RESUMO: O presente trabalho tem como objetivo o estudo dos limites constitucionais ao poder de tributar, que se traduzem em princípios e imunidades tributárias. A abordagem será realizada mediante uma análise das normas constitucionais, das jurisprudências dos tribunais superiores e dos entendimentos doutrinários mais recorrentes acerca do tema. Os limites previstos, no plano abstrato, constituem verdadeira proteção e garantia aos contribuintes e à ordem democrática, buscando não só a prevalência dos direitos fundamentais, mas também proporcionar segurança jurídica frente à atuação do Estado. Contudo, no plano concreto, alguns princípios não atingem o fim visado pelo legislador quando de sua edição, isso ocorre, por exemplo, nos tributos indiretos, que afrontam, muitas vezes, o princípio da capacidade contributiva e do não confisco. Ademais, devido ao diferente cenário nacional quando da elaboração da Carta Magna, algumas imunidades, hoje, se distanciaram dos objetivos democráticos previstos, como à que se refere aos partidos políticos. Assim, é necessária a análise da justiça tributária desejada pela Constituição Federal de 1988 e a efetivamente alcançada quando de sua aplicação.
Palavras-chave: Princípios, imunidades, direitos fundamentais, segurança jurídica, poder de tributar;
ABSTRACT: This paper aims to study the constitutional limits to the power to tax, which are the principles of Constitutional tax and the tax immunities. The approach will be carried out through an analysis of the constitutional norms, the jurisprudence of the higher courts and the most recurrent doctrinal understandings regarding this subject. Those limits, in the abstract plan, constitute a real protection and guarantee to the taxpayers and to the democratic order, seeking not only the prevalence of fundamental rights, but also to provide legal certainty beyond the State’s performance. However, some principles do not reach the end sought by the legislator when they were issued, this occurs, for example, in indirect taxes, which often face the principle of contributory capacity and non-confiscation. Futhermore, due to the different national scenario at the time of the Federal Constitution, some immunities today have distanced themselves from the democratic objectives, such as the one which refers to political parties. Thus, it is necessary to analyse the tax justice desired by Federal Constitution of 1988 and the one effectively achieved when applied.
Keywords: Principles, immunities, fundamental rights, legal certainty, power of tax;
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2. DESENVOLVIMENTO. 2.1. A EFICIÊNCIA ECONÔMICA DOS TRIBUTOS. 2.2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS.2.3. NÃO-INCIDÊNCIA. 2.4. ISENÇÃO. 2.5. IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS. 3. CONCLUSÃO. 4. REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
Mediante um movimento contrário à concepção liberal e ao Estado mínimo, que defendia a presença do Estado apenas nos setores essenciais e com o mínimo de interferência na seara econômica, teve início, no século XIX, uma intervenção maior do ente público no comportamento dos indivíduos e dos agrupamentos, seguindo caminho inverso ao da emancipação da sociedade civil em relação ao Estado (BUFFON et al, 2016).
Segundo LENZA (2019), diferentemente dos Estados Unidos que adotaram uma constituição garantia, promovendo o liberalismo econômico, a Constituição Federal de 1988 traduz uma constituição dirigente, que busca a igualdade substancial e a promoção dos direitos sociais. Assim, a Carta Magna instituiu como destinação da tributação não só o financiamento do Estado, mas também como uma forma de redistribuição de renda, buscando concretizar a tributação como um meio de promover a justiça social e tributária. Isso também se deve ao fato de que o Brasil ainda é um país que apresenta acentuada desigualdade social em todo o seu território.
Na relação jurídico tributária entre os contribuintes e o Estado, aqueles estão em uma posição inferior devido à supremacia do Poder Público. Diante disso, as limitações constitucionais ao poder de tributar estabelecem garantias aos indivíduos de forma a impedir a atribuição ao Sistema Tributário Nacional de arbitrariedades que possam ferir os direitos fundamentais dos nacionais, mas sim que seja um sistema justo e solidário, pautado por determinações legais e que não possuam efeito confisco sobre a renda dos contribuintes.
A despeito da Carta Magna instituir limitações ao poder de tributar buscando a justiça tributária, no que concerne aos tributos incidentes sobre o consumo, ocorre não a progressividade da tributação, como deveria, mas sim a regressividade, onerando mais aqueles que possuem menor renda e atingindo frontalmente o princípio da capacidade contributiva (D’ARAÚJO et al, 2013).
Assim, no presente trabalho serão discutidas as limitações constituições ao poder de tributar impostas pela Constituição Federal de 1988, a eficácia do Sistema Tributário Nacional quanto ao respeito a tais limitações e a promoção dos fins visados no plano abstrato na norma e sua efetivação no plano concreto. O desenvolvimento será composto por um estudo da eficácia econômica dos tributos, dos princípios constitucionais tributários e da não incidência, isenção e imunidades tributárias.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1. A EFICIÊNCIA ECONÔMICA DOS TRIBUTOS
Segundo BUFFON et al (2016), quanto à eficiência econômica dos tributos, é preciso uma análise das funções distributiva, alocativa e estabilizadora. A primeira objetiva a diminuição da diferença econômica entre os indivíduos do país, promovendo ajustes na distribuição de renda, e se consagra mediante os princípios complementares da capacidade contributiva e da redistribuição de riquezas. A função alocativa consiste na promoção de ajustes na alocação de recursos, pois o ônus tributário é revertido para a própria população mediante a oferta de bens e serviços essenciais e desejados, e que não são ofertados pelo sistema privado.
