, como consequência da crescente procura por medicamentos e serviços hospitalares.
Com isso, o objetivo central dessa pesquisa é de analisar os efeitos jurídicos e sociais do cumprimento da função social do contrato de Plano de Saúde em períodos de pandemia. Nos específicos, discute-se inicialmente a base legal que norteia o princípio da função social dos contratos; passando pelos pontos jurídicos a respeito dos contratos de Plano de Saúde. Em seguida faz-se uma contextualização da função social do contrato no período de pandemia, apresentando por fim, os posicionamentos doutrinários e decisões sobre o respectivo tema.
Na metodologia, este estudo classifica-se como um artigo de revisão de literatura onde, haverá avaliações críticas de materiais que já foram publicados, considerando o progresso das pesquisas na temática abordada (KOLLER et al, 2014.). O método utilizado foi o dedutivo.
O presente trabalho recebeu enfoque qualitativo, que é aquele estudo que “utiliza a coleta de dados sem medição numérica para descobrir ou aprimorar perguntas de pesquisas no processo de interpretação” (SAMPIERE et al, 2014, p. 33). Neste estudo utilizou amostras teóricas ou conceituais, que são aquelas voltadas essencialmente para a pesquisa qualitativa.
A busca foi realizada por meio do site de busca Google Acadêmico, Scielo, dentre outros, além de livros e de artigos científicos já publicados, tendo como critérios de inclusão trabalhos publicados entre os anos de 2018 a 2021, nos idiomas inglês e português. Os descritores utilizados foram: Função Social. Contrato. Pandemia. O período de coleta de material foi no mês de agosto de 2021.
2 CONTRATOS COMO INSTRUMENTO DE SEGURANÇA NAS RELAÇÕES NEGOCIAIS
Neste capítulo será tratado a respeito dos contratos, que são, de modo geral, o documento oficial que concede legitimidade e legalidade às relações negociais. Antes de se adentrar no assunto central desse estudo, se torna necessário discorrer sobre a funcionalidade jurídica dos contratos. É importante entender a sua sistemática, para em seguida discuti-lo.
Após a análise sobre os contratos, especifica-o em relação aos contratos de plano de saúde, objeto jurídico central na presente discussão. Posteriormente, discorre-se a respeito da pandemia e como esse cenário pode afetar não apenas a saúde da população, mas também as relações negociais.
2.1 OS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE: ASPECTOS GERAIS
O período de pandemia ao qual o Brasil ainda se encontra trouxe significativos impactos na esfera da saúde, conforme mostrado no tópico anterior. Um dos efeitos dessa situação se situa no que se refere à prestação de saúde de iniciativa privada. Nesse aspecto, encontra-se os planos de saúde disponibilizados por empresas privadas. É nesse contexto que se analisar os principais aspectos dessas empresas nesse tópico.
O plano de saúde, conceitualmente, pode ser entendido como um serviço oferecido por operadoras, empresas privadas, cuja finalidade seja a prestação de assistência médica e hospitalar. A lei brasileira que rege o seu funcionamento é a Lei nº 9.656/98, tendo alguns trechos alterados pela Medida Provisória nº 2.177-44/2001. Em ambas se traz o conceito definitivo do que seja um plano de saúde; aqui transcrito:
Art. 1º [...]
I - Plano Privado de Assistência à Saúde: prestação continuada de serviços ou cobertura de custos assistenciais a preço pré ou pós estabelecido, por prazo indeterminado, com a finalidade de garantir, sem limite financeiro, a assistência à saúde, pela faculdade de acesso e atendimento por profissionais ou serviços de saúde, livremente escolhidos, integrantes ou não de rede credenciada, contratada ou referenciada, visando a assistência médica, hospitalar e odontológica, a ser paga integral ou parcialmente às expensas da operadora contratada, mediante reembolso ou pagamento direto ao prestador, por conta e ordem do consumidor; (...)
(BRASIL, 2001)
Com base no artigo acima, percebe-se que o plano de saúde é ofertado por meio de operadas que, por sua vez, são pessoas jurídicas de direito privado constituídas sob a forma de sociedade civil ou comercial, cooperativa, ou entidade de autogestão, que fornecem produtos ou serviços de Plano Privado de Assistência à Saúde (BRASIL, 1998).
Nota-se também que o presente texto normativo traz a figura do consumidor. O consumidor é o beneficiário do plano privado de assistência à saúde, enquanto as operadoras figuram na qualidade de fornecedoras do serviço prestado. Como esclarece o art. 2º, caput, do Código de Defesa do Consumidor: “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final (BRASIL, 1990, não paginado).
