JOSÉ AUGUSTO BEZERRA LOPES
(orientador)[1].
RESUMO: Diante da garantia constitucional de saúde laboral, a proteção do trabalhador e principalmente o oferecimento de mecanismos de saúde mental e psicológica fazem com que a legislação brasileira previna a ocorrência de doenças ocupacionais, responsabilizando o empregador pela violação aos direitos dos trabalhadores. Recentemente, a Síndrome de Burnout passou a ser classificada como uma doença do trabalho, que entrou em vigor a partir de 1 de janeiro de 2022 com o CID 11 pela Organização Mundial de Saúde. A síndrome do esgotamento profissional do colaborador é caracterizada por sentimentos negativos em relação ao seu trabalho, especialmente aqueles profissionais que estão sob constante pressão e rigor excessivo, desencadeando além de sintomas psicológicos, reações físicas no indivíduo portador da doença. Normalmente relacionada com situações internas, a Burnout é analisada aqui como uma consequência do assédio moral praticado no ambiente de trabalho e os efeitos dela decorrentes para o empregador. Realizada mediante consulta bibliográfica, a metodologia de desenvolvimento do texto é a dedutiva, partindo das premissas gerais sobre as doenças laborais e os sintomas das doenças psicológicas; para as específicas, compreendendo a caracterização da Síndrome de Burnout e as consequências financeiras para os empregadores.
Palavras-chave: Exaustão. Equilíbrio. Vida Profissional.
ABSTRACT: Given the constitutional guarantee of occupational health, worker protection and especially the provision of mental and psychological health mechanisms make Brazilian legislation prevent the occurrence of occupational diseases, blaming the employer for the violation of workers' rights. Recently, Burnout Syndrome came to be classified as an occupational disease, which came into force on January 1, 2022 with ICD 11 by the World Health Organization. The employee's professional burnout syndrome is characterized by negative feelings about their work, especially those professionals who are under constant pressure and excessive rigor, triggering, in addition to psychological symptoms, physical reactions in the individual with the disease. Usually related to internal situations, Burnout is analyzed here as a consequence of the moral harassment practiced in the work environment and the resulting effects for the employer. Conducted through bibliographic consultation, the text development methodology is deductive, starting from the general premises about occupational diseases and the symptoms of psychological diseases; for the specific ones, including the characterization of Burnout Syndrome and the financial consequences for employers.
Keywords: Exhaustion. Balance. Professional life.
INTRODUÇÃO
Assegurada inclusive na Constituição Federal, a saúde dos trabalhadores é uma preocupação que não se limita ao indivíduo, mas também pertence à sociedade e principalmente ao empregador, uma vez que, caso haja o adoecimento no curso do contrato de trabalho, poderá estar caracterizada a doença ocupacional, da qual decorrem uma série de obrigações patronais.
Dentre os deveres do empregador, encontra-se o de proporcionar um ambiente de trabalho saudável, sem ocorrência de práticas que violem os direitos dos empregados, especialmente situações que afetem moralmente os trabalhadores, atingindo a saúde mental.
Recentemente, os diagnósticos da doença de Burnout elevaram os debates jurídicos sobre os fatores que podem levar ao desenvolvimento dessa síndrome em trabalhadores brasileiros e as consequências que ela pode ocasionar nos contratos de trabalho.
O motivo da preocupação advém do fato de que, dentre as situações mais recorrentes em casos de Burnout, se destaca o assédio moral muitas vezes vivenciados no ambiente laboral, fatos estes que levam à exaustão do trabalhador até que este seja reconhecidamente diagnosticado com a síndrome em questão.
Por todo o mencionado, esta pesquisa apresenta o resultado da análise da Síndrome de Burnout como uma consequência do assédio moral organizacional e os efeitos jurídicos advindos de sua constatação, com maior enfoque na responsabilidade civil do empregador.
MATERIAL E MÉTODOS
A produção deste artigo científico de pesquisa bibliográfica se deu através de uma análise específica sobre a síndrome de Burnout e sua ocorrência após situações de assédio moral no ambiente de trabalho.
