FABRÍCIO DE FARIAS CARVALHO [1]
(orientador)
RESUMO[2]: O objetivo deste trabalho foi analisar as possíveis colisões entre o princípio da razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF/88) e os princípios do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LV, CF/88), explorar documentos indiretos, relacionados à pesquisa bibliográfica e documental por meio de leituras, análises e interpretação de textos legais e livros; construindo conhecimentos acerca das decisões jurídicas reais, envolvendo a competência da Justiça Comum e da Justiça Especializada (Juizados Especiais); discernindo sobre a busca para se efetivar a tutela jurisdicional, buscando garantir a segurança jurídica, evitando a existência de uma máquina judiciária intempestiva e inadequada. Por meio de um levantamento bibliográfico envolvendo vários autores que discorrem sobre este tema, viu-se que a celeridade é algo que deve ser buscado pelos que fazem parte do judiciário e pelas partes que o suscitam, destacando-se a contribuição determinada por lei para cada um. Constatou-se que o tempo considerado ideal para se solucionar um litígio passa por uma condição de pacificação social, ou seja, o processo é classificado célere quando respeita os prazos processuais, sem extrapolá-los.
Palavras-chave: Colisão. Princípios. Contraditório. Duração Razoável.
1 INTRODUÇÃO
A dinâmica dos fatos e da vida das pessoas em sociedade foi profundamente afetada pelo estado da arte da tecnologia, que permite a comunicação múltipla e instantânea, além da locomoção de pessoas e mercadorias por meios eficientes e outros tantos avanços que definem o cotidiano contemporâneo.
Essa realidade se projeta para o Direito que regula tais relações e, consequentemente, para o processo, com especial foco no processo civil, consoante se depreende do mandamento constitucional prescrito no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, incluído pela EC nº 45/2004: a razoável duração do processo foi constitucionalizada. Entretanto, a busca da celeridade processual e da agilidade na solução dos conflitos pode conduzir à mitigação de direitos e garantias fundamentais, dentre eles o direito de ação ou acesso à justiça, o contraditório e a ampla defesa.
Tal movimento, que mesmo faz crer que os dias estão mais curtos, e cientificamente, há aqueles que assim sustentam, gera a necessidade da objetividade e da celeridade nas relações interpessoais, que se projetam para o processo, em especial, neste estudo, no processo civil. Para discutir adequadamente o problema que orienta esta pesquisa, foram traçados objetivos-meio, os quais podem ser divididos da seguinte forma: (A) os princípios, propriamente ditos, direito de ação ou acesso à justiça, da razoável duração do processo, do contraditório e da ampla defesa; (B) a ponderação destes princípios. O problema de pesquisa foi elaborado da seguinte forma: Como o Poder Judiciário deve lidar com casos de colisões existentes entre o princípio da duração razoável do processo e os princípios de contraditório e ampla defesa.
O objetivo geral deste trabalho é analisar as possíveis colisões entre o princípio da razoável duração do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF/88) e os princípios do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, LV, CF/88). Para atingir o objetivo geral foram criados os seguintes objetivos específicos: Explorar documentos indiretos, relacionados à pesquisa bibliográfica e documental por meio de leituras, análises e interpretação de textos legais e livros; Construir conhecimentos acerca das decisões jurídicas reais, envolvendo a competência da Justiça Comum e da Justiça Especializada (Juizados Especiais); Discernir sobre a busca para se efetivar a tutela jurisdicional, buscando garantir a segurança jurídica, evitando a existência de uma máquina judiciária intempestiva e inadequada.
Por meio de um levantamento bibliográfico envolvendo vários autores que discorrem sobre o tema em questão, encontrados em livros, revistas, artigos encontrados na grande rede, entre outros, este trabalho discutiu as colisões existentes entre o princípio da duração razoável do processo (artigo 5º, LXXVIII, CF/88) e os princípios do contraditório e ampla defesa (artigo 5º, LV, CF/88).
Analisar o princípio da razoável duração do processo, na atualidade, torna-se algo de grande pertinência, pois, levando em consideração a tradição, a tramitação dos processos decorre durante vários anos, com a apresentação de expedientes envoltos de forma exagerada procrastinatórios, dificultando a andamento satisfatório das questões judiciárias, que se avolumam aguardando soluções. Essa morosidade desperta o interesse por meio de pesquisas visando buscar os desfechos judiciais mais adequados nesses casos.
