RESUMO: Este trabalho tem por objetivo analisar o projeto de Lei no 7.633, de 2014, sobre as disposições concernentes a mulher durante sua gravidez, bem como, pesquisar a respeito de condutas, procedimentos e atos abusivos adotados pelos profissionais da saúde que caracterizam a violência obstétrica e, por fim, mostrar que eles violam o Princípio da Dignidade da Pessoa Humana e as vítimas desse tipo de violência podem ter reparação do dano que lhe foi causado. Para dar resposta ao objetivo proposto, se fará uso de todo arcabouço teórico com base na doutrina, dissertações, teses, legislação e projeto de lei. Os resultados apontam de que dado a concretização do fato, cabe a vítima o direito de reparação do dano por meio da responsabilidade civil, já que as condutas que caracterizam a violência obstétrica ainda não foram tipificadas no ordenamento jurídico brasileiro. Dessa forma, conclui-se que o tema abordado neste artigo é fundamental, visto que é preciso que o parto pare de ser visto como sinônimo de sofrimento e dor, para que os preceitos da humanização no atendimento ao parto prevaleçam, e para que a mulher tenha voz e autonomia, para escolher a maneira como seu bebê virá ao mundo. Contribuindo desta forma para a diminuição da propagação da violência obstétrica.
PALAVRAS-CHAVE: Violência Obstétrica, Projeto de Lei no 7.633/14, Dignidade da Pessoa Humana.
ABSTRACT: The objective of this study is to analyze the draft Law No. 7,633 of 2014 on the provisions concerning women during their pregnancy, as well as to investigate the conduct, procedures and abusive acts adopted by health professionals that characterize obstetric violence and , finally, to show that they violate the Principle of the Dignity of the Human Person and the victims of this type of violence can have compensation of the damage that has been caused to them. In order to respond to the proposed objective, it will make use of any theoretical framework based on doctrine, dissertations, theses, legislation and draft law. The results indicate that given the fact, the victim is entitled to compensation for damages through civil liability, since the conduct that characterizes obstetric violence has not yet been typified in the Brazilian legal system. Thus, it is concluded that the topic addressed in this article is fundamental, since it is necessary that the delivery stop being seen as synonymous with suffering and pain, so that the precepts of humanization in childbirth care prevail, and for the woman have voice and autonomy, to choose the way your baby will come to the world. This contributes to reducing the spread of obstetric violence.
KEYWORDS: Obstetric Violence, Bill no 7.633 14, Dignity of the Human Person.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Análise do projeto de lei n° 7.633/14 sobre as disposições concernentes a mulher aos procedimentos obstétricos e a violência contra a mulher. 2.1. Das disposições do projeto de lei no 7.633, de 2014. 2.2 Do conceito e a caracterização da violência obstétrica. 2.3 Dos procedimentos obstétricos. 2.4 Da violência contra a mulher inserida dentro da violência obstétrica. 3. Da comparação do projeto de lei no 7.633/14 com as disposições constitucionais concernentes a mulher e a violência contra a mulher. 3.1. Dos direitos fundamentais no estado brasileiro segundo a constituição federal de 1988 concernentes a mulher. 3.2. Dos direitos da mulher pós constituição federal de 1988. 3.3. Da violência contra a mulher. 4. Das medidas que podem ser adotadas por mulheres que se deparam com as circunstâncias caracterizadoras da violência obstétrica. 5. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
O Tema fora escolhido em virtude do sonho em ser mãe, ao pesquisar sobre gravidez, pré-natal, partos e outros assuntos que envolvem da concepção ao nascimento do bebê, foi quando me deparei com fatos desagradáveis que ocorrem antes, durante e após o parto, fatos estes que vão desde humilhações, ofensas, constrangimentos, negligências até mesmo violência que ocorrem neste momento delicado da vida da mulher e do ser que está sendo formado em seu ventre. Passar por agressões é difícil em qualquer momento, mas passar por essa situação durante o parto é muito mais complicado, tendo visto que neste período a parturiente fica mais vulnerável.
Por ser uma forma de violência pouco debatida e evidenciada, mas que a cada dia vem ganhando notoriedade estando presente cotidianamente nos hospitais e que necessita ser trazida à baila por comprometer a saúde física e psicológica das mulheres grávidas antes, durante e após o parto, muitas mulheres hoje passam em silêncio sobre a violência obstétrica, por não se darem conta ou não saberem que determinadas condutas adotadas por parte dos profissionais responsáveis pelo bem estar da gestante e do bebê são totalmente condenáveis, que equivalem a violação dos direitos humanos fundamentais, se trata de um atentado contra o princípio da dignidade da pessoa humana de cada mulher que passa pelo constrangimento ou até agressão da violência obstétrica, visto que a chegada de uma nova vida deve ser um momento de felicidade e celebração, não um pesadelo ou um momento de dor, que deixará sequelas para sempre na vida da gestante.
Considerando que a pesquisa versa sobre a violência obstétrica, esta apresenta a seguinte estrutura: no primeiro tópico aborda-se a respeito da análise do Projeto de Lei no 7.633/14 sobre as disposições concernentes a mulher aos procedimentos obstétricos e a violência contra a mulher. No segundo tópico fala-se sobre a comparação do projeto de lei no 7.633/14 com as disposições constitucionais concernentes a mulher e a violência contra a mulher. O Terceiro tópico ocupa-se das medidas que podem ser adotadas por mulheres que se deparam com as circunstâncias caracterizadoras da violência obstétrica e, por fim, tem-se a conclusão.
