DÉBORA JAQUELINE GIMENEZ
FERNANDES FORTUNATO
(orientadores)
RESUMO: Este estudo tem como desiderato esclarecer os óbices jurídicos concernentes à análise da responsabilidade civil das entidades financeiras no âmbito digital. Atualmente, a exploração do comércio eletrônico acarretou uma multiplicidade de riscos ao consumidor, os quais também se manifestaram no setor bancário, onde as fraudes bancárias, tais como phising e pharming, são perpetradas com o fito de angariar dados pessoais e bancários por meio de artimanhas fraudulentas na Internet. Os fraudadores induzem os usuários mediante correspondências eletrônicas, links inverídicos, entre outras artes. A responsabilidade civil se tornou um tema de indubitável magnitude, haja vista a exponencial utilização dos serviços bancários nos últimos anos. Destarte, a responsabilidade civil das instituições financeiras assume um lugar de proeminência, tendo em vista que a súmula 479 do Supremo Tribunal de Justiça acentua que tais instituições respondem objetivamente pelos prejuízos advindos de eventos fortuitos internos relativos a fraudes e delitos perpetrados por terceiros no âmbito das transações bancárias. Desse modo, no contexto digital, especificamente nas fraudes perpetradas no internet banking e mobile banking, a responsabilidade civil é objetiva. Quanto à metodologia utilizada, adotou-se uma abordagem pautada na revisão bibliográfica, mediante consulta a obras, legislação e periódicos que versam sobre a temática em apreço.
Palavras-chave: Responsabilidade Civil. Entidades financeiras. Âmbito Digital. Fraudes Bancárias.
ABSTRACT: This study aims to elucidate the legal obstacles concerning the analysis of civil liability of financial institutions in the digital realm. Currently, the exploration of electronic commerce has brought about a multitude of risks to consumers, which have also manifested in the banking sector, where banking frauds, such as phishing and pharming, are perpetrated with the aim of obtaining personal and banking data through fraudulent schemes on the Internet. The fraudsters induce users through electronic correspondences, misleading links, among other means. As a result of the aforementioned, civil liability has become a matter of undeniable significance, given the exponential use of banking services in recent years. The civil liability of financial institutions assumes a position of prominence, considering that Supreme Court Precedent 479 emphasizes that such institutions are objectively liable for damages resulting from fortuitous internal events related to frauds and offenses committed by third parties in the scope of banking transactions. Thus, it is worth noting that in the digital context, specifically in the frauds perpetrated in internet banking and mobile banking, civil liability is objective. Regarding the methodology employed, a bibliographic review approach was adopted, consulting books, legislation, and journals that address the subject matter at hand.
Keywords: Civil Liability. Financial Institutions. Digital Realm. Banking Frauds.
Hodiernamente, a responsabilidade civil é um fenômeno jurídico atemporal e de extrema importância. Desde tempos remotos, o anseio de estabelecer a imputação de responsabilidade às ações humanas, quando causadoras de danos a terceiros, tem sido perseguido. Nesse sentido, uma análise aprofundada se faz necessária para identificar a pessoa ou entidade que deve ser responsabilizada por atos ilícitos cometidos contra outrem.
Ao abordar a responsabilidade civil das instituições financeiras no âmbito digital, é imprescindível mencionar, inicialmente, a ascensão dos serviços bancários digitais, tais como mobile e internet banking, que têm atraído considerável atenção dos usuários em virtude de sua praticidade e celeridade. Em consequência, tais serviços se consolidaram como ferramentas amplamente utilizadas em âmbito global ao longo dos anos.
Diante do crescimento desses serviços no ambiente digital, emerge a necessidade de examinar quem deve ser responsabilizado civilmente nos casos de fraudes bancárias. Essa indagação assume extrema importância na efetivação da proteção dos consumidores, uma vez que esse impasse pode acarretar prejuízos significativos em suas vidas financeiras.
Na contemporaneidade, persistem desafios para definir a responsabilidade nas relações de consumo no universo digital. Entretanto, a Súmula 479 do Supremo Tribunal Federal estabelece que as instituições financeiras devem arcar com os danos decorrentes de eventos internos imprevisíveis. Em outras palavras, há a possibilidade de imputar às instituições a responsabilidade por fraudes praticadas por terceiros no contexto das operações bancárias. Contudo, é crucial determinar a extensão dessa responsabilidade e se as fraudes se enquadram como eventos internos imprevisíveis.
A expansão do comércio digital trouxe consigo novos modelos de fraude, empregados para obter informações pessoais e bancárias por meio de falsas correspondências eletrônicas, mensagens de texto fraudulentas, comunicações via WhatsApp e redirecionamentos de usuários a sites não oficiais das instituições. Dessa forma, os fraudadores conseguem ocultar habilmente sua identidade, o que dificulta a identificação e responsabilização dos envolvidos pelos danos causados.
Não menos relevante, o propósito fundamental desta pesquisa consiste em identificar os critérios para a responsabilização civil das instituições bancárias em casos de fraudes no ambiente virtual. Além disso, buscar-se-á esclarecer o conceito de responsabilidade civil e os elementos essenciais para fundamentar esse fenômeno jurídico. Também será empreendido um estudo para elucidar o conceito de consumidor e a definição de instituição financeira como prestadora de serviços na relação de consumo, bem como para delinear as características das fraudes bancárias.