Além do mais, a demora do Judiciário termina beneficiando somente o lado que não tem razão e que continua ilesa no decorrer de toda a questão judicial, sendo que o real possuidor do bem jurídico reclamado é impossibilitado de seu exercício, da sua reparação ou da sua posse.
Atrasar ou adiar a tutela jurisdicional traz grave comprometimentos para a eficiência e a presteza referentes ao próprio Estado. Em razão disso, ao se aplicar o princípio da razoável duração do processo este tem se mostrado necessário para resolver problemas da sociedade, clarear estudos acadêmicos, além de ser envolto de importância para o curso de Direito do UNIFSA, tendo em vista converter-se em dos pontos mais relevantes dentro do campo jurídico.
Para melhor compreensão, este trabalho foi dividido em cinco capítulos. O capítulo de nº 1 é a Introdução, trazendo a apresentação e as impressões iniciais sobre o tema. O capítulo de nº 2 aborda as peculiaridades da Duração Razoável do Processo, tais como as considerações diretas e indiretas dos respectivos doutrinadores sobre o tema. Na sequência, no capítulo de nº 3, foi explanado sobre o princípio do contraditório e ampla defesa, que apesar de serem considerados muito semelhantes, parte da doutrina descreve estes princípios de forma distinta, como apresentado a seguir. No capítulo de nº 4 foi exposto o conflito existente entre os princípios da Duração Razoável do Processo, Contraditório e Ampla Defesa, ademais, é discorrido sobre o juízo de ponderação que deve ser adotado individualmente em cada caso concreto. Por fim, no capítulo de nº 5, tem-se a Conclusão, com as considerações finais e as sugestões acerca da temática abordada.
2 A GARANTIA DA DURAÇAO RAZOÁVEL DO PROCESSO
A Emenda Constitucional n. 45/2004, visando trazer garantia a todos acerca do direito fundamental à razoável duração do processo fez a inclusão do inciso LXXVIII no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, reafirmando preocupação vista há bastante tempo com a sua verdadeira efetividade.
Mesmo que a “razoável duração do processo” seja considerada como um termo subjetivo, haja vista a não possibilidade de previsão da exatidão temporal demandada por cada processo, existe a possibilidade de se extrair um sentido cercado de lógica para este princípio. Diz respeito ao corolário do princípio de acesso à jurisdição (art. 5º. XXXV), contemplando ainda o princípio da eficiência (artigo 37, caput), contidos estes na Constituição Federal de 1988, com garantia a todos da divisão de modo racional da duração do processo (MARINONI, 1997, p. 20, apud TUCCI, 2008, p. 433).
Analisar o princípio da razoável duração do processo converter-se, nos dias atuais, em algo pertinente e relevante, em virtude, de maneira tradicional, a tramitação dos processos chega a levar vários anos, com expedientes robustamente procrastinatórios, algo que traz dificuldade para a regularidade da máquina jurídica, apresentando avolumada de decisões que aguardam por soluções.
Ressalta-se também que a lentidão apresentada pelo Judiciário traz benefícios somente para as aquelas partes que não estão com a razão, continuando ilesas no decorrer de todo o processo judicial, ao passo que quem detém o real bem jurídico em reclamação é impedido de exercê-lo, de possuí-lo ou de repará-lo.
O retardamento ou procrastinação da tutela jurisdicional traz grave comprometimentos à eficiência ou à presteza ligadas ao próprio Estado. Em função disso, existe a necessidade de se aplicar o princípio da razoável duração do processo. Todavia, a luta em buscar soluções para o “tempo-inimigo” das tutelas processuais (DINAMARCO, 2004, p. 55-57, apud TAVARES et al, 2008, p. 146) não pode prescindir “da implementação dos direitos fundamentais, sem o que não se constrói um legítimo Estado de Direito Democrático” (TAVARES et al, 2008, p. 145). Esse processo de implementação acontece por intermédio de um processo que traga possibilidades de ampla defesa e do contraditório entre as partes (em situação isonômica de manifestação) envolvidas e que devem ser contempladas quando se der a decisão final, dentro de uma duração de tempo adequada que possibilite se a construção de modo participado dessa decisão, respeitando, sobretudo, as garantias constitucionais. (TAVARES et al, 2008).