O fornecedor diante do contrato de plano de assistência à saúde é aquele que presta serviços médico-hospitalares pré-pagos ao consumidor, assumindo todos os riscos de ter que arcar com os serviços caso o usuário contratante venha a necessitar deles, devido problemas de saúde (STEINMULLER; FARIAS, 2014).
Dessa forma, contratar plano de saúde consiste essencialmente na contratação de um pacote de serviços, havendo vários prestadores, operadoras, profissionais, os quais serão escolhidos.
O contrato é um dos temas da área civil mais importante, uma vez que é o principal instrumento de celebração de um acordo. Seja em um matrimônio, numa compra e venda e nos casos de adesão à um plano de saúde, é por meio do contrato que o acordo é formalizado e válido.
Em termos conceituais, Ricardo Rizzardo (2020) define contrato como sendo aquele onde há uma vontade recíproca de duas partes (bilateral) ou mais (plurilateral) sobre um mesmo objeto, criando, alterando ou extinguindo direitos e obrigações.
É nos dizeres do nobre doutrinador Flávio Tartuce (2021) um dos fatos que o Código Civil elenca como geradores de obrigações, assim como também as declarações unilaterais da vontade e os atos ilícitos, sendo eles dolosos ou culposos. Os contratos para ser constituído é necessário que se observe uma série de princípios, dentre os quais se destacam os seguintes:
· Princípio da Autonomia da Vontade: é a liberdade de realizar contratos, onde as partes têm a alternativa de solenizar ou não, sem a ingerência do Estado;
· Princípio da Supremacia da Ordem Pública: O Estado é prevalente nos que toca ao interesse Púbico;
· Princípio do Consensualismo: Para ser válido, a celebração do contratual tem que ser consensual, quando as partes têm a mesma vontade de realizar o contrato;
· Princípio da Relatividade dos Contratos: Os efeitos contratuais atingem somente as partes que constituintes do contrato celebrado, não afetando assim terceiros;
· Princípio da Obrigatoriedade dos Contratos: Importa a força da vinculação dos acordos celebrados contratualmente;
· Princípio da Revisão dos Contratos: Existe a possibilidade de questionar judicialmente a alteração de cláusulas que compõe o contrato avençado
· Princípio da Boa fé: A veracidade e a certeza estão presentes nesse princípio, em que as partes tem a obrigação de serem honestos, não só no ato da elaboração do contrato, mas até o seu término.
(GONÇALVES, 2020, p. 32)
Pelos princípios supracitados, há de se destacar dois: o princípio da boa-fé e o da probidade. O art. 422 do vigente Código Civil Brasileiro dispõe que: “os contratantes são obrigados a guardar assim, na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. (BRASIL, 2002).
Aqui, a boa-fé na visão de Gonçalves (2020, p. 50) é um princípio cujo valor extrai-se da honestidade, integridade de caráter, no seu aspecto subjetivo, “conspurcando a moralidade, a honestidade, a lisura dos negócios jurídicos, o desempenho legítimo e reto do comportamento humano”.
Para Rizzardo (2020) a boa-fé é um pressuposto moral ao qual estabelece que as partes contratantes tenham uma postura leal para o cumprimento das obrigações, tendo como base o brocado romano neminem laedere (não lesar o próximo). Pela probidade, invoca-se o cumprimento dos deveres e obrigações encontrados no seio do contrato, ou seja, o seu cumprimento.
Já no Princípio da boa-fé, no esclarecimento de Canto (2016), pode ser definido como um comportamento fiel diante o desempenho de cada uma das partes contratantes, frente ao dever das partes de agirem com honestidade e lealdade, compatibilizando os interesses aparentemente opostos e ainda garantindo o desenvolvimento da ordem econômica e social.
2.2 PANDEMIA COMO FATOR DE DESEQUILIBRIO NAS RELAÇÕES CONTRATUAIS ENVOLVENDO SAÚDE
Para melhor compreensão da discussão da temática proposta por esse estudo, se faz necessário tecer algumas linhas gerais sobre o novo cenário encontrado na área da saúde que afetou outras áreas. In casu, estar-se a falar sobre a pandemia global existente em razão da expansão do contágio da Covid-19.
Em meados de 2019 ocorreu na China uma contaminação de um vírus oriundo de morcegos. Até o momento não se sabe como esse vírus surgiu e de que forma ele se desenvolveu. Ocorre que no ano de 2020 tal vírus se espalhou pelo mundo, ocasionando numa pandemia global. Esse vírus ficou denominado de Coronavírus.
