VANUZA PIRES DA COSTA[1]
(orientadora)
RESUMO: Esta pesquisa visa a análise acerca da viabilidade jurídica condenação ao pagamento de indenização decorrente da responsabilização civil pela infidelidade conjugal. O presente trabalho consiste em um breve estudo sobre a caracterização da infidelidade, analisando-se a possibilidade da responsabilização civil decorrente desta prática no ordenamento jurídico brasileiro, considerando a moderna teoria da responsabilidade. O trabalho se valeu do método dedutivo, de abordagem qualitativa e no procedimento foi feito por meio de ampla pesquisa bibliográfica em doutrina, legislação e internet. Conclui-se que a infidelidade conjugal, quando violadora de direitos da personalidade, é capaz de ensejar a responsabilidade civil, possibilitando a condenação ao pagamento de verbas indenizatórias.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Direito Civil. Indenização. Infidelidade Conjugal.
ABSTRACT: This research aims to analyze the legal feasibility of condemning the payment of compensation arising from civil liability for marital infidelity. The present work consists of a brief study on the characterization of infidelity, analyzing the possibility of civil liability arising from this practice in the Brazilian legal system, considering the modern theory of responsibility. The work used the deductive method, qualitative approach and the procedure was done through extensive bibliographic research in doctrine, legislation and internet. It is concluded that marital infidelity, when violating personality rights, is capable of giving rise to civil liability, enabling the conviction to pay compensation.
Keywords: Civil Liability. Civil Law. Indemnity. Marital Infidelity
1 INTRODUÇÃO
Nos termos dos arts. 186 e 927 do Código Civil brasileiro, todo aquele que cometer um ato ilícito deve ser obrigado a indenizá-lo e, conforme o mesmo diploma, esta indenização deve ser medida pela extensão do dano provocado.
Visto isso, cabe discutir se é possível que a infidelidade conjugal gere dever de indenizar, haja vista que, como é sabido, nesta situação há clara violação dos deveres inerentes ao matrimônio, havendo, sem dúvida alguma, desrespeito claro à boa-fé objetiva, se partirmos da visão amplamente defendida na doutrina de que o casamento é, antes de tudo, um contrato solene.
O ordenamento jurídico brasileiro reconhece o dano moral para todo aquele que for vítima de violação de direitos da personalidade, estando neles incluídos a honra, a imagem, a integridade física ou psicológica.
Trata-se de direito constitucionalmente reconhecido, tipificado no art. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal de 1988. No âmbito do Direito de Família contemporâneo, constitucionalizado e pós-positivista, muito se tem discutido acerca da existência ou inexistência da pretensão indenizatória ocasionada por dano moral originado de infidelidade conjugal. Afinal, seria realmente possível recorrer ao Poder Judiciário a fim de ver reconhecido esse direito constitucional à reparação de um dano por desrespeito ao dever matrimonial da lealdade?
O trabalho se vale do método dedutivo, de abordagem qualitativa e no procedimento se dá por meio de ampla pesquisa bibliográfica em doutrina, legislação, jurisprudencia e internet.
Inicialmente é feito um levantamento da evolução da união civil no Brasil, adentrando no contexto da abolição da prática do crime de traição, que ocorreu no ano de 2005, quando a lei n.º 11.106 de 2005 retirou tal conduta punível do Código Penal e em seguida, é apresentado um breve estudo sobre a caracterização da infidelidade, expondo o contexto histórico do divórcio.
Finalmente, será abordada a possibilidade de indenização por dano moral decorrente da infidelidade conjugal, onde será empreendida uma análise acerca do instituto da responsabilidade civil e sua aplicação nos casos de traição.
