RESUMO: A evolução histórica do conceito de família, em especial a evolução legal do divórcio. Tratando sobre a necessidade de adequação social desse instituto legal de dissolução do casamento, adequando-se a primazia da dignidade da pessoa humana e na autonomia de vontade. Versando principalmente à proteção legal da mulher no que tange à sua vontade em um divórcio. Assim a regulamentação do divórcio impositivo além de uma ferramenta que possibilita a proteção legal e justa da vontade de um dos cônjuges, é um aliado no duro processo de desafogamento do judiciário brasileiro, haja vista a simplificação do processo.
Palavras-chave: Direito de Família. Divórcio. Divórcio Impositivo.
INTRODUÇÃO
O divórcio é o meio para dissolução do vínculo conjugal, conforme art. 1571 § 1º do Código Civil de 2002 e Emenda Constitucional 66/2010, seja de maneira consensual ou litigiosa. A figura do divórcio direto, sem que seja necessário a prévia separação judicial por mais de um ano, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos, foi inserida no ordenamento jurídico brasileiro através da Emenda Constitucional 66/2010. A nova redação dada ao art. 226, parágrafo 6º da Constituição Federal de 1988, prevê que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio.
Atualmente no Brasil o divórcio sofre a limitação ao que tange a possibilidade do divórcio em cartório, haja vista que para homologação do mesmo é necessário que haja mútuo consentimento dos cônjuges, e se isso não ocorre o divórcio deve ser feito por via judicial através de uma ação de divórcio.
Porém, como é sabido o direito civil brasileiro, em especial o direito de família, deve acompanhar a evolução da sociedade a fim de estabelecer entre o direito e a sociedade um espelhamento. Assim, o divórcio no Brasil há muito tempo precisa de uma releitura atualizada, pois a norma que versa sobre o tema não compactua com a sociedade do século XXI. Diante disso há clara necessidade de facilitação, ou, desburocratização do divórcio direto no cartório.
No presente artigo será explanado e defendido a inserção no ordenamento jurídico da modalidade de divórcio unilateral, onde na falta de anuência do outro cônjuge para a lavratura da escritura, um dos cônjuges poderá requerer, diretamente no Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais em que lançado o assento do seu casamento, a averbação do divórcio, à margem do respectivo assento.
Para tanto, é imprescindível, antes de adentrar em qualquer mérito acerca do divórcio, que se discuta a evolução histórica do direito, em especial a evolução histórica e legal da família.
Ademais, se faz necessário mencionar que em 2019 a Corregedoria Geral de Justiça do Pernambuco, elaborou um provimento nº 06/2019, a ser seguida pelos cartórios do estado, que versava sobre a possibilidade de realização da averbação do divórcio, ainda que apenas um dos cônjuges se apresentasse, desde que não houvessem filhos menores de idade ou incapazes decorridos da relação. A temática logo virou alvo de uma discussão na Corregedoria Geral de Justiça, que revogou o provimento e emitiu uma recomendação para os Tribunais dos Estados e DF se absterem de editar tais regulamentações.
Diante disso nasceu uma problemática acerca do tema, opiniões divididas sobre da possibilidade, ou não, do divórcio unilateral no Brasil. O presente artigo busca defender a necessidade de regulamentação dessa modalidade a fim de desburocratizar o acesso ao divórcio no Brasil, quando não há anuência de um dos cônjuges.
1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA FAMÍLIA
O direito é reconhecidamente mutável, e se transforma ao decorrer do tempo em virtude de seu interesse primário: amoldar-se a sociedade, haja vista que se direito que não corresponde à sociedade é tido como uma folha de papel.
Assim, na ânsia de uma correspondência com a realidade, cabe ao direito se modificar ao passo em que a sociedade se transforma. Porém, é claro que o direito não possui o poder de prever tal transformações, e por isso ele se insurge na mudança, após a sociedade já ter mudado, é disso que se extrai o fato de por vezes tal mudança no direito não acontecer na velocidade esperada.
Com o direito de família não é diferente, pois a mudança na sociedade ao que tange a temática família, se estrutura quase que diariamente, e em virtude disso, nasce para o direito o dever se atualizar.