2. ANÁLISE DO PROJETO DE LEI N° 7.633/14 SOBRE AS DISPOSIÇÕES CONCERNENTES A MULHER AOS PROCEDIMENTOS OBSTÉTRICOS E A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.
2.1. Das disposições do projeto de lei no 7.633, de 2014
O Projeto de Lei no 7.633 de 2014, de autoria do deputado Jean Wyllys, cuja ementa “Dispõe sobre a humanização da assistência à mulher e ao neonato durante o ciclo gravídico-puerperal e dá outras providências”.
Com ênfase na prevenção dos direitos fundamentais da mulher gestante antes, durante e após o parto, tem como objetivo principal instituir o parto humanizado5 e combater a violência obstétrica, o projeto de lei traz os direitos da mulher durante a gestação e o parto, inclusive nos casos de aborto, e as obrigações dos profissionais de saúde. Trata também dos direitos do feto e do recém-nascido.
As regras previstas aplicam-se, conforme o texto, às instituições do Sistema Único de Saúde (SUS), privados de saúde suplementar e filantrópicas. Profissionais e estabelecimentos que não cumprirem as normas poderão ser punidos civil, penal e administrativamente, de acordo com a proposta.
De acordo com o projeto, toda gestante tem direito à informação e à escolha. Conforme o art. 5° do projeto de Lei, desde a descoberta da gravidez a parturiente terá direito a elaboração de um Plano Individual de Parto, nesse documento, ficarão registradas todas as suas opções, como as equipes de acompanhamento, sempre que possível, o tipo de parto que prefere e o local onde quer que ocorra. Qualquer alteração no plano deverá ser anotada no prontuário pelo médico responsável com a justificativa clínica da mudança. O Plano de Parto é tão importante que é a primeira de uma série recomendações da OMS para melhorar, no mundo todo, o nível do atendimento dado a parturientes e recém-nascidos.
Ainda também de acordo com a proposta, a grávida poderá contar com um acompanhante durante todo o processo, que não precisa ser necessariamente o pai do bebê, ou seu companheiro, ficando a critério da parturiente a escolha do seu acompanhante. Esta fará jus ao direito de contratar profissional auxiliar de parto que será autorizado a executar ações suplementares às equipes da unidade de saúde.
Médicos e demais profissionais de saúde deverão dar prioridade à assistência humanizada no nascimento. Dentre esses princípios, o texto enumera procedimentos como interferência mínima da equipe, preferência por métodos não invasivos e utilização de medicamentos e cirurgias somente quando estritamente necessário.
Assim que nascer, o bebê deverá ser imediatamente colocado em contato com a mãe. Abre-se exceção apenas para atendimento de emergência, em caso de risco de vida para um dos dois. A mulher também terá direito de permanecer em contato com seu filho, mesmo que ele esteja em unidade de tratamento intensivo.
Dependerá de justificativa clínica a adoção de procedimentos como administração de ocitocina sintética (para acelerar o parto), a tração ou remoção manual da placenta e dieta zero durante o trabalho de parto.
Para garantir a prerrogativa de escolha da mulher, o projeto prevê que a equipe de saúde deverá fornecer a ela todas as informações sobre gestação, diferentes formas de parto e amamentação.
2.2. Do conceito e a caracterização da violência obstétrica
A expressão violência obstétrica pode ser definida como o conjunto de atos desrespeitosos, abusivos, maus-tratos e negligência contra a mulher e o bebê, antes, durante e depois do parto. Ela pode ocorrer de três formas, através do desrespeito, que é considerado a forma mais difundida da violência obstétrica, que está ligada as ofensas e a tratamento desrespeitosos e insensíveis a paciente; o abuso, que tem a ver com o uso de uma imposição de poder para constranger ou privar a gestante dos seus direitos; e por fim temos a negligência, que é caracterizada por erro médico, ou seja, é quando os profissionais da saúde atuam com irresponsabilidade ou imprudência, adotando procedimentos que não são recomendados a paciente e ao bebê.
O projeto de lei estudado neste artigo considera a violência obstétrica todo ato praticado pelos profissionais da equipe de saúde que ofenda, de forma verbal ou física, as mulheres gestantes, gestantes em trabalho de parto, em situação de abortamento e após o parto. Caracterizando–se esta conduta como uma forma de propriedade do corpo e dos processos reprodutivos das mulheres pelos profissionais da saúde, através do tratamento insensibilizado, abuso da medicalização e patologização dos processos naturais.
Com a finalidade de esclarecer ainda mais o sobre o tema, o Dossiê ―Parirás com dor elaborado pela Rede Parto do Princípio (2012, p. 60) explica que os atos caracterizadores da violência obstétrica:
São todos aqueles praticados contra a mulher no exercício de sua saúde sexual e reprodutiva, podendo ser cometidos por profissionais de saúde, servidores públicos, profissionais técnico-administrativos de instituições públicas e privadas, bem como civis.
Tais atos podem ser de caráter físico, psicológico, sexual, institucional, material e midiático, sendo que todos eles trazem consequências graves a vida da parturiente, dentre elas podemos citar, danos ao seu psicológico e a sua integridade física, depressões pós-parto, pesadelos, dentre outros.
Embora a atual concepção do processo de partejar tenha por objetivo à efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana através da humanização do parto, o contexto atual nas maternidades aponta para uma situação muito diversa. No Brasil intervenções desnecessárias vêm sendo adotadas com frequência no trabalho de parto, as condutas e os procedimentos realizados pelos profissionais de saúde responsáveis pelo bem-estar da parturiente e do seu bebê devem primeiramente respeitar a condição da gestante, sem submetê-la a intervenções ou procedimentos agressivos, abusivos ou desnecessários. É esse o principal objetivo do projeto de lei com a tipificação da violência obstétrica, garantir a parturiente que sejam respeitados os seus direitos e a sua condição de grávida, bem como a suas vontades com relação ao parto.