Por fim, a condução discursiva deste trabalho será viabilizada por meio de uma meticulosa revisão bibliográfica, embasada em doutrinas consagradas, legislações vigentes, jurisprudências relevantes, artigos científicos, revistas especializadas e periódicos de destaque que sejam congruentes com a temática abordada. Além disso, serão empregados métodos investigativos que almejam instigar questionamentos pertinentes à responsabilidade civil das instituições financeiras diante das fraudes perpetradas no ambiente digital.
1.1 DEFINIÇÃO E CARACTERÍSTICAS GERAIS DE FRAUDE
De antemão, é imprescindível ressaltar que a fraude se configura como uma conduta típica, ilícita e culpável, a qual encontra-se descrita no artigo 171 do Código Penal, nos termos a seguir delineados:
Art. 171. Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena: Reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
O mencionado preceito normativo, ademais, dispõe acerca da majoração da sanção penal em caso de fraude eletrônica, consoante os §§ 2º-A, 2º-B e 3º, in verbis:
§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
§ 2º-B. A pena prevista no § 2º-A deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso, aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional.
§ 3º. A pena aumenta-se de um terço, se o crime for cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.
De acordo com os postulados doutrinários, a fraude assume o status de característica elementar do delito de estelionato, o qual, por sua vez, é passível de identificação por meio dos seguintes elementos: (a) a conduta do agente que visa à obtenção de vantagem ilícita em detrimento de terceiros; (b) a vantagem ilícita pode ser em favor do próprio agente ou de terceiros; (c) a vítima é ludibriada ou mantida em erro; (d) o agente se utiliza de subterfúgios, artimanhas ou outros expedientes fraudadores com o intuito de alcançar sua finalidade (GRECCO, 2022).
Nessa esteira, de acordo com o entendimento do jurista Rogério Grecco (2022), podemos conceituar a fraude como uma conduta intencionalmente direcionada à indução ou manutenção de outrem em erro, mediante o emprego de artifício, ardil ou quaisquer outros expedientes fraudulentos, com o escopo de auferir, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em detrimento alheio.
Ademais, aqueles que praticarem a conduta descrita no tipo penal serão responsabilizados na esfera competente. Por outro lado, no âmbito civil, o indivíduo que sofrer fraude terá o direito de ingressar com uma demanda para reparar os danos patrimoniais e extrapatrimoniais sofridos, sendo importante destacar que, no âmbito do direito civil, o fraudador responderá apenas com seu patrimônio (PAES, 2019; SILVA, 2020).
No tocante à fraude bancária, a estudiosa Roberta da Silva (2020), aduz que existem determinados elementos comuns para configurar o delito em comento, tais como: (a) o sujeito passivo da fraude mantém algum vínculo com uma entidade financeira; e (b) haja a vulnerabilização de alguma informação bancária confidencial e exclusiva.
1.2 MODALIDADES DE FRAUDES BANCÁRIAS
Em razão da atual e crescente tendência de ampliação dos serviços prestados no âmbito digital pelas instituições financeiras, constata-se uma notória elevação nas práticas ilícitas perpetradas por meio da internet. Nesse sentido, a migração de um expressivo contingente populacional para o mobile e internet banking tem propiciado aos transgressores um considerável incremento em suas tentativas fraudulentas, valendo-se, principalmente, de expedientes sofisticados, como a engenharia social, o golpe do motoboy, o golpe do falso contato telefônico e o golpe do envio de mensagem de texto ou e-mail falso, o phishing e o pharming, com o intuito de adquirir indevidamente informações sensíveis de caráter bancário e financeiro dos usuários (GONÇALVES, 2021; SILVA, 2020).
Conforme as asserções de Adriano Volpini, diretor da Comissão Executiva de Prevenção a Fraudes da Febraban, a engenharia social desempenha um papel preponderante em mais de 70% dos ardilosos golpes perpetrados em solo brasileiro. Nesse modus operandi, há uma indução astuciosa ao cliente para que ele confie suas combinações codificadas e senhas aos inescrupulosos estelionatários, os quais se valem da ingenuidade ou da confiança do usuário para extrair informações que possibilitam um acesso ilícito a computadores ou a dados bancários (FEBRABAN, 2020).
Desse modo, podemos descrever a engenharia social como uma estratégia fraudulenta amplamente utilizada, na qual os golpistas exploram a ingenuidade ou confiança do usuário para obter acesso não autorizado a informações sensíveis. Nesse tipo de abordagem, os criminosos manipulam habilmente as emoções e interações sociais, enganando as vítimas e levando-as a divulgar voluntariamente seus códigos, senhas e outras informações pessoais, que são posteriormente utilizadas para fins ilícitos, como acessar computadores ou obter informações bancárias confidenciais.