O Coronavírus faz parte da família de vírus (CoV) e pode causar uma série de efeitos aos seus portadores, tais como resfriados, febre, tosse chegando até mesmo a doenças mais graves como a Síndrome Aguda Respiratória Severa (SARS) e a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS). (ZHANG, 2020).
Esse novo coronavírus recebeu a denominação SARS-CoV-2 pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e a doença que ele provoca ficou conhecida como Covid-19. Desde a sua expansão em território global, o coronavírus tem causado prejuízos de toda ordem, seja social, financeiro, cultural, etc. Ainda vai demorar décadas até de fato dimensionar o seu impacto (MEDEIROS, 2020).
Desde que fora descoberta e expandida, milhares de cidadãos têm sido mortos diariamente ao redor do mundo. Hospitais lotados são apenas um exemplo de como essa doença impactou e ainda assombra a sociedade. Mesmo que não se tenha a cura definitiva, a aplicação de vacinas tem sido amplamente defendida como uma importante medida de prevenção.
O fato é que a sociedade global se modificou com a existência da Covid-19. O novo ‘normal’ nos dias de hoje é a utilização constante de máscara, a aplicação de álcool em gel, o distanciamento entre indivíduos e principalmente o isolamento social, conhecido como “fique em casa”.
É nesse aspecto que a Covid-19 mais pode ser sentida pela população. Ao ter o comércio, escolas e demais estabelecimentos fechados, o isolamento social provocado pela Covid-19 trouxe uma mudança radical na convivência familiar. No período mais crucial do contágio, o comum era ter todos os membros da família no mesmo local durante um longo período (PEREIRA, 2020).
Todavia, é na área da saúde que o impacto desta doença é mais sentido. Hospitais lotados, falta de leitos, atraso no atendimento, perigo de contágio, ausência de estrutura e de medicamentos disponíveis, dentre outros, são apenas um exemplo do enorme agrupamento de problemas enfrentados por essa área na saúde.
Ao analisar a pressão sobre o sistema de saúde no Brasil decorrente da demanda adicional gerada pela COVID-19, Noronha et al. (2020) mostram que existe uma situação bastante alarmante do sistema para atender uma demanda em potencial, uma vez que diversas microrregiões e macrorregiões de saúde operariam além de sua capacidade, comprometendo o atendimento a pacientes principalmente aqueles com sintomas mais severos.
O fato é que o mundo todo não esperava encontrar a descoberta do coronavírus e sua expansão. Em especial no Brasil, a chegada desta doença acabou por escancarar os inúmeros problemas do sistema de saúde, que se já eram frágeis, ficou ainda mais complicados e difíceis de superar (BARRETO et al. 2020).
Essa nova realidade, conforme cita Sodré (2020) exigiu um planejamento imediato do Ministério da Saúde brasileiro. Dentre as alternativas que se encontrou no atual contexto era a de expandir os leitos disponíveis, uma vez que os disponíveis já estavam lotados. Nesse sentido, foi necessário – diante do crescimento do número de casos e de mortes – utilizar os leitos dos estabelecimentos de saúde do setor privado.
Rache et al. (2020) explicam que a utilização dos espaços de hospitais privados foi essencial para que se pudesse amortecer o déficit de demanda. Apesar da junção do setor público e privado para combater o crescimento das demandas, esse fato não deixou de receber críticas quanto a sua real intenção. Sobre isso, importante destacar as seguintes palavras:
[...] Além da baixa execução orçamentária dos recursos, em outra frente de atuação, na relação com os serviços privados, o ministério desonerou os planos de saúde quando muitos começaram a não se colocar disponíveis para atender casos da Covid-19. O até então Ministro da Saúde, Luiz Mandetta, em regime de emergência, abriu as negociações com os hospitais privados e, desta forma, os governadores iniciaram uma compra desordenada de leitos. Esses mesmos hospitais colocaram os preços mais diversos (e dispendiosos) para venderem seus serviços para as secretarias estaduais. Leitos de UTI, enfermarias, insumos, materiais médicos, equipamentos de proteção individual (EPIs) e medicamentos não passaram por regulações que caberiam ao âmbito federal, autorizando os estados a mergulharem nesse momento de crise epidêmica em um mercado de compra e venda de equipamentos e serviços completamente desregulamentados (SODRÉ, 2020, p. 03).
Ao discorrer sobre essa questão, Bahia; Scheffer (2018) lembram que os maiores monopólios do mercado privado da saúde ainda se mantem como os mais rentáveis diante do caos provocado pela pandemia. São grupos de iniciativa privada, incluindo aí as empresas de plano de saúde, que enriqueceram no período de pandemia, principalmente na venda de leitos para os Estados.
