EDUARDA SOFIA SILVA SANTOS[1]
(coautora)
RESUMO: A eutanásia é um assunto bastante complicado de falar, cada um possui um posicionamento a seu respeito, aos religiosos sua doutrina já traçou a decisão quanto a sua permissão e aos que não seguem dogmas se permitem cogitar sua possibilidade. Aqueles que a almejam possuem suas convicções embasadas na dignidade de uma morte como livramento de um sofrimento, angústia, ou até mesmo de ser um peso a outros, alegam que seu direito humano de uma vida digna pode estar sendo violado ao negarem seu desejo. A Constituição Federal de 1988 não traz em seu corpo a abrangência de um direito à morte, pelo contrário, protege a vida, bem mais precioso e inviolável. A vida deve traçar seu rumo, seres humanos não são imortais, e por isso, quando há a comprovação de que aparelhos apenas insistem numa natureza contrária é hora de desliga-los, chamando isto de Ortotanásia, que diferente da eutanásia é permitida. O choque entre viver em angústia e morrer como livramento é recorrente, mas a tecnologia está sempre evoluindo e a qualquer momento pode achar a resposta.
Palavras-chave: Eutanásia. Vida. Dignidade. Direitos Humanos. Morte.
ABSTRACT: Euthanasia is a very complicated subject to talk about, each one has a position about it, to religious people their doctrine has already made the decision regarding their permission and to those who do not follow dogmas allow themselves to consider this possibility. Those who aspire to have their convictions based on the dignity of a death as a release from suffering, anguish, or even being a burden to others, claim that their human right to a dignified life may be being violated by denying their desire. The Federal Constitution of 1988 does not include in its body the right to death, on the contrary, it protects life, a more precious and inviolable asset. Life must set its course, human beings are not immortal, and therefore, when there is proof that devices only insist on a contrary nature, it is time to turn them off, calling this Orthothanasia, which, unlike euthanasia, is allowed. The shock between living in anguish and dying as a release is recurrent, but technology is always evolving and at any moment you can find the answer.
Keywords: Euthanasia. Life. Dignity. Human rights. Death.
1. INTRODUÇÃO
A dignidade da pessoa humana positivou-se na Constituição Brasileira como “Princípio da dignidade da pessoa humana”, sendo estes essencialmente para que se possa compreender como parte funcional dessa dignidade na Constituição. Esse princípio é citado por vários doutrinadores, devido a sua grande importância.
O grande e principal objetivo da dignidade da pessoa humana na jurisprudência é o de que as pessoas possam ter uma segurança de uma vida digna, tendo os direitos fundamentais positivados na Constituição, pois são esses os direitos que concretizam o princípio da dignidade da pessoa humana para que seja expresso ao legislador a proibição de que a vida seja extinta ou seja submetido a certos padrões que são inadmissíveis, da perspectiva que se tem do que é uma vida digna.
Sendo este princípio posto na Constituição como fundamental, deverá ser feita a sua aplicação imediata, automaticamente como uma exigência de realização. Havendo qualquer violação ao princípio da dignidade da pessoa humana, ensejará a pessoa que teve a sua dignidade atingida fazer uma exigência ao Estado para que seja feita uma prestação positiva, mesma essa ocorrendo contra o próprio Estado, pois ao positivar a dignidade da pessoa humana como princípio fundamental, o legislador irá atribuir a função de indicação de qual será o caminho a ser percorrido, sendo em última análise ao poder judiciário.
Com essa função de interpretar, faz-se presente no que relaciona aos princípios instrumentais de interpretação, sendo a carga valorativa e subjetiva do princípio da dignidade da pessoa humana e possibilitado que se faça várias interpretações que poderão levar o ato ou a lei infraconstitucional a serem consideradas constitucionais.
Conceituado no ordenamento jurídico dos estados democráticos de direito, o princípio da dignidade da pessoa humana abrange todo o conjunto de direitos que pertencem à categoria daqueles inerentes ao homem, sua personalidade e sua dignidade. Tais direitos obtêm progressivamente dicção à proporção que se tem uma gradativa mobilidade de repersonalização dignifica o homem juntamente com sua dignidade, posicionando-o no ápice do ordenamento jurídico, como sujeito de amplos direitos.