Para compreender melhor aquilo que se entende por família, e os aspectos jurídicos a ela relacionados, é preciso que seja desenhado um fluxo histórico das unidades familiares e seus desdobramentos jurídicos. Esse pode ser dividido entre família até 1988; e família após 1988.
Primeiramente, insta citar que a família nasce como um fenômeno natural, pois o ser humano era carente de relações afetivas de maneira estável, assim surgem-se os primeiros núcleos familiares da antiguidade.
Porém, a família brasileira, tem seu início calcado principalmente pelo direito romano e direito canônico. Segundo Aurea Pimentel Pereira a família romana era estruturada da seguinte forma:
Sob a auctoritas do pater famílias, que, como anota Rui Barbosa, era o sacerdote, o senhor e o magistrado, estavam, portanto, os membros da primitiva família romana (esposa, filhos, escravos) sobre os quais o pater exercia os poderes espiritual e temporal, à época unificados. No exercício do poder temporal, o pater julgava os próprios membros da família, sobre os quais tinha poder de vida e de morte (jus vitae et necis), agindo, em tais ocasiões, como verdadeiro magistrado. Como sacerdote, submetia o pater os membros da família à religião que elegia.[1]
No direito romano, a base da família era o casamento, ou seja, só existe família, se houver casamento. Assim a família que era formada por costumes, sem regras estatais, e se estruturou no direito romano, através de seus princípios costumeiros.
Seguindo a mesma premissa de “sem casamento, sem família”, o direito canônico, haja vista a ascensão do cristianismo, começa a ser o titular das regras do casamento, logo, das regras de família. Assim, insurge o ideal do cristianismo, que enfoca que só existe família, se houver casamento católico. Como esta era a religião que prevalecia no Brasil, tal feito não teve muita repercussão.
Até que o crescimento da imigração, consequentemente aumento dos não católicos, passou a ser um problema. Pois esses eram impedidos de contrair matrimônio, por não seguirem o catolicismo.
Foi nesse contexto que o Estado se viu obrigado a interferir na esfera do matrimônio, que até então era de poder integral da Igreja Católica. O Estado com o Decreto 3.069 (17/03/1863) cria assim três modalidades de casamento: casamento católico, casamento misto (pessoas católicas, com pessoas não católicas) e casamentos entre pessoas de seitas dissidentes. [2]
Ainda que houvesse a evolução em relação aos modelos de casamento, o conceito de família continuava sendo aplicado somente nos casos em que havia de fato um casamento.
O Estado, contudo, passou aos poucos a se afastar da Igreja, isso conferiu a família um novo viés, pois a mesma passou a ser enxergada pela ótica social, como uma peça da sociedade. Ligada diretamente ao patrimonialismo, além do caráter produtivo e econômico.
Porém, o Estado ainda tinha como família, apenas a relação surgida a partir do casamento, se não houvesse casamento, não haveria família e consequentemente, não haveria proteção estatal.
Mas com o advento da Carta Magna de 1988, nascem questionamentos acerca da família, em contraposição aos princípios que a nova constituição exalava.
Inicia-se a revolução, quando a Constituição Federal de 1988, consagra de maneira expressa o princípio da dignidade da pessoa humana. Que, por muitos, é considerada a chave da transformação do conceito de família. Pois foi a partir desse princípio que nascem as principais evoluções no Direito de Família.
Cumpre citar, igualdade entre homens e mulheres, a ponto de que o patriarcado não se configura mais como modelo, bem como igualdade entre filhos havidos ou não do casamento, e aqueles por adoção, equiparação em direitos das famílias constituídas por casamento, união estável, monoparentais e outras.
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIVÓRCIO
Em que pese o conceito de família e casamento serem amplamente discutidos a muito tempo, o divórcio não tinha a mesma importância jurídica e se quer existia.
No período do Brasil Império, havia a penas a possibilidade da separação pessoal, sem nenhum efeito enquanto ao matrimônio. Em 1891, é disciplinada a chamada separação de corpos, que para acontecer precisava de causas aceitáveis, dentre elas, adultério, injúria grave, abandono voluntário do domicílio conjugal por mais de dois anos contínuos, e mútuo consentimento dos cônjuges.
Mas foi apenas em 1893 que surge a primeira proposição divorcista no Brasil, que, porém, foi rejeitada por diversas vezes. E somente em 1901 é inserido ao Código Civil, pelo jurista Clovis Bevilaqua, a opção do desquite, amigável ou judicial. Ressalta-se que esse produzia apenas a separação dos cônjuges, permanecendo o vínculo matrimonial.