Por fim, os autores explicam que a função estabilizadora está relacionada com a manutenção da estabilidade econômica, mediante a aplicação combinada de gastos e receitas para impactar ou amortecer tendências cíclicas da economia.
Assim, é possível afirmar que, em sua essência e de forma otimizada, os tributos devem ser recolhidos considerando as peculiaridades sociais e econômicas, de forma a não onerar os indivíduos sem observar a proporcionalidade, e o mesmo deve ser devolvido à população, mediante bens e serviços, buscando a equidade social e econômica.
2.2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS
Os princípios tributários previstos na Constituição Federal de 1988 são verdadeiras garantias aos contribuintes, estabelecendo limites à atuação estatal e funcionando como vetores interpretativos da própria Carta Magna (PEZZI, 2006).
Os princípios não são taxativos nem absolutos. Assim, a aplicação prática em situações que gerem conflitos deve sempre buscar a ponderação dos princípios conforme o caso concreto.
Por não serem absolutos, ALEXANDRE (2017) enumera diversas exceções aos princípios tributários, muitas delas foram estabelecidas pela própria Carta Magna, como para os tributos extrafiscais que, em alguns casos, não respeitam o princípio da anterioridade e em podem ter suas alíquotas alteradas por ato do Poder Executivo, dispensando a necessidade de edição de lei. Essa sistemática é necessária para que o tributo possa atingir a sua própria finalidade de intervir na economia, quando necessário.
Contudo, quando da análise do caso concreto, nem sempre os princípios são realmente respeitados no Sistema Tributário Nacional. Um caso alvo de muitas discussões se refere ao princípio do não confisco que, por ser um conceito indeterminado e, consequentemente, não ter contornos bem definidos sobre o que seria ou não confisco sobre a renda do contribuinte, é muitas vezes desrespeitado, principalmente quanto aos tributos que incidem sobre o consumo e sobre a renda. Nesse cenário, DIDIER (2018) afirma que o STF negou eficácia às limitações constitucionais ao poder de tributar quando expressamente optou por não analisar o significado e conceito de renda por entender que essa atribuição cabe à legislação infraconstitucional.
Segundo CABRAL (2018), a tributação brasileira é, em sua maioria, indireta e regressiva, onerando mais os contribuintes de baixa renda. Isso se deve ao fato que tais contribuintes possuem uma elevada parcela de seus rendimentos comprometidos com o pagamento de tributos, ao passo que o indivíduo com renda e patrimônio elevados, ainda que paguem um valor superior, esse valor proporcionalmente ao rendimento auferido é bem menor e não compromete seu patrimônio.
Diante desta discussão, o princípio da capacidade contributiva reafirma que a arrecadação de tributos também deve respeitar a proteção do mínimo existencial, princípio também elencado na CF (BORGES et al, 2016).
2.3. NÃO-INCIDÊNCIA
Segundo ALEXANDRE (2017), juridicamente, a incidência tributária está relacionada com a ocorrência de uma hipótese prevista abstratamente e anteriormente na lei tributária como necessária e suficiente para o nascimento de uma obrigação tributária. Assim, a não incidência corresponde a ocorrências não previstas na regra tributária.
ALEXANDRE (2017) sintetiza três formas em que a não incidência pode ocorrer. A primeira delas seria o caso em que o ente tributante não define determinada situação como hipótese de incidência tributária, mas ela poderia ter sido prevista. O segundo caso consagra a situação em que a hipótese de incidência não estaria abarcada na atribuição constitucional do ente tributante. Por fim, o último caso se refere às imunidades tributárias constitucionalmente previstas, ou seja, a Constituição Federal de 1988 delimita a competência do ente federativo de forma a estabelecer que determinadas situações não podem configurar hipóteses de incidências.
O instituto da imunidade tributária será mais bem analisado em um tópico posterior.
2.4. ISENÇÃO
Segundo ALEXANDRE (2017), diferentemente das imunidades tributárias que consistem em uma delimitação da competência do ente tributante, as isenções se referem ao próprio exercício da competência tributária. Assim, as isenções não estão previstas constitucionalmente, mas em leis, atuando no exercício legal de uma competência.
Ademais, por vezes a Constituição Federal de 1988 institui verdadeiras imunidades sob o título de isenção. Contudo, por estarem previstas constitucionalmente e não legalmente, tais hipóteses de isenção são essencialmente imunidades tributárias. Um exemplo que constitui verdadeira imunidade é o parágrafo 7º do artigo 195 da Carga Magna, que dispõe (BRASIL, 1988):
Art. 195. §7º São isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei (Título VIII, Capítulo II, Seção I).