Ressalta-se que não se tem a pretensão de apresentar aqui formulações definitivas, mas apenas de se teorizar a respeito do que venha a ser a “razoável duração do processo” em consonância com as garantias processuais da isonomia, contraditório e ampla defesa, dentro da constitucionalidade democrática.
Na atualidade, cresce a preocupação quanto ao tempo em que o processo durar. Intenta-se, nessa vertente, a definição ideal de qual momento o Estado-Juiz deveria fazer o oferecimento do último provimento aos litigantes. Os defensores da teoria instrumentalista, a exemplo de Cândido Dinamarco, tendem a dar valor ao princípio da celeridade, destacando com a agilidade dos processos judiciais representaria a eficácia da própria tutela jurisdicional.
A célebre frase pronunciada por Rui Barbosa, a citar “justiça atrasada não é justiça, senão injustiça qualificada e manifesta” faria a tradução adequada do pensamento defendido pelos instrumentalistas. Já os que defendem a teoria neo-institucionalista, os princípios que instituem o processo (isonomia, contraditório, ampla defesa) não podem, em circunstância nenhuma, serem retirados do processo, ainda que tragam prejuízo à celeridade, podendo tornar a decisão jurisdicional ilícita e ilegítima.
Os referidos princípios, inclui a nomenclatura “institucionais”, exatamente por se alicerçar, se instituir e criar o próprio significado de processo, não disponíveis e fundamentais a ele. (MADEIRA, 2007). Portanto, existe nessa teoria a preservação e a valorização dos princípios institucionais insertos no contraditório, da isonomia e da ampla defesa, em benefício da razoável duração do processo.
Inegavelmente, apela-se muito para que se solucione a morosidade existente no Judiciário do Brasil. Não se pode falar em justiça de acesso a uma ordem jurídica quando o demandante é colocado em indefinido e infinito processo de espera para que o litígio que o envolve seja solucionado.
Pode-se conceituar a razoável duração do processo, como um princípio que garante um direito fundamental. Este princípio é estritamente relacionado aos do devido processo legal e do direito de ação, que visam assegurar aos jurisdicionados uma prestação da tutela jurisdicional adequada, útil e tempestiva. Alvim (2013, p. 34) afirma sobre o tema:
É preciso dizer que a ideia da razoável duração do processo é que este se inicie e termine de forma breve, porém eficaz. Isso porque a prestação da tutela jurisdicional de forma tardia pode fazer com que pereça o direito ao jurisdicionado ou que a utilidade deste fique esvaziada.
Além disso, segundo a doutrina contemporânea, os princípios não têm caráter programático, devendo ser aplicados de forma imediata para assegurar a todos os processos uma duração razoável. A jurisprudência internacional do Tribunal Europeu de Direitos Humano fixou três critérios para se aferir se houve ou não dilação indevida do processo, que são respectivamente:
A Corte Europeia de Direitos do Homem firmou o entendimento de que, respeitadas as circunstâncias de cada caso, devem ser observadas três critérios para se determinar a duração razoável do processo, quais sejam: a) complexidade do assunto; b) o comportamento dos litigantes e de seus procuradores ou da acusação e da defesa no processo; c) a atuação do órgão jurisdicional. (ALVIM, 2012, p. 35).
A esses critérios Nelson Nery Jr. Acrescenta um quarto: “a fixação legal dos prazos para a prática de atos processuais que assegure efetivamente o direito ao contraditório e à ampla defesa”. No mesmo está a Ministra Fátima Nancy Andrighi para quem o princípio em questão deve ser analisado no caso concreto:
Todavia, a rica experiência jurisprudencial da Corte de Estrasburgo, de indiscutível validade para os fins da interpretação do indeterminado conceito de “razoável duração do processo” e de aplicação dos mencionados critérios, nos leva a conclusão que o dado cronológico da duração do procedimento não tem valor absoluto, seja porque não existem parâmetros temporais preestabelecidos e uniformes, seja porque a razoabilidade ou excessividade da duração de um processo por si só não se prestam a uma rígida avaliação em abstrato, mas exigem uma específica apreciação a ser feita segundo as circunstâncias concretas de cada causa individual e à luz dos mencionados critérios de avaliação da “razoável duração do processo”. (NERY JR., 2008, p. 85).