Porém ainda assim, era admitido o desquite apenas nas causas enumeradas taxativamente no Código Civil, em seu Art. 317 que trazia o enunciado: “A ação de desquite só se pode fundar em algum dos seguintes motivos: I. Adultério. II. Tentativa de morte. III. Sevicia, ou injuria grave. IV. Abandono voluntário do lar conjugal, durante dois anos contínuos”
Ademais em seu art. 318, havia também a previsão legal do desquite por mútuo consentimento, desde que o casamento perdurasse por mais de dois anos. “Art. 318 Dar-se-á também o desquite por mutuo consentimento dos cônjuges, se forem casados por mais de dois anos, manifestado perante o juiz e devidamente homologado.”
Em 1934 a então Constituição trazia como um de seus preceitos constitucionais a indissolubilidade do casamento, esse preceito foi repetido pelas constituições de 1937, 1946 e 1967.
E foi em 1946 que começam a surgir as tentativas de introdução do divórcio no Brasil, ainda que de maneira indireta. Tentavam que fosse incluída uma quinta causa, a anulação do casamento por erro essencial, se os cônjuges que não tivessem reestabelecido a vida conjugal decorridos cinco anos da decretação ou homologação do desquite. Nesse mesmo período foi proposto também uma emenda constitucional a fim de suprimir o termo “vinculo indissolúvel” do casamento civil.
Em 1975 foi apresentada uma Emenda à Constituição que permitia a dissolução do vínculo matrimonial, decorridos cinco anos de desquite ou sete de separação de fato, porém a mesma não atingiu o quórum exigido para aprovação.
O divórcio foi instituído oficialmente no Brasil em 1977, pela Emenda Constitucional de nº 9, regulamentada pela lei 6515/77 de autoria de Nelson Carneiro. A Ementa foi objeto de inúmeras polêmicas, pois ensejava a possibilidade de um, literalmente, novo casamento, que até 1977 era proibido.
Mas foi apenas em 1988 que houve a possibilidade de se casar e divorciar, quantas vezes fossem necessárias, o que posteriormente foi disciplinado com a Lei 7.841/89 que revogou o artigo da Lei do Divórcio que dispunha sobre a restrição a possibilidade de divórcios sucessivos. Além disso, a CRFB/88 traz em seu art. 226, que o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio, desde que cumprida a separação judicial por mais de um ano, ou comprovada a separação de fato por mais de dois anos. Foi através da Carta Magna de 1988 também que se estabeleceu o reconhecimento de outras formas de constituição familiar.
Em 2007 nasce a possibilidade do divórcio por via administrativa, com a promulgação da Lei 11.441/2007, resta dispensada a ação judicial nos casos de divórcio ou separação consensual. Bastando que as partes compareçam a um cartório de notas e apresentem o pedido, assistidas por um advogado. Há vedação no caso de possuírem filhos menores de idade ou incapazes.
Mas foi apenas em 2010 que foi instituído o divórcio direto no Brasil, através da EC 66, ou popularmente conhecida como a “PEC do divórcio”, que alterou o art. 226, parágrafo 6º da Constituição Federal, acabando com a separação judicial e os prazos exigidos. Além de não mais vincular a culpa do divórcio.
Apesar de ter gerado inúmeras críticas na época, a Emenda Constitucional é um dos grandes passos do direito civil brasileiro, e sua busca pela contemporaneidade.
2 NECESSIDADE DE INSERÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO
Conforme preceitua Luhmann, o direito em que pese ser cognoscitivamente aberto, normativamente é fechado. O que implica dizer que o direito é afetado por outros sistemas, porém sua alteração decorre apenas de um procedimento específico.
Assim, embora o divórcio impositivo possa ser encarado como uma realidade da sociedade atual brasileira, a sua previsão legal e autorização expressa requerem uma alteração na legislação, seguindo todo procedimento legislativo adotado no Brasil para tanto.