De acordo com a Federação Brasileira de Bancos – FEBRABAN (2020), o Golpe do Motoboy é uma artimanha sofisticada que se inicia por meio de uma comunicação telefônica direcionada ao cliente, executada por um indivíduo astucioso que se faz passar por funcionário bancário. Esse farsante notifica o cliente de que seu cartão foi submetido à clonagem, comunicando-lhe a necessidade iminente de bloqueá-lo. Supostamente, o golpista argumenta que a solução reside em cortar o cartão ao meio e solicitar um novo por meio do atendimento eletrônico. O falso funcionário, de forma dissimulada, solicita que a senha seja digitada no dispositivo telefônico e assegura que, em nome da segurança, um motoboy será designado para coletar o cartão a fim de proceder à uma perícia. O cliente, incauto, não tem conhecimento de que, embora o cartão tenha sido partido ao meio, o chip permanece íntegro, o que viabiliza a realização de múltiplas transações fraudulentas.
1.2.3 Golpe do Falso Contato Telefônico
O golpe do falso contato telefônico é uma artimanha em que um impostor se comunica com a vítima, se fazendo passar por funcionário do departamento de segurança de uma instituição financeira, utilizando um número de matrícula fictício. O golpista alega a existência de um problema relacionado aos serviços bancários, como o cancelamento do cartão ou de um cheque. Para construir uma sensação de segurança, o fraudador menciona dados pessoais da vítima, como nome completo, CPF, data de nascimento e endereço (SANTANDER, 2017; SILVA, 2020).
Com o intuito de resolver a suposta situação, o impostor solicita informações sensíveis, como a senha do cartão de crédito, a senha do internet banking, a chave de segurança e o código de verificação do cartão, ou o token recebido por mensagem de texto. Munidos dessas informações, os golpistas realizam transações fraudulentas, efetuando compras no cartão de crédito ou débito da vítima, bem como operações bancárias em sua conta corrente (SANTANDER, 2017; SILVA, 2020).
É importante destacar que, em alguns casos, tanto a operadora de celular quanto a instituição financeira podem ser solidariamente responsabilizadas pela fraude, visto que os golpistas são capazes de manipular o identificador de chamadas, fazendo com que o número oficial do banco seja exibido, e, ao finalizar a ligação, a linha telefônica fica inoperante (SILVA, 2020).
1.2.4 Golpe do Envio de Mensagem de Texto ou E-mail Falso
O Golpe do envio de mensagem de texto ou e-mail falso é uma prática ardilosa na qual os fraudadores enviam mensagens de texto ou e-mails para os clientes das instituições financeiras, simulando serem provenientes do próprio banco. Essas mensagens contêm um "link" que direciona a vítima para uma página falsa, projetada para se assemelhar ao ambiente seguro do banco. Nessa página fraudulenta, a vítima é induzida a fornecer suas senhas e códigos de segurança (SANTANDER, 2017; SILVA, 2020).
Um exemplo recorrente é quando o impostor solicita que a vítima envie a foto do cartão de segurança online através do "link" fornecido, alegando a necessidade de realizar uma atualização. O cartão de segurança online possui fotos das diferentes posições e códigos de segurança, e é utilizado para aprovar todas as transações na conta corrente do cliente (SILVA, 2020). Com essas informações em mãos, os golpistas são capazes de realizar operações fraudulentas, como empréstimos, transferências e outras transações ilícitas.
O phishing, também conhecido como pescaria digital, figura como uma ardilosa forma de fraude eletrônica engendrada pelos mestres da engenharia social, cujo propósito é obter informações pessoais do usuário de maneira ilícita. A modalidade mais corriqueira desse tipo de ataque consiste em mensagens e e-mails falsificados, habilmente elaborados para induzir o usuário a clicar em links suspeitos (FEBRABAN, 2020). Além disso, existem páginas falsas propositadamente concebidas na internet, cujo intuito é induzir o indivíduo a revelar seus dados pessoais.
Os casos mais usuais de phishing envolvem o recebimento de e-mails supostamente provenientes de instituições bancárias, trazendo mensagens alegando irregularidades na conta do cliente, ultrapassagem de limite do cartão, a necessidade de revalidação de pontos em programas de fidelidade, atualização de token, ou até mesmo a introdução de um novo software de segurança bancária que requer instalação imediata pelo usuário (FEBRABAN, 2020).
Neste contexto, é fundamental que os usuários questionem a autenticidade das comunicações recebidas, verifique cuidadosamente os remetentes e evite clicar em links suspeitos. Adicionalmente, é recomendado manter-se atualizado sobre as práticas de segurança recomendadas pelos órgãos competentes e instituições financeiras, a fim de resguardar-se de possíveis ciladas cibernéticas.
O pharming, uma sofisticada modalidade de fraude digital, opera sob os mesmos preceitos do phishing, almejando enganar os consumidores. No entanto, o pharming transcende o phishing ao dispensar o emprego de e-mails, SMS ou outros expedientes fraudulentos como ponto de partida. Em vez disso, o fraudador empreende um ataque direto ao Sistema de Nomes de Domínio (DNS), mais conhecido pela sua nomenclatura em inglês, Domain Name System, por intermédio do qual se viabiliza o redirecionamento automático do consumidor do sítio legítimo do banco para uma versão simulada, denominada de sítio espelho, que, comumente, é meticulosamente construída para se assemelhar sobremaneira à página autêntica da instituição financeira (GONÇALVES, 2021).