O ordenamento jurídico existe com intuito de proteger o indivíduo e sua dignidade, isso significa que o homem é o centro da ordem jurídica, sendo todo direito criado para protegê-lo. É necessário que os direitos da personalidade sejam estudados na atualidade sob a ótica civil constitucional, seguindo as diretrizes ditadas pela principiologia da lei maior, em razão da cidadania, da dignidade da pessoa humana, como princípios constitucionais.
Os princípios da igualdade e da liberdade, são um dos principais da constituição, de maneira que sempre realce o indivíduo como ponto central da ordem jurídica brasileira.
Onde entra a morte por Eutanásia na dignidade da Pessoa Humana? Eutanásia é uma prática bem antiga, sendo um ato que induz o paciência à morte com o propósito de livrar de uma enfermidade crónica ou muito dolorosa, porém, recentemente tem ganhando seu espaço nos estudos. Eutanásia é um método aplicado onde se tem por resultado a morte onde não há dor, nem sofrimento para aqueles que se encontram enfermos em estado irreversível, buscando assim minorar a dor tanto do paciente quanto da família que vê o ente amado em tal situação, na maioria das vezes numa cama de hospital. O princípio da dignidade da Pessoa Humana entra na questão da eutanásia pelo simples fato de que para ela ser aplicada não se deve ferir a dignidade humana do paciente.
Várias ideias e discussões se apresentam para a comunidade científica sobre a Eutanásia, isso passa a ocorrer em diversas áreas da sociedade. Acerca dessas discussões existe os que concordam com a medida da Eutanásia e os que são contra a mesma.
Busca assim, analisar como o paciente se sente, onde pela angústia e sofrimento prefere buscar a morte do que a espera por um tratamento, correlacionando assim a dignidade humana do paciente com o direito.
1. EUTANÁSIA
A palavra eutanásia é originária do grego tendo como principal significado a boa morte, indolor e tranquila ou ato de ceifar a vida de pessoa que foi atingida por uma doença incurável. O direito à vida digna ou a morte digna é caracterizada por um querer do homem, tal direito deveria ser exercido de forma natural, não impedido por leis ou dogmas.
Quando se fala em eutanásia muitos já pensam em ter um dia certo para entregar sua vida, um dia no qual você quer ser morto para que assim possa acabar com o sofrimento e angustia do presente momento, porém, esse ideal é distorcido, não existe a possibilidade de escolher o dia em que se quer morrer no ordenamento jurídico brasileiro (salvo a exceção ortotanásia).
Por mais que seja uma pessoa doente em estado terminal, não se pode escolher quando morrer, mesmo querendo, e sofrendo de dores angustiantes que por si só já causam sentimentos terríveis onde o pouco de racionalidade que sobra no cérebro vê a morte como única saída, deve-se aguentar até o fim, vivo, e ser tratado.
O tratamento muitas vezes poderá não ter bom efeito, ser lento, incapaz de trazer o alívio que o sistema neural tanto quer, mas ainda assim se mostra a melhor possibilidade para descanso da enfermidade que tanto causa sofrimento do que a busca por um fim à vida.
O médico deverá salvar o paciente, trazê-lo de volta à vida saudável e não encurtar seus últimos momentos. Tem de dar esperança ao paciente, fazer com que seus dias na terra possam se prolongar, cuidando-o através de medicamentos e buscando sempre achar uma nova chance para que o mesmo possa ser curado.
No Brasil a pratica da eutanásia é crime. O médico que decidir prestar auxílio para a morte do paciente está indo contra uma lei, que está tipificada no código penal brasileiro, definindo assim.
Conforme pode-se observar no Art. 122 do Código Penal,
Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave.
Parágrafo único - A pena é duplicada:
Aumento de pena
I - se o crime é praticado por motivo egoístico;
II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência.
Além da eutanásia também encontramos outras divisões que se referem a esse tema, como a distanásia, que segundo o autor Genival Veloso a define como “[...] o tratamento insistente, desnecessário e prolongado de um paciente terminal, que não apenas é insalvável, mas também submetido a tratamento fútil.” (2017, p. 1103).
Como vemos na fala de Genival, a distanásia é um procedimento onde já há uma resposta clínica feita pelos médicos onde sabe-se que o tratamento é totalmente inviável, não conseguirá obter êxito algum, apenas prolongará os dias de sofrimento do paciente, acordado ou em coma. Trazendo sofrimento que abrange muito mais que apenas a vida e dores do paciente, mas de toda uma família que sofre dia a dia vendo um querido, em estado irreversível.
