RESUMO: o presente artigo tem por objetivo analisar a divergência existente tanto na doutrina quanto na jurisprudência sobre qual teoria deve ser aplicada aos casos de danos causados ao administrado por atos omissivos do Estado. Será apresentado um histórico da evolução das teorias desde meados do século XIX, além de quais são as correntes doutrinárias, em qual sentido estão decidindo os Tribunais Superiores (Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça) e se existe uma posição majoritária. Quanto à metodologia empregada, trata-se de uma pesquisa básica com abordagem qualitativa, de objetivo exploratório, delineamento bibliográfico e documental. Ao final, conclui-se que o tema não é pacífico na doutrina e que os Tribunais sinalizam a adoção da teoria subjetiva.
Palavras-chave: Administração Pública. Responsabilidade civil do Estado. Extracontratual. Omissão.
1.INTRODUÇÃO
Responsabilidade pode ser conceituada, genericamente, como o dever de responder pelos próprios atos quando estes causarem dano a outrem. Responsabilidade é:
a obrigação que lhe incumbe (o Estado) de reparar economicamente os danos lesivos à esfera juridicamente garantida de outrem e que lhe sejam imputáveis em decorrência de comportamentos unilaterais, lícitos e ilícitos, comissivos ou omissivos, materiais ou jurídicos (MELLO, 2005, p. 917).
Em outras palavras, responsabilidade é o dever que se tem de arcar com as consequências de seus atos. No direito brasileiro essa responsabilidade é uma tríplice responsabilidade, pois há a possibilidade de se responder em três esferas: cível (patrimonial); penal (restrição da liberdade); e administrativa (funcional). É possível a cumulação dessas três responsabilidades, mas, em regra, elas são independentes entre si.
Segundo afirma Mello (2005, p. 917), “todos os povos, todas as legislações, doutrina e jurisprudência universais, reconhecem, em consenso pacífico, o dever estatal de ressarcir as vítimas de seus comportamentos danosos”.
A responsabilidade civil extracontratual do Estado vem evoluindo desde meados do século XIX. Segundo Carvalho Filho (2011), no século XIX a teoria prevalecente no mundo ocidental era a Teoria da Irresponsabilidade Estatal, ou seja, o Estado não se responsabilizava por nenhum ato praticado por seus agentes, pois sempre quando agia, o Estado o fazia buscando o bem comum, logo, incabível responsabilização por qualquer de seus atos (“the king can do no wrong” – o rei não erra). Em decorrência do Estado Liberal, este raramente intervinha nas relações entre particulares.
Essa teoria não durou por muito tempo, pois a ideia da irresponsabilidade estatal gerava insegurança tanto jurídica quanto política.
Houve, então, uma evolução. O Estado Liberal foi substituído pelo Estado de Direito e com ele surgiu uma nova teoria: a Teoria da Responsabilidade Civil com Culpa.
Afirma Mello (2005) que, mesmo após o surgimento do Estado de Direito, a tese da responsabilidade pública não se impôs com facilidade. Referida teoria dividia os atos estatais em duas categorias: os atos de império e os atos de gestão. Aqueles seriam coercitivos, eis que decorrentes da soberania estatal; estes seriam atos praticados pela Administração Pública em pé de igualdade com os administrados.
No caso dos atos de império, o Estado não poderia ser responsabilizado por eventuais danos causados por seus agentes.
Já nos atos de gestão, comprovada a culpa do agente estatal pelo particular, o Estado responderia pelos danos causados.
Essa teoria, entretanto, não vingou. Isso em razão da dificuldade em distinguir-se quais atos eram atos de império e quais eram de gestão, ou ainda, se os erros cometidos pelos agentes públicos estavam ou não associados ao exercício da função pública (CARVALHO FILHO, 2011).
A teoria que se seguiu à Teoria da Responsabilidade com Culpa foi a Teoria da Culpa Administrativa, a qual tornou desnecessária a distinção entre atos de império e atos de gestão.
Por essa teoria, bastaria que o particular comprava-se a falta do serviço para que houvesse o dever de indenizar do Estado.
A falta do serviço se caracteriza em três formas: inexistência do serviço; mau funcionamento do serviço; e retardamento (ou demora) na prestação do serviço.