Dessa forma, ainda que o consumidor introduza corretamente o URL pertinente à instituição, ele é desviado para o sítio falso, sendo levado a crer que está no endereço eletrônico verídico do banco, resultando em sua propensão em fornecer, sem qualquer suspeita de fraude, seus dados pessoais e bancários (GONÇALVES, 2021). Desse modo, o pharming revela-se praticamente indetectável por parte dos usuários comuns da instituição bancária.
Infere-se que o pharming é frequentemente perpetrado por meio de duas técnicas: a instalação de um malware, popularmente conhecido como vírus, no computador da vítima, o qual pode ocorrer quando esta acessa ou faz o download de conteúdo proveniente de sites fraudulentos; e o envenenamento do cache do DNS.
No que diz respeito à responsabilidade civil, assim como no phishing, há divergências na jurisprudência e na doutrina em relação ao banco. Alguns argumentam que o banco é responsável por falhas de segurança que resultaram na clonagem do site, enquanto outros defendem a ausência de vício no serviço e a negligência do consumidor. Embora a corrente majoritária seja de responsabilizar a instituição financeira nos casos de pharming, levando em consideração a invasão do Sistema de Nomes de Domínio e o envenenamento do cache, é necessário analisar se o banco prestou um serviço com vício e se esse vício foi a causa determinante do dano ao consumidor (GONÇALVES, 2021).
2.1 DEFINIÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL
Em princípio, é imperativo ressaltar que a responsabilidade civil é integralmente respaldada pelo Código Civil, em seu artigo 186, ad litteram:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Apreciando os contornos do conceito jurídico de responsabilidade, pode-se inferir que esta implica na conduta lesiva de um sujeito que, agindo primordialmente de maneira ilícita, transgrida uma norma jurídica preexistente, seja ela de natureza legal ou contratual, sujeitando-se, portanto, às consequências de seu ato, quais sejam as obrigações de reparação (GONÇALVES, 2022). Consoante o renomado jurista Carlos Roberto Gonçalves (2022, p. 33), “a responsabilidade civil tem, pois, como um de seus pressupostos, a violação do dever jurídico e o dano. Há um dever jurídico originário, cuja violação gera um dever jurídico sucessivo ou secundário, que é o de indenizar o prejuízo”.
Além disso, é importante esclarecer que, no contexto das instituições bancárias, a responsabilidade civil é geralmente tratada de forma objetiva. Isso significa que, em muitos casos, não é necessário comprovar a culpa específica do banco para que ele seja responsabilizado. Basta estabelecer a relação de causalidade entre a conduta do banco e o dano sofrido pelo cliente para surgir o dever de indenizar (GONÇALVES, 2022). Essa abordagem objetiva busca proteger os consumidores e garantir que sejam compensados pelos danos decorrentes de falhas na prestação de serviços financeiros.
2.2 ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Mediante a minuciosa análise do disposto no artigo 186 do Código Civil, depreende-se que há quatro elementos basilares que configuram a responsabilidade civil: (i) a ação ou omissão; (ii) a culpa ou dolo do agente; (iii) o nexo de causalidade e; (iv) o dano suportado pela vítima.
A responsabilidade civil surge quando uma pessoa, por meio de sua ação ou omissão, ocasiona prejuízo a outra. Nesse contexto, a responsabilidade pode decorrer de atos praticados diretamente pelo agente, de atos praticados por terceiros que estejam sob sua responsabilidade, bem como de danos causados por objetos e animais de sua propriedade (GONÇALVES, 2022). Em cada uma dessas situações, o agente assume a obrigação de reparar os danos causados, independentemente da existência de culpa, visando restabelecer a ordem e compensar o prejuízo suportado pela vítima.
É unânime o consenso acerca da presença do dolo no mencionado artigo 186 do Código Civil, já que este se refere, de início, à "ação ou omissão voluntária", para posteriormente aludir à culpa, caracterizada como "negligência ou imprudência". Nesse contexto, o dolo se configura como a manifestação de uma vontade deliberada, consciente e intencional de transgredir um direito, ao passo que a culpa se revela como a ausência de diligência adequada (GONÇALVES, 2022). Desse modo, o dolo assume a natureza de uma violação premeditada e intencional do dever jurídico.
O Nexo de causalidade representa o vínculo necessário entre a ação ou omissão do agente e a consequência danosa observada. É por meio desse nexo que se estabelece a relação de causa e efeito que fundamenta a obrigação de indenizar. Sem a presença desse nexo, não há a responsabilidade civil. Se o dano ocorreu, porém sua origem não está diretamente ligada ao comportamento do agente, não se configura a relação de causalidade, e consequentemente, não existe a obrigação de indenização (GONÇALVES, 2022).
Sem a comprovação do prejuízo, não é possível atribuir responsabilidade civil a alguém. Com efeito, o elemento objetivo da culpa reside na transgressão de um dever previamente estabelecido. A responsabilidade surge como uma reação decorrente da violação desse dever. No entanto, mesmo na ocorrência de uma infração do dever jurídico, acompanhada de culpa ou até mesmo dolo por parte do infrator, nenhuma compensação será devida se não houver a constatação de um efetivo prejuízo (GONÇALVES, 2022).
