DANILO BEZERRA DE CASTRO[1]
(orientador)
RESUMO: O trabalho analisa a responsabilidade civil do médico por erro médico, frente a responsabilidade instituída no Código de Defesa do Consumidor. O objetivo geral objetivo é identificar o entendimento predominante a respeito da responsabilidade civil do médico por dano ao paciente. O problema da pesquisa abrange os casos envolvendo erro médico e a responsabilização civil por danos causados ao paciente frente à possível incidência da responsabilidade imposta no Código de Defesa do Consumidor. A metodologia é pesquisa bibliográfica e documental, para desvendar conceitos, raciocínios, entendimentos da legislação, doutrinas, e jurisprudências que possam ser utilizadas no tema. Perante o ordenamento pátrio são imputadas exceções a responsabilidade do profissional liberal, o Código de Defesa do Consumidor adota a responsabilidade, independente de culpa e o Código Civil a comprovação da conduta negligente, imprudente e negligente do médico. Quanto aos resultados, a responsabilidade das clínicas e hospitais é objetiva. Conclui-se que a responsabilidade do profissional liberal é subjetiva, incidindo a responsabilidade objetiva nos casos previstos em legislação.
Palavras-chave: Culpa; Erro Médico; Objetiva; Responsabilidade Civil; Subjetiva.
ABSTRACT: The work analyzes the doctor's civil liability for medical error, facing the responsibility established in the Consumer Defense Code. The general objective is to identify the prevailing understanding regarding the physician's civil liability for harm to the patient. The research problem covers cases involving medical errors and civil liability for damages caused to the patient in view of the possible incidence of liability imposed by the Consumer Defense Code. The methodology is bibliographic and documentary research, to unveil concepts, reasoning, understandings of legislation, doctrines, and jurisprudence that can be used in the subject. Exceptions to the responsibility of the liberal professional are imputed before the national order, the Consumer Defense Code adopts responsibility, regardless of fault and the Civil Code the proof of the negligent, reckless and negligent conduct of the doctor. As for the results, the responsibility of clinics and hospitals is objective. It is concluded that the responsibility of the liberal professional is subjective, focusing the objective responsibility in the cases foreseen in legislation.
Keywords: Fault; Medical Error; Objective; Civil Responsability; Subjective.
1 INTRODUÇÃO
O estudo analisa a responsabilidade civil do médico frente ao imposto no Código Civil, considerando que o legislador instituiu o Código de Defesa do Consumidor (CDC), o que inflige divergência acerca de qual espécie de responsabilidade irá predominar no caso concreto, na responsabilidade subjetiva (lei cível) ou responsabilidade objetiva (legislação consumerista).
Tem-se por objetivo identificar o entendimento predominante a respeito da responsabilidade civil do médico por dano ao paciente, se este realmente será obrigado a reparar o dano causado, ou seja, obter um estudo mais aprofundado da relação médico-paciente. Os objetivos específicos estão apresentados nos três capítulos escolhidos para discussão do tema, dessa maneira, exemplificar o erro do médico durante sua atuação profissional, identificar a relação entre médico e paciente - contratual ou lega, analisar a responsabilidade civil por danos causados por erro dos médicos.
O problema da pesquisa abrange os casos envolvendo erro médico e a responsabilização civil por danos causados ao paciente, levando em conta que o Código de Defesa do Consumidor também poderá ser aplicado ao caso (perante a constatação de uma relação de consumo entre médico e paciente, essa conexão será regida pelo CDC) e imputa a vulnerabilidade do consumidor. Com isso, surgem questionamentos a respeito da incidência da responsabilidade civil nessa situação.
Vale acrescentar que a denominação erro médico, é expressão utilizada pelo Poder Judiciário para classificar a responsabilidade existente na conjuntura fática entre médico e paciente. Conquanto, no ordenamento brasileiro, ao profissional liberal são imputadas exceções, é tanto que o Código de Defesa do Consumidor adota a responsabilidade objetiva desses profissionais, ou seja, a responsabilidade independente de culpa e o Código Civil a comprovação da conduta negligente, imprudente e negligente.
Para tanto, não restam dúvidas da importância do tema. Nesse pressuposto, também há responsabilidade de clínicas e unidades hospitalares.
Em relação a metodologia jurídica, está qualificada como pesquisa bibliográfica e documental, para desvendar conceitos, raciocínios, entendimentos da legislação, doutrinas, e jurisprudências que possam ser utilizadas no tema. A relevância da pesquisa, incide na possibilidade de viabilizar outros estudos sobre o assunto, além disto, os casos que compreendem erro médico, afetam mulheres de pessoas diariamente.
O primeiro tópico fomenta o conceito de erro médico e o desenvolvimento histórico, fazendo abordagem doutrinária, abarcando a atuação profissional e o modo de agir de forma imprudente, negligente ou imperita.
A segunda seção trata da natureza jurídica das relações de consumo, analisando a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ante a vulnerabilidade do consumidor ao adquirir produtos ou serviços.
Por consequência, o terceiro e último pressuposto teórico investiga a responsabilidade civil, estudando o entendimento da doutrina e posicionamento da jurisprudência sobre o conteúdo.