Da Teoria da Culpa Administrativa chega-se a Teoria da Responsabilidade Objetiva, que é a teoria adotada, em regra, no Brasil e em grande parte dos países ao redor do globo.
O que fundamenta a Teoria da Responsabilidade Objetiva é a chamada Teoria do Risco Administrativo, segundo a qual, o Estado, por se encontrar em relação de desigualdade perante o particular, deve arcar com um risco naturalmente maior em razão das inúmeras atividades por ele desempenhadas.
A adoção da referida teoria é confirmada pela redação do art. 37, §6º, da Constituição Federal. Até esse ponto não há que se falar em divergências doutrinárias e jurisprudenciais, sendo pacífico que, em se tratando de condutas comissivas, sejam dolosas ou culposas, a responsabilidade civil do Estado é objetiva.
A discussão surge quando o assunto é a responsabilidade civil em casos de omissão estatal, tema este levantado por Furtado (2007, p.1027):
este talvez constitua o aspecto mais controvertido no estudo da responsabilidade civil do Estado. A grande dúvida, persistente até os dias atuais na doutrina e na jurisprudência, consiste em saber se, na omissão, a responsabilidade civil do Estado é objetiva ou subjetiva.
Salienta-se que, segundo Di Pietro (2011), existe muita divergência terminológica entre os autores, não sendo pacífica a divisão das teorias sobre a responsabilidade estatal. Cumpre-me informar que neste trabalho foi adotada a classificação do professor Carvalho Filho.
Então indaga-se: qual a posição predominante na doutrina? Existe posição pacífica na jurisprudência dos Tribunais Superiores?
A hipótese sugerida para resolver tais questões é de que o Estado, ante a violação do direito de um particular (incolumidade de seu patrimônio), deve ressarci-lo pelos danos causados, independentemente da existência de culpa na ação ou omissão de seus agentes, tendo em vista que na relação entre Administração Pública e administrado, este seria do lado mais fraco da relação.
O Brasil, conforme dito acima, através do art. 37, §6º, da Constituição, adotou a Teoria do Risco Administrativo (responsabilidade civil objetiva). Ocorre que, tanto doutrina quanto jurisprudência, não chegaram a um consenso sobre a aplicabilidade ou não do dispositivo constitucional retro mencionado aos danos ocorridos em razão de omissão estatal.
O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, ora adotam uma posição (defendendo a responsabilidade civil objetiva para danos causados em razão de omissão estatal), ora adotam outra (defendendo a responsabilidade civil subjetiva, ou seja, exigindo a demonstração de “culpa” – falta do serviço - por parte da Administração).
Importante salientar que isso vem ocorrendo ao longo do tempo, não se podendo afirmar que, em determinada época os Tribunais adotavam a primeira corrente e que em outro período de tempo, adotavam a segunda.
Conforme será demonstrado, o que nos é tangível é informar a tendência dos Tribunais, convindo analisar a discordância existente tanto na doutrina quanto na jurisprudência para que se possa chegar a uma conclusão e assim fornecer mais segurança para os operadores do direito e para a própria Administração Pública e seus administrados.
O presente estudo tem como tema a responsabilidade civil extracontratual do Estado nos casos de omissão e para tanto é uma pesquisa do tipo básica.
Pesquisa básica é aquela que objetiva gerar conhecimentos novos úteis para o avanço da ciência sem aplicação prática prevista, envolve verdades e interesses universais, é feita para aumentar o conhecimento sobre algum assunto, sem que se tenha na pesquisa uma aplicação imediata, aplica o conhecimento pelo conhecimento e busca este para a difusão na comunidade (DACTES, 2012).
O método científico utilizado é o hipotético-dedutivo, “um método que procura uma solução, através de tentativas (conjecturas, hipóteses, teorias) e eliminação de erros que não leva à certeza, pois o conhecimento absolutamente certo não é alcançado” (RAZUK, p. 06).
No que se refere à abordagem, esta é qualitativa, pois
Compreende um conjunto de diferentes técnicas interpretativas que visam a descrever e a decodificar os componentes de um sistema complexo de significados. Tem por objetivo traduzir e expressar os sentidos dos fenômenos do mundo social; trata-se de reduzir a distância entre indicador e indicado, entre teoria e dados, entre contexto e ação (NEVES, 1996).