2.3 EXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
As excludentes de responsabilidade civil eximem o agente causador do dano do dever de reparar a vítima. Essas excludentes surgem quando um ou mais elementos constitutivos da responsabilidade civil, tais como ação ou omissão, culpa ou dolo, nexo de causalidade e dano, são suprimidos da conduta ilícita perpetrada, acarretando na inexistência de imputação pela ilicitude cometida (SILVA, 2020).
De acordo com Roberta da Silva (2020), as excludentes de responsabilidade compreendem: (a) a legítima defesa; (b) o estado de necessidade; (c) o exercício regular do direito; (d) o estrito cumprimento do dever legal; (e) o caso fortuito e força maior; (f) a culpa exclusiva da vítima; (g) o fato exclusivo de terceiro; (h) a renúncia da vítima à indenização e a cláusula de não indenizar.
Dado o exposto, torna-se relevante frisar que a presente pesquisa não tem como objetivo aprofundar-se em uma análise pormenorizada de cada uma das excludentes mencionadas. Sua finalidade é outra, e, portanto, a menção dessas excludentes é meramente informativa, apresentada com o intuito de referenciá-las, sem adentrar em seus detalhes específicos.
3 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
De início, ressalta-se que o Código de Defesa do Consumidor - Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990, encontra sua raiz na Constituição Federal de 1988, a qual consagrou tal dispositivo legal como uma norma de índole constitucional, viabilizando, assim, a salvaguarda dos direitos dos consumidores. Trata-se de uma norma de cunho cogente e de interesse coletivo.
Em uma perspectiva panorâmica, é inegável que o Código de Defesa do Consumidor delineia o conceito de consumidor com o desiderato de clarificar a abrangência da relação jurídica de consumo, em outras palavras, delimita as características fundamentais e a sua aplicabilidade como destinatário final de um produto ou prestação de serviços, dessa maneira, pondo termo ao desenvolvimento da atividade negocial. Nesse sentido, o art. 2º, da Lei nº 8.078/1190, dispõe:
Art. 2°. Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
A fim de compreender a entidade do consumidor enquanto uma das partes envolvidas na relação de consumo, faz-se imprescindível realçar que, consoante anteriormente mencionado, é imperativo que o indivíduo retire de circulação do mercado o produto almejado para aquisição. Nesse exato instante, o sujeito se qualifica como destinatário final daquela mercadoria e se transforma em consumidor.
Evidencia-se que é factível constatar que todo vínculo de cunho consumerista engloba duas entidades: o adquirente de um produto ou serviço e o provedor ou comerciante de um produto ou serviço. Nessa perspectiva, a relação encontra sua gênese na satisfação de uma necessidade do consumidor, o qual carece de controle sobre a produção de bens e serviços de consumo e se submete às condições impostas pelos produtores e fornecedores de serviços.
Nota-se que é possível observar que toda relação de consumo envolve duas figuras: o comprador de um produto ou serviço e o fornecedor ou comerciante de um produto ou serviço. Nesse sentido, a relação tem sua ascendência na satisfação de uma necessidade do consumidor, que não possui controle sobre a produção de bens e serviços de consumo e se submete às condições dos produtores e fornecedores de serviços.
Diante deste contexto, revela-se patente que, quando se aborda a figura do consumidor, a manifestação de assimetria entre as partes se faz notória, haja vista que o Código de Defesa do Consumidor se destina à salvaguarda de uma parte mais suscetível, cuja vulnerabilidade se evidencia.
No que concerne ao reconhecimento da vulnerabilidade, esta pode manifestar-se sob diferentes formas: técnica, jurídica, fática e informacional. A vulnerabilidade técnica surge quando o adquirente carece de conhecimentos específicos acerca do objeto de sua aquisição, o que o torna mais suscetível a ser iludido quanto às características e utilidade do produto. Por sua vez, a vulnerabilidade jurídica reside na ausência de conhecimentos jurídicos específicos, incluindo contabilidade e economia, uma vez que se presume que os consumidores são leigos nessas matérias e não possuem a expertise necessária.
A vulnerabilidade fática, por outro lado, concentra-se primordialmente no fornecedor do produto ou serviço, analisando especialmente sua posição econômica privilegiada e a natureza e essência da prestação do serviço em questão. E, no que tange à vulnerabilidade informacional, trata-se essencialmente da relevância das informações no contexto do bem de consumo, bem como do considerável poder de influência que tais informações exercem sobre a psique do consumidor, ou seja, a persuasão a que este está sujeito ao optar por adquirir um produto ou serviço no mercado consumerista.
Ademais, vale mencionar que não se pode menosprezar a possibilidade de a pessoa jurídica enquadrar-se como consumidora, desde que comprovada a sua vulnerabilidade, conforme entendimento jurisprudencial reiterado, tendo o Supremo Tribunal de Justiça como o principal órgão orientador nessa matéria.