2.3. Dos procedimentos obstétricos
O ato de parir é um dos momentos mais feliz e celebrado na vida. E por ser um evento estritamente ligado à condição da existência da humana, estando gradualmente com a história da humanidade, os povos mais antigos festejavam o nascimento e o assimilavam a um evento cultural.
Por um longo período de tempo o parto era ligado estritamente a mulher, visto que o parto era realizado pelas parteiras, comadres e a curandeiras que dominavam a arte de partejar, estas eram familiarizadas com os procedimentos para facilitar o parto, também eram encarregadas de confortar a parturiente com alimentos e palavras agradáveis. No Brasil também era assim, no século XX o parto era exclusivamente feito pelas parteiras e foi:
ao longo da década de 40, desenvolveram-se no Brasil os primeiros passos dirigidos à saúde pública da mulher. Até o início da década de 60, a preocupação sobrepairava a assistência ao parto e, posteriormente, com a introdução da medicina preventiva no país e a criação dos centros de saúde, iniciaram-se os programas de pré-natal que, na realidade, tinham como objetivo principal reduzir a mortalidade infantil (ANDRADE: apud BRASIL, 2001, p. 17).
Mais tarde, a organização dos diversos movimentos sociais que marcaram a transição democrática nos anos 1980 representou um grande impulso às questões da saúde da mulher.
Hoje são adotados os procedimentos obstétricos que são um conjunto de técnicas e conhecimentos empregados no cuidado de gestantes, parturientes, recém-nascidos e seus familiares. O objetivo é garantir a normalidade no nascimento das crianças e a qualidade de vida da mulher.
Vem sendo adotando a algum tempo a humanização da assistência obstétrica nos procedimentos obstétricos, o conceito dessa humanização é muito amplo, pois envolve um conjunto de conhecimentos, práticas e atitudes que tem por objetivo a promoção do parto, do nascimento saudável e a prevenção da morbimortalidade materna e perinatal, essa conduta de humanização inicia-se no pré-natal e procura garantir que a equipe de saúde realize procedimentos comprovadamente benéficos para a mulher e o bebê, evitando assim as intervenções desnecessárias, preservando sua privacidade autônoma.
Recomenda-se que o parto seja o mais natural possível, e que se deve respeitar a condição em que a grávida se encontra, porém, vários procedimentos, considerados invasivos e danosos à mulher no atendimento ao trabalho de parto vem sendo adotados, dentre eles estão falta de esclarecimento e consentimento da paciente nos casos de Manobra de Kristeller, Episiotomia, amniotomia, entre outros.
Dentre os procedimentos no parto normal demonstradamente úteis e que devem ser estimulados de acordo com o Ministério da saúde são, o planejamento individual, determinando onde e por quem o parto será realizado, respeito ao direito da mulher a privacidade, apoio emocional pelos prestadores de serviços durante o trabalho de parto e parto, fornecimento as mulheres de todas a informações que desejarem, vigilância das contrações uterinas por palpação abdominal, prevenção da hipotermia do bebê, prevenção da hemorragia neonatal com o uso da vitamina K, prevenção da oftalmia gonocócica com o uso de nitrato prata ou tetraciclina dentre outras.
Atualmente a Organização Mundial da Saúde tem orientado para que seja adotado como regra nas maternidades o parto humanizado, visto que as características oriundas deste, tem a mulher como sendo a personagem central do parto, e os conceitos e técnicas extraídas dos estudos científicos, mostrando-se um modelo completo e ideal de assistência ao parto e em consonância com os preceitos constitucionais.
2.4. Da violência contra a mulher inserida dentro da violência obstétrica
Muito embora exista previsão constitucional acerca da igualdade de gênero, as mulheres ainda continuam em desvantagem em relação aos homens em vários aspectos na vida, não é novidade que apesar das garantias fundamentais inerentes a mulher, ainda continua sendo muito comum a mulher ser tratada de forma desrespeitosa, grosseira, humilhante, agressiva ou mesmo violenta, pelo simples fato de ser mulher. Isso acontece diariamente nas ruas e em casa. Muitas vezes a mulher se sente desrespeitada, humilhada, constrangida, mas seu sentimento não é reconhecido ou é tratado como uma coisa boba ou até mesmo “frescura”, como é popularmente falado. No parto não é diferente, por ser uma forma de violência pouco debatida e evidenciada, mais que existe cotidianamente nos hospitais e centros médicos, a violência obstétrica existe sim, e pode comprometer a saúde física e psicológica da paciente.
Quando a gestante se sente desrespeitada ou submetida a procedimentos desnecessários, nas instituições de saúde durante o atendimento ao pré-natal, parto, aborto ou puerpério, dizemos que ela passou por uma situação de violência, o que caracteriza a chamada violência obstétrica.
Quanto a violência obstétrica, a proposta apresentada define essas atitudes como:
Art. 13 – Caracteriza-se a violência obstétrica como a apropriação do corpo e dos processos reprodutivos das mulheres pelos (as) profissionais de saúde, através do tratamento desumanizado, abuso da medicalização e patologização dos processos naturais, que cause a perda da autonomia e capacidade das mulheres de decidir livremente sobre seus corpos e sua sexualidade, impactando negativamente na qualidade de vida das mulheres.