2 O ERRO DO MÉDICO DURANTE SUA ATUAÇÃO PROFISSIONAL
No primeiro capítulo será abordado os aspectos introdutórios acerca do erro médico. Vale frisar que o termo “erro médico”, embora em desuso, é utilizado neste estudo para promover uma melhor didática.
A terminologia “erro médico” foi feita em razão de ser a expressão bastante usada pelo Poder Judiciário para se tratar da responsabilidade civil existente na relação médico e paciente. Desse modo, por estratégia científica elegeu-se a referida expressão. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
Acerca dos preceitos históricos do erro médico, com primeiro histórico tem-se a tratativa disposta no Código de Hamurabi:
(...) que adotava a lei de talião da qual se encontram registros na Lei das XII Tábuas e que foi a primeira a estabelecer a compensação financeira. No Egito, as regras do Livro Sagrado deveriam ser seguidas pelos médicos que, assim procedendo, estariam livres de qualquer punição, mesmo com a morte do paciente. Os ostrogodos e visigodos entregavam o médico para a família do doente, falecido por suspeito erro daquele, para que o justiçassem como bem entendessem. Da composição voluntária à critério da vítima, e que envolvia um “resgate” soma em dinheiro ou entrega de um objeto, passou-se à composição tarifada. Sobreveio, então, a Lei Aquilia, que estabeleceu as bases da responsabilidade dos médicos, prevendo indenizações e abolindo a pena de morte por imperícia e negligência. Exigia, entretanto, que o dano contrariasse o Direito e que fosse derivado de falta in committendo. (CORREIRA-LIMA, 2012, p. 23)
O mencionado autor ratifica dizendo que o Direito Francês acabou com a responsabilidade civil dos médicos em 1929, ao proclamar a responsabilidade moral dos profissionais de medicina. Já em 1936, firmou-se novo entendimento jurisprudencial sobre a responsabilidade médica, impulsando a responsabilidade médica e a responsabilidade do erro médico. (CORREIRA-LIMA, 2012)
Todavia, revela-se que o direito a integridade humana em sentido amplo (físico e moral), acompanha o homem desde sua concepção, com o surgimento da sua personalidade, ou seja, desde o nascimento com vida, até a morte, sendo este direito, oponível a tudo e a todos. (MILLEN et al., 2014)
Acerca do conceito, o erro médico, ou propriamente dito, o dano causado pela atuação médica, pode ser de natureza patrimonial ou extrapatrimonial (este último se divide em danos morais e danos estéticos, que serão analisados mais adiante no terceiro capítulo). (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
A denotação “erro médico” forma na mente das pessoas uma ideia de uma falha cometida pelo médico (incompetência). A expressão, entretanto, deve ser entendida como qualquer situação indesejada ocorrida nos serviços de assistência à saúde, de modo abrangente, envolvendo médicos, enfermeiros, entidade de atuação na área ou militantes em saúde. Na maioria dos casos, são situações isoladas se se considerar a infinidade de consultas, prescrições, tratamento, cirurgias, que são praticadas diariamente. Sendo ainda verbalizado de várias maneiras, como erro técnico, má prática profissional, mal desempenho ou conduta inadequada. Erro de diagnóstico, erro no procedimento, erro na escolha da terapia, falta de procedimento terápico, erro na administração ou prescrição de medicamento, falha de atendimento, etc. (POLICASTRO, 2019)
Assim, o erro médico e o erro do médico são premissas inconfundíveis, ao passarem pelo campo do Direito Civil, no que corresponde a responsabilização do causador do dano, de forma a ressarcir o prejuízo causado em face à conduta ilícita causadora de lesão física ou moral. (POLICASTRO, 2019)
É definido ainda como “a conduta (omissiva ou comissiva) profissional atípica, irregular ou inadequada, contra o paciente durante ou em face de exercício médico”. (CORREIRA-LIMA, 2012, p. 21)
Pode ser qualificada também como o dano provocado ao paciente, pela ação ou omissão, durante o exercício da profissão, sem o interesse de cometer o ato, em outros termos, há um defeito na prestação do serviço pelo médico ao paciente (aquele que sofre o dano). Um dos maiores receios de um médico, durante o exercício da profissão é cometer um erro, pois isso possivelmente impacta a vida de todas as partes envoltas ao caso concreto. (DEL VALLE, 2020)
Em função disso, as atividades “do médico e dos hospitais situados no Brasil, assim como todas as ações capazes de gerar dano, estão sujeitos à responsabilização, a depender do caso, civil ou criminal que a Lei determina”. (SILVA; THIBAU, 2020, p. 149). Como se vislumbra, a expressão erro médico, tem muita amplitude e com isso abarca além dos médicos, outros profissionais do ramo da saúde, como dentistas, enfermeiros, fisioterapeutas, dentre outros. Em resumo, será compreendido como o dano ocasionado ao paciente pela ação ou omissão de um profissional atuante na área da saúde. (FREITAS, 2020)
De todo modo, o erro médico poderá ser decorrente da atuação do profissional, e também derivado da atividade dos hospitais e clínicas médicas (ante a falta de assistência aos profissionais de saúde durante o exercício da profissão). Além do mais, não restam dúvidas que a ação ou omissão nesses mencionados núcleos poderá causar dano ao paciente. (FREITAS, 2020)
Nesse contexto, o Conselho Federal de Medicina no Código de Ética, classifica o erro médico conforme a conduta praticada pelo profissional durante a atuação:
É vedado ao médico:
Art. 1º Causar dano ao paciente, por ação ou omissão, caracterizável como imperícia, imprudência ou negligência.