No que concerne à pessoa jurídica no desenvolvimento de sua atividade produtiva, não há incidência do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que se trata de consumo intermediário, não sendo possível a inversão do ônus da devido à ausência de hipossuficiência. Em vez disso, a situação envolve apenas o incremento da atividade profissional com fins lucrativos. Consoante Miragem (2004)
O reconhecimento ou não da vulnerabilidade passa a servir, então, tanto para situações excepcionais, em que a pessoa jurídica empresária, embora não sendo destinatária final fática e econômica, é classificada como consumidora, quanto para excluir, em circunstâncias excepcionais, a aplicação das normas de proteção ao consumidor quando presentes condições particulares do adquirente ou usuário, que o coloquem em situação de superioridade em relação ao vendedor ou prestador de serviços.
Constata-se que, no tocante à pessoa física, a vulnerabilidade é presumida, ao passo que, no que tange à pessoa jurídica, a vulnerabilidade deve ser devidamente demonstrada. De maneira explícita, o princípio da vulnerabilidade se erige como um sustentáculo essencial e determinante no arcabouço conceitual do consumidor, pois se revela em distintas facetas, a saber: técnica, jurídica, fática e informacional.
3.2 DEFINIÇÃO DE FORNECEDOR E PRESTADOR DE SERVIÇO
Consoante ao disposto no Código de Defesa do Consumidor, o delineamento do conceito de fornecedor e prestador de serviços pode ser inferido do seu artigo 3º, que arrola que essas entidades se configuram como todo indivíduo que exerce uma atividade de cunho econômico.
Art. 3°. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços
§ 1°. Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2°. Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Por conseguinte, a figura do empresário, elencada no artigo 966 do Código Civil, desempenha um papel de notável relevância na delimitação desses sujeitos no contexto da relação de consumo.
Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Cumpre salientar que o conceito de fornecedor e prestador de serviço é abrangente, devendo sua classificação ser analisada sob a perspectiva do indivíduo em questão e da atividade por ele desempenhada. A abrangência do conceito de fornecedor pode ser depreendida como abarcando todo aquele que introduz um produto ou serviço no mercado com a finalidade de comercializá-lo.
A atividade econômica, mencionada no artigo 966 do Código Civil, transcende não apenas a simples oferta de produtos ou serviços, mas engloba também o planejamento estratégico inicial até a produção, abrangendo a aquisição de insumos, o processo produtivo, as atividades de marketing e a logística.
Em síntese, para se engajar em uma atividade econômica, o fornecedor e o prestador de serviços seguem uma trajetória estratégico-profissional, visando disponibilizar no mercado os produtos ou serviços por eles fabricados, com o intuito de auferir lucro. É possível constatar que o parágrafo 2º do artigo 3º inclui as instituições financeiras e bancárias como prestadoras de serviços, sujeitas, portanto, à aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor.
A habitualidade se revela como um requisito primordial para a conceituação de fornecedor, mesmo que não seja expressamente estabelecido pela legislação. Trata-se de um fato intrínseco à figura do fornecedor, o exercício de sua atividade profissional de forma regular e contínua, concomitantemente à onerosidade, uma vez que se trata do desenvolvimento de seu próprio empreendimento.
Outro aspecto relevante a ser considerado para caracterizar um fornecedor é a questão da remuneração. Para determinar se um sujeito se enquadra nessa categoria, entende-se que mesmo que o serviço ou produto seja adquirido de forma gratuita, é incontestável que a produção ou a concepção desse serviço, desde sua origem, envolveu onerosidade - uma remuneração indireta - e outros custos relacionados à sua criação. Portanto, esse sujeito também se submete às normas de defesa do consumidor.
É de suma importância destacar a definição de produto e serviço sob a perspectiva jurídica. O termo "produto" abrange uma ampla gama de bens, sejam eles móveis ou imóveis, fungíveis ou infungíveis, materiais ou imateriais, que compõem o mercado de consumo. Por outro lado, o termo "serviço" engloba todas as atividades prestadas no mercado e disponibilizadas para consumo.
No que diz respeito à relação entre consumidores e instituições financeiras e bancárias como prestadoras de serviços, o consumidor é considerado usuário dos produtos e serviços oferecidos pelos bancos. O termo "consumidor" usualmente é utilizado para se referir ao cliente. Portanto, as instituições financeiras e bancárias fazem parte da cadeia de produção até o final da relação com o consumidor. Segundo Grinover (2011, p. 48): “qualquer um que, a título singular, mediante desempenho de atividade mercantil ou civil e de forma habitual, ofereça no mercado produtos ou serviços, e a jurídica, da mesma forma, mas em associação mercantil ou civil e de forma habitual”.
3.3 RESPONSABILIDADE OBJETIVA E A TEORIA DO RISCO NO CONTEXTO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Antes de adentrar ao cerne da questão, é primordial esclarecer que o Código de Defesa do Consumidor, em seus artigos 12, 13 e 14, in verbis, estabelece a aplicação da responsabilidade civil objetiva aos fornecedores, em decorrência dos eventuais danos decorrentes de produtos ou serviços fornecidos.
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 13. O comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:
I. O fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;
II. O produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador;
III. Não conservar adequadamente os produtos perecíveis.
Parágrafo único. Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso.