Encontramos também a ortotanásia, que é “[...] a suspensão de meios medicamentosos ou artificiais de vida de um paciente em coma irreversível e considerado em ‘morte encefálica’, quando há grave comprometimento da coordenação da vida vegetativa e da vida de relação.” (FRANÇA, 2017, p. 1103).
Um exemplo prático ocorre quando se desligam os respiradores de um paciente em coma irreversível (que se tem a certeza através de exames seguros) e que permanece com vida, diga-se, sinais cerebrais ativos, por causa que o aparelho fazia o corpo permanecer em estado de vida. Mais claro ainda ocorre quando o cérebro morre, mas o corpo permanece vivo por causa dos aparelhos, que é a morte encefálica. Genival ainda define que a eutanásia seria a supressão da vida por compaixão ao paciente.
Quando se diz que alguém possui alguma doença crônica que acarreta dores constantes, tem-se a primeiro momento o tanto que essa pessoa sofre, dias no qual mal aguenta sair da cama de tanta dor, dias em que irá chorar angustiada de dor, e que até o momento a mesma doença não tenha nenhum tratamento que traga cura, mas tenha tratamentos que amenizem seu estrago, esse será o procedimento correto a ser buscado. O paciente tem que ser tratado até a morte, por mais que ele sofra de dores constantes e a doença seja incurável até o momento.
Seguindo a mesma lógica, mas dessa vez imaginando que fosse permitido tal artifício, como ficaria o estado emocional do médico que se visse em tal situação? O mesmo ficaria com sentimento de culpa, carregaria em suas mãos a morte daquele paciente, um peso que somente aqueles que já passaram sabem como é. A maioria dos seres humanos possuem sentimentos de afeto por toda vida, não aceitam a morte de outros e médicos sentem isso mais ainda, pois quando se veem diante de um paciente em estado clínico de doença grave não querem ver a vida daquele ser humano perdida, são capazes de fazer o impossível para ver ele curado, mas entregar sob sua responsabilidade a capacidade de tirar a vida de seu paciente é algo extremamente deprimente para a maioria, alguns até que conseguiriam lidar, mas a maioria sofreria com o ato.
De acordo com a Constituição Federal de 1988, Art. 1º Inciso III e caput do artigo 5º:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. (CÉSPEDES e ROCHA, 2018, p. 04)
Muitos pensam, invocando os artigos 1º inciso III e 5º da Constituição Federal de 1988, que pode ser considerado digna a prática de eutanásia, alegando que tais artigos por se referirem à dignidade à vida alcançam muito além, que pelo fato de uma pessoa sofrer de dores constantes a sua dignidade estaria sendo ferida, violando assim os direitos que essa possui, e desta forma podendo alegar que a pratica de eutanásia faria jus ao direito, onde a dignidade não está intrinsicamente ligada à vida, mas sim ao bem estar, pois, no sofrimento não há viver, apenas sobrevier.
A dignidade citada por alguns não existe, pois, tal ato pode ser visto como suicídio, o que é ilegal em nosso ordenamento jurídico. E nesse contexto entendemos ainda mais que escolher quando morrer não pode ser levado para o lado do debate sobre dignidade humana de vida.
Não se pode fixar os olhos apenas ao fato de que a morte pode trazer, aparentemente, descanso ao sofrimento do paciente, deve-se ter olhos abertos para enxergar que por mais doloroso que seja ao indivíduo que sofre, praticar um ato de ceifar a vida de um ser humano com intuito de privá-lo do sofrimento não possui dignidade alguma.
Não importa a época, sempre existiu o pensamento de que devíamos sacrificar um doente se o mesmo não tivesse a chance de ser curado. Hoje esse pensamento está um pouco diferente, mas ele encontra suas raízes nessas ideias.
No pentateuco, que não possui fundamentação científica para o estudo, mas reflete grandemente no pensamento e no comportamento da sociedade é encontrado em diversas partes o relato de o que deveria ser feito à aqueles que se encontrassem em estado de lepra (hanseníase), eram removidos de seus clãs e colocados para fora da cidade para morrerem sozinhos, o desconhecimento do povo daquele tempo sobre o tratamento de enfermos era tão grande quanto o desconhecimento que possuímos hoje em dia para curar alguém de um câncer, sabemos como tratar mas ainda não chegamos perto da cura, e eles sabiam tratar e era colocando para longe da cidade, assinando praticamente o atestado de óbito desses enfermos, pois, uma vez fora das cidades estavam expostos à feras selvagens que os matariam na primeira oportunidade.
