RESUMO: A disparidade no contexto racial é tema de grandes discussões a nível social e jurídico. Em um mundo com tantos avanços tecnológicos tornando a sociedade cada vez mais moderna a questão racial ainda está em destaque. O presente artigo visa contextualizar e refletir sobre o racismo, sob o ponto de vista jurídico com foco na constituição federal e outras leis que tratam da questão racial na sociedade brasileira.
PALAVRAS-CHAVE: Constituição- Negro- Questão Racial – Disparidade- Escravidão
ABSTRACT: The disparity in the racial context is subject of great debate at the social and legal level. In a world with so many technological advances making society more and more modern, the racial issue is still highlighted. This article aims to contextualize and reflect about the racism from a legal point of view focusing on the federal constitution and other laws that deal with the racial issue in the Brazilian society.
KEYWORDS: Constitution - Black - Racial Question - Disparity – Slavery
SUMÁRIO: 1. Introdução -2. Principais Leis Relacionadas à Temática Racial 3. Ponderações acerca das Leis 4. Considerações Finais
1. INTRODUÇÃO
Estamos em uma era que os avanços tecnológicos saíram da mente dos cientistas e dos filmes de ficção para as nossas casas, onde inovações inimagináveis fazem parte do nosso cotidiano. Um simples celular que cabe na palma da mão nos conecta com o mundo. Assim, discutir temas como inclusão, diversidade e racismo em uma sociedade moderna é de suma importância, uma vez que se faz necessário que tal avanço seja transferido para outras áreas da sociedade, para que temas como este possam fazer parte da história e não só da realidade brasileira. Provavelmente o melhor caminho a ser seguido nessa reflexão seja voltar ao cerne do problema. Refazendo esse caminho, talvez seja possível encontrar algumas omissões que culminaram no que estamos vivenciando. Assim, faz-se necessário uma linha do tempo com as principais leis atuais que abarcam a questão racial.
2. PRINCIPAIS LEIS RELACIONADAS À TEMÁTICA RACIAL
Em 13 de maio de 1888 através da lei 3.353 foi extinta a escravidão no Brasil, popularmente conhecida como lei Áurea. Tal lei, considerada como marco histórico para negros, foi omissa na questão de integração do negro como ser social dotado de poderes e obrigações. O que se extrai da lei de abolição da escravatura é que políticas sociais adequadas para que negros pudessem ter acesso à educação, alimentação, saúde e lazer não ganharam força ou nem se pensou na criação de tais estatutos e projetos sociais. Assim, encontra-se a primeira lacuna aberta, que poderia explicar a disparidade social entre negros e brancos estampada na sociedade brasileira. Após cem anos da Lei Áurea, a Constituição de 1988, traz em seu texto no título dos princípios e direitos fundamentais art. 3⁰ inciso III – “reduzir a pobreza e a marginalizaçao as desigualdades sociais e regionais”. No inciso IV – “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (BRASIL, 1988, Art. 3⁰ III, IV). A pergunta aqui é: o que foi feito e o que tem sido feito para promover o bem de todos? Tendo em vista que é um direito fundamental impresso no texto constitucional. Mais adiante no art. 4⁰ do regimento das relações internacionais inciso VIII- “repúdio ao terrorismo e ao racismo” (BRASIL, 1988, Art. 4⁰ VII) se o estado repudia o racismo nas relações internacionais pode se inferir que também repudia tal ato dentro do estado. Logo em seguida no artigo 5⁰ da Constituição dos direitos e garantias fundamentais, “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza...” (BRASIL, 1988, Art. 5⁰). O questionamento é: ao viver em um estado democratico de direito e nossa Constituição, sendo considerada lei soberana, repudia o racismo e garante diretos a todos, e assegurado que são iguais perante a lei. A indagação do racismo arraigado, enraizado e por muitos negado, não deveria ser pauta ou discussão atual.