Em que pese as críticas necessárias sobre a real utilização do setor privado na pandemia provocada pela Covid-19, o fato é que esse setor também se viu impactado pela atual situação, principalmente as empresas de plano de saúde, que frente ao número de adesão (e também a queda) teve que se adaptar ao novo cenário. A respeito dessa questão, discute-se mais adiante. Antes, contudo, analisa-se os aspectos gerais dos contratos de plano de saúde no Brasil, como mostra o tópico a seguir.
3 FUNÇÃO SOCIAL DOS CONTRATOS DE PLANO DE SAÚDE NA PANDEMIA
O Princípio da Função Social dos Contratos certamente é um dos principais desse instituto, porque trazem nas suas cláusulas um cunho assistencial, sendo, portanto, observada a busca pelo equilíbrio contratual sem, contudo, transformá-las em instrumentos para práticas abusivas que poderão ocasionar danos aos usuários.
Nesse aspecto:
Trata-se, sem sombra de dúvida, do princípio básico que deve reger todo o ordenamento normativo no que diz respeito à matéria contratual. O contrato, embora aprioristicamente se refira somente às partes pactuantes (relatividade subjetiva), também gera repercussões e - por que não dizer? – deveres jurídicos para terceiros, além da própria sociedade, de forma difusa (MIRANDA, 2018, p. 63).
Pedras Júnior (2018, p. 44) explica que a função social “é a relação dos contratantes com a comunidade, uma vez que gera consequências a outrem. O efeito principal da função social dos contratos é a ineficácia de relações que acaba por ofender interesses sociais, a dignidade da pessoa”.
Com isso, a função social do contrato busca, sobretudo, servir os objetivos da pessoa humana. É um princípio que encontra raiz no texto constitucional (art. 5º XXIII), porque nele se encontra o princípio basilar de todo o ordenamento jurídico brasileiro: o princípio da dignidade da pessoa humana, ao qual impõe o respeito à todo o indivíduo, em sua totalidade.
Em relação a sua natureza jurídica, a função social deve ser vista como a formalização de um contrato onde não pode haver onerosidade excessiva, desproporção e injustiça social. Também não deve infringir interesses individuais que englobam a tutela da dignidade humana (BASSO, 2018).
Na concepção de Albuquerque (2020), a função social promove a realização de uma justiça comutativa, dizimando as desigualdades substanciais entre os contraentes. Se encontra normatizado no art. 421 do Código Civil atual, onde deixa claro que o contrato será celebrado em razão e nos limites da função social.
Dantas (2016) explica que a função social se encontra na legislação brasileira pelo fato de que o legislador entendeu que fosse necessário preservar o equilíbrio das relações contratuais, ou seja, que cada negócio jurídico o bem estar de cada parte seja preservado. Segundo Tepedino; Konder; Bandeira (2020) a função social tutela os direitos coletivos e difusos diante das relações privadas, incluindo aí as relações de posse e propriedade.
Por ser um instituto de difícil entendimento e de aplicabilidade, cabe ao Magistrado entender de que modo esse princípio será aplicado. Nesse sentido, destaca-se a seguinte explicação:
O artigo 421 do CC deixa claro que a vontade do legislador ao limitar a liberdade das partes no que for relativo aos efeitos causados à coletividade. [...] o juiz poderá preencher os claros do que significa essa "função social", com valores jurídicos, sociais, econômicos e morais. A solução será dada diante do que se apresentar, no caso concreto, ao juiz. Poderá, por exemplo, proclamar a inexistência do contrato por falta de objeto; declarar sua nulidade por fraude à lei imperativa (CC, art. 166, VI), porque a norma do art. 421 é de ordem pública (CC, art. 2.035, parágrafo único); convalidar o contrato anulável (CC, arts. 171 e 172); determinar a indenização da parte que desatendeu a função social do contrato etc. (GONÇALVES, 2020, p. 55).
De todo modo, para melhor compreensão do que seja o princípio da função social, basta apenas entender que caso ele não existisse, os negócios jurídicos poderiam facilmente trazer danos e prejuízos a alguma das partes, ao meio ambiente e à sociedade. E esses danos dificilmente seriam revertidos ou consertados sem a presença desse instituto, que por sua vez, impõe os contratos não celebrados com essa finalidade não possui validade.