Analisando o atual desenvolvimento da humanidade, pode-se notar como a medicina evoluiu, uma doença que antes poderia matar vários, hoje é quase irrelevante. Na antiguidade ela era utilizada como rota de fuga para os que estavam próximos da morte e não queria sofrer com a desonra, pois para alguns, sofrer com dor era motivo de desonra.
Houve também os que faziam seu uso como forma de eliminar os “defeituosos”, como por exemplos bebês que nascessem com alguma doença já eram de cara “descartados” pois iriam desonrar a família ou não serviriam para trabalhar nem para a guerra, como relata Maria, 2009, p. 23.
O diagnóstico da incurabilidade é duvidoso, é difícil um médico alegar que determinada doença é incurável, pois, nunca sabemos quando pode surgir a cura para uma doença, e com tantos avanços tecnológicos atuais nunca saberemos em que momento alguma pesquisa pode ter seus resultados publicados alegando a cura de uma determinada doença.
Por mais que todos digam que não tem cura, o avanço constante da medicina moderna pode e deve trazer esperança para os milhares de enfermos que se encontram em leitos de hospitais com suas perspectivas praticamente destruídas a respeito de poder sair daquele estado. Por isso nunca se deve pesar na eutanásia como uma saída, ela deve ser jogada de fora, colocando a busca pela cura como opção única e verdadeira, buscando todo tipo de tratamento novo.
E não há porque focar apenas na cura, uma forma de tratar é suficiente para trazer vida nova ao enfermo, e como exemplo vemos os atuais avanços da medicina em buscar a vacina para o COVID-19, ainda não se fala muito nos jornais sobre buscar a cura para esse vírus que tem causado morte e medo em toda a humanidade, mas se vê uma busca sem limites para uma forma de imunizar a população, uma vacina, que não irá curar mas sim proteger, diminuindo fortemente as chances de contágio. Há também uma busca intensa para o tratamento desse vírus, desde o início do surto diversos medicamentos foram apontados como eficientes, mas infelizmente não houve êxito durante os estudos que comprovam como eficientes, mas mesmo assim os pesquisadores não desistiram.
Algumas pessoas que são a favor da eutanásia costumam dizer que se trata do Direito Natural a vida, pois podemos escolher o que fazer de nossas vidas, no entanto esse pensamento é um tanto errado, por mais que em nossa constituição tenha lei versando sobre direito à vida não significa dizer que esse direito é de escolher o que bem entender com ela, pois uma vida afeta outras ao seu redor, a partir da vida é que o ser humano tem efetivo direito e deveres sobre ela.
2. DIREITOS HUMANOS
A Constituição Federal e o Código Penal Brasileiros asseguram a inviolabilidade do direito à vida e presumem as punições caso alguém viole tal direito. Conquanto ninguém poderá ser privado aleatoriamente ou casualmente de sua vida, pois causaria uma pena de responsabilização criminal. Porém, caso algum indivíduo queira tirar sua própria vida, o Código Penal não possui nenhuma penalidade quanto a esta.
Todos nascem com direitos e garantias, e o Estado não pode tratá-los como concessões, porque alguns desses direitos são criados pelo ordenamento jurídico, outros direitos são criados por meio de certa manifestação de vontade e outros direitos só são reconhecidos em cartas legislativas. Deve-se exigir que a sociedade respeite a dignidade de todas as pessoas e que garantam os meios para atender às suas necessidades básicas.
Direitos humanos são definidos como um conjunto de direitos e garantias institucionalizadas para o ser humano, cujo objetivo central é respeitar a sua dignidade, protegendo o poder do Estado e garantindo condições mínimas de vida e desenvolvimento.
Os seres humanos são o desenvolvimento integral da personalidade que visa garantir que os humanos respeitem a vida, a liberdade, a igualdade e a dignidade. Esta proteção deve ser ativamente reconhecida pelos ordenamentos jurídicos nacionais e internacionais.