Sendo princípio, este conceito tem alta indeterminação e só pode ser analisado no acaso concreto: em alguns processos pode se fazer necessária instrução probatória que demande um maior lapso temporal, diferente de outros feitos, em que é possível provar-se o fato por meio de prova documental pré-constituída, ou ainda, matérias controvertidas que envolvam apenas a inteligência do diploma legal envolvendo a questão.
A natureza jurídica da razoável duração do processo é de princípio e, também, de garantia e direito fundamental do indivíduo. Significa que a razoável duração do processo seja administrativa ou judicial (civil ou penal), passou a ser direito subjetivo e garantia fundamental assegurada a todo e qualquer pessoa pela Carta Magna.
Segundo Didier Jr. (2008, p. 28):
A discussão sobre a existência ou não deste direito fundamental acabou, tendo atualmente meramente histórica. AEC n° 45/2004, que reformou constitucionalmente o Poder Judiciário, incluiu o inciso LXXVIII No art 5° da CF/88: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. A mesma emenda constitucional acrescentou a alínea “e” no inciso II do art 93 da CF, estabelecendo que “não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão.
Assim, o princípio da razoável duração do processo pode ser concebido como um desdobramento do direito de ação, bem como uma decorrência do princípio do devido processo legal, e relaciona-se com outros princípios como já enfatizado no texto. Desse modo, a celeridade sempre deve ser observada em consonância com as garantias que decorrem do devido processo legal, como as garantias do contraditório, ampla defesa e o direito de produzir provas, os quais orientam a dinâmica processual:
A ação deve ser precipuamente considerada na sua dinâmica, ou seja, supondo-se a existência de um processo. A ação, como a totalidade dos institutos do processo, existe necessariamente limitada pelo tempo; existe para exaurir-se. Todo instituto do processo tem uma dimensão temporal; nasce, desenvolve-se e morre. Somente sobrevive ao processo a eficácia da sentença, quase sempre, a coisa julgada material, sobreposta à parte dispositiva da sentença, para resguardo do bem jurídico nela defendido. (DIDIER JR., 2008, p. 89).
O princípio da razoável duração do processo consta da Convenção Americana de Direitos Humanos – Pacto de San da Costa Rica, artigo 8°. Assim, com a inclusão no texto constitucional, artigo 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, segundo Stoco (2007), apenas tomou explícito norma que já existia implicitamente no ordenamento jurídico.
3 O PRINCÍPIO DO CONTADITÓRIO E AMPLA DEFESA
No século XX, houve uma importante mudança no significado de direito essencial do homem ao contato com a jurisdição. As ações adotadas para resolver litígios davam uma ideia individualista dos direitos, isso nos séculos XVIII e XIX, nos Estados com postura liberal. “Acesso à Jurisdição” tinha sentido de que o os cidadãos tinham os direitos formais de entrarem com algum pedido no Judiciário, (CAPPELLETTI, 1988, p. 9), respondendo pelos elevados custos e saber lidar com a morosidade da resposta judicial.
Ao passo que a sociedade muda, em função do “colapso” do Estado tido com liberal que não resolver os problemas crescentes do meio social, aparece uma nova ideia, pela qual a sociedade exige do Estado não apenas que reconheça os direitos, mas, principalmente, que se garanta a sua efetivação.
Dessa forma, ganhou particular relevância o direito de se acessar a jurisdição, uma vez que não compõe mais o conjunto dos direitos considerados como essenciais ao homem, sendo reconhecido, possivelmente, como o mais essencial deles, pois é o que permite a sua materialização. (LAFER, 1988, p. 147). Portanto, o ordenamento deve cumprir o atendimento, de mais eficaz e na íntegra à solicitação daqueles que exercem os direitos que possuem à jurisdição, ou à maior extensão de defesa.
Não basta, pois, que se assegure o acesso aos tribunais [...]. Delineia-se inafastável, também, a absoluta regularidade deste com a verificação efetiva de todas as garantias resguardadas ao consumidor da justiça, em um breve prazo de tempo [...]. (TUCCI, 2008, p. 450).