O contrato privado de plano de assistência à saúde visa proteger a vida da pessoa que venha a necessitar de tratamento médico-hospitalar, mesmo em situações em que o usuário não necessite efetivamente do serviço. Nesta relação entre o consumidor e uma operadora de plano de assistência à saúde, as cláusulas contratuais já se encontram pré-estabelecidas sendo que o consumidor adere aos termos da contratação sem que lhe haja a possibilidade de alterá-las ou modificá-las.
Ocorre que o atual momento vivenciado pelo mundo, tem trazido a discussão sobre o cumprimento do princípio da Função Social. Num contexto atual, onde se encontra um cenário de calamidade pública na área da saúde, com leitos lotados, hospitais sem equipamentos suficientes, falta de medicamentos, aumento do contágio de Covid-19, dentre outros problemas, assuntos relacionados à saúde e consequentemente a responsabilização dos planos de saúde vem à tona.
Muito das discussões que recaem sobre os Planos de Saúde dizem respeito ao seu custo. Isso se explica pelo fato de que, “os planos de saúde de modo geral possuem altos valores, segmentando o seu público final” (VITAL, 2020, p. 01). Com isso, o que se nota é um aumento de uso e de pedidos aos Planos de saúde em período de pandemia.
Diante do quadro fático que se apresenta, a jurisprudência brasileira, por exemplo, tem se posicionado no sentido de para que haja o cancelamento de plano de saúde em razão do não-pagamento das mensalidades pelo usuário durante a epidemia, é necessária, antes, a concessão de prazo razoável para regularização. É preciso considerar a crise econômica e sanitária, principalmente quando a segurada é pessoa idosa (VITAL, 2020).
Nessa senda, nasce a importância de se ressaltar a função social dos contratos, conforme conceituado anteriormente. Conforme ensina Gomes (2016, p. 260) “deve-se primar sempre pela conservação do contrato, pois este exerce função social de relevância essencial para os seus usuários, que se sobrepõe ao mero interesse financeiro presente na relação, quais sejam, a proteção e promoção do direito fundamental à saúde”.
Consoante excerto de recente decisão monocrática proferida pela Ministra Maria Isabel Galotti do Superior Tribunal de Justiça:
[...] Observo, de outra parte, que a Organização Mundial de Saúde declarou a pandemia do Covid-19, o que ensejou edição de decreto de calamidade pública no Brasil desde o dia 20.3.2020, circunstância que também desaconselha a suspensão do contrato de plano de saúde dos requerentes no presente momento, especialmente em razão de contarem eles com mais de 60 anos idade (fls. 18-19) e, portanto, estarem incluídos no grupo de risco em caso de serem infectados pelo vírus. Ressalto que, em decorrência dessa situação absolutamente peculiar vivenciada pela população brasileira (e do mundo), a Procuradoria-Geral da República consultou a Agência Nacional de Saúde Suplementar - ANS sobre as providências a serem adotadas para garantir “a continuidade da prestação de serviços aos segurados que, porventura, percam as condições de manter o pagamento de suas mensalidades em dia durante esse período de calamidade pública”. Diante disso, ao que tudo indica, a agência reguladora decidiu recomendar aos operadores de plano de saúde que não suspendam ou rescindam os contratos de planos de saúde de usuários inadimplentes há mais 60 dias, conforme notícias veiculadas na imprensa [...] (grifo do autor)[2]
Pela decisão acima, verifica-se que a magistrada reconheceu a vulnerabilidade do casal de idosos e os riscos potencializados pela pandemia, assegurando-lhes a garantia existencial à saúde e a expectativa dos consumidores em detrimento da escolha da seguradora, esta que continuará recebendo os valores contratado.
Como mostra esse julgado, houve o respeito ao princípio da função social dos contratos, o direito social à saúde e mitigar nessas situações específicas a autonomia das seguradoras para, com isso, proteger os consumidores em meio às incertezas da pandemia.
Continuando, a jurisprudência tem entendido que diante de uma situação crítica a qual todos os cidadãos estão passando devido ao Covid-19, o risco não é a manutenção do contrato em si, mas sim a preservação da saúde, do bem-estar e, logo, da vida do consumidor.