2 UNIÃO CIVIL: PROCESSO DE EVOLUÇÃO NO BRASIL
A priori, o casamento, até meados do século XIX era tratado como uma espécie de negócio entres as famílias dos nubentes, visto que a opinião dos futuros cônjuges não tinha grande relevância na decisão. As cerimonias de casamentos eram sempre realizadas pelas igrejas, devido a influência religiosa dos portugueses colonizadores deste país (MATOS, ANA CARLA HARMATIUK, 2021, p. 327).
Acerca do instituto do casamento, leciona Daniel Sarmento (2020, p. 625) que, apesar das variadas definições doutrinárias, a Lei nº 10.406 de 2002 que instituiu Código Civil vigente, em sede de seu Livro IV, por mais que tenha atribuído destaque ao casamento, sendo, dessa forma, o primeiro tópico a ser tratado no âmbito do Direito de Família positivado, não se deteve simplesmente a conceituá-lo, muito menos previu qualquer conceito exaustivo para o termo “família”. Limitou-se, na verdade, a regulamentar questões pertinentes aos requisitos para sua celebração, impedimentos, causas suspensivas, sua eficácia e os variados regimes patrimoniais entre os cônjuges.
De acordo do Daniel Carnacchioni (2020, p. 664), seguindo a linha histórica, o casamento civil surgiu no Brasil em seu período de República através do decreto n.º 181, publicado no dia 24 de janeiro de 1890 do chefe de Governo Provisório, Marechal Deodoro da Fonseca, onde a união passou a ser por meio de negócio jurídico (contrato) entre duas pessoas que expressamente visam a união.
O citado autor ressalta ainda que naquele tempo este “casamento” celebrado era tratado como indissolúvel, sob influência propagada pela religião, não levando em consideração o fim da união do casal. Era possível tão somente a separação física dos cônjuges, também conhecida como separação de corpos, por determinados motivos, sendo um deles o adultério, contudo, o casamento não era desfeito (CARNACCHIONI, 2020, p. 653).
Rodrigues (2002, p. 435) conceitua o casamento como “um contrato de direito de família que tem por fim promover a união do homem e da mulher, de conformidade com a lei, a fim de regularem suas relações sexuais, cuidarem da prole comum e se prestarem mútua assistência”.
Anderson Schreiber (2019, p. 568) aponta que o Código Civil de 1916 trouxe algumas alterações e obrigações do casal de um para com o outro. Porém, o ápice foi em 1977, 61 anos após a publicação no Código Civil, com a introdução da novíssima Lei do Divórcio possibilitando o divórcio entre os cônjuges, tendo sido sedimentada em 1988, com a publicação da Constituição Federal.
Ainda atento à evolução do conceito de entidade familiar na legislação civil brasileira, o mencionado autor acrescenta que, com o advento na nova Carta Magna, o conceito de família foi ampliado, deixando de ser o clássico e obsoleto pai-mãe-filhos, passando a proteger de forma igualitária todos os membros da família. De forma que, também passou a reconhecer a existência de novas e diferentes estruturas familiares, a exemplo das monoparentais, onde a família é chefiada somente pelo pai ou pela mãe, passando a reconhecer também as uniões estáveis e a possibilidade de convertê-las em casamento civil. (SCHREIBER, 2019, p. 547)
Por conseguinte, o Código Civil de 2002 trouxe novas atualizações para o casamento, firmando que o casamento é a forma de estabelecer a comunhão plena de vida dos cônjuges possuidores de iguais condições, se tratando de direito e deveres na Ordem Civil.
Segundo Maria Berenice Dias:
A vida é dinâmica e a evolução da sociedade, aliada ao rompimento de dogmas até então impostos, queda de tabus, ou seja, transformações diversas, acabaram por produzir mudanças arrojadas na seara do direito de família, sendo a última delas, e talvez a mais notória e importante, a promulgação da Emenda Constitucional nº 66/2010 que instituiu o divórcio, sem procedimento prévio, prazo ou culpa do outro cônjuge, no direito pátrio. (DIAS, 2020, p.322).