Para que isso aconteça, existe a necessidade de o processo dispor de meios aptos para fazer de forma satisfatória a prestação jurisdicional, em outras palavras, trazer garantia ao jurisdicionado seu direito verdadeiro, consistente e no menor espaço de tempo possível, compreendendo-se esse possível tal qual um lapso temporal com razoabilidade. Não basta só a efetividade, é indispensável que a decisão aconteça tempestivamente.
O artigo 5º versa sobre o direito do acesso à jurisdição, destacando que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Esse destaque na Constituição segue uma tendência de todo o mundo, com representação de vários tratados, bem como acordos internacionais, buscando assegurar efetivamente dentro do Direito uma tutela.
3.1 Contraditório
O princípio do contraditório é tradicionalmente expresso nas Constituições do Brasil, desde a Constituição do império de 1824, em seu artigo 179, inciso VIII, bem como nas subsequentes: CF de 1891, no artigo 72, § 16; CF de 1967, artigo 150, § 15; e, CF de 1969, artigo 153, § 15. Na Constituição de 1988 o dispositivo encontra-se previsto expressamente no artigo 5°, inciso LV. Segundo Didier Jr (2008, p. 21):
O processo é um instrumento de composição de conflito – pacificação social – que se realiza sob o manto do contraditório. Contraditório é inerente ao processo. Trata-se de princípio que pode ser decomposto em duas garantias: participação (audiência; comunicação; ciência) e possibilidade de influência na decisão.
O princípio do contraditório reafirma o princípio da igualdade na medida em que garante, no processo judicial e no processo administrativo, a igualdade de armas, ou seja, as partes possuem o mesmo tratamento e as mesmas oportunidades, não só apenas de participação no processo, mas principalmente a faculdade de, por meio das suas manifestações, influir para a decisão final.
De acordo com Nery Jr. (2008, p. 80):
O princípio do contraditório, além de se constituir fundamentalmente em manifestação do princípio de estado de direito, tem íntima ligação com o da igualdade das partes e o do direito de ação, pois o texto constitucional, ao garantir aos litigantes o contraditório e a ampla defesa, quer significar que tanto o direito de ação quanto o direito de defesa são manifestações do princípio do contraditório.
Cumpre ressaltar que esta igualdade não deve ser uma igualdade meramente formal, mas sim uma igualdade de armas do ponto de vista substancial, ou seja, uma paridade fática efetiva (ou o mais efetiva possível) posta aos litigantes. O princípio do contraditório reflete a democracia, incluindo-se a reafirmação do Estado Democrático de Direito, como também uma democracia endoprocessual.
Democracia no processo recebe o nome de contraditório. Democracia é participação; e a participação no processo se opera pela efetivação da garantia do contraditório. O princípio do contraditório deve ser visto como manifestação do exercício democrático de um poder. (NERY JR, 2008, P. 81).
No mesmo sentido está Eduardo Arruda Alvim sustentando que “o princípio do contraditório apresenta-se como uma consequência natural do Estado de Direito. Assim, cabe ao legislador, ao elaborar as leis, assegurar a isonomia entre as partes para igual tratamento em processo, assegurar esta igualdade entre os litigantes.
Ao juiz cabe garantir aos litigantes igualdade de tratamento (artigo 125, inciso I do CPC) e, por consequência o contraditório. Ao juiz, como sujeito do processo, compete participação ativa na observância do contraditório, pelo que se pode concluir os litigantes tem a garantia, o direito ao contraditório, ao passo que o juiz tem o dever de lhes assegurar o contraditório. (NERY JR., 2008, p. 82).
Desse modo, o princípio do contraditório significa “a necessidade de dar conhecimento da existência da ação e de todos os atos do processo às partes, e, de outro, a possibilidade de as partes reagirem aos atos que lhes sejam desfavoráveis.
3.2 Ampla Defesa
O princípio da ampla defesa, assim como o princípio do contraditório, está expressamente previsto no artigo 5°, inciso LV, da Constituição da República. Ambos podem ser compreendidos como duas faces de uma mesma moeda, pois, para que a ampla defesa exista, o contraditório necessariamente também deve se fazer presente.