Também nesse cenário, imperioso destacar que durante a pandemia as empresas de Plano de Saúde tiveram alguns deveres elencados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS); a saber:
QUADRO 1 – Deveres das empresas de Plano de Saúde na Pandemia
OBRIGAÇÃO |
DESCRIÇÃO |
Realização dos testes do Coronavírus |
Os planos de saúde devem garantir que seus associados sejam submetidos aos exames para detecção da Covid-19, quando indicado por profissional médico. No entanto, é válido salientar que a obrigatoriedade se dá apenas para casos de pacientes internados. Nestes casos, além de ofertar o teste para confirmação da contaminação, o plano de saúde deve arcar com todos os custos, tratamentos e medicamentos utilizados durante a internação por Covid-19. |
Atendimento via Telemedicina |
Com autorização foi assinada pelo Conselho Federal de Medicina, através da Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, os planos de saúde são obrigados a custear as consultas via telemedicina quando este for o método mais indicado para a continuidade do acompanhamento do segurado. |
Cumprimento de carência |
Para pacientes que buscam atendimento por covid-19, todos os exames relacionados à enfermidade, desde testes a exames complementares e internações, devem ser efetuados, já que se trata de uma condição de emergência. Neste cenário, a carência máxima de 24 horas deve ser respeitada, garantindo a preservação à vida e a saúde do paciente (Norma Técnica nº 23/2021). |
Prazos máximos para atendimento |
Para consulta eletivas, o prazo máximo foi estendido de 7 para 14 dias. Já as internações eletivas, que antes deveriam ser liberadas em até 21 dias, foram estendidas de acordo com a capacidade de resposta da operadora de saúde. Vale destacar que a medida foi adotada visando a diminuição da aglomeração de pacientes em salas de espera de consultórios, bem como o comprometimento de vagas de internação clínica e intensiva – reservando-as para pacientes urgentes, infectados pelo novo coronavírus.[3] |
Internações |
Com base no disposto no artigo 12, inciso II, alínea "d", da Lei 9656/98, os planos também devem cobrir internações (em leitos hospitalares e UTI) e terapias que podem ser empregadas no tratamento de problemas causados pelo coronavírus. |
Fonte: BRASIL (2020).
Cabe destacar que dentro do contexto aqui analisado há a inclusão da Teoria da Imprevisão. Na legislação brasileira, conforme mostra o art. 478, nos contratos de natureza continuada ou diferida (Plano de Saúde, por exemplo), caso haja uma desvantagem na relação contratual entre as partes em razão de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, o contrato poderá ser revisto ou o devedor pode pedir a sua resolução (TUCCI, 2020).
Pelo texto do artigo acima mencionado, note-se que a presença de fato imprevisível é condição essencial para que o contrato seja resolvido ou revisado. Ao estabelecer o conceito da Teoria da Imprevisão, tem-se:
Evento imprevisível são acontecimentos estranhos, independentes da vontade das partes, que elas não podem prever e que de tal forma alteram as circunstâncias que, na execução, o contrato deixa de corresponder, não só à vontade dos contratantes, como à natureza objetiva dele (FARO; LIMA; VIEIRA, 2020, p. 01).
A IV Jornada de Direito Civil, aprovou-se o Enunciado nº 366, onde trouxe o seguinte entendimento: o fato extraordinário e imprevisível causador da onerosidade excessiva é aquele que não está coberto objetivamente pelos riscos próprios da contratação (TUCCI, 2020).
A base ao qual se encontra a Teoria da Imprevisão e também o da Onerosidade Excessiva está na necessidade de “atender ao princípio da justiça contratual, que impõe o equilíbrio das prestações nos contratos comutativos, a fim de que os benefícios de cada contratante sejam proporcionais aos seus sacrifícios” (ROSENVALD, 2013, p. 530).
Em razão desse conceito, entende-se que guerras, tragédias ambientais, depressões econômicas, entre outros eventos globais, se enquadrem no que seja um acontecimento imprevisível. Nesse sentido, uma pandemia também pode ser mencionada.
A pandemia global da Covid-19 é um exemplo claro de evento extraordinário, ao qual nenhum indivíduo poderia prever. Inclusive, importante citar, que esse fato é fundamental para caracterizar a revisão de um contrato. Como bem explica Tucci (2020) para alterar, revisar ou resolver um contrato no caso em tela é preciso que haja repercussão direta no equilíbrio das obrigações pactuadas e que a situação extraordinária não tenha contribuição das partes.
Estabelecido a Teoria da Imprevisão, fica mais claro observar que os contratos de plano de saúde devem ser revisados durante a pandemia. Isso porque:
- há a possibilidade de as empresas de plano de saúde aumentarem o valor das prestações em decorrência da instabilidade econômica causada pela pandemia e;
- a pandemia causou (e ainda causa) significativo impacto na prestação de saúde, principalmente ao consumidor.
Nos casos da relação entre uma empresa de Plano de Saúde e o consumidor pode haver a falta de pagamento das prestações. Nesse contexto, tem-se entendido também que se deve pesar um equilíbrio na relação contratual diante da pandemia.