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Ao tratar da responsabilidade civil objetiva, faz-se imperativo ressaltar que a comprovação adequada do vício é imprescindível, a fim de identificar a ocorrência do evento danoso ou lesivo ao consumidor. Nesse contexto, torna-se essencial estabelecer uma conexão causal entre o defeito e o prejuízo experimentado, independentemente da necessidade de demonstrar a culpa daquele que perpetrara o ato ilícito.
teoria do risco da atividade ou do negócio jurídico, no contexto da responsabilidade civil objetiva, estabelece que todo aquele que se engaja na oferta de produtos ou serviços no mercado assume o risco de causar prejuízos aos consumidores. Assim, diante da ocorrência do prejuízo, surge o dever de reparação, independentemente da comprovação de dolo ou culpa. Conforme expresso por Silva (2020, p. 36) “de acordo com a teoria do risco da atividade aquele que coloca, mediante ganhos ou vantagens, alguém em risco, deve arcar com os danos decorrentes”.
No que se refere às instituições financeiras e bancárias, devido à natureza lucrativa de suas práticas, é possível constatar a presença do risco. Portanto, a atividade por elas exercida é considerada arriscada, uma vez que existe a possibilidade de o empreendimento ocasionar danos e, inevitavelmente, a obtenção do lucro estará vinculada a tais possíveis prejuízos.
3.4 O ÔNUS DA PROVA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO
O Código de Defesa do Consumidor é uma legislação específica que busca regular as relações de consumo. Os novos preceitos estabelecidos por essa norma prevalecem sobre leis gerais, pois trata-se de uma matéria singular e específica. As leis anteriores foram revogadas e só são aplicáveis quando houver compatibilidade expressa.
Da mesma forma, a responsabilidade objetiva consagrada no Código de Defesa do Consumidor estabelece um equilíbrio entre fornecedor e consumidor, atribuindo exclusivamente ao fornecedor a responsabilização pelos riscos. Além disso, destaca-se a possibilidade de responsabilidade solidária entre os membros da cadeia de produção do bem de consumo ou prestação de serviço.
No que diz respeito ao ônus da prova nas relações de consumo, a legislação consumerista é a principal fonte, sendo o Código de Processo Civil aplicado subsidiariamente. A vulnerabilidade do consumidor, sua hipossuficiência e o contexto específico do caso são elementos que influenciam na produção de provas. Isso significa que, em virtude do princípio da vulnerabilidade, o juiz deve presumir que o consumidor é a parte mais frágil na relação jurídica de consumo. Conforme estabelecido pelo artigo 4°, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 4º. A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
I. reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;
A hipossuficiência é um fenômeno jurídico que se refere à presunção da falta de recursos econômicos por parte do consumidor, o que o impede de arcar com os custos da produção de provas em um processo. Theodoro Júnior (2017, p. 445) argumenta que a hipossuficiência “trata-se de impotência do consumidor, seja de origem econômica, seja de outra natureza, para apurar e demonstrar a causa do dano cuja responsabilidade é imputada ao fornecedor”.
Além disso, a verossimilhança das alegações é um aspecto crucial a ser avaliado pelo juiz, pois a partir dela são extraídos indícios factuais da veracidade dos fatos narrados. Embora não haja certeza absoluta sobre o que ocorreu, a análise do caso concreto fundamenta a presunção dos fatos.
Nesse contexto, torna-se imperativo ressaltar a existência do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, o qual estabelece a latente possibilidade de se proceder à inversão do ônus probatório. Essa prerrogativa, prevista na norma consumerista, consiste em uma medida excepcional, por meio da qual se desloca a incumbência da prova para a parte contrária ao consumidor, quando se evidenciam circunstâncias verossímeis que atestam a fragilidade do consumidor e sua incapacidade de arcar com o ônus probatório, ao passo que o fornecedor, por sua vez, detém maior capacidade técnica, econômica e informacional.
Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:
[...].
VIII. A facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências.
Além disso, impera salientar que o Código de Processo Civil, em seu artigo 333, estabelece que o ônus da prova recai sobre o autor no que tange aos fatos constitutivos de seu direito, bem como sobre o réu quando há alegação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor (BRASIL, 2015).
Destaca-se, outrossim, a existência de duas modalidades de inversão do ônus probatório, sendo uma delas de cunho legal e de caráter obrigatório, e a outra a critério discricionário do juiz. A primeira deriva de disposição legal específica, enquanto a segunda depende do entendimento do magistrado diante das circunstâncias apresentadas.
No âmbito das relações bancárias, verifica-se a ocorrência da inversão do ônus probatório, haja vista tratar-se de uma relação de consumo. Nesse contexto, quando o juiz se depara com fatos verossímeis e a hipossuficiência do consumidor, a incumbência de provar que as alegações do autor não são verídicas recai sobre as instituições financeiras.
4 A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS NAS FRAUDES BANCÁRIAS NO ÂMBITO DIGITAL
O advento do meio digital no âmbito bancário trouxe consigo a promessa de praticidade, comunicação e interconexão para os usuários. No entanto, lamentavelmente, práticas ilícitas têm comprometido a integridade desse ambiente, tornando o consumidor ainda mais vulnerável na relação de consumo. É crucial destacar que o consumidor deposita sua confiança no fraudador, o que torna essencial o estudo aprofundado dessa temática, visando compreender os principais aspectos envolvidos.