Sem intervenção ou abordagem direta junto aos seres humanos, a pesquisa se fundamenta em informações publicadas até o momento de sua elaboração, retiradas de sites, bibliotecas, jornais, revistas, periódicos, material digital e outros meios de divulgação de informação gratuita e onerosa.
Apesar de somente no ano de 2022 ter havido oficialmente a classificação da Síndrome de Burnout como uma doença ocupacional, a pesquisa inclui os documentos científicos publicados na última década, marcada pelo surgimento dos casos reais, considerando os ensinamentos de profissionais da medicina e do direito laboral.
1 O DIREITO AO AMBIENTE LABORAL SAUDÁVEL
Ao trabalhador é garantido um ambiente de trabalho saudável e seguro, sendo considerado um instrumento para o alcance da finalidade laboral, com um trabalho produtivo e lucrativo para o empregado e o empregador.
É importante estabelecer que o ambiente de trabalho é o local onde se desenvolvem as relações de trabalho, onde se dá a convivência entre os trabalhadores e o desenvolvimento das atividades laborais. Por isso, é indispensável que o local de trabalho disponha de condições dignas para que o trabalhador se sinta mais motivado no desenvolvimento de suas tarefas (BRITO, 2014, p. 14).
É sabido que ao trabalhador são resguardados uma série de direitos individuais, os quais estão enumerados no artigo 7º da Constituição Federal de 1988, dentre eles encontra-se a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (inciso XXII, artigo 7º, CF). No mesmo artigo também há a proibição de qualquer discriminação ou distinção entre os profissionais em um ambiente de trabalho (BRASIL, 1988).
Os ditames constitucionais mencionados consistem em direitos sociais pertencentes a todos os indivíduos, cuja proteção é dever do Estado e também da sociedade.
Entre os fundamentos axiológicos da sociedade brasileira estão, na forma do preâmbulo da Constituição de 1988, a segurança e o bem-estar sociais. Esses valores, compreendidos em sua dimensão mais ampla, asseguram conclusão no sentido de que a ordem social interna está comprometida com tais propósitos, sendo recorrentes evidências disso no campo laboral. Perceba-se que entre os direitos sociais estampados no art. 6º do texto constitucional estão o trabalho, a segurança e a saúde, dando relevo à redação do art. 7º, XXII, do mesmo diploma legal. Não há dúvida, portanto, de que os trabalhadores têm o direito de ver reduzidos os riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança laboral. Esse é um compromisso não apenas do Estado brasileiro, mas de toda a sua sociedade, que é confirmado pelo confronto entre os arts. 200, VIII, e 225, caput, da Carta Magna (MARTINEZ, 2016, p. 547).
Tratam-se de garantias diretamente relacionadas com os direitos humanos, posto que são desdobramentos do direito à vida, à segurança e à saúde, que constituem corolários do princípio fundamental da dignidade humana (LEITE, 2018).
O princípio da dignidade humana busca assegurar aos trabalhadores vários direitos, dentre eles o direito à intimidade, protegendo o empregado contra o assédio sexual, a qualquer tipo de discriminação ou a qualquer situação degradante que cause a ele vexame ou humilhação.
Resta evidente, que o princípio da dignidade humana tem aplicação abrangente, protegendo o empregado nas suas relações trabalhistas contra situações degradantes e humilhantes que venham a denegrir a sua honra e respeitabilidade (BRITO, 2014, p. 1).
A previsão de um ambiente laboral saudável tem por escopo a prevenção de riscos, visando impedir que o trabalhador seja acometido por um acidente de trabalho ou seja diagnosticado com doenças decorrentes do trabalho (doenças ocupacionais), sobre as quais o tópico a seguir se desenvolve.
2 AS DOENÇAS OCUPACIONAIS NO DIREITO DO TRABALHO
Para além dos acidentes que atingem sobremaneira a saúde dos trabalhadores, a legislação nacional trata de definir as doenças ocupacionais e profissionais no artigo 20 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991:
Art. 20. Consideram-se acidente do trabalho, nos termos do artigo anterior, as seguintes entidades mórbidas:
I - doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social;
II - doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constante da relação mencionada no inciso I.