(...) são figuras conexas, sendo que a ampla defesa qualifica o contraditório sem defesa. Igualmente é lícito dizer que não há defesa sem contraditório (...) O contraditório é o instrumento de atuação do direito de defesa, ou seja, este se realiza através do contraditório.
Assim, a instrução de qualquer processo, inclusive na esfera administrativa, será necessariamente contraditória, com ampla defesa, e com os meios e recurso a isso inerentes.
De acordo com Nery Jr. (2010, p. 83):
Ampla defesa significa permitir às partes a dedução adequada de alegações que sustentam sua pretensão (autor) ou defesa (réu) no processo judicial (civil, penal, trabalhista e eleitoral) e no processo administrativo, com consequente possibilidade de fazer prova dessas mesmas alegações e interpor os recursos cabíveis contra as decisões judiciais e eleitorais.
Em sentido análogo, Didier Jr. (2008, p. 84) faz a seguinte afirmação: “Convém lembrar, ainda, que a ampla defesa é “direito fundamental de ambas as partes”, consistindo no conjunto de meios adequados para o exercício do adequado contraditório. Trata-se do aspecto substancial do contraditório”.
Assim, do direito à ampla defesa, intimamente ligado ao contraditório, também decorre o direito de produção das provas, uma vez que a produção de provas efetiva a ampla defesa: isso significa elencar o direito sem possibilitar meios à parte litigante para seu exercício, assim, o “direito à prova, pois, está imbricado com a ampla defesa e dela é indissociável”.
A assistência jurídica, integral e gratuita, deve ser compreendida da forma mais ampla possível, inclusive com assistência extrajudicial. Assim, a assistência jurídica além de permitir o acesso à justiça, fortalece o princípio em questão, pois garante ao litigante carente a possibilidade não só de ingressar em juízo, mas ter assistência técnica gratuita permitindo que utilize os mecanismos de ataque e defesa previstos em lei, bem como que produza provas e tenha orientação técnica de como se portar perante o juízo.
É direito fundamental de todos o acesso à assistência jurídica integral que compreende não apenas a assistência, isto é, a defesa da pessoa em juízo – civil, criminal, trabalhista, eleitoral – cujo regulamento se encontra previsto na LAJ, como também a assessoria extrajudicial. (NERY JR, 2008, p. 84).
Neste contexto, destaca-se que, por outro lado, para garantir a ampla defesa é necessária a presença de profissional habilitado (um advogado) para assegurar todos os meios previstos em lei inerentes, necessários e imprescindíveis à defesa, ou seja, imperiosa se faz a capacidade postulatória.
A autodefesa nada mais é do que o direito da parte de presença, direito este de estar presente e tomar ciência os atos processuais desenvolvidos, bem como o direito de audiência, ou seja, de ser ouvido, possibilitando, assim, dar sua versão aos fatos, apresentando fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do direito ventilado pela parte adversa.
Por todo o exposto, conclui-se que o princípio da ampla defesa qualifica o contraditório, tomando-o efetivo, bem como a possibilidade de, por meio do seu exercício, assegurar a isonomia de tratamento bem como a isonomia entre as partes, assim, se passa a tratar da isonomia no próximo assunto de trabalho.
4 POSSÍVEIS CONFLITOS ENTRE A DURAÇÃO RAZOÁVEL DO PROCESSO E AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO
Observa-se que a necessidade e a vontade de solucionar conflitos em um tempo considerado curto derrubou a preferência antiga em função de processos repletos de formalidade e burocracia, com tramitação que duraram vários anos. De forma curiosa, ganhou espaço a Emenda Constitucional nº 45/2004, erigindo o “princípio da razoável duração do processo” à categoria de direito classificado como fundamental, bem como se perfez inúmeras reformas processuais, por intermédio da Lei nº 10.444/2002, Lei nº 11.232/2005, Lei nº 11.280/2006, Lei nº 11.382/2006, Lei nº 11.419/2006, visando imprimir uma maior “celeridade” ao processo civil do Brasil. Todavia, o Conselho Nacional de Justiça deliberou acerca de várias sobre metas de modernização do Judiciário no que diz respeito ao seu próprio desempenho, objetivando, sobretudo, minimizar a quantidade de demandas.