2.5. IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS
Segundo ALEXANDRE (2017), a imunidade tributária é uma espécie do gênero não incidência.
Ainda que as imunidades tributárias estejam intrinsecamente vinculadas aos princípios tributários, estes não são sinônimos, de forma que as imunidades necessariamente devem conter previsão na Constituição Federal (PORTELLA, 2016).
A Carta Magna atribuiu aos templos religiosos, partidos políticos e instituições sem fins lucrativos o instituto da imunidade tributária, buscando resguardar os próprios valores elencados na Constituição e a manutenção da ordem democrática (RIBEIRO et al, 2016).
Contudo, a exemplo dos partidos políticos e instituições religiosas, segundo CALDAS (2017), configura abuso de direito a utilização indevida da norma imunizante e a mesma não deve ser interpretada de forma absoluta, uma vez que o patrimônio, renda e serviços de determinadas instituições possuem valores bastante elevados, e a imunidade, nestes casos, fugiria da própria real vontade do legislador constituinte.
Assim como apresentado quanto aos princípios constitucionais tributários, também nas imunidades, o Sistema Tributário Nacional se mostra falho e alvo de diversas críticas.
3. CONCLUSÃO
Conforme exposto no presente artigo, embora a Carta Magna tenha instituído princípios e imunidades visando a proteção dos contribuintes frente ao poder de tributação do Estado, sobretudo quanto aos hipossuficientes, no plano concreto, o fim alcançado muitas vezes é contrário.
A despeito das críticas apresentadas neste estudo, é possível afirmar que diversas limitações ao poder de tributar constituem sim garantias aos indivíduos, alcançando os resultados desejados pelo legislador. Contudo, de forma geral, o Sistema Tributário Nacional se mostra falho, principalmente nos tributos incidentes sobre o consumo, dificultando ainda mais a justiça social e econômica.
Assim, é necessária uma reestruturação da tributação, de forma que seja alcançada e respeitada não só a capacidade contributiva dos indivíduos, mas também a solidariedade econômica. O Sistema Tributário Nacional deve levar em consideração as diferentes realidades sociais que cada região brasileira apresenta, servindo como um instrumento extrafiscal quando necessário, para que seja alcançada a justiça tributária mediante uma melhor redistribuição do ônus fiscal e, em sequência, a arrecadação seja efetivamente mais bem redistribuída para a população.
4. REFERÊNCIAS
ALEXANDRE, R. Direito Tributário/Ricardo Alexandre – 11. Ed. rev., atual. e ampl. – Salvador – Ed. JusPodivm, 2017.
BORGES, A. de M.; OLIVEIRA, A. M. Limitações ao Princípio da Capacidade Contributiva: Mínimo Existencial e Confisco. Conpedi Law Review, v. 2, n. 4, p. 180-200, Uruguai, 2016.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 10 de junho de 2020.
BUFFON, M.; MARCOLAN, E. P. Tributação como Instrumento de Intervenção Estatal: Breve História, desde a Modernidade à Idade Contemporânea. Revista de Finanças Públicas, Tributação e Desenvolvimento – RFPTD, v. 4, n. 4, 2016.
CABRAL, M. V. C. Imposto de Renda e Justiça Fiscal à Luz do Princípio Constitucional da Capacidade Contributiva. Revista de Finanças Públicas, Tributação e Desenvolvimento – RFPTD, v. 6, n.6, 2018.
CALDAS, F. R.. O abuso da imunidade tributária. 01/06/2017. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-tributario/o-abuso-da-imunidade-tributaria/. Acesso em: 10 jun. 2020.
DIDIER, T. V. A Ineficácia das Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar na Construção do Conceito de Renda pela Jurisprudência do STF. Revista de Finanças Públicas, Tributação e Desenvolvimento – RFPTD, v. 6, n. 7, p. 159-176, 2018.
D’ARAÚJO, P. J. S.; GASSEN, V.; PAULINO, S. R. da F. Tributação sobre Consumo: O esforço em onerar mais quem ganha menos. Sequência (Florianópolis), n.66, p. 213-234, jul. 2013.
LENZA, PEDRO. Direito Constitucional Esquematizado/Pedro Lenza. – 23. Ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2019. (Coleção esquematizado ®)
PEZZI, A. C. G. Dignidade da Pessoa Humana, Mínimo Existencial e Limites à Tributação no Estado Democrático de Direito. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Faculdade de Direito. Porto Alegre, RS, 2006.
PORTELLA, A. As Limitações ao Poder de Tributar Estabelecidas na Constituição Federal, de 1988. Revista ESMAT, ano 8 – nº 10, p. 89-110, 2016.
RIBEIRO, M. de F.; SILVA, T. N. Imunidade Tributária e o Princípio da Segurança Jurídica. Revista Thesis Juris – RTJ, eISSN 2317-3580, v. 5, n. 2, p. 531-547, São Paulo, 2016.
Engenheira Civil
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Larissa Albuquerque Marques. Os limites constitucionais ao poder de tributar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 abr 2022, 04:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58214/os-limites-constitucionais-ao-poder-de-tributar. Acesso em: 22 nov 2024.
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