Nesse ponto, a Agência Nacional de Saúde (ANS) determinou a suspensão de reajustes nos valores de todos os planos de saúde no período de setembro a dezembro de 2020, em razão da pandemia do novo Coronavírus. Com efeito, nos termos do Comunicado nº 85, de 31 de agosto de 2020, a Diretoria Colegiada da ANS, visando mitigar os efeitos provenientes da atual pandemia, bem como visando manter o equilíbrio das relações negociais e garantir a continuidade e a qualidade da prestação de assistência à saúde dos consumidores dos planos de saúde, determinou a suspensão, por 120 dias, a partir de setembro, da aplicação de reajustes anuais e por mudança de faixa etária para todos os tipos de plano de assistência médico-hospitalar (individual/familiar e coletivos - por adesão e empresariais). (BRASIL, 2020).
É compreensível que não se pode obrigar uma seguradora de suspender as cobranças das suas mensalidades; no entanto, em período de pandemia da Covid-19, a situação econômica de milhares de brasileiros, assim como o comércio, ficou instável. Soma-se a isso, a urgência em se ter uma prestação de saúde, uma vez que a Covid-19 ainda não possui cura, mas seus efeitos no corpo e na mente humana são rápidos e mortais.
Nesses casos, caso haja a suspensão do plano de saúde em período de pandemia, ela pode ser considerado, inclusive como prática abusiva. É o que mostra o seguinte julgado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO D EOBIRGAÇAÕ DE FAZER. PLANO DE SAÚDE. INDEFERIMENTO. DO PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA PARA DETERMINAR O RESTABELECIMENTO DO CONTRATO DO PLANO DE SAÚDE. INCOFORMISMO. CABIMENTO. PRESENÇA DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA AO CASO. A suspensão ou o cancelamento do plano de saúde por inadimplência durante a pandemia da COVID-19 pode, em tese, caracterizar prática abusiva. A observância da boa-fé objetiva, equilíbrio na relação de consumo e função social do contrato. Ausência de demonstração de notificação do devedor para purgar a mora. Artigo 13, II, da Lei 9.656/98 e Súmula n. 94, desta C. Corte. Restabelecimento do contrato de plano de saúde. Decisão reformada. Agravo provido. (TJ-SP – AI:21456366520208260000 SP 2145636 – 65.2020.8.26.0000, Relator: Pedro de Alcântara da Silva Leme Filho, Data de Julgamento: 29/08/2020, 8º Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/08/2020). (grifo meu)
Com isso, fica evidente que uma rescisão de contrato de plano de saúde, por inadimplência do beneficiário, durante a pandemia de COVID-19, “afora a crueldade que encerra, coloca em risco a dignidade da pessoa humana, a saúde e, ao fim e ao cabo, a própria vida, o que não se pode admitir” (SALVINI, 2021, p. 02).
O que se defende nesse estudo, é de que num período de pandemia, as empresas de Plano de Saúde devem ter uma atenção especial para os seus clientes, haja vista que a expansão da Covid-19 é considerada uma situação de emergência, que implica risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis ao paciente, revelando-se obrigatória a cobertura, não se podendo admitir a rescisão do contrato ainda que por inadimplência, posto que decorrente de força maior (SALVINI, 2021).
Entretanto, também é imperioso aferir que por outro lado, deve-se atentar para a situação das empresas de Plano de Saúde, que de igual modo também sofreram e ainda sofrem abalos financeiros e estruturais oriundos da pandemia da Covid-19. Desse modo, na visão de Schulman (2020, p. 03) a aplicação de princípios como a boa-fé objetiva e a função social do contrato, “precisará levar em conta as singularidades de cada contrato, dada a pluralidade de arranjos. Reitera-se que a pandemia atinge a todos, mas a cada um de modo distinto”.
Com base no descrito acima, é preciso que se analise essa situação de modo particular, observando a condição real de cada paciente e de cada contrato firmado.
É preciso que se busque a razoabilidade de cada situação, para que as partes não tenham qualquer prejuízo, uma vez que a pandemia afeta a todos, sem distinção. Como bem acentua Neves (2018, p. 285) “não parece razoável tratar todos os casos de forma unitária, em função de imposição legal, sem que sejam consideradas as peculiaridades de cada caso que levaram à revisão de uma situação antes acordada em contrato”.
Buscando trazer uma solução para esse caso, cita-se o posicionamento de Salvini (2021, p. 03) que acentua que “tão logo finda a situação excepcional, terão a seu dispor os instrumentos de cobrança das mensalidades eventualmente não pagas e ainda a possibilidade de revisão dos termos contratuais adequando-os e reequilibrando-os à nova realidade pós pandemia”.
