RESUMO: A cidadania é um dos principais fundamentos previstos na Constituiçao Federal de 1988, em suas primeiras linhas, a saber, artigo 1º, inciso II. Ao lado da dignidade da pessoa humana balizam as normas que devem prevalecer em respeito aos direitos e garantias fundamentais. Avançando na leitura constitucional, observa-se que o artigo 5º da Carta Magna, expõe que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (..)”. Dessa forma, ao menos no plano normativo, as pessoas têm direitos tutelados de forma isonômica. É neste contexto que o legislador originário estabeleceu que os direitos sociais são essenciais à vida do ser humano, de igual forma, enfatizou que as pessoas em vulnerabilidade social terão um amparo do estado em caso de necessidade. Apesar das previsões constitucionais de proteção, amparo e direitos e garantias fundamentais, há determinada parcela da população que não possuem acesso ao mínimo para sobrevivência. É o caso das pessoas em situação de rua, uma camada em hipervulnerabilidade. Esse artigo tem a intenção de destacar os possiveis avanços e retrocessos perpassados por essa normativos de amparo às pessoas em situação de rua, em especial o decreto 7.053 de 23/12/2009.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Decreto lei nº 7.053/09. 3. (in) eficiência da PNPSR. 5. Conclusão. 6. Referências Bibliográficas.
1.INTRODUÇÃO
A situação da pessoas em situação de rua sempre foi um desafio a ser enfrentado pela sociedade. Uma vez que essa decisão de se alijar de seus familiares tem origens por vezes desconhecidas e por vezes incuráveis. O estudo de Silva (2009) enfatiza que há dois componentes permanentes: a extrema pobreza vivenciada por essas pessoas e os vínculos familiares rompidos ou fragilizados.
Mas, conforme previsão constitucional, o Estado tem o dever de amparar esssa pessoas e prestar-lhe o que é digno para a vida. Na realidade existe um paradoxo entre as conquistas dos direitos sociais e a sua concretização na prática.
Observa-se que nas ruas das diversas cidades do Brasil, a cidadania dessas pessoas que fazem da rua o seu lar é praticamente inexistente. O acesso à saúde, educação, moradia, dentre tantos direitos elencados na Carta Magna é algo inacessível para pessoas que perderam a noção da sua qualidade de cidadão e de dignidade.
2. DECRETO LEI Nº 7.053/09 – POLÍTICA NACIONAL PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA
A conceituação utilizada para população em situação de rua, artigo 1º, paragráfo único:
o grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória.
Acrescenta-se que alguns autores descrevem as pessoas em situação
de rua como pessoas de origem, interesses, vinculações sociais e perfis socioeconômicos diversificados e por isso não é um grupo populacional homogêneo e sim heterogeneo.
Borin (2003), ressalta que a população em situação de rua é heterogena pelos seguintes caracteristicas:
A multiplicidade de características pessoais, que esse segmento social apresenta, dificulta a utilização de uma definição unidimensional. A variedade de soluções dadas à subsistência e formas de abrigo, tempo de permanência na rua, a trajetória interior a situação de rua, a herança cultural e social [...], o tempo de rua e as formas de rompimento dos vínculos familiares, os tipos de socialização que se consolidam na rua, a rotina espacial, o uso de substâncias químicas (álcool e/ou drogas) e o seu grau de comprometimento, as condições de autoestima, sexo, a idade, a escolaridade e as formas de reintegração que almejam, são fatores que dificultam uma conceituação que não seja reducionista ou mesmo unifocal e nos conduz a uma tipologia dentro dos moradores de rua na cidade.
O decreto expõe em seu artigo 5º os princípios Política Nacional para a População em Situação de Rua, além da igualdade e equidade:
I - respeito à dignidade da pessoa humana;
II - direito à convivência familiar e comunitária;
III - valorização e respeito à vida e à cidadania;
IV - atendimento humanizado e universalizado; e
V - respeito às condições sociais e diferenças de origem, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual e religiosa, com atenção especial às pessoas com deficiência.
O decreto enfatiza o direito à cidadania e a dignidade da pessoa humana, tais são fundamentos basilares da Constituição Federal. Há ainda a previsão no artigo 6º das diretrizes da Política Nacional para a População em Situação de Rua, bem como no artigo Art. 7o os seus objetivos a serem atingidos. Em termos normativos o documento traduz de forma satisfatória a pretensão da população em situação de rua.
Mas com objetivo de buscar seus direitos e se apropriar de forma efetiva, um grupo de pessoas em situação de rua se uniram e formaram o Movimento Nacional de Pessoas em Situação de Rua. O MNPSR foi criado num contexto de violência o qual ocorreu na Praça da Sé, em São Paulo, em agosto de 2004, momento em que 15 pessoas em situação de rua foram brutalmente assassinadas.
Assim, como forma de indignação o acontecimento ficou conhecido nacionalmente como “Massacre da Sé” e o dia 19 de agosto ficou registrado como o Dia Nacional de Luta da População em Situação de Rua.
Oposto do que acontece na realidade, sendo que a estigmatização, o preconceito e o desrespeito é muito maior do que se pode imaginar. As pessoas em situação de rua sofrem diariamente com o desprezo e falta de amparo de seus familiares e da sociedade.