E não é só isso, ofensas verbais ou físicas, como ironizar ou constranger a mulher devido a fatores como religião, cor, nível educacional ou orientação sexual. Preterir e ignorar queixas e solicitações da grávida também fazem parte dessa lista. Realizar cesariana sem indicação clínica real ou submeter a mulher a procedimentos invasivos desnecessários ou humilhantes também constam como formas de ofensas, e por tanto são considerados fatos caracterizadores da violência obstétrica.
Essa modalidade de violência contra a mulher vem se tornado cada vez mais notória na sociedade, ocorre que um número significativo de mulheres não tem conhecimento do que é uma violência obstétrica, que quando se deparam com uma situação caracterizadora de tal conduta, acreditam que tais atos e procedimentos são meramente normais, ficam traumatizas, abaladas emocionalmente e muitas vezes com sequelas que levarão para a vida toda, mais o pior é que as vezes muitas delas sabem que tem algo errado, mais simplesmente se omitem. A violência obstétrica não é natural. O atendimento ao pré-natal, parto, pós-parto e aborto sempre deve ser realizado com respeito, respeito ao bem-estar da mulher e do bebê, às leis e às evidências científicas.
3. DA COMPARAÇÃO DO PROJETO DE LEI No 7.633/14 COM AS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS CONCERNENTES A MULHER E A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER.
3.1 Dos direitos fundamentais no estado brasileiro segundo a constituição federal de 1988 concernentes a mulher.
A Constituição Federal de 1988 além de restaurar a democracia no Brasil, a nossa Carta Magna também é um marco na defesa da equidade de gênero e a proteção aos direitos da mulher. Diante disso, vemos o avanço que adveio com a Constituição de 1988 no sentido de romper o legado discriminatório em relação a mulher, impulsionado fundamentalmente pela mobilização do movimento feminista, tendo como principal referência no processo de luta pela restauração da democracia e a proteção dos direitos da mulher, a apresentação da Carta das Mulheres Brasileiras aos Constituintes em 1988, esta carta indicava as demandas do movimento feminista e de mulheres. A Carta Magna de 1988 incorporou no artigo 5° que “Homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”. E no artigo 226, parágrafo 5° que “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos pelo homem e pela mulher”. Esses dois artigos inicialmente garantiram a condição de equidade de gênero, bem como a proteção dos direitos humanos das mulheres pela primeira vez na República Brasileira, deles foram desencadeados uma série de direitos e garantias fundamentais as mulheres.
Logo em seu preâmbulo a Constituição Federal manifestou o seu compromisso ideológico em instituir um estado democrático de direito dizendo que:
[...] destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos [...]. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988)
A Carta Magna vigente em nosso país utilizou várias expressões para se referir aos direitos fundamentais, como direitos humanos, direitos e garantias fundamentais, direitos e liberdades constitucionais, direitos e garantias individuais, além de muitas outras, como liberdades individuais, liberdades públicas, liberdades fundamentais, direitos humanos, direitos constitucionais, direitos públicos subjetivos, direitos da pessoa humana, direitos naturais, direitos subjetivos. No que lhe concerne os direitos fundamentais, “são considerados como aqueles reconhecidos pelo direito constitucional positivo e, portanto, delimitados espacial e temporalmente”. (ARSIE apud SARLET, 1998, p. 98).
Considerando a temática versada neste artigo, merecem ênfase os direitos individuais e coletivos e os direitos sociais. Os direitos e garantias fundamentais individuais e coletivos estão voltados primordialmente aos direitos ligados a pessoa humana e a sua personalidade, tais como, a vida, dignidade, honra e liberdade, previstos no artigo 5º da Constituição Federal. Os direitos sociais, por outro lado, asseguram as melhorias das condições de vida dos cidadãos, buscando, dessa forma, concretizar a igualdade social entre hiperssuficientes e hipossuficientes. Ressalta-se que os direitos e garantias fundamentais não estão restritos ao Título II, estando presente em todo texto da Constituição Federal.
Além dos artigos supramencionados, percebemos também que a República Federativa do Brasil tem por um dos seus fundamentos (art. 1° da Constituição Federal) a Dignidade da Pessoa Humana, como um dos princípios fundamentais inerentes ao ser humano, consagrando este como:
Valor essencial, o qual confere unidade e sentido ao texto constitucional, de modo a imprimir-lhe feição particular e inconfundível, que há de perpassar todo o sistema constitucional vigente, servindo de norte para a interpretação das demais normas que o compõem (ANDRADE: apud ROCHA, 1988, p. 113).
De acordo com esse preceito, o ser humano passa a ter valor pelo simples fato de existir, é um princípio que está ligado à sua condição de pessoa, seu conceito é extremamente abrangente, bem como, sua delimitação, desta forma, há uma grande dificuldade de se formar um conceito jurídico a respeito, seu significado vem sendo formado e compreendido historicamente como valor, que preexistiu ao homem. Mas podemos dizer que o princípio da dignidade da pessoa humana está ligado a honra, moral, privacidade, intimidade entre outros diretos da personalidade. É um valor constitucional que irradia luzes sobre todo o ordenamento jurídico, ou seja, em todos os seus âmbitos, atuando como um piso mínimo protetivo, ressaltando a importância do mencionado princípio temos:
A ideia de que a dignidade da pessoa humana é um valor que deve fundamentar e orientar todo e qualquer exercício do poder é facilmente percebida na Constituição não apenas pela primazia topográfica, mas por expressa previsão do primeiro artigo da Constituição, que elege a dignidade da pessoa humana como fundamento da República e do Estado Democrático de Direito que ali eram instituídos. (CASADO FILHO, 2012, p. 58)
Nesse sentido é importante ressaltar que o Constituinte de 1988, considerou o direito à vida e a saúde, como sendo uma decorrência imediata da consagração do princípio da dignidade da pessoa humana. O direito a Saúde por sua vez constitui-se como clausula pétrea, como um direito social fundamental a cada indivíduo e um dever do estado. Diante da formação deste vínculo indivisível de direitos explanados concluímos que o a Constituição Federal de 1988, trouxe ideais capazes de romper preconceitos e fortalecer garantias. Além da Consagração do já mencionado direito à saúde, que passou a ser um direito social fundamental, obrigando o estado a partir daquele momento a prestações positivas, e, por resultado, à formulação de políticas públicas sociais e econômicas destinadas à promoção, à proteção e à recuperação da saúde, e por consequência, o direito à vida, a Carta Política de 1988, foi construtiva e edificante no que tange aos diretos da mulher, que durante muito tempo na história vinha sendo tratada como uma propriedade do homem.