Nesta perspectiva Piovesan enuncia que
“O valor da dignidade humana impõe-se como núcleo básico e informador do ordenamento jurídico brasileiro, como critério e parâmetro de valoração a orientar a interpretação e compreensão do sistema constitucional instaurado em 1988. A dignidade humana e os direitos e garantias fundamentais vêm a constituir os princípios constitucionais que incorporam as exigências de justiça e dos valores éticos, conferindo suporte axiológico ao sistema jurídico brasileiro.”(2018 p. 499)
Os direitos fundamentais são direitos humanos garantidos por lei e sistema. Trata-se de direitos objetivamente efetivos em um determinado ordenamento jurídico, ou seja, são declarações constitucionais de natureza declarativa, e têm por objetivo reconhecer a existência de privilégios básicos dos cidadãos no plano jurídico. A liberdade de expressão (Inc. IX, art. 5º), a intimidade e a honra (Inc. X, art. 5º) e a proteção da propriedade e do consumidor são direitos fundamentais.
Os direitos humanos foram, há não muito tempo, conquistados através dos tratados internacionais, como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em dezembro de 1948, um grande marco para a história do direito. Esse tratado mudou drasticamente o mundo, direitos antes inimagináveis agora foram alcançados.
Outro fator existente é sobre o artigo 3 que trouxe o direito à vida, tão tratado nesse tema de eutanásia, em seu corpo também o artigo 25, que assegura ao ser humano o direito a um padrão de vida capaz de lhe assegurar saúde, bem estar, alimentação, entre outros, alem da Carta Magna de 1988, que preceitua a vida como um bem jurídico e possui uma autonomia da vontade.
3. PANORAMA HISTÓRICO E RELIGIOSO DA EUTANÁSIA
O termo "Eutanásia" foi criado pelo filósofo Francis Bacon por volta do século XVII que era definida como a cura ideal para doenças incuráveis da época. Etimologicamente, o "eu" em grego significa "bem ou boa", e "THANASIA" significa morte. Portanto, de forma simples, é a interferência dos processos naturais da vida ao prever a boa morte. Ao longo da história, vários grupos sociais viram essa prática de maneiras diferentes.
Por exemplo, as civilizações antigas: Atenas e Esparta. Neste cenário, Genival Veloso de França, médico e bacharel em direito, em seu artigo “Eutanásia: direito de matar ou direito de morrer” (1999, p.1) trata-se sobre a eutanásia na capital da Grécia, Atenas. Onde autorizava o envenenamento para matar os idosos. Em Esparta, bebês recém-nascidos deformados eram jogados do alto do monte Taijeto. A premissa era que seus filhos se tornassem futuros lutadores. Embora essa possibilidade tenha sido eliminada, não há razão para mantê-los vivos.
Além disso, deve ser enfatizada a posição da religião, que é o comportamento que influencia o tema em discussão por meio de valores, crenças e costumes, que normalmente, condenam essa prática.
Observa-se que uma das principais religiões monoteístas, o Judaísmo, a vida são definidos como um fenômeno absoluto por esta religião. Não importa quanto sofrimento a humanidade tenha e quão miserável seja sua vida, não é permitido retirá-lo de acordo com a sagrada lei judaica, o Torá. Nesse sentido, os fiéis religiosos assentados têm o chamado "Dom da Vida" e não podem realizar intervenções que levem diretamente à morte.
O Islamismo enfatiza princípios semelhantes ao Judaísmo. A Declaração Islâmica dos Direitos Humanos de 1990, redigida com base nas opiniões e julgamentos do Alcorão, estabeleceu seus pontos de vista sobre isso ao condenar a eutanásia, como segue:
I – Direito à Vida
A vida humana é sagrada e inviolável e todo esforço deverá ser feito para protegê-la. Em especial, ninguém será exposto a danos ou à morte, a não ser sob a autoridade da Lei.
A Igreja Católica Apostólica Romana está obviamente na base da defesa do ideal sagrado e inviolável de vida dentro da soberania de Deus sobre todos os seres vivos, especialmente os seres humanos, e adota uma posição de rejeição por não permitir o comportamento de morte antecipada, para tal, o único que tem permissão para acabar com uma vida é Deus.