Não obstante, na Lei de abolição da escravatura e no texto constitucional, outras leis foram criadas com o intuito de preencher a lacuna das disparidades sociais entre negros e brancos, retratando a sociedade como desigualitária. Dentre elas a Lei nº 12.711, que garante quotas para candidatos negros, reconhecendo que estes não têm as mesmas oportunidades de ingresso a uma universidade federal devido à uma série de fatores, dentre os quais educação de qualidade. Há também o estatuto da Igualdade Racial, Lei nº 12.288, que promoveu o crescimento em número de atores negros em filmes, comerciais e novelas. Outra lei importante na tentativa de sanar o problema do racismo foi a lei nº 12.990, garantindo a reserva de 20% das vagas oferecidas em concursos públicos aos candidatos negros. Com esse breve e superficial quadro de leis apresentado, observa-se que leis para combater o racismo e banir esse mal que assola, desola e degola a população negra.
3. PONDERAÇÕES ACERCA DAS LEIS
No entanto, é importante se ter um posicionamento diante de tais leis, buscando estratégias para fazer valer os direitos e garantias fundamentais. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), 56% da população se declara como preta ou parda. 56% da população brasileira é formada por negros então juntos podem ser fiscais das desigualdades, elegendo legisladores e membros do Congresso negros ou aqueles sensíveis à causa racial, que possam representar e auxiliar o governo na implantação de políticas eficazes de investimento mais adequados com vistas a sanar a desigualdade com a população negra e outros grupos étnicos, para que as gerações futuras possam gozar de direitos fundamentais e não de uma utopia.[1]
Se o poder emana do povo e considera-se um estado democrático de direito, chegou o momento de refletir, desenvolver e votar para políticas eficazes. Segundo Silvio de Almeida:
não é possível compreender o racismo sem pensar seu funcionamento a partir das estruturas estatais, pois é por meio do Estado que se opera com a classificação e divisão de pessoas. A ideologia nacionalista, por sua vez, apresenta-se como funcional à tentativa de reconstruir uma identidade comum numa tentativa de apagar os conflitos entre os diferentes grupos/classes e as contradições do sistema capitalista, o qual, ao longo do tempo, sofistica suas estratégias e técnicas de reprodução. (Juliana Harumi apud, Almeida; Silvio, 2019)
Toda a história de anos de escravidão e uma abolição realizada apenas no papel culminaram no retrato social da atualidade. Dessa forma, o que resulta em poucos negros ocupando cargos de liderança, como também, poucos são os que cursam educação superior de níveis mais altos de competição. Ações efetivas podem ser colocadas em prática, nas eleições neste ano. É importante eleger deputados sensíveis à causa que poderão desenvolver e votar políticas públicas. Sabe- se que a educação é o esteio de tudo, lutar por uma educação de qualidade às populações mais necessitadas, que se torne prioridade. Desenvolver e oferecer um ensino técnico competente que prepare os jovens, de forma real, para o mercado de trabalho de maneira constante, com a evolução das novas tecnologias. [2]
Assim como se fazem cotas para ingressar nas instituições públicas, expandi-las para o setor privado e para mercado de trabalho como um todo, é inevitável, abrindo um leque de oportunidades àqueles discriminados por racismo no Brasil.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao falar em diversidade e inclusão faz-se necessário citar dentro do grupo de negros também temos LGBT, e outros grupos minoritários que sofrem e são menosprezados por opção sexual, deficiência física e condições diversas que fazem com que alguns se achem no direito de tachar, exclui-los ou colocá-los em grupos.