Porém, o Provimento 06/2019 Corregedoria Geral De Justiça – PE violou a normatividade fechada do direito. O provimento em questão editado pelo Corregedor-Geral de Justiça de Pernambuco, Desembargador JONES FIGUEIREDO ALVES, regulamentava o procedimento de averbação de divórcio impositivo, nos serviços de registro civil de casamentos. Versava este sobre a possibilidade de realização da averbação do divórcio, ainda que apenas um dos cônjuges se apresentasse desde que não houvesse filhos menores de idade ou incapazes decorridos da relação.
Provimento 6/2019:
Art. 1º. Indicar que qualquer dos cônjuges poderá requerer, perante o Registro Civil, em cartório onde lançado o assento do seu casamento, a averbação do seu divórcio, à margem do respectivo assento, tomando-se o pedido como simples exercício de um direito potestativo do requerente.
Parágrafo 1º. Esse requerimento, adotando-se o formulário anexo, é facultado somente àqueles que não tenham filhos de menor idade ou incapazes, ou não havendo nascituro e, por ser unilateral, entende-se que o requerente optou em partilhar os bens, se houver, a posteriori.
Parágrafo 2º. O interessado deverá ser assistido por advogado ou defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do pedido e da averbação levada a efeito.
Art. 2º. O requerimento independe da presença ou da anuência do outro cônjuge, cabendo-lhe unicamente ser notificado, para fins de prévio conhecimento da averbação pretendida, vindo o Oficial do Registro, após efetivada a notificação pessoal, proceder, em cinco dias, com a devida averbação do divórcio impositivo.
Parágrafo Único. Na hipótese de não encontrado o cônjuge notificando, proceder-se-á com a sua notificação editalícia, após insuficientes as buscas de endereço nas bases de dados disponibilizadas ao sistema judiciário.
Art. 3º. Em havendo no pedido de averbação do divórcio impositivo, cláusula relativa à alteração do nome do cônjuge requerente, em retomada do uso do seu nome de solteiro, o Oficial de Registro que averbar o ato no assento de casamento, também anotará a alteração no respectivo assento de nascimento, se de sua unidade, ou, se de outra, comunicará ao Oficial competente para a necessária anotação; em consonância com art. 41 da Resolução nº 35 do Conselho Nacional de Justiça.
Art. 4º. Qualquer questão relevante de direito a se decidir, no atinente a tutelas específicas, alimentos, arrolamento e partilha de bens, medidas protetivas e de outros exercícios de direito, deverá ser tratada em juízo competente, com a situação jurídica das partes já estabilizada e reconhecida como pessoas divorciadas.
Parágrafo único – As referidas questões ulteriores, poderão ser objeto de escritura pública, nos termos da Lei nº 11.441, de 04.01.2007, em havendo consenso das partes divorciadas, evitando-se a judicialização das eventuais questões pendentes.
Como justificativa, foi apresentada a necessidade de estabelecimento de medidas desburocratizantes ao registro civil, bem como, o fato do divórcio no Brasil ser um direito potestativo, que requer apenas a autonomia de vontade de um dos cônjuges.
Ainda que socialmente o provimento seja tangente ao atual viés da sociedade, há de se estabelecer erros grosseiros quanto a formalidade do provimento, visto que regula assunto tratado em legislação civil e constitucional, não observando a hierarquia, nem a competência exclusiva da união para reger o assunto.
Logo, a Corregedoria Nacional de Justiça, órgão do Conselho Nacional de Justiça, emitiu uma Recomendação nº 36, de 30 de maio de 2019, aos Tribunais dos Estados e do DF impondo não só a abstenção de editar ato que regulamente a averbação de divórcio extrajudicial por declaração unilateral emanada de um dos cônjuges (divórcio impositivo), mas também a revogação de eventual ato já emitido nesse sentido, como forma de garantia a segurança jurídica do ordenamento brasileiro.
É evidente a necessidade de uma regulamentação, pelas vias corretas, do instituto do divórcio impositivo no Brasil. Isso se dá principalmente ao fato de que atualmente o divórcio já resta como um ato imotivado, ficando evidente que a sua judicialização em muitos casos pode ser dispensada. Se não se faz necessária a prévia autorização judicial para o casamento, por quê a cobraríamos do divórcio?