Conforme a doutrina de Paulo Nader (2018, p. 641), após o processo de evolução do direito de família, atualmente, é sabido que para a validação do casamento, os cônjuges deverão comparecer a qualquer Cartório de Registro Civil dentro da jurisdição do registro do local da cerimônia/festa, devendo ser observados os requisitos legais para a celebração, atentando-se ao art. 226 da Constituição Federal, que conceitua a entidade familiar.
3 DIVÓRCIO: CONTEXTO HISTÓRICO
Abordando a temática do casamento, em seu Manual de Direito Civil, Daniel Carnacchioni (2020) aduz que, apesar da relevante da conquista obtida pela sociedade brasileira com a instituição do divórcio – que assegurou não só a liberdade individual, mas também representou um importante distanciamento entre o Estado e a Igreja – ainda que contando com inovações diversas, o mesmo somente era possível “após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos”, conforme se extrai da anterior redação do art. 226, § 6º da Constituição da República de 1988.
Segundo Maria Berenice Dias:
Introduz-se no direito pátrio o sistema binário de dissolução da sociedade e vínculo conjugal, em que é necessária primeiramente a separação dos cônjuges, para somente após se divorciarem. Ademais, necessário ainda o apontamento das causas que motivaram tal dissolução. (DIAS, 2020, p. 821).
Adentrando novamente no contexto histórico, de acordo com a Mestre em história social, Andrea Borelli (2004, p. 225), nos séculos XIX e XX o adultério era considerado com uma escamoteação destruidora do amor carnal no âmbito do afeto conjugal. Naquele momento, somente a mulher era penalizada pela prática do adultério, o marido somente era apregoado infração se caso fosse descoberto que ele detinha outra família alheia ao seu casamento, todavia não era caracterizado como o adultério, em si.
Naquela época, segundo Borelli (2004, p. 226), o machismo era tão predominante que não existia o adultério masculino, havendo somente aquele praticado pela esposa, sendo previsto no artigo 250 do CP de 1830, que por sinal era bem claro sobre isso. Contudo, com o advento do CP de 1940, o adultério passou a valer tanto para a figura masculina quanto para a feminina, sendo previsto no referido artigo 240 do CP que era punido com pena de detenção, de quinze dias a seis meses.
Contudo, prossegue a mencionada autora, diante de inúmeras discussões acerca do instituto do adultério tanto na esfera cível como na penal, pondo em evidência a constate evolução da sociedade, concluiu-se que a traição/adultério não mais justifica ser considerada como crime. Dessa forma, com a vigência da lei 11.106 de 2005, o crime de traição deixou de existir, sendo revogado o art. 240 do Código Penal, passando a gerar somente efeitos extrapenais, a exemplo dos danos morais. (BORELLI, 2004, p. 220).
Acerca da descriminalização da prática, Borelli (2004, p. 235) afirma que o adultério deixou de ser crime não por se tratar de questões de foro íntimo ou por não ser do interesse público, se fosse assim nenhum litigio que chega ao judiciário seria de interesse público, a exemplo de uma negativação no Serasa indevidamente feita, decorrente de um cartão de crédito recebido sem ter sido solicitando, dentre vários outros motivos.
Carnacchioni (2020, p. 689) aduz que foi necessário o transcorrer de pelo menos longos 30 (trinta) anos de avanços doutrinários e jurisprudenciais e, sobremaneira, o amadurecimento e a evolução social da sociedade brasileira para que culminasse na aprovação e promulgação, em julho de 2010, da Emenda Constitucional nº 66/2010 que, promovendo significativa alteração no parágrafo 6º do art. 226 da Constituição da República de 1988, instituiu o divórcio direto no Brasil.
A indigitada norma constitucional, dispensada sua regulamentação por qualquer legislação infraconstitucional, ingressou no ordenamento jurídico com eficácia imediata e direta, permanecendo a Lei nº 6.515/1977 vigente apenas no que diz respeito às normativas de caráter processual. Dessa forma, possibilitou-se a qualquer dos cônjuges a busca pelo divórcio, sem a necessidade de aguardar prazos ou declinar motivos e causas para tanto. (CARNACCHIONI, 2020, p. 691).