3.2 Dos direitos da mulher pós constituição federal de 1988.
Desde as revoluções do século 18 as mulheres vêm lutando por direitos e igualdade, mais apesar das conquistas importantes realizadas até as primeiras décadas do século 20, como o direito a educação e ao voto, o modelo de igualdade aspirado estava referenciado no modelo masculino de igualdade, no qual não estava incluída a ideia de igualdade paras as mulheres. (BRUSCHINI, C; UNBEHAUM, S, 2002, p. 127).
A Constituição Federa de 1988 representou um grande marco na história das mulheres brasileiras, trazendo resultados as manifestações femininas que ocorriam afim de trazer um pouco mais de dignidade ao sexo feminino. Diante desse processo árduo e contínuo, podemos dizer que a maior vitória que estas tiveram foi a equiparação de gênero, tendo visto, que as mulheres eram tratadas como propriedade do homem e, portanto, não tinham voz, o princípio da igualdade formal encontra-se previsto no caput do art. 5° da Constituição Federal, no qual diz que todos são iguais perante a lei, sendo vedada as distinções de qualquer natureza.
No decorrer da história foi sendo observado que a igualdade formal não era suficiente para garantir as condições de vida igualitárias, essa situação ficou muito clara durante os movimentos e revoluções sociais, desenvolve-se o conceito de igualdade material. Destarte o estado passou a estabelecer um tratamento desigual para os desiguais, na medida de suas desigualdades, de forma a tentar equilibrá-las tanto quanto fosse possível, para entendermos melhor, Filho (2012) em sua obra Direitos Humanos Fundamentais nos explica o que vem a ser a igualdade formal e a igualdade material dentro do princípio da isonomia:
Quando falamos de isonomia, não podemos deixar de lembrar que a igualdade costuma ser vista sob dois aspectos: a igualdade formal, representada pela igualdade perante a lei, e a igualdade material, externada pelos mecanismos constitucionais, em especial os direitos sociais e econômicos, que buscam assegurar a igualdade dos pontos de partida. (CASADO FILHO, 2012, p. 68)
Portanto para que as mulheres fossem tratadas de forma igualitária era necessário que esse novo direito, ou método as alcançasse também de forma que essa equidade não se desse apenas na formalidade da lei, mais sim que fosse uma equidade concreta ou material, levando em consideração sua individualidade nos mais diversos contextos culturais. Além da consagração da equidade de gênero nossa Carta Política assegurou as mulheres a proibição da diferença de salários por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, bem como, trouxe direitos e garantias as presidiarias de terem asseguradas as condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação, e é estabelecido a mulher tempo menor do que o homem para a aposentadoria dentre outros direito e garantias.
Hoje em dia, encontramos nos âmbitos mundial, nacional e regional, direitos e garantias inerentes a mulher, na esfera Global a Organização das Nações Unidas, prevê como proteção aos direitos fundamentais das mulheres, a convenção para eliminar todas as formas de discriminação contra a mulher, esta foi reconhecida pelo brasil em 1 de fevereiro de 1984. Já no campo regional, temos a Convenção para Prevenir, Punir e Erradicar a violência contra a mulher, a convenção de Belém do Pará, ratificada pelo Brasil em 27 de novembro de 1995.
Apesar de existirem amparos legais, o que está em lei não vem sendo obedecido, a desigualdade de gênero apesar de toda evolução histórica ainda está fortemente presente na atualidade e uma das formas pela qual ela se manifesta, é por meio da violência, este fator vem contribuindo para o desequilíbrio de poder entre homens e mulheres. É notório que em muitos dos casos a violência, é usada de forma livre e consciente, como mecanismo de subordinação das mulheres, que por sua vez, muitas vezes deixam de reagir por medo. Neste caso fica visível, o desequilíbrio, a desigualdade que tende a reforçar a indefensibilidade das mulheres quando se deparam com qualquer tipo de violência, como resultado dessa vulnerabilidade, temos a violência contra a mulher crescendo cada vez mais em nosso meio.