Assim, reduções ou limites a autonomia de vontade devem ser suprimidas, e o divórcio em sua dimensão civil constitucional necessita de uma nova roupagem, que facilite a proteção dessa autonomia. Tendo em conta o fato de que um dos cônjuges é titular de uma vontade, a qual deverá ser respeitada e seguida na solicitação do divórcio. E a atual redação do artigo 733 do CPC atual prevê que somente o “divórcio consensual, a separação consensual e a extinção consensual de união estável poderão ser realizados por escritura pública”.
Diante desse cenário, o Senador Rodrigo Pacheco apresentou o projeto de lei tratando do Divórcio unilateral, Projeto de Lei nº 3.457/2019, que em linhas gerais, regulamenta o tema inspirado pelo provimento do Tribunal de Pernambuco.
O então projeto de lei traz a inserção do art. 733-A no Código de Processo Civil de 2015, com a seguinte redação:
Art. 733-A. Na falta de anuência de um dos cônjuges, poderá o outro requerer a averbação do divórcio no Cartório do Registro Civil em que lançado o assento de casamento, quando não houver nascituro ou filhos incapazes e observados os demais requisitos legais.
§ 1º. O pedido de averbação será subscrito pelo interessado e por advogado ou defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
§ 2º. O cônjuge não anuente será notificado pessoalmente, para fins de prévio conhecimento da averbação pretendida. Na hipótese de não encontrado o cônjuge notificando, proceder-se-á com a sua notificação editalícia, após insuficientes as buscas de endereço nas bases de dados disponibilizadas ao sistema judiciário.
§ 3º. Após efetivada a notificação pessoal ou por edital, o Oficial do Registro Civil procederá, em cinco dias, à averbação do divórcio.
§ 4º. Em havendo no pedido de averbação do divórcio, cláusula relativa à alteração do nome do cônjuge requerente, em retomada do uso do seu nome de solteiro, o Oficial de Registro que averbar o ato, também anotará a alteração no respectivo assento de nascimento, se de sua unidade; ou, se de outra, comunicará ao Oficial competente para a necessária anotação.
§ 5º. com exceção do disposto no parágrafo anterior, nenhuma outra pretensão poderá ser cumulada ao pedido de divórcio, especialmente alimentos, arrolamento e partilha de bens ou medidas protetivas, as quais serão tratadas no juízo competente, sem prejuízo da averbação do divórcio.
Posto isso, é indispensável que o referido projeto de lei seja aprovado e o ordenamento jurídico brasileiro contemple a modalidade de divórcio unilateral, requerido por apenas um dos cônjuges, através do seguinte procedimento:
Qualquer um dos cônjuges poderá requerer, perante o Registro Civil, em cartório onde lançado o assento do seu casamento, a averbação do seu divórcio, à margem do respectivo assento. Desde que não tenham filhos ou não havendo nascituro ou filhos de menor idade ou incapazes e por ser unilateral entende-se que o requerente optou em partilhar os bens, se houverem, a posteriori.
O procedimento deve, indispensavelmente, ser assistido por um advogado ou defensor público, e independerá da presença ou da anuência do outro cônjuge, cabendo-lhe unicamente ser notificado, para fins de prévio conhecimento da averbação pretendida, vindo o Oficial do Registro, após efetivada a notificação pessoal, proceder, em cinco dias, com a devida averbação do divórcio impositivo. Caso não encontrado o intimado, a sua notificação poderá ser feita extraordinariamente, via edital.
Será possível também o retorno ao uso de nome de solteiro, desde que solicitada e anotada a alteração no respectivo assento de nascimento, se de sua unidade, ou, se de outra, comunicará ao Oficial competente para a necessária anotação.
Questões referentes às tutelas especificas, alimentos, partilha de bens, medidas protetivas e outros, deverão ser tratadas em juízo, porém os requerentes já estarão com a situação jurídica de divorciados. Tal medida se perfaz importante dado o princípio da inafastabilidade da jurisdição, preceituado na carta magna de 1988, em seu art. 5º XXXV.
3 PRINCIPAIS ASPECTOS POSITIVOS DO DIVÓRCIO IMPOSITIVO
Tendo em vista a constitucionalização do direito civil, bem como do processo civil, cujo qual está positivado no Código de Processo Civil.
Art. 8º Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência.
Atualmente se faz necessário que o princípio da dignidade da pessoa humana seja respeitado em todas as relações civis, bem como no ordenamento jurídico que dispõe acerca dessas relações.