Com isso, ao sanar ou diminuir o impacto da pandemia, pode a empresa privada de Plano de Saúde requerer na medida do possível, o valor das mensalidades não pagas pelo consumidor.
O que fica claro nesse ponto, é a de que enquanto perdurar a pandemia da Covid-19 o consumidor tenha o direito da continuidade de seu plano de saúde, ainda que ele não consiga pagar. É uma situação excecional, que afeta a todos e pela qual ninguém esperava. Assim, deve-se impor cautela e parcimônia de todos, principalmente numa relação tão sensível quanto a gerada por um contrato, em especial quando envolve a área da saúde.
Com isso, firma-se entendimento de que os contratos de Plano de Saúde, em que pese em período de pandemia, deverão observar ao princípio da função social do contrato. Sem desmerecer o trabalho desenvolvido pela seguradora e atenta ao eventual prejuízo, o que se preserva, sobretudo, é o direito à saúde.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Num período marcado pela pandemia provocada pelo Covid-19 em âmbito global desde o fim de 2019, o mundo mudou de forma significativa, impactando as relações humanas, a economia, a política, o meio ambiente e principalmente a área da saúde. Diante disso, a escolha inicial da presente temática decorre da necessidade de se observar os efeitos que esse quadro vem trazendo à sociedade.
Para melhor discutir essa questão, escolheu-se discorrer a respeito do cumprimento da função social do contrato de Plano de Saúde em período de pandemia. Isso se explica pelo fato de que, como é de conhecimento geral, a realidade brasileira da saúde pública atual não vem demonstrando melhorias em relação às dificuldades para acesso ao atendimento médico-hospitalar.
Muitos cidadãos brasileiros, em busca da efetiva prestação de serviços ligados à saúde, ingressam nos planos de assistência médica particular, a fim de obter a segurança para que no momento em que precisar, estarem amparados contratualmente pelo sistema privado.
A problemática é evidenciada quando isso não ocorre, isto é, quando não há o cumprimento dos contratos de plano de saúde, que frente ao atolamento de leitos e demais estruturas de estabelecimentos de saúde, vêm desrespeitando o princípio da função social.
O estudo do referido princípio é de suma importância na presente temática, posto que na relação consumerista entre o Plano de Saúde e seus usuários, deve haver proteção da parte hipossuficiente da relação: o consumidor, que frente ao período enfrentado em decorrência da pandemia do Covid-19, tem tido seu direito à saúde mais limitado, como consequência da crescente procura por medicamentos e serviços hospitalares.
Dessa forma, o estudo da função social do contrato de plano de saúde é muito valioso para o Direito, pois reúne elementos que permitem afirmar que a referida espécie de contrato deve ter suas cláusulas respeitadas e seguidas pelas pessoas jurídicas dos Planos de Saúde, além de fornecer informações sobre os direitos dos usuários, que muitas vezes são acometidos pela ignorância sobre o tema, o que gera a supressão de um importantíssimo e inderrogável direito fundamental: a saúde.
O que ficou evidenciado no decorrer do estudo é de que essa situação deve ser analisada de modo particular, ou seja, observando as subjetividades de cada caso, para somente assim encontrar um equilíbrio na relação. Insta salientar que tanto as empresas de plano de saúde quanto o consumidor são igualmente impactados pela pandemia da Covid-19. Por isso, se faz necessário haver uma readequação dos parâmetros definidores do equilíbrio contratual.
Aqui seria bom o texto apresentar a possibilidade da readequação dos parâmetros definidores do equilíbrio contratual.
Frente ao exposto, fica claro considerar que nesse cenário é preciso que ambas as partes busquem chegar a um acordo benéfico a ambos. Assim, após a pandemia pode ser possível restabelecer o padrão definidor de equilíbrio de antes.
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[1] Mestre. Professor da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP). E-mail:
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[3] Disponível em: <https://www.gov.br/ans/pt-br/arquivos/assuntos/consumidor/prazos-maximos-de-atendimento-1/cartilha_prazos_maximos_de_atendimento.pdf>. Acesso em: 21 set. 2021.
Bacharelanda em Direito pela Faculdade de Ciência Jurídicas de Paraíso do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Nádyla Albino da. A função social do contrato de plano de saúde como instrumento de proteção do consumidor em tempos de pandemia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 nov 2021, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57343/a-funo-social-do-contrato-de-plano-de-sade-como-instrumento-de-proteo-do-consumidor-em-tempos-de-pandemia. Acesso em: 22 nov 2024.
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