Parágrafo único. A responsabilidade médica é sempre pessoal e não pode ser presumida
(BRASIL, 2010, não paginado)
Embora o Código de Ética Médica não traga definição sobre o que seja erro médico, é essencial que o médico atue preventivamente de forma a evitar erros, sendo atualizado e atento ao cumprimento nas diretrizes dispostas no Código de Ética Médica. (BRASIL, 2010)
Conforme o exposto, no Artigo 186 do Código Civil de 2002 (Lei n. 10.406/2002) verifica-se que:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
(BRASIL, 2002, não paginado)
Na mesma forma, a Constituição Federal de 1988 traz em seu bojo normativo, que deverá se responsabilizar civilmente o sofredor do dano, no artigo 5°, inciso V e X: “Art. 5°, inciso V, é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” e “inciso X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação” (BRASIL, 2022, não paginado).
Dentro do certame médico, tem-se como imperícia a falta de conhecimento sobre determinado ato, é exemplo a falta de especialidade técnica. Na perspectiva da prática da imprudência, essa está atrelada a ação do profissional que age de modo a causar danos ao paciente, como na hipótese em que o médico prescreve medicamentos pelo telefone (para o seu auxiliar), sem realizar maiores exames. A negligência é conduta representada pela omissão, aqui o profissional será cobrado pelo que deixou de fazer. (SOUZA, 2020)
Há muitos modos do médico ser declarado imperito, imprudente ou negligente, como em situações em que qualquer profissional poderá delegar para assistente inexperiente procedimento que este não domina; realizar cirurgia sem os equipamentos de segurança necessários ou sem realizar o chamado risco anestésico; não verificar alergias ou a ingestão de outras drogas incompatíveis ao prescrever medicações etc. Não é aceitável, por exemplo, que vítima de lesão no trânsito, politraumatizada, não seja submetida a exame radiológico ou avaliação neurológica. Ou que o anestesiologista realize, simultaneamente, duas ou mais anestesias. (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2019)
O erro médico poderá ser arguido sobre duas formas de responsabilidade, como ser verá nos capítulos seguintes, a responsabilidade legal, aquela atribuída aos tribunais, que comporta ações de cunho penal e civil. E a responsabilidade administrativa, cuja competência fica a cargo dos Conselhos de Medicina, por meio de instauração de procedimento ético disciplinar. (MILLEN et al, 2014)
Como consequência disso, o número de demandas judiciais envolvendo erro médico é expressivo. Em pesquisa realizada pelo Conselho Nacional de Justiça entre os anos de 2014 a 2017, aponta-se que foram ajuizadas cerca de 83.728 demandas pleiteando indenização por erro médico. (BRASIL, 2018)
A doutrina de Santos estima que aproximadamente 70% dos processos contra médicos ocorrem por não terem especialização, deixando claro que a falta de informação específica os leva a praticar falhas. (SANTOS, 2014)
Em dados divulgados pela pesquisa realizada pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar da Universidade Federal de Minas Gerais, entre abril de 2017 a março de 2018, com análise de 182 prontuários de hospitais de todo o país, cerca de 19,4 milhões de pessoas são tratadas em hospitais brasileiros, e 1,3 milhão sofre algum efeito colateral em decorrência do ato praticado pelo médico, em alguns casos a consequência disso poderá ser fatal, pois segundo o estudo, 55 mil pessoas morrem por ano no país em razão dos chamados erros médicos. (FIORAVANTI, 2020)
Mesmo com as grandes proporções envoltas no assunto, principalmente pela mídia, que pode desencadear forte pressão sobre o caso, ainda existem casos que não ganham notoriedade, e não chegam sequer a ser relatados e investigados pelas autoridades. Com isso, não se sabe realmente o que acontece com a vítima, a maioria dos estudos dão importância para o número de denúncias e processos, sem investigar mais a fundo a subjetividade da questão atrelada a vítima. (MENDONÇA; CUSTÓDIO, 2016)
Vale ressalvar que nem toda falha profissional deverá ser enquadrada como erro médico, pois o dano à saúde do paciente poderá ser provocado pela evolução do caso, que estará emanado de incerteza e imprecisão da ciência. Cabe ao Poder Judiciário analisar cada situação conforme as provas apresentadas nos autos. (FREITAS, 2020)
Conforme visto, o médico será responsabilizado quando agir de forma imprudente, negligente ou imperita, no atendimento ao paciente durante o exercício de suas funções laborativas. No mesmo modo, poderá incorrer em penalidades outros profissionais de saúde e até mesmo hospitais e clínicas.