Por fim, acredita-se que uma serie de medidas em conjunto podem ser o apogeu de uma nova era onde negros e excluídos devem ser respeitados porque são iguais perante as leis e têm direito a uma vida digna. Entendendo-se por vida digna o direito ao trabalho, de ir e vir, de moradia honrada e acesso a educação. A cor da pele deve deixar de ser um ícone de desigualdade no mundo. É hora de devolver aos negros, e aos excluídos por questão racial, de maneira consciente, toda essa privação histórica que assola a sociedade atual.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Silvio Luiz de. O que é racismo estrutural? Belo Horizonte (MG): Letramento, 2018
BERTULIO, Dora Lucia de Lima. Ação Afirmativa no Ensino Superior: considerações sobre a responsabilidade do Estado brasileiro na promoção do acesso de negros à Universidade – o sistema jurídico nacional. In: PACHECO, Jairo Queiroz; SILVA, Maria Nilza da (org.). O negro na universidade: o direito à inclusão. Brasília, DF: Fundação Cultural Palmares, 2007.
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2016]. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm >.Acesso em: 12 out. 2020.
BRASIL, Lei nº 12.711, de 29 de agosto de 2012. Dispõe sobre o ingresso nas universidades federais e nas instituições federais de ensino técnico de nível médio. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12711.htm>.Acesso em: 27 fev. 2019.
BRASIL, Lei nº 3.270, de 28 de setembro de 1885 (Lei do Sexagenário). Disponível em: <https://www.bn.gov.br/explore/curiosidades/28-setembro-1885-promulgada-lei-sexagenarios> Acesso em: 10 out. 2020.
BRASIL, Lei nº 3.353, de maio de 1888 (Lei Áurea). Declara extinta a escravidão no Brasil. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lim/lim3353.htm>, Acesso em: 10 out. 2020.
BRASIL, lei nº 12.288, de 20 de julho de 2010. Esta Lei institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população negra a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12288.htm>. Acesso em: 27 fev. 2019.
BRASIL, Lei nº 12.990, de 9 de junho de 2014.Reserva aos negros 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista controladas pela União.Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12990.htm>Acesso em: 10 out. 2020.
[1] Algumas das iniciativas atuais, projeto de lei N.º 1.866-A, de 1999 do Sr. Luiz Salomão. “Dispõe sobre medidas de ação compensatória para a implementação do princípio da isonomia social do negro; tendo parecer: da Comissão de Educação e Cultura, pela aprovação deste, e pela rejeição do de nº 3147/00, apensado (relatora: DEP. CELCITA PINHEIRO); e da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, pela rejeição deste e dos de nºs 3.147/00, 5.293/01, 5.882/05, 2.697/07 e 6.213/02 apensados (relator: DEP. CARLOS SANTANA).”Disponível em: <https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1715071>. Acesso em: 20 jan. 2021.
Recentemente, a Comissão de Educação (CE) em audiência pública debateu sobre o PL 4656/2020 “que propõe a revisão da Lei de Cotas a cada 10 anos. O autor, senador Paulo Paim (PT-RS) explica que uma avaliação da Lei está prevista apenas para 2022 e que a atual legislação poderá deixar de ser aplicada, caso se considere que os seus objetivos já foram alcançados.” PINHEIRO, Regina. Debatedores pedem a permanência da Lei de Cotas. Disponível em: <https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2021/12/10/debatedores-pedem-permanencia-da-lei-de-cotas>. Acesso em: 30 dez.2021.
[2] Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ipea, um em cada quatro jovens não concluiu o ensino fundamental em 2017 no Brasil e aponta que “As desigualdades de desempenho entre alunas e alunos brancos e negros também é significativa, revelando o caráter interseccional das desigualdades de oportunidades escolares no ensino fundamental.” Assim, é de suma importância que as políticas sejam baseadas na atual realidade. Ipea, disponível em < https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=38348>. Acesso em 20.jan.2021.
LLM em Negócios Transnacionais pela University of the Pacific, McGeorge School of Law,advogada, com experiência profissional em consultoria de direito societário, incluindo nas áreas de compliance, contratos, direito ambiental e politicas internas.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Ana Paula Dos. A Constituição de 1988 diminuiu o racismo contra o negro? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jan 2022, 04:28. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58009/a-constituio-de-1988-diminuiu-o-racismo-contra-o-negro. Acesso em: 26 nov 2024.
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