4. EUTANÁSIA E OS DIREITOS HUMANOS
Pode-se dizer que os Direitos Humanos possuem uma lógica material, do qual é inspirado na dignidade da pessoa humana. De acordo com Flávia Piovesan,
“[...] a Declaração de 1948 vem a inovar ao introduzir a chamada concepção contemporânea de direitos humanos, marcada pela universalidade e indivisibilidade desses direitos. Universalidade porque clama pela extensão universal dos direitos humanos, sob a crença de que a condição de pessoa é o requisito único para a titularidade de direitos, considerando o ser humano um ser essencialmente moral, dotado de unicidade existencial e dignidade, esta como valor intrínseco à condição humana.” (2019 p. 61)
Entende-se então que dignidade é aliada em duas dimensões, sendo uma a biológica, em seu aspecto físico-corporal e também, a dimensão biográfica, sendo as crenças, opções e valores. Sendo assim, o direito não deve preocupar-se apenas com uma das questões, mas sim, buscar pelo ser humano em si.
Quando se trata de uma vida da qual está indisponível, é preciso ceder a autonomia a mesma, pois se encontra em fase terminal e, em meio a limitações, agonia e sofrimento.
Além de tudo, sabemos que não há como fugir da temida discussão a respeito de qual seria a verdadeira vontade do indivíduo e também, em tentar saber se uma pessoa que se encontra em uma situação grave e próxima da morte, conseguiria de alguma forma racionalmente autorizar ou não a própria morte. E também, se essa exigência dependesse de os familiares fornecer o consentimento, a situação ainda seria complicada, pois, quando se trata de interesses inconfessáveis que de alguma forma poderiam ter influência contra o paciente.
5. AMEAÇA AO DIREITO À VIDA
O título “Direitos e Garantias Básicas” pertencente à Constituição Federal estipula o direito à vida, que é o direito mais básico, pois todos os demais direitos derivam dele. Está vinculado ao princípio constitucional da inviolabilidade e não renúncia, ou seja, o direito à vida não pode ser respeitado por meio de penas criminais, nem os indivíduos podem renunciar a esse direito e objetivar a morte.
Art. 5º da CF: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...]
O Estado tem a responsabilidade de garantir o direito à vida, que não é apenas sobreviver, mas também gozar de uma vida digna em termos de sobrevivência. De acordo com Moraes, 2021, p. 87: “O Estado deverá garantir esse direito a um nível de vida adequado com a condição humana respeitando os princípios fundamentais da cidadania, dignidade da pessoa humana e valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;”.
O estado garante o direito à vida, proibindo mortes provocativas como a eutanásia. Entretanto, a eutanásia mencionada no primeiro anteprojeto não deve ser vista como uma ameaça ao direito à vida, pois só se aplica às pessoas que estão prestes a morrer e inevitavelmente morrer conforme mencionado acima, ou seja, quando a pessoa sobrevive por meio de máquinas, o chamado vida vegetativa.
Quando uma pessoa não desfruta plenamente do direito à vida, uma pessoa não pode nem mesmo reivindicar uma vida digna porque está privada de liberdade e exerce muitos direitos, como o direito à vida será ameaçado pela eutanásia, e não pode desfrutar de um padrão de vida adequado, por exemplo Educação, cultura, lazer e até suas funções importantes são autônomas.
No âmbito constitucional, um indivíduo neste estado não tem mais vida, pois sua "vida" já foi involuntariamente tirada. Pelo entendimento, é óbvio que todos têm direito à vida, ou seja, direito à vida, não só isso, mas também o direito de desfrutar de uma vida plena e digna, respeitando seus valores e necessidades.
O direito à vida está vinculado ao princípio da dignidade humana, o que significa que o direito à vida não é apenas o direito à sobrevivência, mas também o direito a viver com dignidade. Portanto, sob o argumento de sofrer uma dor irreversível, uma dor irreversível e um tratamento degradante, alguém afirma estar protegendo o seu direito à vida, não seria torturado? O seu direito à integridade física e mental foi violado?
Nessas circunstâncias, deve-se observar o direito de viver com dignidade, a liberdade de todos e a autonomia para expressar sua vontade, o direito de escolher entre a vida e a morte. A Constituição estipula ainda: Além de garantir o respeito pela integridade pessoal e moral, também estipula que ninguém será submetido a tortura ou tratamento desumano ou degradante (Art. 5º, III).
Não basta a mera proteção do direito à vida, mas o ser humano deve ser respeitado em termos de sua integridade física, mental e moral, tendo em vista que existe uma relação entre esses direitos. A vida humana é uma questão perante a lei, pois só surge quando existe um conflito entre as pessoas, o que requer a intervenção da lei, devendo o Estado respeitar a decisão de todos.