3 A RELAÇÃO ENTRE MÉDICO E PACIENTE - CONTRATUAL OU LEGAL
Considerando que podem surgir alguns imbróglios jurídicos, imperioso o estudo sobre a relação entre médico e paciente poderá ser atrelada as tratativas legais dispostas no Código de Defesa do Consumidor. É enriquecedor, abordar a natureza da relação de consumo entre médico e paciente. A natureza jurídica da relação entre médico e paciente é alvo de embates pela doutrina, havendo divergência sobre o tema:
Parte da doutrina defende ser a responsabilidade médica sempre contratual, fundamentada no fato de que o paciente (ou alguém que o represente), ao procurar o profissional da saúde, e este, ao aceitar tratá-lo, celebram um negócio jurídico. Este entendimento encontra respaldo na ideia de que o contrato de prestação de serviços médicos não exige formalidade, podendo ser verbal ou até tácito, e se aperfeiçoa com o acordo de vontades entre pessoas capazes, vez que o objeto, em regra, é lícito. (PITANGA, 2017, p. 24)
Nessa esteira, ainda remanesce, “de maneira minoritária, o entendimento de que a relação tem natureza jurídica sui gêneris (de contrato atípico), em face da especificidade e complexidade da ligação que se estabelece entre o profissional e o seu paciente”. (PITANGA, 2017, p. 24)
Assim, as disposições legais referentes aos contratos estão sistematizadas no Código Civil de 2002. A matéria divide-se entre contratos parte geral e contratos em espécie, compreendendo os artigos 421 a 480 e também os artigos 481 a 823. (BRASIL, 2002)
Em sua definição na lei civil, o contrato é ato jurídico, bilateral ou plurilateral que representa um pacto entre duas ou mais vontades, cujos os interesses se contrapõem, assim, uma das partes fica encarregada da prestação e a outra da contraprestação (MELLO, 2021).
O contrato tem como pressuposto, a manifestação da vontade, seja tácita ou expressa dos concordantes. Devendo ser pontuado, na celebração do mesmo, os princípios da boa-fé, lealdade, e sigilo quando este for preciso. (FERNANDES, 2011)
Por consequência, o Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990) é também aplicado ao caso. Nesse sentido, o consumidor é o paciente, e o médico o fornecedor, a lei consumerista trata da definição de ambos:
Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
(BRASIL, 1990, não paginado)
O paciente é consumidor, pois se beneficia dos serviços prestados pelo médico (profissional liberal), que será remunerado pela sua prestação de serviço, por isso, há quem defenda a relação médico e paciente como uma relação de consumo.
Na sequência, é preciso discorrer sobre a definição de produto e serviço, os parágrafos do artigo 3º da Lei n. 8.078/1990, dispõem que:
Art. 3º (...)
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (BRASIL, 1990, não paginado)
Entende-se por profissional liberal o prestador de serviço solitário, que faz do seu conhecimento um mecanismo de sobrevivência, abrangendo a responsabilidade pessoal deste pelos serviços prestados. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
Dessa conjuntura entre consumidor e fornecedor, surge uma relação contratual de prestação de serviço, portanto. A doutrina expressa no que concerte ao contrato de consumo, que o “Código de Defesa do Consumidor Brasileiro, tem o dever de amparar o consumidor frente aos contratos”. (TARTUCE, 2017, p. 227)
O Código de Defesa do Consumidor considera a natureza da relação médico e paciente como contratual, entretanto, a relação não deve ser tratada de modo simplista, como mero contrato, é preciso uma reflexão que respeite as partes envolvidas, garantindo que a vontade do paciente seja respeitada. (PAZINATTO, 2019)
No direito médico, as cláusulas contratuais devem ser pactuadas com a maior transparência e clareza possível para que ambas as partes entendam o que está sendo acordado, e com isso, invalidando a possibilidade de o contrato ser anulado ou nulo (BAIA, 2019). Conforme a Resolução do Conselho Federal de Medicina 01/2016, e do Código de Ética Médica de 2018, no que se refere aos contratos, as informações devem ser claras e objetivas, pois garantem mais segurança ao ato médico e permitem ao paciente consentir ou declinar da terapêutica proposta pelo profissional. (PAZINATTO, 2019)
Assim sendo, a natureza da combinação entre médico e paciente, é caracterizada como contratual, em decorrência da existência de uma prestação de serviços por parte do médico em favor do paciente. Com o objetivo de proporcionar satisfação ao cliente (nesse caso paciente), o médico realiza algum procedimento (cirúrgico ou não). (ROSA, 2013)
Considerando a vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo, e com fundamento na teoria do risco da atividade do fornecedor, o Código de Defesa do Consumidor (CDC) adotou a responsabilidade objetiva como regra geral. Diante da vulnerabilidade, da hipossuficiência do consumidor e da necessidade de protegê-lo, opta o CDC, expressamente, pela responsabilidade objetiva dos fornecedores de produtos ou serviços (VARALLI, 2022). O CDC consolida a responsabilidade sem culpa do fornecedor, com exceção de alguns casos previstos em lei. Trata-se de responsabilidade objetiva, que independe da análise de culpa do fornecedor, fundada na teoria do risco, que considera a possibilidade de dano como parte da atividade econômica empresarial, imputando obrigação de reparação mesmo que não haja configuração da culpa, por negligência, imprudência ou imperícia. (AZEVEDO, 2015)