3.3. Da violência contra a mulher.
Muito embora exista previsão constitucional a respeito da igualdade de gênero a mulher na prática continua em desvantagem em relação ao homem em diversas questões do cotidiano, a declaração da Organização das Nações Unidas sobre a Eliminação da Violência contra a Mulher, de 1993, e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (Convenção de Belém do Pará), de 1994, identificaram que a violência contra a mulher, seja ela realizada no âmbito público ou privado, constitui grave violação aos direitos humanos e por consequência limita total ou parcialmente o exercício dos demais direitos fundamentais, definindo a violência contra a mulher como:
[...] a expressão ‘violência contra as mulheres’ significa qualquer ato de violência baseado no género do qual resulte, ou possa resultar, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico para as mulheres, incluindo as ameaças de tais atos, a coação ou a privação arbitrária de liberdade, que ocorra, quer na vida pública, quer na vida privada. (ONU, 1993)
O Pensamento feminista através de estudos sobre a violência, procurou por um lado salientar sua disseminação nos mais diversos espaços sociais, e por outro desfazer sua invisibilidade, as pesquisas se orientaram no sentido de perceber a violência como um fenômeno substantivo e plural, já que são diversas as conhecidas expressões para este tipo de violência, quais sejam, violência contra o gênero, violência contra a mulher, violência doméstica, violência sexual, violência familiar, violência conjugal, violência verbal, violência nos serviços públicos e privados, e dentro deste podemos encaixar a violência obstétrica. A violência contra a mulher Pode ser “Definida como uma ação que envolve o uso da forca real ou simbólica por alguém com a finalidade de submeter o corpo e a liberdade de um outro, a violência aparece como uma tentativa de estender a própria vontade sobre a alteridade”.
No Brasil, o tema da violência contra a mulher ganhou notoriedade com a promulgação da Lei no 11.34, de 2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, aguardada e festejada pela população em geral, já que previa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, assunto que cada vez mais amedrontavam milhares de mulheres brasileiras. Além de trazer à tona a discussão acerca do tema, a lei garantiu à mulher uma proteção mais eficiente no seu dia a dia. Conforme artigo 2° da referida Lei:
Art. 2° Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. (BRASIL, 2006)
O artigo 3° da referida lei assegura que:
Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.
Sendo assim, os estudos sobre as modalidades de violências cotidianas, e disseminadas nos variados espaços e relações sociais da sociedade brasileira serve tanto para que todos saibam que determinadas condutas não são normais, e sim violência, bem como, para que se conheça suas múltiplas manifestações, porque só assim conheceremos as novas formas de violência, que a cada ano que passa vem se mostrando de maneiras distintas, pois no nosso contexto muitas mulheres passam por determinadas situações ou se sujeitam a determinados procedimentos por não terem conhecimento de que aquilo caracteriza uma violência contra a mulher, dado isso surge a necessidade do estudo sobre a violência pois ela se apresenta de diversas formas na vida da Mulher.
Mesmo diante dos avanços no que tange aos direitos e garantias da mulher brasileira, vemos que ainda com a divulgação da Lei Maria da Penha, esta não foi suficiente para impedir o desenvolvimento da violência contra a mulher. Analisando uma pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA, que indica as taxas de feminicídio, ou seja, homicídio da mulher por conta de um conflito de gênero, entre 2001 e 2006, a taxa aferida foi de 5,28 por 100.000 mulheres. Já entre 2007 e 2013, após a promulgação da referida da Lei Maria da Penha, a taxa foi de 5,22 em 100.000 mulheres, o que nos faz chegar à conclusão de que, mesmo com a publicação da Lei, o índice deste meio de violência manteve-se nos mesmos níveis do período anterior.
Diante da análise dos alcances da condição feminina firmados nos textos legais, vê-se que a violência contra a mulher persiste até o dia de hoje, e vem se mostrando por diversas aspectos e meios sociais. E como se não bastasse as modalidades de violência já existentes na sociedade brasileira, que sem dúvida retardam ainda mais o desenvolvimento dos direitos da mulher, outro tipo de violência vem se tornando cada vez mais evidente no Brasil, é a violência obstétrica.
4. DAS MEDIDAS QUE PODEM SER ADOTADAS POR MULHERES QUE SE DEPARAM COM AS CIRCUNSTÂNCIAS CARACTERIZADORAS DA VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA.
O Brasil não possui uma lei especifica sobre o combate à violência obstétrica. Contudo, nosso país vem lutando através de novas políticas socias para que as parturientes tenham um atendimento humanizado, existe o projeto de Lei no 7.633, de 2014, que dispõe sobre a humanização e a assistência à mulher e ao neonato durante o ciclo-puerperal. Faz parte da estruturação da proposta que atualmente encontra-se na câmara dos deputados, a erradicação da violência obstétrica, que apresenta que:
Art. 17 – Todos os casos de violência obstétrica praticados pelos profissionais da equipe de saúde serão relatados à ouvidoria dos serviços de saúde e às Comissões de Monitoramento dos Índices de Cesarianas e de Boas Práticas Obstétricas - CMICBPO, e constituem infração à legislação sanitária federal, implicando obrigatoriamente na aplicação das penalidades previstas nesta Lei ao estabelecimento de saúde.
§ 1º - Os e as profissionais de saúde que praticarem atos de violência obstétrica ficam pessoalmente sujeitos à responsabilização civil e criminal decorrente de suas condutas.
§ 2º - Os casos de violência obstétrica serão também notificados aos Conselhos Regionais de Medicina e de Enfermagem, para os devidos encaminhamentos e aplicações de penalidades administrativas aos profissionais envolvidos
O artigo 17 do Projeto de Lei no 7.633, de 2014, dispõe sobre possibilidade de os estabelecimentos de saúde onde ocorrerem a violência obstétrica serem penalizados, por estarem infringindo a legislação sanitária federal. Mas o projeto de lei vai além no que tange a responsabilidade das condutas caracterizadoras da violência obstétrica, trazendo desta vez a possibilidade dos profissionais de saúde envolvidos, também serem responsabilizados no âmbito civil e criminal, arcando assim com a consequência de suas condutas, outra possibilidade apresentada pela proposta recai também sobre o profissional da saúde, mas desta vez o intuito é de responsabiliza-lo administrativamente, ou seja, este passará a responder por processo administrativo instaurado no respectivo órgão institucional.