O Direito apresenta-se com o objetivo principal de sanar conflitos no âmbito social, garantindo a justiça e fazendo prevalecer o convívio harmonioso e pacífico entre os cidadãos. Dessa forma, visando garantir tal intento, no decorrer dos séculos foram desenvolvidas teorias filosóficas com tendência a seguir o Direito, assegurando a tranquilidade da sociedade, a exemplo da teoria do jusnaturalismo, do positivismo jurídico e, de forma mais atual, teoria do pós-positivismo ou da normatividade dos princípios.
A mais antiga das teorias é a do jusnaturalismo, datada do século XVI, tendo como base a presença de um direito que se dá naturalmente, criado pela própria natureza, ligado, inevitavelmente, às leis e ao Direto. Neste contexto, Barroso (2004, p.318) faz a seguinte contribuição:
Sua ideia básica consiste no reconhecimento de que há, na sociedade, um conjunto de valores e de pretensões humanas legítimas que não decorrem de uma norma jurídica emanada do Estado, isto é, independem do direito positivo. Esse direito natural tem validade em si, legitimado por uma ética superior, e estabelece limites à própria norma estatal.
Isso quer dizer que essa teoria favorece a interpretação histórica, e não exclusivamente a atuação dos juízes e das leis. No decorrer do Estado Liberal consolidaram-se os ideais constitucionais que a crença nos direitos naturais do homem encontrou seu ápice e, da forma paradoxal, também a sua superação (BARROSO, 2004).
Alguns fatores levaram o jusnaturalismo à superação, entre eles o empenho pelo conhecimento científico, a busca pela objetividade e pela força coativa, abrindo espaço para o surgimento de uma segunda teoria filosófica, denominada de positivismo jurídico. O positivismo jurídico tem várias especificidades, destacando como principal a função de aproximar o Direito com a norma, e ainda buscar sistematizar o ordenamento jurídico, com base na criação e validação de normas de conteúdo tanto direto quanto objetivo.
Porém, verifica-se na história que a lei não deve apresentar-se limitadamente, tal qual uma verdade com cunho absoluto imposta e que dever ser rigorosamente seguida. Sabe-se que muitas atrocidades acontecem destacando, com exclusividade, o nome da lei, a exemplo do que já aconteceu na Itália, correspondendo ao fascismo, e na Alemanha, identificando-se com o nazismo.
De acordo com Barroso (2004), a partir de meados do século XX, já não havia espaço para o positivismo jurídico. A quase absoluta aproximação entre Direito e norma com a seu rígido distanciamento da ética não tinham relação tanto com o estágio, bem como com o processo civilizatório e o que pretendiam aqueles que faziam o patrocínio das causas humanas. Em contrapartida, os discursos científicos envolviam plenamente o Direito. Quem operava o Direito não queria a volta pura e natural do jusnaturalismo, aos fundamentos considerados vagos, ou ainda abstratos ou metafísicos pautados por uma razão considerada subjetiva.
Surge, assim, a terceira teoria filosófica citada, denominada de pós-positivismo, que é a união do Direito e da Ética, com atribuição maior de normatividade aos princípios. (BARROSO, 2004). Os trabalhos dos promotores, dos juízes, dos advogados, bem como dos operadores do Poder Público em geral são influenciados pela essa destacada inovação quanto à interpretação do Direito, e também referente à ascensão dos princípios, pois conseguem produzir reações positivas acerca da realidade jurídica, funcionando como auxiliador levar mais justiça aos conflitos ora existentes.
Neste contexto, buscar solução para eficácia da celeridade sem ofender os princípios do contraditório e da ampla defesa é o principal objetivo do Estado Democrático de Direito, já que permite o uso e gozo dos direitos essenciais em debate, sem que se precise suprimir totalmente qualquer um deles. (TAVARES, 2007).
Na visão de Tavares (2007, p.116):
[...] não abriga espaço para se cogitar de sumarização da cognição, mas possível se falar em sumarização da técnica procedimental, como seria o caso da retirada do efeito suspensivo aos recursos, da executoriedade das sentenças sem novo “processo” (de execução, como já se processa pela Lei 11.232/05), das ações coletivas, e sobretudo, da aplicabilidade da própria lei procedimental civil, no que concerne aos julgamentos conforme o estado do processo, quando as partes expressamente afirmam a desnecessidade da produção da prova em audiência, uma vez que o direito à prova é da parte, não se sujeitando ao (in)deferimento pela discricionariedade do órgão estatal judicial.