A natureza jurídica dos hospitais perante os pacientes também é contratual, pois se estabelece uma relação firmada por um contrato de prestação de serviço hospitalar, composto pelo fornecimento de hospedagem, medicamentos, e serviços paramédicos. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
Os artigos 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor apresentam a disposição da responsabilidade do fornecedor pelo produto ou serviço:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(BRASIL, 1990, não paginado)
Os mencionados dispositivos criam a sistemática da responsabilidade no mercado de consumo, como fundamento para reparação do consumidor, quanto aos danos materiais e morais causado pelo fornecedor. Vale destacar que o parágrafo 3º do artigo 14, trata da inversão do ônus da prova para o fornecedor de serviços, que responderá independentemente da existência de culpa. (BRASIL, 1990)
Todavia, o parágrafo 4º do mesmo dispositivo legal, estabelece que os profissionais liberais têm responsabilidade subjetiva, ou seja, depende de culpa. Já o Código Civil de 2002 dispõe sobre a responsabilidade subjetiva nos artigos 186 e 927. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
Diante desse dispositivo, criou-se na prática uma espécie de inversão automática do ônus da prova:
(...) contra o profissional, sem se questionar a presença de verossimilhança ou da hipossuficiência (critérios ditos ope iudicis). Desta maneira, compactuou-se, em farta jurisprudência, que a relação médico-paciente configura relação de consumo e que esta deve implicar, sempre ou quase sempre, na inversão do ônus probatório da culpa para o profissional liberal (fornecedor). (NUNES DE SOUZA, 2015, p. 75-76 apud PITANGA, 2017, p. 28)
Assim, a responsabilidade pessoal dos profissionais liberais deverá ser apurada mediante a verificação de culpa. A exceção prevista na lei, considera as relações contratuais dos fornecedores como personalíssimas, ou seja, aquelas que não podem ser transferidas a outrem, pois estarem relacionadas a determinada pessoa. (AZEVEDO, 2015)
Além de estabelecer a responsabilidade objetiva para o Hospital, o CDC adotou a responsabilidade solidária. Consolidando o entendimento que todos os fornecedores de produtos ou serviços que causem danos aos consumidores podem responder pela totalidade da reparação. A solidariedade está prevista nos artigos 7º e 25 (AZEVEDO, 2015)
Logo, a relação entre hospital e paciente que carrega um status de contrato de consumo, também é eivada de responsabilidade objetiva, justificada mediante a presença da hipossuficiência do consumidor frente a figura do fornecedor, como forma de amenizar a desigualdade existentes nas relações de consumo. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
Em relação a esse aspecto, o hospital, enquanto prestador de serviço, está diante de uma responsabilidade sem culpa para todos os casos de acidente de consumo provocados pelo fornecimento de serviço com defeito, desde que o dado esteja atrelado as atividades praticadas por profissional vinculado. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021)
Quanto aos médicos que apenas compõem o corpo clínico, sem vínculo empregatício. De acordo com o a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, os médicos que utilizam as instalações hospitalares para realização de cirurgias não estão inseridos em uma relação médico e hospital. (BRASIL, 2019)
4 RESPONSABILIDADE CIVIL POR DANOS CAUSADOS POR ERRO DOS MÉDICOS
Neste capítulo serão investigados os pressupostos da responsabilidade civil objetiva e subjetiva na reparação de danos pelo médico para com o paciente. Antes de estudar detalhadamente o assunto, é conveniente fazer uma breve explicação do instituto da responsabilidade no Direito Civil brasileiro.
Com o passar do tempo a responsabilidade civil veio se debatendo, sobre qual a teoria era eficaz para aplicar nos fatos danosos, sendo, subjetiva ou objetiva. Mas no século XXI foi decidido que ambas deveram ser utilizadas. O direito brasileiro convive sabiamente com ambas as responsabilidades civis, a objetiva e subjetiva. (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2019)).
Contudo, a divisão entre responsabilidade civil subjetiva e objetiva, causa diferença no andamento do processo judicial, e como consequência disso, reflete na condenação ou o dever de indenizar. A responsabilidade objetiva é a condenação do fornecedor de serviço (hospital, clínica, laboratório, etc.). A pessoa jurídica será obrigada a indenizar, mesmo sem culpa, basta que haja o dano e o nexo causal, ou seja, o dano tenha sido causado por ato do preposto do estabelecimento. O mesmo já não ocorre com a responsabilidade subjetiva, em que o dano e o nexo causal, deverá existir com a comprovação da culpa. A responsabilidade objetiva é aplicada para o profissional liberal, conforme o parágrafo 4º do artigo 14 do CDC. (SANTOS, 2014)
A responsabilidade civil do médico é subjetiva, conforme já mencionado, pois além de não existir legislação que a defina como objetiva, o Código Civil de 2002, expressa a seguinte redação:
Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.
(BRASIL, 2002, não paginado).
Então, assim o legislador deixa claro, pela disposição do artigo 951 do Código Civil de 2022 a referência ao profissional da saúde, o médico, recepcionando a responsabilidade subjetiva.
Embora a responsabilidade civil seja tratada como regra. Existe a responsabilidade objetiva, sem a comprovação do elemento culpa, conforme descrito no artigo 927 do Código Civil, in verbis:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
(BRASIL, 2002, não paginado).