Dos estados brasileiros o primeiro a sancionar uma Lei em combate a violência obstétrica foi estado de Santa Catarina, a Lei no 17.097, de 2017, que “Dispõe sobre a implantação de medidas de informação e proteção à gestante e parturiente contra a violência obstétrica no Estado de Santa Catarina.” A lei garante proteção à gestante e parturiente contra a violência obstétrica. O primeiro município a aprovar uma Lei na luta para a prevenção da violência obstétrica, foi o município de Diadema, localizado no estado de São Paulo, a Lei no 3.363, de 2013, “Dispõe sobre a implantação de medidas de informação à gestante e parturiente sobre a Política Nacional de Atenção Obstétrica e Neonatal, visando, principalmente, a proteção destas contra a violência obstétrica no Município de Diadema”. Mais uma lei visando proteger as mulheres desta modalidade de violência contra a mulher.
Atualmente o Governo do Amazonas através da Secretaria de Saúde – SUSAM, começou uma campanha educativa sobre a violência obstétrica, através da rede cegonha, que consiste na distribuição de material informativo sobre o tema nas maternidades de Manaus e em outras unidades de saúde das redes pública e privada. A campanha tem por finalidade esclarecer aos profissionais e usuários das redes públicas e privadas de saúde sobre o tema e, consequentemente, colaborar no combate a esse tipo de violência contra as mulheres.
Como já foi mencionado acima, no Brasil ainda não temos lei específica em combate a violência obstétrica promulgada, no entanto, as mulheres que se deparam com essas práticas que caracterizam agressão, identificando a ocorrência da violência obstétrica, se a vítima optar por dar entrada em uma ação judicial, deve exigir a cópia dos prontuários da gestante e do bebê, procurar um advogado ou defensor público, narrar os fatos ocorridos a ele, somente assim você terá seus direitos respeitados, e os médicos e enfermeiros serão responsabilizados civilmente pelos danos causados. Nesse sentido temos:
RESPONSABILIDADE CIVIL – DANO MORAL - VIOLÊNCIA OBSTÉTRICA. Direito ao parto humanizado é direito fundamental. Direito da apelada à assistência digna e respeitosa durante o parto que não foi observado. As mulheres tem pleno direito à proteção no parto e de não serem vítimas de nenhuma forma de violência ou discriminação. Privação do direito à acompanhante durante todo o período de trabalho de parto. Ofensas verbais. Contato com filho negado após o nascimento deste. Abalo psicológico in re ipsa. Recomendação da OMS de prevenção e eliminação de abusos, desrespeito e maus-tratos durante o parto em instituições de saúde. Prova testemunhal consistente e uniforme acerca do tratamento desumano suportado pela parturiente. Cada parturiente deve ter respeitada a sua situação, não cabendo a generalização pretendida pelo hospital réu, que, inclusive, teria que estar preparado para enfrentar situações como a ocorrida no caso dos autos. Paciente que ficou doze horas em trabalho de parto, para só então ser encaminhada a procedimento cesáreo. Apelada que teve ignorada a proporção e dimensão de suas dores. O parto não é um momento de "dor necessária". Dano moral mantido. Quantum bem fixado, em razão da dimensão do dano e das consequências advindas. Sentença mantida. Apelo improvido. (TJ-SP 00013140720158260082 SP 0001314-07.2015.8.26.0082, Relator: Fábio Podestá, Data de Julgamento: 11/10/2017, 5ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 11/10/2017).
Outra forma de combater a violência e ter resguardados seus direitos, é comunicar ao Poder Público o ocorrido, informando à secretaria de saúde da localidade através de um relato detalhando dos fatos, dessa forma, a secretaria da saúde local poderá averiguar o caso internamente e orientar seus profissionais sobre as práticas de assistência ao parto. A vítima de violência obstétrica pode também optar por protocolar uma reclamação junto ao Conselho Regional de Medicina contra o médico e a equipe profissional que lhe prestaram serviço, visto que o Código de Processo Ético-Profissional do Conselho Federal de Medicina prevê a instauração de sindicância para apurar a conduta do profissional que, a depender do apurado, poderá culminar no arquivamento do procedimento ou deflagração de um processo ético- profissional. As vítimas também podem fazer uma reclamação junto ao Ministério Público, tendo visto que este é guardião dos direitos difusos e coletivos, segundo a nossa Carta Magna, cabe a ele a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. Destarte, a direção dada pelo Ministério Público não se restringirá ao caso em particular, mas visará beneficiar toda a coletividade, ampliando desta forma seus efeitos a toda sociedade.
Entretanto, ressalta-se que nenhuma das hipóteses listadas acima irá consolar a vítima, e tão pouco, lhe trazer alívio ao trauma suportado. Milhares de mulheres sofrem ou já sofreram violência obstétrica, mas mesmo diante disso, muitas se mantiveram caladas, não é surpreender, porque a modalidade de violência tratada neste trabalho até pouco tempo era desconhecida, tratada como algo natural, algo que toda mulher iria ou irá passar um dia, um dos momentos mais lindos da vida de uma mulher tem sido manchado, manchado com a violência obstétrica, vejamos um relato:
Me mostraram minha filha às pressas há uns 2 metros de distância e saem todos da sala, me deixando sozinha, de pernas amarradas e abertas de frente para uma janela que dá para rua. Nesse momento percebi que eu continuava chorando sem parar, desde o momento que entrei naquele bloco cirúrgico, e continuei até o momento da alta no dia seguinte. Eu achei que o espetáculo de desrespeito aos direitos humanos já tinha terminado, mas eu me surpreendia cada vez mais (como se fosse possível). Fui depositada numa sala de observação por 3 horas, que pareceram para mim dias. De 5 em 5 minuto eu abordava um funcionário, suplicando por acolhimento e informação. Até que ouço de longe a notícia de que minha filha estava em choque e que tinha pouquíssimas chances de sobreviver. (MISURA, 2013).