O divórcio unilateral vem com objetivo de acentuar a proteção a dignidade da pessoa humana, essa que é tida como princípio máximo, ou macro princípio. Sua definição não é exata e por isso existem diversos conceitos diferentes, conforme Jorge Miranda e Rui Medeiros.
“A dignidade da pessoa humana é da pessoa concreta, na sua vida real e quotidiana, não é de um ser ideal e abstracto. É o homem ou a mulher, tal como existe, que a ordem jurídica considera irredutível, insubsistente e irepetivel e cujos direitos fundamentais a Constituição enuncia e protege.”
Dessa interpretação dos juristas portugueses, é possível extrair que o princípio da dignidade humana, necessita ser observado partindo da premissa da realidade do ser humano em seu contexto social. Assim, defender o divórcio unilateral é reforçar a dignidade da pessoa concreta, que ao tentar se divorciar passa por entraves, vexames, onde o cônjuge não aceita o divórcio, e então usa-o como ferramenta de coação, ou quando esse está ausente.
Além disso, com o divórcio unilateral, será possível também satisfazer de maneira mais eficaz o princípio da não intervenção, ou princípio da liberdade. Conforme dispõe o art. 1.513 do CC “É defeso a qualquer pessoa, de direito público ou privado, interferir na comunhão de vida instituída pela família.” Princípio esse que conforme Flavio Tartuce, (TARTUCE, 2016, p. 1.190) mantém relação direta com o princípio da autonomia privada, que tem por fundamento a liberdade, um dos principais atributos do ser humano. O divórcio unilateral reafirmaria assim, a autonomia de vontade de um dos cônjuges como suficiente para o divórcio. Afastando a intervenção do Estado na vida privada e reiterando a liberdade sobre seu estado civil.
Ressalta-se que o divórcio unilateral pode ater-se a apenas desfazer o vínculo matrimonial, possibilitando que as questões patrimoniais sejam discutidas posteriormente, o que segue o mesmo teor da Súmula 197 do STJ, que aduz: “O divórcio direto pode ser concedido sem que haja prévia partilha dos bens.”
A necessidade de facilitação do divórcio no Brasil quando um dos cônjuges não anuírem com o pedido, almeja afastar obstáculos materiais e formais ao divórcio, possibilitando assim, maior garantia ao princípio da dignidade da pessoa humana, bem como a autonomia de vontade.
O desígnio, de trazer ao direito civil brasileiro a desburocratização do acesso ao divórcio, será uma importante ferramenta para o desembaraço da morosidade do judiciário brasileiro. A redução de demandas judiciais será evidente, tendo em vista que cumprido os requisitos legais, o divórcio poderá ser feito diretamente no cartório.
Tal medida possibilitará que o poder judiciário brasileiro, conduza outras ações de maneira mais célere, na busca de resguardar o princípio da razoável duração do processo.
Condicionar o divórcio a subscrição de ambos os cônjuges na escritura é de certa forma frear a autonomia de vontade das partes, pois isso nem sempre é possível. É muito comum, que por receio, ou capricho, um dos cônjuges não assine o divórcio, como forma de punição ao outro, ferindo diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana.
Tal situação é vista por inúmeras vezes no bojo de relações abusivas, onde a mulher é vítima de violência doméstica, seja física ou psicológica, e o agressor tem como “arma” fala de que não dará o divórcio. Nesses casos é inevitável que haja desgaste a mulher quando essa tenta se divorciar. Pois com a negativa do cônjuge em anuir com o divórcio extrajudicial, a via judicial é acionada para tal ação.
Com a implantação do divórcio impositivo haveria uma redução nesse tipo de agressão, pois a mulher, vítima de violência doméstica, poderia sozinha, averbar o divórcio no cartório, com a simples notificação do cônjuge. Ressaltasse que medidas protetivas continuam em sede de ação judicial, mas o simples fato de não haver mais o vínculo jurídico matrimonial com o agressor, já é um avanço para a vítima.