4 DA POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL DECORRENTE DA INFIDELIDADE CONJUGAL
No que diz respeito ao dano moral, é desse modo que Carlos Roberto Gonçalves tenta conceituá-lo:
Dano moral é o que atinge o ofendido como pessoa, não lesando seu patrimônio. É lesão de bem que integra os direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a imagem, o bom nome etc., como se infere dos arts. 1º, III, e 5º, V e X da Constituição Federal, e que acarreta a lesado dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação. (GONÇALVES, 2019, p. 315).
Entretanto, esse autor leciona que a dor, angústia, dissabores e humilhação experimentados pela vítima não são propriamente o dano moral, mas sim o conteúdo, a consequência eventual do dano.
De acordo com Lilian Iati Gaspar (2021, p. 214) nos Tribunais Superiores brasileiros vem prevalecendo o entendimento segundo o qual a viabilidade da indenização por esta modalidade de dano moral, decorrente de infidelidade conjugal, exige que o sofrimento suportado pelo cônjuge que fora traído deve sempre ultrapassar o mero dissabor resultante do término de todo e qualquer relacionamento, devendo ainda ter o potencial de afetar o seu psicológico, causando sofrimento de ordem física, tendo em vista a humilhação, os constrangimentos daí decorrentes e, muitos casos, a exposição dos envolvidos à opinião pública.
Ainda de acordo com a autora:
Assim, para que o Judiciário reconheça o dever de indenizar, essas circunstâncias devem ser, necessariamente, provadas, pois constituem um dos requisitos necessários à responsabilização civil: o efetivo dano. Além dele, devem ser comprovados a conduta dolosa e o nexo causal entre essa conduta e o dano efetivamente sofrido. Ausentes um desses três elementos, não haverá reconhecimento de indenização por dano moral. (GASPAR, 2021, p. 215).
Oportuna a citação de decisão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, que deixa claro o citado entendimento majoritário dos tribunais pátrios:
EMENTA: APELAÇÃO - DIREITO DE FAMÍLIA - INDEFERIMENTO DE COMPLEMENTAÇÃO DA PROVA PERICIAL - CERCEAMENTO DEFESA - INOCORRÊNCIA - DIVÓRCIO - INFIDELIDADE CONJUGAL - DANO MORAL - CONDENAÇÃO - NÃO CABIMENTO - AUSÊNCIA DE EXPOSIÇÃO PÚBLICA DO CÔNJUGE TRAÍDO - INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO A DIREITO DA PERSONALIDADE. - Não se configura cerceamento de defesa o indeferimento de perícia ou a complementação daquela já realizada, pois a demonstração de dano psíquico sofrido pela vítima não constitui prova suficiente para qualificar o dano moral, sendo indispensável a demonstração do propósito de ultrajar, humilhar o cônjuge traído, o que não poderia ser revelado pela prova requerida. - O descumprimento do dever de fidelidade não gera, por si só, o dever de indenizar. A configuração do dano moral em tais hipóteses pressupõe que se demonstre, além da dor e do sofrimento, que, com a traição, o consorte traído foi colocado em situação vexatória, humilhante, exposto publicamente, situação esta não demonstrada nos autos. (TJMG - Apelação Cível 1.0395.13.003377-6/001, Relator(a): Des.(a) Maria Inês Souza, 2ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/08/2021, publicação da súmula em 09/08/2021).