Pela leitura do artigo, mesmo que o agente não tenha agido com culpa, haverá o dever de indenizar, sendo assim, o juiz poderá condenar, mesmo que não exista nenhuma conduta negligente, imprudente ou imperita. Para sustentar no que afirma o artigo citado acima no que se refere a indenização, observa-se o seguinte julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), onde dispõe que:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PROCEDIMENTO CIRÚRGICO REALIZADO PARA RESOLVER SÍNDROME DA APNÉIA OBSTRUTIVA DO SONO (SASO). FALECIMENTO DO PACIENTE. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO ACERCA DOS RISCOS DA CIRURGIA. CONSTATAÇÃO APENAS DE CONSENTIMENTO GENÉRICO (BLANKET CONSENT), O QUE NÃO SE REVELA SUFICIENTE PARA GARANTIR O DIREITO FUNDAMENTAL À AUTODETERMINAÇÃO DO PACIENTE. RESTABELECIMENTO DA CONDENAÇÃO QUE SE IMPÕE. REDUÇÃO DO VALOR FIXADO, CONSIDERANDO AS PARTICULARIDADES DA CAUSA. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE. (BRASIL, 2022, não paginado).
Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a responsabilidade e do médico é subjetiva, sendo configurada após a comprovação da culpa nos termos do Código de Defesa do Consumidor e do Código Civil de 2002.
Assim, a responsabilidade civil será objetiva, nos casos especificados na lei, devendo haver uma previsão legal para que determinado agente responda sob a égide da responsabilidade civil objetiva.
Em decorrência disso, veja o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, dispondo sobre responsabilidade civil, onde não houve a demonstração do erro médico:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO INDENIZATÓRIA - RESPONSABILIDADE CIVIL - ERRO MÉDICO -RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL - PROVA DE CULPA DO MÉDICO IMPRESCINDIBILIDADE - ERRO MÉDICO NÃO COMPROVADO - PRETENSÃO INDENIZATÓRIA IMPROCEDENTE. - A RESPONSABILIDADE CIVIL DO HOSPITAL PELO ERRO MÉDICO COMETIDO EM SUAS DEPENDÊNCIAS TEM NATUREZA OBJETIVA, ISTO É, INDEPENDE DA DEMONSTRAÇÃO DE CULPA DO PRÓPRIO HOSPITAL EM RELAÇÃO AO EVENTO DANOSO, TODAVIA, NÃO PRESCINDE DE PROVA DA CULPA DO MÉDICO, POSTO QUE A RESPONSABILIDADE DESTE É SUBJETIVA, EX VI DO ART. 14, $ 4°, DO CDC - AUSENTE A DEMONSTRAÇÃO DE ERRO MÉDICO, NÃO HÁ QUE SE FALAR EM CONDENAÇÃO DO NOSOCÔMIO AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO A PACIENTE ATENDIDA EM SUAS DEPENDÊNCIAS. (BRASIL, 2020, não paginado).
Isso ocorre, devido ao fato de alguns tribunais brasileiros entenderem que a relação médica paciente é uma relação de consumo, subordinada ao Código de Defesa do Consumidor, onde o médico é prestador de serviço e o paciente consumidor. (SANTOS, 2014)
Embora o Código de Ética Médica estabeleça que a natureza da atuação profissão do médico não caracteriza relação de consumo. Mesmo assim, o consenso jurisprudencial é de que a relação médico-paciente se configura como típica relação de consumo (GODINHO et al., 2020). Entretanto, tem-se os médicos como profissionais liberais que exercem, com autonomia, seu mister profissional, sem subordinação técnica a outrem. Esses profissionais, segundo o CDC, apenas respondem culposamente pelos danos que causem (CDC, art. 14, § 4º). (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2019)
Nesse sentido, poder-se-ia perguntar se haveria, normativamente falando, vantagem para o paciente em se aplicar o CDC, ao invés do Código Civil, sendo certo que a responsabilidade civil do médico, nos dois casos, é subjetiva, isto é, depende do elemento culpa. A resposta afirmativa se impõe, sem pretensão de exaustividade. (FARIAS; BRAGA NETTO; ROSENVALD, 2019)
Assim, “não se pode negar a formação de um autêntico contrato entre o cliente e o médico, quando este o atende. Embora muito já se tenha discutido, hoje já não pairam mais dúvidas a respeito da natureza contratual da responsabilidade médica como subjetiva”. (GONÇALVES, 2021, p. 1094)
Logo, “independentemente do dano causado, a responsabilidade civil médica e de natureza subjetiva. Mas a responsabilização na seara médica tem suas peculiaridades”. (ROSENVALD; MENEZES; DADALTO, 2021, não paginado)
Em virtude do erro médico, alguns aspectos da responsabilidade civil devem ser observados:
O dever de reparar a vítima surgirá se a ação ou omissão do médico causar dano à saúde ou à integridade do paciente. Mas a conduta geradora de resultado adverso será considerada erro médico se distante daquilo que se espera de um bom profissional. De todo modo, o erro médico pode ser consequência da atuação do profissional em si, ocasião em que a responsabilização civil exige a prova da culpa, mas também pode derivar da atividade dos hospitais e clínicas, quando a responsabilidade é objetiva, dispensando a aferição da culpa. (CARVALHO, 2021, sem paginação)