O objetivo metodológico a que se refere esse estudo é de uma pesquisa exploratória, onde “seu objetivo é a caracterização inicial do problema, sua classificação e de sua definição. Constitui o primeiro estágio de toda pesquisa científica” (RODRIGUES, 2007, p. 02).
Foi realizado um levantamento bibliográfico e documental. As fontes utilizadas para a pesquisa se concentram na consulta à bibliografia sobre o tema, priorizando o enfoque do Direito Público, fundamentalmente no Direito Administrativo.
Junto à pesquisa bibliográfica stricto sensu, realizamos também consulta à legislação pertinente e análise da jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Ao final, conclui-se que não há posição pacífica na doutrina. Em relação à jurisprudência, observa-se que apesar da divergência, os Tribunais Superiores sinalizam a adoção da teoria subjetiva para a responsabilização civil em casos de omissão estatal.
2.DIVERGÊNCIA DOUTRINÁRIA E JURISPRUDENCIAL
Devido a relevância do tema, grandes nomes do Direito Administrativo vêm tentando apresentar uma correta solução para a questão se a responsabilidade do Estado em relação a atos omissivos é objetiva ou subjetiva. Atualmente, pode-se fazer uma afirmação categórica: entre os doutrinadores, o tema não é pacífico.
Di Pietro (2011) cita alguns renomados autores que defendem a adoção da vertente subjetiva: José Cretella Junior, Yuseff Said Cahali, Alvaro Lazzarini, Oswaldo Aranha Bandeira de Mello, Celso Antonio Bandeira de Mello. Citada autora, inclusive, se filia a essa teoria.
Para Mello (2005, pp. 936-937):
Quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva. Com efeito, se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E, se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja sendo obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar ao evento lesivo.
O autor segue sua explanação afirmando ainda que o Estado só seria responsável caso fosse praticado algum ato ilícito por um de seus agentes, pois “não há conduta ilícita do Estado (embora do particular possa haver) que não seja proveniente de negligência, imprudência ou imperícia (culpa)...” (MELLO, 2005, p. 937).
Desse modo, não bastaria, para configuração da responsabilidade estatal, a simples relação entre a ausência do serviço e o dano sofrido; haveria a necessidade de comprovação de culpa por parte do Estado.
Alexandrino (2011), sem hesitar, afirma que em relação aos danos causados por atos omissivos da Administração a responsabilidade civil do Estado é subjetiva.
Di Pietro (2011, p. 654), tentando acalmar os ânimos sobre a discussão, afirma que “na realidade, a diferença entre as duas teorias é tão pequena que a discussão perde um pouco do interesse, até porque ambas geram para o ente público o dever de indenizar”.
Um grande autor do Direito Administrativo brasileiro que defende a adoção da teoria da responsabilidade civil objetiva em relação à omissão estatal é Helly Lopes Meirelles (1993, p. 566), que, citado por Furtado (2007, p. 1028) diz:
Nessa substituição da responsabilidade individual do servidor pela responsabilidade genérica do Poder Público, cobrindo o risco da sua ação ou omissão, é que se assenta a teoria da responsabilidade objetiva da Administração, vale dizer, da responsabilidade sem culpa, pela só ocorrência da falta anônima do serviço, porque esta está, precisamente, na área dos riscos assumidos pela Administração para a consecução de seus fins.
Corroborando o posicionamento de Meirelles, Carvalho Filho (2011, p. 539), citado por Marinela (2011, p. 884), afirma que:
Queremos deixar claro, no entanto, que o elemento marcante da responsabilidade extracontratual do Estado é efetivamente a responsabilidade objetiva; daí, não se nos afigurar inteiramente correto afirmar que, nas condutas omissivas, incidirá a responsabilidade objetiva. A responsabilidade objetiva é um plus em relação à responsabilidade subjetiva e não deixa de subsistir em razão; além do mais, todos se sujeitam normalmente à responsabilidade subjetiva, porque essa é a regra do ordenamento jurídico. Por conseguinte, quando se diz que nas omissões o Estado responde somente por culpa, não se está dizendo que incide a responsabilidade subjetiva, mas apenas que se trata de responsabilização comum, ou seja, aquela fundada na culpa, não se admitindo então a responsabilidade sem culpa.