Esse é apenas um, dos inúmeros relatos que ao pesquisarmos pelo tema iremos encontrar, o caso narrado é apenas um trecho do que Ana Paula Garcia passou na maternidade, infelizmente seu bebê morreu e passado o sofrimento, ela ingressou com ação no judiciário, foi a primeira ação do tipo no país.
Por meio desta pesquisa, percebeu-se que a violência obstétrica está presente nas unidades de saúde antes, durante e após o trabalho de parto, depreciando a mulher e sua relevância como personagem principal do ciclo gravídico puerperal.
Diante disso, o estudo sobre o tema resgata a importância da minimização ou até mesmo erradicação das práticas prejudicais a saúde da mulher e do bebê praticado pelos profissionais da saúde, se faz necessário a criação de estratégias por parte do estado para que se crie programas de conscientização da parturiente e equipe médica, afim de que ambos os lados possam ter conhecimento sobre o tema.
Ressalta-se que a violência obstétrica ainda é pouco conhecida, mais já é um grande passo o estado reconhecer o tema como sendo de interesse público, milhares de mulheres todos dias estão vivenciando nas maternidades momentos marcantes de puro terror, e ficam caladas, muitas delas por falta de informação, e é desse ponto que surge o Projeto de Lei nº 6.733, de 2014, que traz a violência obstétrica como lei em âmbito nacional, com o objetivo de resguardar os direitos das mulheres gestantes, bem como, para que elas tenham embasamento legal para argumentar e denunciar situações de desrespeito.
REFERÊNCIAS
WYLLYS, Jean. BIOGRAFIA. Disponível em: http://jeanwyllys.com.br/wp/bio. Acesso em: 26 out 2021.
CAMARA DOS DEPUTADOS. Minuta do Projeto de Lei 7.633/2014. Disponível em: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1257785&filename =PL+7633/2014. Acesso em: 26 out 2021.
BEBÊ ABRIL. Disponível em: https://bebe.abril.com.br/gravidez/entenda-como-e-o-parto- humanizado/. Acesso em: 26 out 2021.
UNA-SUS. Universidade aberta do SUS. Disponível em https://www.unasus.gov.br/noticia/voce-conhece-recomendacoes-da-oms-para-o-parto- normal. Acesso em 26 out 2021.
CAMARA NOTICIAS. Projeto institui regras para realização de partos no Brasil. Disponível em:http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/SAUDE/471158-PROJETO- INSTITUI-REGRAS-PARA-REALIZACAO-DE-PARTOS-NO-BRASIL.html. Acesso em: 1 out 2021.
Brasil. Ministério da Saúde. Parto, aborto e puerpério: assistência humanizada à mulher. Brasília 2001. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/cd04_13.pdf. Acesso em: 1 out 2021.
PARIR E NASCER. Disponível em: http://parirenascer.blogspot.com.br/2013/10/inducao-do- trabalho-de-parto-parte-ii.html. Acesso em: 26 out 2021.
TELÉSAÚDE. Conjuntivite Neonatal. Disponível em: https://www.ufrgs.br/telessauders/perguntas/conjuntivite-neonatal/. Acesso em: 26 out 2021.
SANTA CATARINA. Lei no 17.097, de 2017. Florianópolis. Disponível em: http://leis.alesc.sc.gov.br/html/2017/17097_2017_Lei.html. Acesso em: 15 nov. 2021.
SÃO PAULO. Lei no 3.363, de 2013. Diadema. Disponível em: http://www.cmdiadema.sp.gov.br/legislacao/leis_integra.php?chave=336313. Acesso em: 15 nov. 2021.
SÃO PAULO. TJ-SP 00013140720158260082 SP 0001314-07.2015.8.26.0082. Relator: PODESTÁ, Fábio. Publicado no DJ de 11.10.2017. Disponível em: https://tj-sp.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/509315821/13140720158260082-sp-0001314- 0720158260082. Acesso em: 15 nov. 2021.
MISURA, Luciana. O que é a violência obstétrica e como você pode ajudar a acabar com ela. Disponível em: http://luciana.misura.org/2013/02/25/o-que-e-a-violencia-obstetrica-e-como- voce-pode-ajudar-a-acabar-com-ela/. Acesso em 15 nov. 2021.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, Brasília, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 15 nov. 2021.
BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Brasília. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm. Acesso em 15 nov. 2021.
BRUSCHINI, C; UNBEHAUM, S. Gênero, Democracia e Sociedade Brasileira. São Paulo. Editora 34: 2002.
ARSIE, Gonçalves Jaqueline. Violência Obstétrica: uma violação aos direitos fundamentais da mulher. 2015. p. 96. Monografia, Direito, Universidade de Santa Catarina, Centro de Ciências Jurídicas, Florianópolis, 2015.
CASADO FILHO, Napoleão. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Saraiva: 2012 (Coleção Saberes do Direito; p. 57)
Graduando(a) do Curso de Direito do Centro Universitário FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIRA, Sabrina haoxovell de. A violência obstétrica, o lado escuro do parto: de acordo com o projeto de Lei n° 7.633, de 2014 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 nov 2021, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57547/a-violncia-obsttrica-o-lado-escuro-do-parto-de-acordo-com-o-projeto-de-lei-n-7-633-de-2014. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
Por: Jaqueline Lopes Ribeiro
Precisa estar logado para fazer comentários.