Estudos revelam que, apesar dos expressivos investimentos em tecnologia por parte dos bancos visando a segurança, tais esforços têm se mostrado insuficientes diante do crescimento exponencial de tentativas de fraude desde 2021. A maioria desses golpes não resulta de falhas ou invasões no sistema de segurança, mas sim da habilidade persuasiva dos fraudadores, os quais conseguem obter dados privados dos consumidores, que inadvertidamente fornecem acesso às suas contas bancárias (PORTAL R7, 2021, n. p.).
O avanço globalizado da tecnologia introduziu inúmeras vantagens e desvantagens nos serviços bancários. As vantagens são evidentes, como a possibilidade de abrir uma conta bancária sem a necessidade de comparecer fisicamente à instituição financeira, bem como a realização de transações financeiras, investimentos, negociações, transferências e muito mais. No entanto, as desvantagens surgem na forma de novos modelos de fraude que surgiram nesse sistema digital. Assim, é inegável que a internet aumentou a vulnerabilidade do consumidor.
No que diz respeito à responsabilidade civil dos bancos como prestadores de serviços na relação de consumo, a reparação dos danos causados aos consumidores é objetiva. A Súmula 479 do Supremo Tribunal de Justiça, um precedente qualificado, estabelece que "as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias”.
Nesse contexto, as fraudes e delitos que afetam o sistema bancário no meio digital, causando danos aos usuários e a terceiros, configuram-se como casos fortuitos internos, visto que representam riscos inerentes ao próprio empreendimento. Desse modo, a instituição financeira não pode se eximir da obrigação de indenizar. No entanto, caso a fraude tenha sido cometida pelo consumidor ou por terceiros, a responsabilidade civil da instituição bancária pode ser afastada.
Essa flexibilização ocorre porque o entendimento sumulado não se aplica quando a culpa recai exclusivamente sobre o consumidor ou outra parte, ou seja, a causalidade não engloba a atividade do fornecedor, neste caso a instituição financeira. Em última análise, na prática, o consumidor deve agir com cautela, uma vez que a responsabilidade objetiva das instituições dependerá das circunstâncias específicas de cada caso.
A responsabilização civil das instituições financeiras no que se refere à ilicitude das fraudes foi a temática abordada neste presente trabalho. A responsabilidade civil ocorre por meio de um estudo que visa identificar o indivíduo que praticou o ato ilícito, assim como, aclarar os elementos constitutivos da responsabilidade civil e as excludentes de ilicitude para que cada caso concreto seja analisado de acordo com a sua especificidade.
Constatou-se ao decorrer do trabalho que a lei consumerista é aplicada nas relações bancárias, uma vez que as instituições financeiras atuam no mercado de consumo como fornecedoras de prestação de serviço. Sendo assim, todas as proteções consumeristas são direcionadas às relações bancárias, como por exemplo, a inversão o ônus da prova, a verossimilhança das alegações e a hipossuficiência do usuário – ora consumidor.
Identificou-se que toda ação que visa obter vantagem desonesta é enquadrada como fraude. O avanço da tecnologia colocou em evidência o tema das fraudes bancárias no âmbito online, desse modo, os bancos buscam informar os clientes dessas possíveis falcatruas, uma tentativa de evitar que os malfeitores tenham êxito em sua empreitada.
Dado o exposto, o esforço das instituições financeiras em evitar tais fraudes passou a ser reconhecido nos tribunais, motivando o entendimento dos magistrados – a depender do caso – reconhecer a culpa exclusiva do consumidor, que é entendido como responsável pelo zelo de seus dados pessoais.
O Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula 479, entendeu que as instituições financeiras devem responder objetivamente pelos danos gerados por fortuito em relação às fraudes financeiras e delitos praticados por outrem. Dessa forma, a responsabilização civil dos bancos tem sua ascendência quando há falha de deveres básicos contratuais de cuidado e segurança, principalmente, no que tange à falsificação de assinatura e segurança dos caixas.
Por fim, verificou-se que o judiciário aplica as normas consumeristas nas relações de consumo, contudo, é preciso ter cautela ao afirmar que a existência da fraude é suficiente, uma vez que é de extrema importância que a conduta do consumidor seja analisada, pois se seu ato contribuiu com a consumação da fraude, a responsabilidade civil pode ser afastada.
ALVES, Caroline Cassane. A Responsabilidade Civil das Instituições Bancárias por Danos Causados ao Consumidor, pela Utilização Indevida, por Terceiro, de Cartão de Crédito, Débito ou Pix. 2022. 53 f. TCC (Graduação) - Curso de Direito, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Campus Perdizes, São Paulo, 2022. Disponível em: <https://sapientia.pucsp.br/handle/handle/31716>. Acesso em: 20 de abril de 2023.
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graduanda em Direito pela Universidade Brasil – Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CHAVES, Crislaine dos Santos. As ardilosas falcatruas bancárias no cenário digital e a imputação civil das instituições financeiras Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 maio 2023, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61540/as-ardilosas-falcatruas-bancrias-no-cenrio-digital-e-a-imputao-civil-das-instituies-financeiras. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
Por: Jaqueline Lopes Ribeiro
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