No mesmo sentido decidiu o Tribunal de Justiça do estado do Amapá, porém, reconhecendo a configuração do dano moral por infidelidade conjugal na hipótese, em virtude da exposição social do cônjuge traído:
APELAÇÃO CÍVEL. INFIDELIDADE CONJUGAL. SUCESSIVOS CASOS EXTRACONJUGAIS DO MARIDO. FILHO FORA DA RELAÇÃO MATRIMONIAL. ABALO PISICOLÓGICO DA ESPOSA TRAÍDA. DANOS MORAIS CONFIGURADOS. CRITÉRIO BIFÁSICO ADOTADO. NÃO PROVIMENTO. 1) A infidelidade conjugal, como causa isolada, não gera dever de indenizar o cônjuge traído. 2) Configura dano moral, no entanto, a comprovação de nexo de causalidade entre as condutas e o dano experimentado. 3) No caso, ocorreram sucessivas condutas infiéis do marido ao longo da relação matrimonial, uma das quais gerou um filho fora do casamento, no que resultou exposição social da esposa, incluindo conversas de terceiros em redes sociais atribuindo alcunhas depreciativas a ela, humilhação e dano psicológico suportado. 4) Critério bifásico de quantificação do dano adotado. 5) Apelações não providas. Sentença mantida. (APELAÇÃO. Processo Nº 0044016-51.2018.8.03.0001, Relator Juiz Convocado MARIO MAZUREK, CÂMARA ÚNICA, julgado em 1 de Outubro de 2020).
Lilian Iati Gaspar, já citada, informa que existe uma posição minoritária no âmbito do Poder Judiciário que caminha na direção de que as relações desse mundo pós-moderno não permitem mais que seja reconhecido o dano moral decorrente de infidelidade conjugal, haja vista que o adultério se tornou prática comum na atualidade, em razão da “precarização” do instituto do casamento, já não mais tão solene quanto antes, e que se deve considerar o adultério até mesmo como algo previsível, esperado, especialmente diante das inúmeras facilidades encontradas nos dias atuais visando a aproximação das pessoas. (GASPAR, 2021, p. 215).
Ainda segundo Iati Gaspar (2021, p. 220), apesar dessa corrente que vem sendo adotada por pequena parcela do Poder Judiciário, merece destaque que, para boa parte dos indivíduos, a infidelidade conjugal ainda é assunto extremamente delicado e capaz sim de gerar inúmeros transtornos psicológicos que podem ser capazes de justificar a condenação no dever de indenizar por parte do cônjuge faltoso, a fim de que seja obrigado a reparar o dano causado. Entretanto, ressalva-se, caso pretenda ver reconhecido o seu direito constitucional de reparação civil pelos danos morais suportados, o cônjuge lesado enfrentará a inevitável subjetividade do julgador da causa – haja vista que inexiste responsabilidade objetiva no caso.
Conforme Cunha Pereira:
A indenização por danos morais vem crescendo no Brasil a partir de 1988, com a Constituição da República, principalmente nas relações de consumo. Indeniza-se facilmente por um constrangimento ou sofrimento causado por um cheque devolvido incorretamente pelo banco, por exemplo. No Direito de Família o assunto é recente, e as resistências ficam, inclusive, por conta do medo de se instalar uma indevida indústria indenizatória, com uma avalancha de pessoas requerendo, aos tribunais indenização por todo e qualquer sofrimento nas relações amorosas. (PEREIRA, 2013, p. 414).
Com essa posição não concorda Anderson Schreiber (2020, p. 825), pois afirma que ainda que seja inexistente na legislação brasileira dispositivo expresso que trate da reparação decorrente do dano em face da conduta infiel do consorte que dá causa à dissolução do vínculo matrimonial, percebe-se que diante daqueles outrora citados de ordem constitucional ou civil, no que tange ressarcibilidade, não há restrição sequer em sua aplicação a qualquer seara do direito, inclusive de família, razão pela qual não se sustenta a intransigência ao entendimento da inadmissibilidade de indenização por danos morais decorrentes da infidelidade conjugal, que deflagre na ruptura do vínculo, ao singelo argumento de ausência de previsão legal.