Por fim, Furtado (2007, pp. 1031-1032) conclui:
Em conclusão, a discussão sobre a responsabilidade civil do Estado na omissão, especificamente acerca do seu enquadramento na teoria objetiva ou a teoria subjetiva, vem de muito tempo, e não há sinais de que venha a ser adotada uma teoria em detrimento da outra. É certo, todavia, que na jurisprudência é mais fácil identificar a menção à teoria subjetiva quando se trata de situações de omissões do Estado.
Conforme demonstrado e dito anteriormente, a doutrina não é pacífica acerca do tema. Alguns autores afirmam ser majoritário na doutrina o entendimento de que a responsabilidade civil extracontratual do Estado é subjetiva, devendo ser aferido quatro requisitos antes da responsabilização estatal: omissão (falta do serviço), dano, nexo de causalidade e comprovação de culpa. Já outros discordam dessa orientação, afirmando que basta que o administrado lesado demonstre a ocorrência do dano e que houve omissão por parte do Estado para que este seja responsabilizado.
Em relação à jurisprudência brasileira, há diversas decisões em ambos os sentidos, tanto no Supremo Tribunal Federal quanto no Superior Tribunal de Justiça.
Na ementa do RE 136861/TJ, julgado em 2021, percebe-se claramente a adoção da teoria objetiva no caso de omissão estatal em seu dever de fiscalização:
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. FISCALIZAÇÃO DO COMÉRCIO DE FOGOS DE ARTIFÍCIO. TEORIA DO RISCO ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. NECESSIDADE DE VIOLAÇÃO DO DEVER JURÍDICO ESPECÍFICO DE AGIR. 1. A Constituição Federal, no art. 37, § 6º, consagra a responsabilidade civil objetiva das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos. Aplicação da teoria do risco administrativo. Precedentes da CORTE. 2. Para a caracterização da responsabilidade civil estatal, há a necessidade da observância de requisitos mínimos para aplicação da responsabilidade objetiva, quais sejam: a) existência de um dano; b) ação ou omissão administrativa; c) ocorrência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa; e d) ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. 3. Na hipótese, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo concluiu, pautado na doutrina da teoria do risco administrativo e com base na legislação local, que não poderia ser atribuída ao Município de São Paulo a responsabilidade civil pela explosão ocorrida em loja de fogos de artifício. Entendeu-se que não houve omissão estatal na fiscalização da atividade, uma vez que os proprietários do comércio desenvolviam a atividade de forma clandestina, pois ausente a autorização estatal para comercialização de fogos de artifício. 4. Fixada a seguinte tese de Repercussão Geral: “Para que fique caracterizada a responsabilidade civil do Estado por danos decorrentes do comércio de fogos de artifício, é necessário que exista a violação de um dever jurídico específico de agir, que ocorrerá quando for concedida a licença para funcionamento sem as cautelas legais ou quando for de conhecimento do poder público eventuais irregularidades praticadas pelo particular”. 5. Recurso extraordinário desprovido.
Divergindo do mencionado posicionamento, há julgados relativos a danos causados por presos foragidos do sistema prisional nos quais o Supremo exige que seja demonstrado nexo de causalidade entre os danos causados e a fuga, exigindo-se a demonstração de contemporaneidade entre esses elementos, como se observa no RE 608880/MT:
EMENTA. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. ART. 37, § 6º, DA CONSTITUIÇÃO. PESSOA CONDENADA CRIMINALMENTE, FORAGIDA DO SISTEMA PRISIONAL. DANO CAUSADO A TERCEIROS. INEXISTÊNCIA DE NEXO CAUSAL ENTRE O ATO DA FUGA E A CONDUTA DANOSA. AUSÊNCIA DE DEVER DE INDENIZAR DO ESTADO. PROVIMENTO DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. 1. A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público e das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público baseia-se no risco administrativo, sendo objetiva, exige os seguintes requisitos: ocorrência do dano; ação ou omissão administrativa; existência de nexo causal entre o dano e a ação ou omissão administrativa e ausência de causa excludente da responsabilidade estatal. 2. A jurisprudência desta CORTE, inclusive, entende ser objetiva a responsabilidade civil decorrente de omissão, seja das pessoas jurídicas de direito público ou das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. 3. Entretanto, o princípio da responsabilidade objetiva não se reveste de caráter absoluto, eis que admite o abrandamento e, até mesmo, a exclusão da própria responsabilidade civil do Estado, nas hipóteses excepcionais configuradoras de situações liberatórias como o caso fortuito e a força maior ou evidências de ocorrência de culpa atribuível à própria vítima. 4. A fuga de presidiário e o cometimento de crime, sem qualquer relação lógica com sua evasão, extirpa o elemento normativo, segundo o qual a responsabilidade civil só se estabelece em relação aos efeitos diretos e imediatos causados pela conduta do agente. Nesse cenário, em que não há causalidade direta para fins de atribuição de responsabilidade civil extracontratual do Poder Público, não se apresentam os requisitos necessários para a imputação da responsabilidade objetiva prevista na Constituição Federal - em especial, como já citado, por ausência do nexo causal . 5. Recurso Extraordinário a que se dá provimento para julgar improcedentes os pedidos iniciais. Tema 362, fixada a seguinte tese de repercussão geral: “Nos termos do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, não se caracteriza a responsabilidade civil objetiva do Estado por danos decorrentes de crime praticado por pessoa foragida do sistema prisional, quando não demonstrado o nexo causal direto entre o momento da fuga e a conduta praticada”.