Não se pode dizer que a “Constituição da República” só protege o direito à vida no sentido biológico, mas a uma vida com dignidade, o que significa respeito pela escolha do estilo de vida e, portanto, a liberdade de morrer com dignidade.
6. RESOLUÇÃO DO CFM 1.805/2006, VIVER OU SOBREVIVER
Aprovado pelo Conselho Federal de Medicina, esta resolução permite ao médico suspender tratamentos que irão prolongar a vida em fase terminais que se aplicara a uma doença grave ou incurável, essa qual, pela resolução não se enquadra na eutanásia, mas sim como a ortotanásia.
Nesse cenário o paciente não é induzido à morte, o que ocorre é que não é mais induzido a sobreviver através de medicamentos, e equipamentos, mas sim seguindo o curso normal da vida, vida essa que tem de ser respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante.
A eutanásia não se limita apenas aos doentes terminais, como todos sempre lembram ao citar seu nome. Ela abrange também outras situações polêmicas, como as de recém-nascidos com anomalias congênitas, crianças que podem ter uma vida pela frente, mas por serem um pouco “fora dos padrões da sociedade” tem sua vida cessada, pessoas que se encontram em estados vegetativos irreversível também podem ter sua vida suspensa e pessoa inválidas sem a capacidade de cuidar de si mesmas.
Vale lembrar que as pessoas costumam ligar a ideia da morte como a falência do organismo como um todo e não de alguns órgãos, como o cérebro. Por exemplo, a pessoa pode estar em perfeitas condições corporais, com boa aparência, limpa, somente não fala, e mantém os olhos fechados, pois o encéfalo já parou de funcionar e a vida se encerrou.
Estar vivo não é somente ficar deitado sobre uma cama recebendo alimentos por sonda e remédios, estar vivo é mais que isso, estar vivo é respirar sem dificuldades, é conseguir fazer uma caminhada de manhã, é poder ir ao banheiro e não necessitar da ajuda de ninguém, para alguns, o que não for isso é classificado como sobreviver.
Em contrapartida a ortotanásia pode ser definida como uma “morte correta” decorrente de um processo natural. Neste caso o enfermo já está no processo natural da morte e recebe uma contribuição do médico para que esse estado siga seu curso, ao invés de prolongar o processo artificial de morte, deixa-se que se conclua naturalmente.
De forma clara nesse procedimento ao invés do médico forçar o paciente a permanecer vivo, ele desliga as máquinas e deixa o corpo do paciente agir por conta própria, seguindo seu curso natural.
7.CONCLUSÃO
Ante o exposto, pode-se concluir que o sistema jurídico brasileiro se orienta pelos princípios fundamentais, os quais são entendidos como valores expressados socialmente. Esses valores se tornam evidentemente mais notáveis quando envolvem bens jurídicos mais relevantes como, por exemplo, a vida. Diante disso, constata-se que a eutanásia sempre foi considerado ato ilícito no ordenamento brasileiro, sendo essa determinação coerente com os valores que estruturam as decisões legais em respeito à vida humana
Ademais, vale mencionar que o consentimento do paciente para a realização da eutanásia ou a motivação piedosa de quem a pratica não excluem a ilegalidade da ação nem exoneram de culpa quem a praticou.
Os preceitos legais intrínsecos à moral, enquanto fundados na razão, podem ser universalizados a todos os seres que seguem a racionalidade. O princípio que fundamenta a condenação da eutanásia equivale ao que condena o aborto provocado e a pena de morte: a dignidade da vida do ser humano. Assim, entende-se que o primeiro direito da pessoa humana é a sua vida e, mesmo que ela tenha outros bens preciosos, a vida, além de fundamental, é a condição de todos os outros. Portanto, esse bem deve ser protegido acima de qualquer outro.
Por fim, não se deve confundir eutanásia com a ortotanásia, haja vista que esta última é a omissão voluntária de meios não convencionais que, apesar de eficazes, alcançaram seus objetivos apenas temporariamente. Assim, o paciente logo retornará à condição anterior aos benefícios obtidos. O tratamento é considerado um tanto leviano quando apenas prolonga a morte, mas não pode efetivamente melhorar ou corrigir a doença.
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Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário São Lucas Ji-Paraná.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, CEZAR PRAXEDES DE CARVALHO. Eutanásia e sua relação com direitos humanos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 nov 2021, 04:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57438/eutansia-e-sua-relao-com-direitos-humanos. Acesso em: 22 nov 2024.
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