Desse modo, a obrigação delineada acima é compatível com a responsabilidade civil do médico sob o viés subjetivo, e não objetivo, como dispõe a doutrina, e a jurisprudência em alguns casos específicos. (CARVALHO, 2021)
Nesse seguimento, afirma-se que a “responsabilidade civil do profissional decorrente do erro médico e apresenta pressupostos legalmente definidos, como o exercício profissional, o dano, a culpa e o nexo de causalidade, e que esta responsabilidade será, no geral, contratual, subjetiva e como obrigação de meio” (CORREIA-LIMA, 2012, p. 43). Para caracterização da responsabilidade civil, é necessária a configuração da conduta do agente, da culpa, do nexo de causalidade e o dano:
A conduta do agente decorre de uma ação que consiste em uma conduta positiva, e da omissão que seria a não realização de um dever jurídico de praticar determinado ato. A culpa é outro elemento imprescindível, sendo regra para caracterização da responsabilidade civil, revelada através da imprudência, negligência e imperícia. O nexo de causalidade, traduzido na ligação ou relação de causa e efeito entre a conduta e o resultado. (MELLO, 2022, p. 82-83)
A responsabilidade civil por erro médico surge quando é agredido um interesse eminente particular, sendo como um dano de natureza material, moral, estético, e assim ferindo a outrem, no entanto, o sujeito que cometeu o ato ilícito é responsável pelo pagamento de uma compensação pecuniária, caso não possa repor o dano causado anteriormente, conforme exposto no Código Civil de 2002. (BRASIL, 2002).
Por via de consequência, a possibilidade de responsabilização ocorrerá somente se houver um dano, que pode ser material, moral, estético, afetivo ou existencial. A materialização do dano ocorre com a definição do efeito prejuízo suportado pela vítima (MELLO, 2022). Os pressupostos definem o grau de responsabilidade do agente e, consequentemente o modo de reparação:
No âmbito do trabalho médico, pode haver a responsabilidade tanto no plano jurídico como no plano moral. No plano jurídico, porque pode ocorrer a responsabilidade jurídica na área penal e na área civil. A responsabilidade jurídica vai emergir quando ocorrer um prejuízo material ou imaterial. A reação a esse prejuízo se dá na área penal ou na área civil, conforme o ofendido, titular do direito violado, seja a sociedade ou um indivíduo. No caso de ser a sociedade, a responsabilidade será penal; caso seja um indivíduo, o ofendido, a responsabilidade será civil. (LOPES et al., 2018, p. 5)
O referido autor sustenta a ideia de uma triple responsabilidade, entre médico e paciente, assegurando as responsabilidades civis, criminais e de consumo, em caso de erro, quando o médico atende o paciente no hospital ou em consultório particular. Por consequência disso, o erro médico poderá ser punido também perante Conselho Federal de Medicina através de sanção disciplinar. (LOPES et al., 2018)
Assim, a responsabilidade médica é analisada por ângulos opostos, a primeira é a responsabilidade decorrente da prestação de serviço direita e pessoal do médico como profissional liberal, e a segunda insurge da prestação de serviços médicos de forma empresarial, dentro das instituições hospitalares, clinicas, casas de saúde, laboratórios entre outros. (CAVALIERI FILHO, 2015 apud CUNHA, 2019).
Esse tratamento diversificado dado aos profissionais liberais pressupõe dos fatores externos que podem afetar a materialização do que fora contratado, tendo em vista que o resultado fim não depende apenas do esforço profissional. (ANGELIM, 2018)
Além disso, a jurisprudência do Tribunal do Distrito Federal e Territórios fortalece o disposto pela doutrina, acerca da responsabilidade subjetiva do médico e responsabilidade objetiva do hospital:
A RESPONSABILIDADE DOS HOSPITAIS NO QUE TANGE À ATUAÇÃO DOS MÉDICOS É SUBJETIVA, DEPENDENDO DA DEMONSTRAÇÃO DA CULPA DO PROFISSIONAL. A PACIENTE FOI SUBMETIDA A UMA CIRURGIA E, DURANTE O PERÍODO DE RECUPERAÇÃO, APÓS SENTIR DESCONFORTO ABDOMINAL, FOI CONSTATADO O ESQUECIMENTO DE UMA COMPRESSA EM SEU ABDÔMEN. OS DESEMBARGADORES EXPLICARAM QUE A RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL, VIA DE REGRA, É OBJETIVA, FUNDADA NA TEORIA DO RISCO DA ATIVIDADE, DE MODO QUE, PARA A RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTABELECIMENTO, FAZ-SE NECESSÁRIO DEMONSTRAR SOMENTE A FALHA DO SERVIÇO E A RELAÇÃO DE CAUSALIDADE COM O RESULTADO LESIVO. TODAVIA, SE O ERRO DERIVA DE IMPERÍCIA, IMPRUDÊNCIA OU NEGLIGÊNCIA DO MÉDICO E NÃO DE FALHA HAVIDA NO SERVIÇO HOSPITALAR, A RESPONSABILIDADE DO HOSPITAL, EMBORA SOLIDÁRIA, SOMENTE SE CONFIGURA QUANDO COMPROVADA A CULPA DO PROFISSIONAL. PARA OS JULGADORES, O ESQUECIMENTO DA COMPRESSA CIRÚRGICA NO CORPO DA PACIENTE, POR SI SÓ, CARACTERIZA A EVIDENTE CULPA DO MÉDICO. DESSA FORMA, O COLEGIADO CONCLUIU QUE O HOSPITAL DEVE RESPONDER PELOS DANOS OCORRIDOS, AINDA QUE NEGUE A EXISTÊNCIA DE QUALQUER VÍNCULO COM O PROFISSIONAL QUE REALIZOU O ATO CIRÚRGICO. (BRASIL, 2015, sem paginação)