Assim, o autor retira o efeito suspensivo dos recursos, a aplicabilidade do denominado “cumprimento de sentença”, as ações coletivas e o julgamento antecipado da lide (artigo 330, incisos I e II, CPC) como medidas que destacam a brevidade processual. Cita-se, além dessas, as medidas de operacionalidade e gerenciamento da máquina judiciária no conhecimento e processamento dos conflitos, o que acontece, por exemplo, através do fim dos processos que se encontram grande espaço de tempo sem impulso (artigo 267, incisos I e II, do CPC). (TAVARES, 2007).
5 CONCLUSÃO
Verificou-se que os aspectos culturais aparecem como um o problema que mais se destaca, gerando morosidade ao Sistema Judiciário. Observa-se que no território brasileiro existe um número ideal de juízes, visando a promoção de respostas para as demandas existentes diante do judiciário. Todavia, nota-se a inexistência de gestão estratégica e melhor utilização do tempo, prologando-se os vínculos processuais com intenções distantes ao ideal, que é obter, incessantemente a justiça.
Dessa forma, afirma-se que, no Brasil, a morosidade processual percebida é oriunda de um conjunto de problemas, mas essas dificuldades vêm da ausência do planejamento, bem como da ausência de uma gestão eficiente e, sobretudo, pelos indivíduos que fazem parte do corpo do Poder Judiciário.
Notou-se que a efetividade do processo não tem origem somente no que diz respeito à obediência de maneira restrita ligada à celeridade, mas, sobretudo, em se observar conjuntamente todos os direitos, sejam eles fundamentais ou processuais, constantes do ordenamento jurídico do Brasil. Assim, tem-se que a conciliação da razoável duração do processo levando em consideração os princípios do devido processo legal é algo, de fato, repleto de complexidade, em virtude de requerer de forma individual cada caso, bem como que se aplique os princípios instrumentais, utilizando-se, ainda, das técnicas utilizadas pela Hermenêutica Jurídica, com ênfase para a teoria da ponderação
Conclui-se que a celeridade é algo que deve ser buscado pelos que fazem parte do judiciário e pelas partes que o suscitam, destacando-se a contribuição determinada por lei para cada um. Constatou-se que o tempo considerado ideal para se solucionar um litígio passa por uma condição de pacificação social, ou seja, o processo é classificado célere quando respeita os prazos processuais, sem extrapolá-los. Nas situações que não existe possibilidade de se cumprir os prazos definidos por lei considerando-se os atos imprescindíveis ao deslinde do processo, existe a necessidade de se atentar para o caso concreto, às especificidades contidas em cada demanda, definindo prioridades àquelas que não dispõe de muito espaço de tempo, bem como as que dizem respeito aos anseios das crianças, dos idosos, processos alimentares e que envolvam os direitos considerados fundamentais.
REFERÊNCIAS
ARRUDA ALVIM, Eduardo. Direito processual civil. 5. ed. São Paulo: Ed. RT, 2013.
ARRUDA ALVIM, Eduardo. Manual de processual civil direito. 15. ed. São Paulo: Ed. RT, 2012.
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[1] Professor do curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho, Mestre pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUC/RS. E-mail: [email protected]
[2] Trabalho de Conclusão de Curso apresentado no Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA, Teresina-PI, 10 de setembro de 2021.
Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERREIRA, Antonio Carlos Furtado. Razoável do processo: colisões existentes entre o princípio da duração razoável do processo (Artigo 5º, LXXVIII, CF/88) e os princípios do contraditório e ampla defesa (Artigo 5º, LV, CF/88) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 nov 2021, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57503/razovel-do-processo-colises-existentes-entre-o-princpio-da-durao-razovel-do-processo-artigo-5-lxxviii-cf-88-e-os-princpios-do-contraditrio-e-ampla-defesa-artigo-5-lv-cf-88. Acesso em: 22 nov 2024.
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