Como forma de contextualizar a situação um exemplo a ser demonstrado é o atendimento na rede de saúde e assistência social. Quando um mendigo vai procurar um socorro médico, o mesmo é trato com ultraje e sempre é “separado” das demais que estão aguardando atendimento. Isso se deve, por vezes em razão da higiene pessoal e a falta da documentação, o que obsta o acesso ao atendimento solicitado.
Assim, conforme expõe Vasconcelos (1999), a existência de um direito, por si só não determina que a população tenha acesso, mas a forma de que é colocado à disposição da sociedade pode reforçá-lo ou torná-lo abstrato.
3.A (IN)EFICIÊNCIA DA PNPSR.
Ao observar que as pessoas em situação de rua não conseguem retornar ao convívio da sua família ou mesmo recuperar a sua cidadania com o trabalho ou livrar-se das drogas, é de se afirmar que a Política Nacional para a População em Situação de Rua não atingiu seus objetivos.
Assim, enfatiza Faleiros (2006), que desenvolvimento da cidadania social:
(...) consiste na obrigação do Estado em garantir condições dignas para todos estruturando através de uma rede de proteção social que articule acesso à saúde, à educação de qualidade, à formação profissional, aos direitos
trabalhistas, aos seguros sociais, à habitação e saneamento, à informação e à assistência pública enquanto garantia de renda e de serviços sociais.
De certo que avanços podem ter ocorrido, mas o desrespeito é o fator mais visível desse problema. Isso é percebido ao citar a situação das pessoas em situação de rua que estão na área da Cracolândia em São Paulo.
Rotineiramente a Guarda Municipal e a Polícia Militar fazem operações para dispersar essas pessoas que vão de um lado para o outro com os seus pertences nas mãos, isso somente para demonstrar que o poder público está fazendo alguma coisa para resolver ao problema.
Tais atos são respostas ao clamor desesperado de programas televisivos que cobram uma solução das autoridades, mas não há a resolução do problema, somente mudam de um lugar para o outro.
Nesse contexto não se verifica uma atuação contundente da PNPSR, uma vez que não há mudança de vida e nem resgate da cidadania dos que sofrem diariamente as mazelas da rua.
4.CONCLUSÃO
O presente estudo tem relevância na discussão dos fundamentos e concretização dos Direitos Humanos, principalmente em relação às pessoas em situação de rua. Assim, o assunto é pertinente e envolve o estudo de impacto de um direito já previsto em diversos documentos nacionais, internacionais, mas em grande parte das vezes não é respeitado.
A população destinatária de políticas públicas oriundas do poder público por vezes tem suas pretensões tolhidas em face das limitações imposta sem sobrepesar a situação em que vivem, uma vez que já estão em situação de vulnerabilidade e não são enxergadas pelo poder público.
Assim Silva (2009), enfatiza que para as pessoas em situação de rua, a defesa dos direitos humanos é de fundamental importância, pois expressa o respeito à vida e ao trato humano para quem está em situação de total risco social.
No âmbito dos direitos e garantias fundamentais, o Art. 5° postula que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos de seus incisos e parágrafos que, por sua vez, consagram a igualdade material ao promover tratamento igual para os iguais e desiguais.
Apesar de ter delineado de forma objetiva e congruente toda a sua temática assistencialista, ainda tem muito a ser desenvolvido. A pobreza e a desigualdade social são o ponto mais expoente desse problema. Não tem como atacar tal situação sem discutir o assunto com a sociedade do amanhã.
A educação da atual geração é fundamental para mitigar o desrespeito e desprezo que as pessoas em situação de rua sofrem diariamente. Talvez com uma sociedade mais perceptível ao problema do outro possa enxergar que é possível sim essa pessoa que perambula pelas ruas tenha dignidade e cidadania.
Logo, que efetivamente uma pessoa em situação de rua possa mudar a sua vida e sentir orgulho de seu país, uma vez que, na atualidade, não falta normativos regularizando direitos, mas falta de mecanismos para a sua concretização.
5.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
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BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. São Paulo:
Saraiva, 2017.
CARVALHO, Kildare Gonçalves de. Direito Constitucional. 18. ed. Belo Horizonte:
Del Rey, 2012.
DE MELLO, Celso Antônio Bandeira. Conteúdo Jurídico do Princípio da
Igualdade. 3ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
MENDES, Gilmar Ferreira. Estado de Direito e Jurisdição Constitucional. São
Paulo: Saraiva, 2012.
MORAES, Alexandre. de. Direitos Humanos Fundamentais. São Paulo: Atlas,
2000.
MOTTA, Sylvio e BARCHET, Gustavo. Curso de Direito Constitucional. Rio de
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PIOVESAN, Flávia. Direitos humanos e o direito constitucional
internacional.14. ed., rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2013.
RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos. – 7. ed. – São Paulo : Saraiva Educação, 2020.
SILVA, M.L.L. Trabalho e população em situação de rua no
Brasil. São Paulo: Cortez, 2009
VASCONCELOS, A.M. Serviço Social e prática reflexiva.
Revista da Faculdade de Serviço Social da UERJ, n.10, jul., 1997
pós-graduanda Legalle virtual.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RODRIGUES, Fabiane Juvenal de Lima. A Cidadania das pessoas em situação de rua e a (in) eficiência da Política Nacional para a População em Situação de Rua Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 maio 2023, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61455/a-cidadania-das-pessoas-em-situao-de-rua-e-a-in-eficincia-da-poltica-nacional-para-a-populao-em-situao-de-rua. Acesso em: 22 nov 2024.
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