§ 1º Não são consideradas como doença do trabalho:
c) a que não produza incapacidade laborativa;
d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.
§ 2º Em caso excepcional, constatando-se que a doença não incluída na relação prevista nos incisos I e II deste artigo resultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho (BRASIL, 1991).
Deste modo, são duas espécies diferentes de adoecimento do trabalhador, mas que possuem os mesmos efeitos práticos. Sobre a diferença entre a doença de trabalho e a profissional, ensina:
Diferentemente da doença profissional, a doença de trabalho não está atrelada à função desempenhada pelo trabalhador, mas ao local onde o operário é obrigado a trabalhar.
Como exemplo de doença de trabalho, podemos citar: o câncer que acomete trabalhadores de minas e refinações de níquel, as pessoas que trabalham em contato com amianto ou em proximidade com algo radioativo, os trabalhadores que sofrem de doenças pulmonares por estarem em contato constante com muita poeira, névoa, vapores ou gases nocivos, a surdez provocada por local extremamente ruidoso, entre outros (RAMOS JUNIOR,2018, p.1).
Por não serem resultado da função exercida pelos trabalhadores, várias são as hipóteses de doenças de trabalho que causem a incapacidade laboral do funcionário, seja por questões físicas, como também de ordem psicológica. Nesta última modalidade, a Síndrome de Burnout têm crescido entre os trabalhadores.
2.1 A SINDROME DE BURNOUT
Um dos assuntos em alta no direito do trabalho consiste na possibilidade de a Síndrome de Burnout ser considerada uma doença ocupacional, causada principalmente pela ocorrência de assédio ocupacional.
O motivo da análise jurídica consiste no fato de que um dos diagnósticos mais recorrentes entre trabalhadores incapacitados para o desempenho de suas funções é o de síndrome de Burnout.
Segundo as informações disponibilizadas pela OMS, a síndrome é caracterizada como o “estresse crônico no ambiente de trabalho que não foi gerenciado com sucesso”. Consequentemente, a pessoa pode apresentar:
· falta de energia e sentimento de exaustão;
· atitude cínica ou negativa em relação ao trabalho;
· distanciamento mental das suas atividades;
· redução da eficácia durante o desempenho do serviço.
Porém, é importante ressaltar que não é o mesmo que o transtorno generalizado de ansiedade ou a depressão, já que a causa do burnout está diretamente relacionada com o trabalho. Porém, quando não tratada, a síndrome pode dar origem a essas e outros transtornos emocionais (CARVALHO, 2022, p.1).
Da definição acima, percebe-se que os sintomas do Burnout são manifestados de formas diferentes:
São diversos os sintomas associados ao Burnout encontrados na literatura. Dentre eles estão os sintomas físicos (fadiga constante e progressiva, dores musculares ou osteomusculares, distúrbios do sono e do sistema respiratório, cefaleias/enxaquecas, perturbações gastrointestinais, imunodeficiência, transtornos cardiovasculares, disfunções sexuais e alterações menstruais em mulheres); os sintomas psíquicos (falta de atenção/concentração; alterações da memória; lentificação do pensamento; sentimento de alienação, de solidão e de impotência; impaciência; labilidade emocional; dificuldade de auto aceitação/baixa autoestima; stenia/desânimo/disforia/depressão; desconfiança/paranoia); os sintomas comportamentais (negligência/escrúpulo excessivo, irritabilidade, incremento da agressividade, incapacidade para relaxar, dificuldade na aceitação de mudanças, perda de iniciativa, aumento do consumo de substâncias, comportamento de alto risco, suicídio) e os sintomas defensivos (tendência ao isolamento, sentimento de onipotência, perda do interesse pelo trabalho ou até pelo lazer, absenteísmo, ímpetos de abandono do trabalho, ironia/cinismo) (LOPES e PEGO, 2015, p.1).
Oficialmente, a síndrome de Burnout foi reconhecida como uma doença ocupacional a partir de janeiro do ano de 2022, quando foi incluída na Classificação Internacional de Doenças (CID) da Organização Mundial de Saúde (OMS), repercutindo nos direitos trabalhistas e previdenciários advindos das atividades laborais (CAVALLINI, 2022).