No Superior Tribunal de Justiça há diversos julgados adotando a teoria subjetiva. Podemos citar o REsp 1708325/RS, julgado em 2022:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO. MORTE EM DECORRÊNCIA DE DISPARO DE ARMA DE FOGO NO INTERIOR DE HOSPITAL PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VIGILÂNCIA. FALHA ESPECÍFICA NO DEVER DE AGIR. EXCLUDENTE DE ILICITUDE. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva, uma vez que decorre do risco administrativo, em que não se exige perquirir sobre existência de culpa, conforme disciplinado pelos arts. 14 do Código de Defesa do Consumidor; 186, 192 e 927 do Código Civil; e 37, § 6º, da Constituição Federal. 2. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se ao entendimento do Excelso Pretório, firmou compreensão de que o Poder Público, inclusive por atos omissivos, responde de forma objetiva quando constatada a precariedade/vício no serviço decorrente da falha no dever legal e específico de agir. 3. A atividade exercida pelos hospitais, por sua natureza, inclui, além do serviço técnico-médico, o serviço auxiliar de estadia e, por tal razão, está o ente público obrigado a disponibilizar equipe/pessoal e equipamentos necessários e eficazes para o alcance dessa finalidade. 4. A análise da responsabilidade civil, no contexto desafiador dos tempos modernos, em que se colocam a julgamento as consequências impactantes das omissões estatais, impõe ao julgador o ônus preponderante de examinar os dispositivos civis referidos, sob o olhar dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. 5. Logo, é de se concluir que a conduta do hospital que deixa de fornecer o mínimo serviço de segurança e, por conseguinte, despreza o dever de zelar pela incolumidade física dos pacientes, contribuiu de forma determinante e específica para o homicídio praticado em suas dependências, afastando-se a alegação da excludente de ilicitude, qual seja, fato de terceiro. 6. Recurso especial provido para restabelecer a indenização, pelos danos morais e materiais, fixada na sentença.
Também o REsp nº 1708325/RS:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO. MORTE EM DECORRÊNCIA DE DISPARO DE ARMA DE FOGO NO INTERIOR DE HOSPITAL PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VIGILÂNCIA. FALHA ESPECÍFICA NO DEVER DE AGIR. EXCLUDENTE DE ILICITUDE. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva, uma vez que decorre do risco administrativo, em que não se exige perquirir sobre existência de culpa, conforme disciplinado pelos arts. 14 do Código de Defesa do Consumidor; 186, 192 e 927 do Código Civil; e 37, § 6º, da Constituição Federal. 2. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se ao entendimento do Excelso Pretório, firmou compreensão de que o Poder Público, inclusive por atos omissivos, responde de forma objetiva quando constatada a precariedade/vício no serviço decorrente da falha no dever legal e específico de agir. 3. A atividade exercida pelos hospitais, por sua natureza, inclui, além do serviço técnico-médico, o serviço auxiliar de estadia e, por tal razão, está o ente público obrigado a disponibilizar equipe/pessoal e equipamentos necessários e eficazes para o alcance dessa finalidade. 4. A análise da responsabilidade civil, no contexto desafiador dos tempos modernos, em que se colocam a julgamento as consequências impactantes das omissões estatais, impõe ao julgador o ônus preponderante de examinar os dispositivos civis referidos, sob o olhar dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. 5. Logo, é de se concluir que a conduta do hospital que deixa de fornecer o mínimo serviço de segurança e, por conseguinte, despreza o dever de zelar pela incolumidade física dos pacientes, contribuiu de forma determinante e específica para o homicídio praticado em suas dependências, afastando-se a alegação da excludente de ilicitude, qual seja, fato de terceiro. 6. Recurso especial provido para restabelecer a indenização, pelos danos morais e materiais, fixada na sentença (grifos nossos).