Desse modo, verifica-se que a responsabilidade do médico é subjetiva e do hospital é objetiva. O Superior Tribunal de Justiça, em sua jurisprudência, esclarece que o hospital responde objetivamente pelos danos causados por seus funcionários, porém, a responsabilidade dos danos decorrentes do trabalho médico sem vínculo, haverá responsabilidade subjetiva do profissional, conforme o Recurso Especial 1.832.371:
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. ERRO MÉDICO EM PROCEDIMENTO CIRÚRGICO. LEGITIMIDADE PASSIVA DO HOSPITAL. TEORIA DA ASSERÇÃO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO HOSPITAL. SOLIDARIEDADE COM OS MÉDICOS RESPONSÁVEIS PELA CIRURGIA. COMPROVAÇÃO DA CULPA DOS PROFISSIONAIS. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. HIPÓTESE EXCEPCIONAL. JULGAMENTO: CPC/2015. (BRASIL, 2021, sem paginação)
Nesse julgando, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça proferiu esse entendimento no julgamento de uma ação indenizatória que envolvia um menor, vítima de erro médico durante a realização de cirurgia cardíaca.
Sendo assim, a responsabilidade civil do erro médico, é questão complexa, ante a dicotomia existente entre a responsabilidade objetiva disposta no Código de Defesa do Consumidor e a responsabilidade subjetiva imposta pelo Código Civil de 2002.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O erro médico abrange vários conceitos, sendo utilizado pela doutrina e por consequência, o Poder Judiciário, para definir as ações imprudentes, negligentes e imperitas praticadas pelo profissional liberal. A expressão pode ser compreendida como uma situação decorrente da relação médico e paciente. É definida no Código de Ética Médica respeitando os mesmos pilares do Código Civil, a exigência de ação ou omissão voluntária, negligente, imprudente e imperita. Além da atuação do profissional liberal, o erro médico poderá incidir sobre as clinicas e unidades hospitalares.
Conforme observado, a maioria dos casos envolvendo erro médico, parte das condutas do profissional liberal, quase 70%, pelos dados divulgados, a maioria das ações ajuizadas são contra erro médico. Embora a crescente incidência do assunto, ainda existem relatados que não são investigados, seja por receio da vítima em denunciar ou a comprovação dos danos causados.
A natureza jurídica da relação entre médico e paciente é alvo de embate doutrinário, parte da doutrina considera a responsabilidade médica como contratual, entendimento pautado pela não formalidade dos contratos de prestação de serviço. A Resolução do Conselho Federal de Medicina 01/2016, e do Código de Ética Médica de 2018 ratifica a objetividade das informações que representam segurança nas condutas médicas.
Assim, as informações prestadas pelos médicos, devem ser as mais claras possíveis. Frente ao disposto, impera no ordenamento brasileiro duas conjunturas, da responsabilidade do profissional liberal, a responsabilidade objetiva, reflexo do Código de Defesa do Consumidor e a responsabilidade civil subjetiva imposta no Código Civil, salvo aqueles casos que a lei civil define como responsabilidade objetiva.
Levando em conta que algumas dessas situações podem ser classificadas como relação de consumo, a vulnerabilidade do consumidor predomina sobre o fornecedor. Na responsabilidade subjetiva o profissional deverá responder por seus atos, desde que comprovada sua culpa, e a responsabilidade objetiva independe de culpa.
Sob as clínicas e hospitais recai a responsabilidade objetiva, as unidades hospitalares respondem objetivamente pelos danos causados aos pacientes pelos médicos que compõem seu corpo clinico. Os médicos sem vínculo empregatício não estão inseridos nessa responsabilidade objetiva e respondem subjetivamente.
Conclui-se que a responsabilidade do profissional liberal é subjetiva, incidindo a responsabilidade objetiva nos casos previstos em lei, conforme a jurisprudência pátria do Superior Tribunal de Justiça e a doutrina.
REFERÊNCIAS
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[1] Professor da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP). Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília. E-mail: [email protected]
Graduando do curso de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERNANDES, FELIPE TEIXEIRA. A responsabilização civil por erro médico ao paciente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 out 2022, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/59594/a-responsabilizao-civil-por-erro-mdico-ao-paciente. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Erick Labanca Garcia
Por: Erick Labanca Garcia
Por: ANNA BEATRIZ MENDES FURIA PAGANOTTI
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
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