Bem como, será possível o divórcio direto em cartório quando o cônjuge estiver ausente ou em lugar incerto, haja vista que atualmente o juiz, ao esgotar as possibilidades de citação pessoal, faz a citação via edital e decreta o divórcio, conforme jurisprudência:
Ação de divórcio. Citação por edital. Falta de esgotamento das vias ordinárias para a citação da parte acionada. Possibilidade. Ausência de prejuízo. Sentença confirmada. 1. A simples contestação por negativa geral não implica na necessidade de produção ele prova oral, sendo injustificável determinar-se a nulidade ela sentença, ainda que se discuta ser inoportuna a citação editalícia, por ausência ele pleno esgotamento das vias ordinária para a citação da parte acionada, pois, mesmo que tivesse sido pessoalmente citado, o réu nada poderia alegar para impedir a decretação do divórcio. 2. Improvimento pelo recurso de apelação. (TJBA, AC 0082655-3 1.2011 .8.05.000 1, 2.ª C. Cív, rel. Des. Maria Socorro Barreto Santiago, p. 0 7/08/20 13).
Isso comprova, que a via judicial foi acionada para mera decretação de divórcio, o que poderia facilmente ser resolvida diretamente no cartório, caso a modalidade de divórcio unilateral fosse uma realidade brasileira.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, é possível concluir que a realidade social brasileira atual, requer uma atualização ao instituto do divórcio, pois há clara e evidente necessidade de contemplar a modalidade de divórcio unilateral, a fim de que haja entre a realidade e o ordenamento jurídico uma simetria.
O divórcio unilateral será uma ferramenta importante para a concretização de princípios, como a dignidade da pessoa humana, não intervenção, liberdade e autonomia privada dos indivíduos.
Através dessa nova modalidade, onde será possível o divórcio direto no cartório promovido por apenas um dos cônjuges, haverá um desafogamento do judiciário no que tange as ações de divórcio litigioso.
Assim, caberá ao judiciário apenas a resolução de questões que necessitam da intervenção do Ministério Publico, guarda, partilha de bens e outros.
O tema já vem sendo alvo de provimentos judiciais, porém tais provimentos foram revogados, por tratar de matéria cuja competência para legislar é da União. Mas restou evidente a necessidade de lançar um olhar sobre esse tema, a fim de atualizar o divórcio no Brasil.
Através disso professores e o Senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG) propuseram o projeto de 3457/19, que adicionará o art. 733 A ao Código de Processo Civil, a fim de que o divórcio unilateral possa ser realizado no Brasil, o projeto que já está em tramitação, se aprovado, irá gerar inúmeros benefícios e avanços para o direito civil brasileiro.
REFERÊNCIAS
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Base de dados de Jurisprudência do IRIB. STJ: Divórcio indireto. Partilha de bens – inexigibilidade. IRIB, 2013. Disponível em: https://irib.org.br/noticias/detalhes/stj-div-oacute-rcio-indireto-partilha-de-bens-inexigibilidade/. Acesso em: 12 out. 2019.
BRASIL. Código Civil. Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002.
BRASIL. Código de Processo Civil. Lei 13.105 de 16 de março de 2015.
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DIAS. Berenice. Manual de Direito das Famílias. 5. ed.. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
DELGADO, Maria Luiz; SIMÃO, José Fernando. Impedir a declaração unilateral de divórcio é negar a natureza das coisas. Conjur, 2019. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2019-mai-19/processo-familiar-barrar-declaracao-unilateral-divorcio-negar-natureza-coisas. Acesso em: 12 out. 2022.
JÚNIOR, Fredie Didier. CURSO DE DIREITO PROCESSUAL CIVIL, VOL. 1. 17. Ed. Salvador: JusPodivm, 2015;
NORONHA, Maressa Maelly Soares; PARRON, Stênio Ferreira. A EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE FAMÍLIA NORONHA. UNIESPC
http://uniesp.edu.br/sites/_biblioteca/revistas/20170602115104.pdf. Acesso em: 12 out. 2019.
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-64451996000100006. Acesso em: 12 out. 2019.
https://pantheon.ufrj.br/bitstream/11422/5646/1/CEFSouza.pdf. Acesso em: 12 out. 2019.
TARTUCE, Flavio. Manual de Direito Civil. 6ª ed. São Paulo: Editora Forense, 2016.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MORAIS, DALILA PRISCILA ANDRADE. Divórcio unilateral: necessidade de regulamentação no ordenamento jurídico brasileiro Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 maio 2023, 04:16. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61473/divrcio-unilateral-necessidade-de-regulamentao-no-ordenamento-jurdico-brasileiro. Acesso em: 22 nov 2024.
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