Uma das suas causas principais consiste no assédio moral em ambiente de trabalho.
3 O ASSÉDIO MORAL COMO ELEMENTO CARACTERIZADOR DA SINDROME DE BURNOUT
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), para proteger o trabalhador, inclui a punição do empregador que pratica ou que permite a prática de assédio moral no ambiente laboral, chegando a caracterizar a justa causa do empregador, conforme o artigo 483 da CLT (BRASIL, 1943).
Segundo a lição de Rodolfo Pampliona Filho (2018, p. 1) assédio moral consiste em “uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo por efeito a sensação de exclusão do ambiente e do convívio social”.
Por sua vez, Sônia Mascaro Nascimento complementa:
Já o assédio moral (mobbing, bullying, harcèlement moral ou, ainda, manipulação perversa, terrorismo psicológico) caracteriza-se por ser uma conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica, de forma repetitiva e prolongada, e que expõe o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente de trabalho, durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. (2004, p. 922)
As consequências do assédio moral laboral advêm da sua natureza jurídica que causa ao trabalhador um sofrimento capaz de ensejar o reconhecimento do dano moral a sua pessoa.
Sobre a natureza jurídica do assédio moral, a doutrina aponta: (a) discriminação; (b) dano moral. O assédio moral tem a finalidade de excluir a pessoa do meio ambiente do trabalho, logo, as suas condutas assumem uma modalidade de discriminação negativa, a qual há de ser repudiada. De forma deliberada, quem assedia tem o firme propósito de expor a sua vítima a uma série de situações de desigualdade (= discriminação negativa) em relação aos demais colegas de trabalho e ao próprio meio ambiente do trabalho. Por outro lado, o assédio moral também pode ser visto como uma atitude de ofensa ao patrimônio ideal (violação de um direito de personalidade) do trabalhador, logo, assume, de certa forma, como consequência, o equivalente a um dano moral. Contudo, não se pode dizer que o assédio moral seja um dano moral. O dano moral é a consequência do assédio moral. Aliás, o assédio moral também pode gerar danos materiais (= patrimoniais) à vítima (JORGE NETO e CAVALCANTE, 2019, p. 951).
Sendo assim, para o empregado as consequências são psicológicas e podem levar a abalos que extrapolam o mero aborrecimento. Nesse sentido, são comuns sentimentos de desconforto e até mesmo pânico de estar no ambiente ocupacional, perante as pessoas que praticam os atos de assédio. Em casos mais graves a situação emocional pode evoluir para uma doença psicológica.
De acordo com os estudos de Francisco Pereira Jorge Neto e Jouberto de Quadros Pessoa Cavalcante, “como exemplos de problemas de saúde causados ao trabalhador pelo assédio moral: depressão, dores de cabeça, tonturas, distúrbios digestivos, palpitações, tremores, diminuição da libido, falta de ar, falta de apetite etc.” (JORGE NETO e CAVALCANTE, 2019, p. 954).
Caracterizada por se originar por fatos ocorridos no ambiente laboral, a síndrome de Burnout na maioria das vezes tem sintomas iniciados com o sofrimento de situações consideradas assédio moral ocupacional somado a situações de excesso de cobrança e o cansaço.
É certo que a origem primária da síndrome de burnout é o próprio ambiente laboral no qual o indivíduo se insere. Todavia, essa simples constatação não é suficiente para uma definição técnica de sua fonte primária causadora. Ademais, a existência de assédio moral
também não é o único fator para que essa síndrome se manifeste no assediado. Necessita-se de algo mais para que haja uma determinação adequada de sua causa laboral. Na verdade, a referida síndrome advém do modo de gestão do trabalho, caracterizado por pouca ou nenhuma autonomia, sobrecarga de tarefas e insegurança m relação a estas, falta, instabilidade no emprego, sentimento de desmoralização no ambiente de trabalho, sentimento de injustiça, um
controle quantitativo e qualitativo do trabalho, a falta de suporte da chefia e dos colegas, somados à predisposição intrínseca do indivíduo (OLIVEIRA, 2022, p. 24).