Conforme Iati Gaspar:
Dessa forma, havendo regramento acerca da violação do dever de fidelidade recíproca, como, por exemplo, a estipulação de multa caso o fato se torne público, o cônjuge traído poderá buscar o Poder Judiciário para obrigar o cônjuge faltoso a, de fato, efetuar o pagamento do valor pecuniário estabelecido pelas próprias partes, em momento anterior ao casamento, pelo descumprimento do dever de fidelidade recíproca. (GASPAR, 2021, p. 236).
Ainda conforme Iati Gaspar (2021, p. 214), nesse ínterim, não será necessário que o interessado demonstre o dano do mesmo modo tal como na situação em que não há qualquer regulamento específico acerca do assunto entre os cônjuges. No exemplo citado, é suficiente que seja demonstrado que o ato se tornou publicamente conhecido, sendo despicienda a constatação de que as circunstâncias foram capazes de afetar o psicológico do cônjuge vítima da traição.
Assim, percebe-se que o tema é por demais tormentoso, havendo divergência doutrinária no que tange à responsabilização civil por danos morais decorrente da infidelidade conjugal, havendo aqueles que reconhecem a violação do dever da lealdade como sendo um ato ilícito e aquelas que o relevam considerando o contexto socioeconômico da sociedade hodierna. Porém, na jurisprudência, tem prevalecido que cabe a indenização quando o cônjuge traído teve que suportar situação causadora de vexame, humilhação e exposição pública da traição.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante das considerações que foram desenvolvidas ao longo deste artigo, foi possível notar que a infidelidade constitui conduta capaz de gerar transtornos muitos severos ao indivíduo traído, o que, consequentemente, pode vir a afetar os âmbitos emocionais/psicológicos, ético-profissionais, físicos e sociais.
O ordenamento jurídico pátrio compreende que esses transtornos são sim ensejadores do dano moral, vez que são capazes de violar direitos da personalidade, e que a controvérsia estaria apenas no debate se esse dano seria suficiente para suscitar a reparação civil em pecúnia. Ademais, foi possível observar que existe, ainda, uma responsabilidade civil objetiva decorrente da quebra do dever de lealdade, que constitui, segundo a moderna doutrina de direito civil, um dever jurídico anexo a todo e qualquer contrato.
Desse modo, o presente artigo atingiu o objetivo a que se propôs, haja vista que foi capaz de demonstrar que a infidelidade pode vir a ferir direitos da personalidade, impostos no ordenamento jurídico e pela sociedade, podendo o traidor vir a ser condenado ao pagamento de indenização por danos morais.
Além disso, em que pese a controvérsia que versa se o dano seria capaz ou não de ensejar o pagamento de indenização, foi possível constatar que o instituto jurídico do dano moral é essencial ao ordenamento, no que atine à doutrina da responsabilização civil, não somente às partes, mas também para toda a coletividade, tendo em vista as suas funções de reparação, punição e a educação.
Dessarte, a condenação do infiel ao pagamento de verba decorrente dos danos morais praticados à vítima da traição é uma forma de demonstrar não só para o ofendido como também para o ofensor, e até mesmo para a sociedade civil organizada, que o ordenamento jurídico nacional não tende a compactuar com a ameaça ou violação a direitos da personalidade, tratados explicitamente ou mesmo implicitamente, constituindo forma de desencorajar comportamentos violadores de direitos essenciais.
REFERÊNCIAS
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[1] Mestra em Direito. Professora da Universidade de Gurupi (UNIRG) e Faculdade de Ciências Jurídicas de Paraíso do Tocantins (FCJP). E-mail: [email protected]
Advogado. Bacharel em Direito pela Universidade Unirg de Gurupi - TO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: HENRIQUE MOTA VALADãO, . Responsabilidade civil: indenização por infidelidade conjugal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 nov 2022, 04:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60114/responsabilidade-civil-indenizao-por-infidelidade-conjugal. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
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