Pela análise dos julgados acima, podemos notar uma forte tendência de que seja adotada a teoria subjetiva no âmbito dos Tribunais Superiores. Porém, certo é de que ainda não há posicionamento firmado em sede de repercussão geral ou através de recursos repetitivos, o que, por certo, em breve ocorrerá.
3.CONSIDERAÇÕES FINAIS
No Brasil não há uma posição pacífica sobre qual a teoria adotada em relação a responsabilidade civil extracontratual do Estado nos casos de omissão.
Há respeitável parte da doutrina defendendo a adoção da teoria objetiva, tendo em vista que a Constituição não faz nenhuma ressalva em relação aos atos omissivos em seu art. 37, §6º.
Há também grandes nomes do Direito Administrativo defendendo que deve ser aplicada a teoria subjetiva, cabendo ao administrado demonstrar a existência de culpa lato sensu por parte do Estado na falta de prestação do serviço.
Percebeu-se pelo estudo feito no presente artigo que no âmbito do Supremo Tribunal a matéria é por vezes divergente, não se podendo ainda dizer qual a teórica prevalente na Corte.
Já no Superior Tribunal de Justiça pode-se dizer que há uma forte tendência pela adoção da teoria subjetiva, o que se confirma pelos atuais julgados, alguns dos quais foram acima colacionados.
Ante o exposto, a Teoria Subjetiva mostra-se como mais recomendável, pois reflete a regra geral do sistema de responsabilidade civil do ordenamento jurídico brasileiro, qual seja: culpa não se presume, se prova. E, como sabidamente afirma Di Pietro (2011), a consequência jurídica, adotando-se uma ou outra teoria, é a mesma: o dever de indenizar do Estado por danos causados ao particular.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Administrativo Descomplicado. 19ª ed. ver. E atual., Rio de Janeiro: Método, São Paulo: Método, 2011.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo. 18ª ed., São Paulo, Malheiros Editores, 2005.
BRASIL. Constituição Federal. Disponível em: <http://www.planalto,gov.br> Acesso em 23/02/2023.
______. Código Civil. Disponível em: <http://www.planalto,gov.br> Acesso em 23/02/2023.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Curso de Direito Administrativo. 24ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
DACTES, Cristiane. Pesquisa Básica X Pesquisa Aplicada. Disponível em <http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAtj8AB/pesquisa-basica-x-pesquisa-aplicada>. Acesso em: 06/01/2023.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 24ª ed. São Paulo: Atlas, 2011.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Direito Administrativo. Belo Horizonte. Editora Fórum, 2007.
MARINELA, Fernanda. Direito Administrativo. 4ª ed., Niterói: Impetus Editora, 2011.
NEVES, José Luis. Pesquisa Qualitativa – Características, Usos e Possibilidades. Disponível em: <http://www.ead.fea.usp.br/cad-pesq/arquivos/c03-art06.pdf>. Acesso em 06/01/2023.
RAZUK, Paulo César. O Método Científico. Disponível em: <http://www.unisc.br/portal/upload/com_arquivo/o_metodo_cientifico_04.pdf>. Acesso em 06/01/2023.
RODRIGUES, William Costa. Metodologia Científica. Disponível em: <http://professor.ucg.br/siteDocente/admin/arquivosUpload/3922/material/William%20Costa%20Rodrigues_metodologia_cientifica.pdf>. Acesso em 06/01/2023.
Delegado de Polícia da Polícia Civil do Estado de Goiás. Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade Projeção. Formado pelo Centro Universitário de Brasília – UniCeub.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MENDES, Bruno Ramos. A responsabilidade civil extracontratual do Estado nos casos de omissão Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 mar 2023, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61132/a-responsabilidade-civil-extracontratual-do-estado-nos-casos-de-omisso. Acesso em: 22 nov 2024.
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