A partir de tais informações, tem-se que, uma vez comprovada a sua origem laboral, a Síndrome de Burnout pode levar a responsabilização civil do empregador em razão da ocorrência de assédio moral dentro do ambiente de trabalho.
4 A RESPONSABILIZAÇÃO DO EMPREGADOR PELA MANUTENÇÃO DO AMBIENTE LABORAL E PELA OCORRENCIA DE BURNOUT
Tal como dito até aqui, o trabalhador tem direito a um meio ambiente de trabalho que seja saudável, que priorize pela sua integridade física e mental, sob pena de, uma vez constatada uma doença ocupacional, ser o empregador responsabilizado por eventual falha de sua parte ou de seus prepostos e funcionários.
Portanto, o empregador/contratante tem o dever de reduzir os riscos à saúde do empregado/contratado:
O empregador deve se empenhar em tentar minimizar de todas as formas possíveis a redução dos perigos existentes na sua atividade econômica. Como a redução dos riscos é uma previsão Constitucional, o empregador deve contribuir para a efetivação do direito à integridade física do empregado. Contudo, para isso, é necessário o empregador fornecer aos trabalhadores todo o aparato técnico, treinamento, o material necessário à proteção, investir em tecnologias e em equipamentos mais seguros que substituam os métodos ultrapassados de produção (BRITO, 2014, p. 1).
Neste sentido, diante da constatação de prejuízos materiais ou imateriais ao trabalhador, o empregador ficará obrigado a indenização segundo determina a legislação civil (MARTINEZ, 2016).
Apesar de a síndrome Burnout ter sido inserida no CID apenas no início do ano de 2022, na prática judicial, a caracterização desta doença há anos tem sido atribuída à execução do contrato de trabalho e por tal motivo passível de responsabilização do empregador.
DOENÇA OCUPACIONAL – SINDROME DE BURNOUT – INDENIZAÇÃO. Diagnosticada no curso do contrato de trabalho a Sindrome de Burnout (síndrome do “esgotamento profissional”) que levou ao afastamento previdenciário do autor, no curso do aviso prévio, por um ano e quatro meses, por doença ocupacional equiparada a acidente do trabalho, é devida a reintegração ao emprego e ainda a indenização de cunho moral, nos termos dos arts. 118 da Lei nº 8.213/91, segunda parte do item II da Súmula 378 do TST e artigos 186 e 927 do CCB e art. 5º, incisos V e X da constituição Federal (TRT- 3 – Recurso Ordinário 0011012-62.2017.5.03.0048, Décima Primeira Turma. Relator Des. Antonio Gomes de Vasconcelos, Julgamento: 4 de março de 2021).
Acompanhando o entendimento do julgamento acima, o Tribunal do Trabalho da 1ª região reconheceu em um caso concreto a ocorrência não apenas do assédio moral, como também a identificação de doença ocupacional de Síndrome de Burnout:
ASSÉDIO MORAL – SEGREGAÇÃO DE EMPREGADO CONTANDO COM MAIS DE 32 ANOS DE CONTRATO DE TRABALHO – DOENÇA OCUPACIONAL – INDENIZAÇÃO DEVIDA. I – O assédio moral (ou “mobbing”, como o chamam doutrina e jurisprudência modernas) é caracterizado pela pressão continuada e de cunho psicológico que uma pessoa exerce sobre outra, com o intuito de força-la a adotar determinada prática, que lhe avilta o espírito ou lhe traz transtornos priquicos ou psicossomáticos. II – Neste contexto, caracteriza-se o assédio moral pela conduta lesiva e culposa do empregador, que abusa do poder diretivo, disciplinar ou fiscalizatório, e cria um ambiente de trabalho hostil, expondo seus empregados a reiteradas situações de constrangimento e humilhação, que ofendem sua saúde mental e até mesmo física. III – Na hipótese vertente, a parte ré discriminou de forma patente o autor que lá trabalhava há 32 anos, esvaziando suas atividades, mudando o seu local de trabalho e isolando-o. Isso foi causa à eclosão de doença ocupacional (Síndrome de Burnout), conforme demonstra parecer médico aliado à prova testemunhal. V – Assim, correta a r. sentença que condenou a ré ao pagamento de indenização reparatória. VI – Recurso da parte ré conhecido e não provido. (TRT1 – Recurso Ordinário 00112965920145010039 RJ. Quinta Turma. Relator Des. Evandro Pereira Valadão Lopes. Julgamento em 18 de novembro de 2017. Publicação em 13 de dezembro de 2017.)
Além disso, para o empregado vigora o direito à estabilidade acidentária, prevista no artigo 118 da já mencionada Lei n°. 8.213/1991, que garante a manutenção do contrato de trabalho pelo prazo mínimo de doze meses a contar da cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente do auxílio acidente (BRASIL, 1991). No entanto, o direito a esse benefício advém do preenchimento dos requisitos legais.
Quais os requisitos para a aquisição do direito previsto no art. 118 da Lei 8.213/91? O primeiro requisito que o preceptivo em questão exige é o de que o trabalhador tenha sofrido um acidente do trabalho, entendendo-se como tal, nos termos da Lei 8.213/91: a) o acidente típico (art. 19); b) as moléstias profissionais ou do trabalho (art. 20); ou c) os eventos equiparados ao acidente do trabalho (art. 21). O segundo requisito está em que a garantia no emprego somente terá início após a cessação do benefício previdenciário. Aqui há uma explicação lógica: é que durante o período em que o obreiro percebe o auxílio-doença acidentário o seu contrato de trabalho (tecnicamente, os seus efeitos) fica suspenso, impedindo, assim, a prática do ato patronal de dispensa (LEITE, 2018, p. 569).
Ausentes os requisitos, a estabilidade provisória não será assegurada ao trabalhador, no entanto, tal fato não impede a responsabilização civil do empregador, desde que comprovada a ocorrência de dano moral e a conduta lesiva por parte da empresa. Isto porque um pedido não depende necessariamente do outro, haja vista que um de ordem laboral e outro civil.
CONCLUSÃO
A ordem jurídica brasileira prevê que todo cidadão é titular de direitos e garantias intransferíveis e irrenunciáveis, dentre as quais, a dignidade humana se destaca. Quer isto dizer que, ainda que em ambiente produtivo laboral, ao indivíduo devem ser resguardadas condições mínimas de dignidade para que seja contínua a sua capacidade de trabalho.
Infelizmente, em sociedade, os indivíduos estão sujeitos a inúmeros fortuitos à sua saúde, situações estas que podem levar à suspensão do trabalho por incapacidade laboral, causando prejuízos também aos empregadores. Todavia, para além de evitar os danos financeiros, existem medidas que podem prevenir o adoecimento, reduzindo os riscos à integridade física dos trabalhadores.
Neste sentido, o fato de ser o contratante dos serviços de um indivíduo faz surgir para o empregador o dever de proteger a saúde daquele através do fornecimento de um meio ambiente laboral saudável. Com isso, devem ser combatidas as situações de exaustão no ambiente de trabalho, uma vez que são crescentes os diagnósticos de trabalhadores identificados como portadores de Síndrome de Burnout, normalmente relacionados com o assédio moral ocupacional.
Após o desenvolvimento da pesquisa, foi possível confirmar a teoria de que o assédio moral se apresenta muito favorável ao adoecimento dos trabalhadores vitimados diariamente em seus postos de trabalho. Por tal motivo, além da estabilidade provisória dos portadores de doença ocupacional, o trabalhador ainda poderá ingressar com pedido de indenização civil pelos danos morais advindos da conduta do empregador e/ou de seus prepostos e funcionários, mediante a comprovação dos requisitos legais da responsabilidade civil.
REFERÊNCIAS
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[1] Prof(a). Orientador(a) do Curso de Direito da Universidade de Gurupi - UnirG).
Acadêmica do Curso de Direito da Universidade de Gurupi - UnirG;
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COELHO, KENNYA NERES. Síndrome de burnout: uma consequência do assédio moral organizacional. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 nov 2022, 04:12. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60099/sndrome-de-burnout-uma-consequncia-do-assdio-moral-organizacional. Acesso em: 22 nov 2024.
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